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Educação Escola e Pandemia

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organizadora

Denise D'Auria - Tardeli

EDUCACÃO
ESCOLA
DD E PANDEMIA
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experiências ee discussões
sobre professores ,
alunos ee gestores

$ pimenta
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organizadora
Denise D'Auria - Tardeli

EDUCACÃO
ESCOLA
E PANDEMIA
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experiências e discussões
sobre professores ,
alunos e gestores

pimenta
| São Paulo | 2021 | jeanno
Copyright © Pimenta Cultural, alguns direitos reservados.
Copyright do texto © 2021 os autores e as autoras.
Copyright da edição © 2021 Pimenta Cultural.

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estão disponíveis em: <https://creativecommons.org/licenses/>. Direitos para esta
edição cedidos à Pimenta Cultural. O conteúdo publicado não representa a posição
oficial da Pimenta Cultural.

CONSELHO EDITORIAL CIENTÍFICO


Doutores e Doutoras

Airton Carlos Batistela Bernadétte Beber


Universidade Católica do Paraná, Brasil Universidade Federal de Santa Catarina, Brasil
Alaim Souza Neto Breno de Oliveira Ferreira
Universidade do Estado de Santa Catarina, Brasil Universidade Federal do Amazonas, Brasil
Alessandra Regina Müller Germani Carla Wanessa Caffagni
Universidade Federal de Santa Maria, Brasil Universidade de São Paulo, Brasil
Alexandre Antonio Timbane Carlos Adriano Martins
Universidade Estadual Paulista Júlio de Mesquita Filho,Brasil Universidade Cruzeiro do Sul, Brasil
Alexandre Silva Santos Filho Caroline Chioquetta Lorenset
Universidade Federal de Goiás, Brasil Universidade Federal de Santa Catarina, Brasil
Aline Daiane Nunes Mascarenhas Cláudia Samuel Kessler
Universidade Estadual da Bahia, Brasil Universidade Federal do Rio Grande do Sul, Brasil
Aline Pires de Morais Daniel Nascimento e Silva
Universidade do Estado de Mato Grosso, Brasil Universidade Federal de Santa Catarina, Brasil
Aline Wendpap Nunes de Siqueira Daniela Susana Segre Guertzenstein
Universidade Federal de Mato Grosso, Brasil Universidade de São Paulo, Brasil
Ana Carolina Machado Ferrari Danielle Aparecida Nascimento dos Santos
Universidade Federal de Minas Gerais, Brasil Universidade Estadual Paulista Júlio de Mesquita Filho, Brasil
Andre Luiz Alvarenga de Souza Delton Aparecido Felipe
Emill Brunner World University, Estados Unidos Universidade Estadual de Maringá, Brasil
Andreza Regina Lopes da Silva Dorama de Miranda Carvalho
Universidade Federal de Santa Catarina, Brasil Escola Superior de Propaganda e Marketing, Brasil
Antonio Henrique Coutelo de Moraes Doris Roncareli
Universidade Católica de Pernambuco, Brasil Universidade Federal de Santa Catarina, Brasil
Arthur Vianna Ferreira Edson da Silva
Universidade Católica de São Paulo, Brasil Universidade Federal dos Vales do Jequitinhonha e Mucuri, Brasil
Bárbara Amaral da Silva Elena Maria Mallmann
Universidade Federal de Minas Gerais, Brasil Universidade Federal de Santa Maria, Brasil
Beatriz Braga Bezerra Emanoel Cesar Pires Assis
Escola Superior de Propaganda e Marketing, Brasil Universidade Federal de Santa Catarina, Brasil
Erika Viviane Costa Vieira Juliana Tiburcio Silveira-Fossaluzza
Everly Federal dos Vales do Jequitinhonha e Mucuri, Brasil Universidade Estadual Paulista Júlio de Mesquita Filho, Brasil
Pegoraro
Universidade
Julierme Sebastião Morais Souza
Universidade Federal do Rio de Janeiro, Brasil Universidade Federal de Uberlândia, Brasil
Fábio Santos de Andrade Karlla Christine Araújo Souza
Universidade Federal de Mato Grosso, Brasil Universidade Federal da Paraíba, Brasil
Fauston Negreiros Laionel Vieira da Silva
Universidade Federal do Ceará, Brasil Universidade Federal da Paraíba, Brasil
Felipe Henrique Monteiro Oliveira Leandro Fabricio Campelo
Universidade Federal da Bahia, Brasil Universidade de São Paulo, Brasil
Fernando Barcellos Razuck Leonardo Jose Leite da Rocha Vaz
Universidade de Brasília, Brasil Universidade Federal do Rio Grande do Sul, Brasil
Francisca de Assiz Carvalho Leonardo Pinhairo Mozdzenski
Universidade Cruzeiro do Sul, Brasil Universidade Federal de Pernambuco, Brasil
Gabriela da Cunha Barbosa Saldanha Lidia Oliveira
Universidade Federal de Minas Gerais, Brasil Universidade de Aveiro, Portugal
Gabrielle da Silva Forster Luan Gomes dos Santos de Oliveira
Universidade Federal de Santa Maria, Brasil Universidade Federal do Rio Grande do Norte, Brasil
Guilherme do Val Toledo Prado Luciano Carlos Mendes Freitas Filho
Universidade Estadual de Campinas, Brasil Universidade Federal do Rio de Janeiro, Brasil
Hebert Elias Lobo Sosa Lucila Romano Tragtenberg
Universidad de Los Andes, Venezuela Pontifícia Universidade Católica de São Paulo, Brasil
Helciclever Barros da Silva Vitoriano Lucimara Rett
InstitutoTeixeira,
Anísio Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais
Brasil Universidade Metodista de São Paulo, Brasil
Marceli Cherchiglia Aquino
Helen de Oliveira Faria Universidade Federal de Minas Gerais, Brasil
Universidade Federal de Minas Gerais, Brasil
Marcia Raika Silva Lima
Heloisa Candello Universidade Federal do Piauí, Brasil
IBM e University of Brighton, Inglaterra
Marcos Pereira dos Santos
Heloisa Juncklaus Preis Moraes Universidad Internacional Iberoamericana del Mexico, México
Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul, Brasil Marcos Uzel Pereira da Silva
Humberto Costa Universidade Federal da Bahia, Brasil
Universidade Federal do Paraná, Brasil
Marcus Fernando da Silva Praxedes
Ismael Montero Fernández, Universidade Federal do Recôncavo da Bahia, Brasil
Universidade Federal de Roraima, Brasil
Margareth de Souza Freitas Thomopoulos
Jeronimo Becker Flores Universidade Federal de Uberlândia, Brasil
Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul, Brasil Maria Angelica Penatti Pipitone
Jorge Eschriqui Vieira Pinto Universidade Estadual de Campinas, Brasil
Jorge Luís de
Universidade Oliveira
Estadual PintoJúlio
Paulista de
Filho Mesquita Filho, Brasil Maria Cristina Giorgi
Centro Federal de Educação Tecnológica
Universidade
José Federal doFornos
Luís Giovanoni Rio Grande do Norte, Brasil
Pontifícia Celso Suckow da Fonseca, Brasil
Maria de Fátima Scaffo
Universidade
Josué Antunes de Macêdo
Católica do Rio Grande do Sul, Brasil Universidade Federal do Estado do Rio de Janeiro, Brasil
Maria Isabel Imbronito
Universidade Cruzeiro do Sul, Brasil Universidade de São Paulo, Brasil
Júlia Carolina da Costa Santos Maria Luzia da Silva Santana
Universidade Cruzeiro do Sul, Brasil Universidade Federal de Mato Grosso do Sul, Brasil
Juliana de Oliveira Vicentini Maria Sandra Montenegro Silva Leão
Universidade de São Paulo, Brasil Pontifícia Universidade Católica de São Paulo, Brasil
Michele Marcelo Silva Bortolai Rosane de Fatima Antunes Obregon
Universidade de São Paulo, Brasil Universidade Federal do Maranhão, Brasil
Miguel Rodrigues Netto Sebastião Silva Soares
Pontifícia Universidade Católica de São Paulo, Brasil Universidade Federal do Tocantins, Brasil
Nara Oliveira Salles Simone Alves de Carvalho
Universidade Federal do Rio Grande do Norte, Brasil Universidade de São Paulo, Brasil
Neli Maria Mengalli Stela Maris Vaucher Farias
Pontifícia Universidade Católica de São Paulo, Brasil Universidade Federal do Rio Grande do Sul, Brasil
Patricia Bieging Tadeu João Ribeiro Baptista
Universidade de São Paulo, Brasil Universidade Federal de Goiás, Brasil
Patrícia Helena dos Santos Carneiro Taíza da Silva Gama
Universidade do Estado do Rio de Janeiro, Brasil Universidade de São Paulo, Brasil
Patrícia Oliveira Tania Micheline Miorando
Universidade de Aveiro, Portugal Universidade Federal de Santa Maria, Brasil
Patricia Mara de Carvalho Costa Leite Tarcísio Vanzin
Universidade Federal de São João del-Rei, Brasil Universidade Federal de Santa Catarina, Brasil
Paulo Augusto Tamanini Thiago Barbosa Soares
Universidade Federal de Santa Catarina, Brasil Universidade Federal de São Carlos, Brasil
Priscilla Stuart da Silva Thiago Camargo Iwamoto
Universidade Federal de Santa Catarina, Brasil Universidade de Brasília, Brasil
Radamés Mesquita Rogério Thiago Guerreiro Bastos
Universidade Federal do Ceará, Brasil Universidade Estácio de Sá e Centro Universitário Carioca, Brasil
Ramofly Bicalho Dos Santos Thyana Farias Galvão
Universidade de Campinas, Brasil Universidade Federal do Rio Grande do Norte, Brasil
Ramon Taniguchi Piretti Brandao Valdir Lamim Guedes Junior
Universidade Federal de Goiás, Brasil Universidade de São Paulo, Brasil
Rarielle Rodrigues Lima Valeska Maria Fortes de Oliveira
Universidade Federal do Maranhão, Brasil Universidade Federal do Rio Grande do Sul, Brasil
Raul Inácio Busarello Vanessa Elisabete Raue Rodrigues
Universidade Federal de Santa Catarina, Brasil Universidade Estadual de Ponta Grossa, Brasil
Renatto Cesar Marcondes Vania Ribas Ulbricht
Universidade de São Paulo, Brasil Universidade Federal de Santa Catarina, Brasil
Ricardo Luiz de Bittencourt Walter de Carvalho Braga Júnior
Universidade Federal do Rio Grande do Sul, Brasil Universidade Estadual do Ceará, Brasil
Rita Oliveira Wagner Corsino Enedino
Universidade de Aveiro, Portugal Universidade Federal de Mato Grosso do Sul, Brasil
Robson Teles Gomes Wanderson Souza Rabello
Universidade Federal da Paraíba, Brasil Universidade Estadual do Norte Fluminense Darcy Ribeiro, Brasil
Rodiney Marcelo Braga dos Santos Washington Sales do Monte
Universidade Federal de Roraima, Brasil Universidade Federal de Sergipe, Brasil
Rodrigo Amancio de Assis Wellington Furtado Ramos
Universidade Federal de Mato Grosso, Brasil Universidade Federal de Mato Grosso do Sul, Brasil
Rodrigo Sarruge Molina
Universidade Federal do Espírito Santo, Brasil
PARECERISTAS E REVISORES(AS) POR PARES
Avaliadores e avaliadoras Ad-Hoc

Adilson Cristiano Habowski Antônia de Jesus Alves dos Santos


Universidade La Salle - Canoas, Brasil Universidade Federal da Bahia, Brasil
Adriana Flavia Neu Antonio Edson Alves da Silva
Universidade Federal de Santa Maria, Brasil Universidade Estadual do Ceará, Brasil
Aguimario Pimentel Silva Ariane Maria Peronio Maria Fortes
Instituto Federal de Alagoas, Brasil Universidade de Passo Fundo, Brasil
Alessandra Dale Giacomin Terra Ary Albuquerque Cavalcanti Junior
Universidade Federal Fluminense, Brasil Universidade do Estado da Bahia, Brasil
Alessandra Figueiró Thornton Bianca Gabriely Ferreira Silva
Universidade Luterana do Brasil, Brasil Universidade Federal de Pernambuco, Brasil
Alessandro Pinto Ribeiro Bianka de Abreu Severo
Universidade Católica do Rio Grande do Sul, Brasil Universidade Federal de Santa Maria, Brasil
Alexandre João Appio Bruna Carolina de Lima Siqueira dos Santos
Universidade do Vale do Rio dos Sinos, Brasil Universidade do Vale do Itajaí, Brasil
Aline Corso Bruna Donato Reche
Universidade do Vale do Rio dos Sinos, Brasil Universidade Estadual de Londrina, Brasil
Aline Marques Marino Bruno Rafael Silva Nogueira Barbosa
Centro Universitário Salesiano de São Paulo, Brasil Universidade Federal da Paraíba, Brasil
Aline Patricia Campos de Tolentino Lima Camila Amaral Pereira
Centro Universitário Moura Lacerda, Brasil Universidade Estadual de Campinas, Brasil
Ana Emidia Sousa Rocha Carlos Eduardo Damian Leite
Universidade do Estado da Bahia, Brasil Universidade de São Paulo, Brasil
Ana Iara Silva Deus Carlos Jordan Lapa Alves
Universidade de Passo Fundo, Brasil Universidade Estadual do Norte Fluminense Darcy Ribeiro, Brasil
Ana Julia Bonzanini Bernardi Carolina Fontana da Silva
Universidade Federal do Rio Grande do Sul, Brasil Universidade Federal de Santa Maria, Brasil
Ana Rosa Gonçalves De Paula Guimarães Carolina Fragoso Gonçalves
Universidade Federal de Uberlândia, Brasil Universidade Estadual do Norte Fluminense Darcy Ribeiro, Brasil
André Gobbo Cássio Michel dos Santos Camargo
Universidade Federal da Paraíba, Brasil Universidade Federal do Rio Grande do Sul-Faced, Brasil
André Luís Cardoso Tropiano Cecília Machado Henriques
Universidade Nova de Lisboa, Portugal Universidade Federal de Santa Maria, Brasil
André Ricardo Gan Cíntia Moralles Camillo
Universidade do Estado do Rio de Janeiro, Brasil Universidade Federal de Santa Maria, Brasil
Andressa Antonio de Oliveira Claudia Dourado de Salces
Universidade Federal do Espírito Santo, Brasil Universidade Estadual de Campinas, Brasil
Andressa Wiebusch Cleonice de Fátima Martins
Universidade Federal de Santa Maria, Brasil Universidade Estadual de Ponta Grossa, Brasil
Angela Maria Farah Cristiane Silva Fontes
Universidade de São Paulo, Brasil Universidade Federal de Minas Gerais, Brasil
Anísio Batista Pereira Cristiano das Neves Vilela
Universidade Federal de Uberlândia, Brasil Universidade Federal de Sergipe, Brasil
Anne Karynne da Silva Barbosa Daniele Cristine Rodrigues
Universidade Federal do Maranhão, Brasil Universidade de São Paulo, Brasil
Daniella de Jesus Lima Francisco Geová Goveia Silva Júnior
Universidade Tiradentes, Brasil Universidade Potiguar, Brasil
Dayara Rosa Silva Vieira Francisco Isaac Dantas de Oliveira
Universidade Federal de Goiás, Brasil Universidade Federal do Rio Grande do Norte, Brasil
Dayse Rodrigues dos Santos Francisco Jeimes de Oliveira Paiva
Universidade Federal de Goiás, Brasil Universidade Estadual do Ceará, Brasil
Dayse Sampaio Lopes Borges Gabriella Eldereti Machado
Deborah Susane
Universidade EstadualSampaio Sousa Lima
do Norte Fluminense Darcy Ribeiro, Brasil Universidade Federal de Santa Maria, Brasil
Gean Breda Queiros
Universidade Tuiuti do Paraná, Brasil Universidade Federal do Espírito Santo, Brasil
Diego Pizarro Germano Ehlert Pollnow
Instituto Federal de Brasília, Brasil Universidade Federal de Pelotas, Brasil
Diogo Luiz Lima Augusto Giovanna Ofretorio de Oliveira Martin Franchi
Ederson Universidade
Pontifícia Silveira Católica do Rio de Janeiro, Brasil Universidade Federal de Santa Catarina, Brasil
Glaucio Martins da Silva Bandeira
Universidade Federal de Santa Catarina, Brasil Universidade Federal Fluminense, Brasil
Elaine Santana de Souza Handherson Leyltton Costa Damasceno
Universidade Estadual do Norte Fluminense Universidade Federal da Bahia, Brasil
Darcy Ribeiro, Brasil
Helena Azevedo Paulo de Almeida
Eleonora das Neves Simões Universidade Federal de Ouro Preto, Brasil
Universidade Federal do Rio Grande do Sul, Brasil
Heliton Diego Lau
Elias Theodoro Mateus Universidade Estadual de Ponta Grossa, Brasil
Universidade Federal de Ouro Preto, Brasil
Hendy Barbosa Santos
Elisiene Borges Leal Faculdade de Artes do Paraná, Brasil
Universidade Federal do Piauí, Brasil
Inara Antunes Vieira Willerding
Elizabete de Paula Pacheco Universidade Federal de Santa Catarina, Brasil
Universidade Federal de Uberlândia, Brasil
Ivan Farias Barreto
Elizânia Sousa do Nascimento Universidade Federal do Rio Grande do Norte, Brasil
Universidade Federal do Piauí, Brasil Jacqueline de Castro Rimá
Elton Simomukay Universidade Federal da Paraíba, Brasil
Universidade Estadual de Ponta Grossa, Brasil Jeane Carla Oliveira de Melo
Elvira Rodrigues de Santana Universidade Federal do Maranhão, Brasil
Universidade Federal da Bahia, Brasil
João Eudes Portela de Sousa
Emanuella Silveira Vasconcelos Universidade Tuiuti do Paraná, Brasil
Universidade Estadual de Roraima, Brasil João Henriques de Sousa Junior
Érika Catarina de Melo Alves Universidade Federal de Pernambuco, Brasil
Universidade Federal da Paraíba, Brasil
Joelson Alves Onofre
Everton Boff Universidade Estadual de Santa Cruz, Brasil
Universidade Federal de Santa Maria, Brasil
Juliana da Silva Paiva
Fabiana Aparecida Vilaça Universidade Federal da Paraíba, Brasil
Universidade Cruzeiro do Sul, Brasil
Junior César Ferreira de Castro
Fabiano Antonio Melo Universidade Federal de Goiás, Brasil
Universidade Nova de Lisboa, Portugal
Lais Braga Costa
Fabrícia Lopes Pinheiro Universidade de Cruz Alta, Brasil
Universidade Federal do Estado do Rio de Janeiro, Brasil
Leia Mayer Eyng
Fabrício Nascimento da Cruz Universidade Federal de Santa Catarina, Brasil
Universidade Federal da Bahia, Brasil
Manoel Augusto Polastreli Barbosa
Fabrício Tonetto Londero Universidade Federal do Espírito Santo, Brasil
Universidade Federal de Santa Maria, Brasil
Marcio Bernardino Sirino Railson Pereira Souza
Universidade Federal do Estado do Rio de Janeiro, Brasil Universidade Federal do Piauí, Brasil
Marcos de Souza Machado Rogério Rauber
Universidade Federal da Bahia, Brasil Universidade Estadual Paulista Júlio de Mesquita Filho, Brasil
Marcos dos Reis Batista Samuel André Pompeo
Universidade Federal do Pará, Brasil Universidade Estadual Paulista Júlio de Mesquita Filho, Brasil
Maria Aparecida da Silva Santandel Simoni Urnau Bonfiglio
Universidade Federal de Mato Grosso do Sul, Brasil Universidade Federal da Paraíba, Brasil
Maria Edith Maroca de Avelar Rivelli de Oliveira Tayson Ribeiro Teles
Universidade Federal de Ouro Preto, Brasil Universidade Federal do Acre, Brasil
Mauricio José de Souza Neto Valdemar Valente Júnior
Universidade Federal da Bahia, Brasil Universidade Federal do Rio de Janeiro, Brasil
Michele de Oliveira Sampaio Wallace da Silva Mello
Universidade Federal do Espírito Santo, Brasil Universidade Estadual do Norte Fluminense Darcy Ribeiro, Brasil
Miriam Leite Farias Wellton da Silva de Fátima
Universidade Federal de Pernambuco, Brasil Universidade Federal Fluminense, Brasil
Natália de Borba Pugens Weyber Rodrigues de Souza
Universidade La Salle, Brasil Pontifícia Universidade Católica de Goiás, Brasil
Patricia Flavia Mota Wilder Kleber Fernandes de Santana
Universidade do Estado do Rio de Janeiro, Brasil Universidade Federal da Paraíba, Brasil
Raick de Jesus Souza
Fundação Oswaldo Cruz, Brasil

PARECER E REVISÃO POR PARES


Os textos que compõem esta obra foram submetidos
para avaliação do Conselho Editorial da Pimenta
Cultural, bem como revisados por pares, sendo
indicados para a publicação.
Direção editorial Patricia Bieging
Raul Inácio Busarello
Editora executiva Patricia Bieging
Coordenadora editorial Landressa Rita Schiefelbein
Assistente editorial Caroline dos Reis Soares
Diretor de criação Raul Inácio Busarello
Editoração eletrônica Lucas Andrius de Oliveira
Peter Valmorbida
Imagens da capa Freepik, Jenteva, Macrovector - Freepik.com
Revisão Bruna Cantero
Organizadora Denise D’Auria-Tardeli

Dados Internacionais de Catalogação na Publicação (CIP)


___________________________________________________________________________

E244 Educação, escola e pandemia: experiências e discussões sobre


professores, alunos e gestores. Denise D’Auria-Tardeli -
organizadora. São Paulo: Pimenta Cultural, 2021.331p..

Inclui bibliografia.
ISBN: 978-65-5939-310-7 (eBook)
1. Educação. 2. Escola. 3. Pandemia. 4. Reestruturação.
5. Organização. I. D’Auria-Tardeli, Denise. II. Título.

CDU: 370
CDD: 370

DOI: 10.31560/pimentacultural/2021.107
___________________________________________________________________________

PIMENTA CULTURAL
São Paulo - SP
Telefone: +55 (11) 96766 2200
livro@pimentacultural.com
www.pimentacultural.com 2 0 2 1
SUMÁRIO
Apresentação................................................................................. 13

Capítulo 1

Aprendizagem em situação adversa:


reflexões e os seus desdobramentos .............................................. 16
Cristofer André Caous
Denise D’Auria-Tardeli

Capítulo 2
Educação remota e crianças com dificuldades
de aprendizagem
Adriana Pasqualini em tempos de pandemia ................................. 39

Capítulo 3

Lugar e papel da relação pedagógica


em tempos de pandemia: sentidos, desafios
e aprendizados a partir da compreensão de professores ................ 62
Joice Maria de Oliveira
Maria Teresa Ceron Trevisol
Vanessa Maghry de Andrade

Capítulo 4

Em tempos de confinamento, os desafios


em lidar com as competências socioemocionais
nos cursos
Simone de educação profissional ........................................... 89
Balsamo
Capítulo 5

Os desafios causados pela excepcionalidade


Moro e o clima escolar..................................................... 109
da Covid-19
Adriano

Telma Pileggi Vinha

Capítulo 6
Educação, pandemia e desigualdades:
gestão em
Marcelo dos tempos
Santos de mudanças .................................................. 140

Maria José de Oliveira Russo

Capítulo 7

Projetos de vida de professores frente


à pandemia da Covid-19:
Valériasentidos
entre Arantes e significados ......................................................... 167

Beattriz Guedes de Seixas

Capítulo 8

Projeto entre nós: rodas de conversa


com educadores em tempos
de
Cristina da Covid-19
Maria D’Antona
pandemia ............................................................. 189
Bachert

Mara Cristina Normídio Bini


Maria Cristina do Nascimento
Lucas de Góes Ribeiro
Beatriz Favinchi Rossi
Capítulo 9

Intervenção on-line com a equipe gestora


na escola pública em tempos de pandemia ............................. 213
Daniela Crepaldi Molás
Karen Naomi Cardoso Kubo
Renata Thurler Lessa
Carlos Henrique Ferreira da Silva
Letícia Lovato Dellazzana-Zanon

Capítulo 10

Juventudes, tecnologias e formação


profissional em tempos de pandemia:
uma experiência com jovens de São Paulo-SP.............................. 237
Lucian da Silva Barros

Capítulo 11

Intervenção psicológica on-line para


o desenvolvimento de projetos de vida
de adolescentes da rede pública:
desafios e possibilidades
Juliano Porto ............................................................. 261
de Cerqueira Leite

Júlia Kawano Brito


Antonella Bisetto
Carlos Henrique Ferreira da Silva
Letícia Lovato Dellazzana-Zanon

Capítulo 12

Experiências da pós-graduação stricto sensu


no contexto da covid-19: o que as pesquisas
têm nosTessaro
Mônica indicado?......................................................................... 286

Rosane França Cavasin


Capítulo 13

Práticas de autoconhecimento
como estratégia de autorregulação
para e gestores
Unguer Raphael
professores
Patrícia Bataglia na pandemia................................. 306

Cristiane Paiva Alves


Júlia Costa Ishiuchi
Isabel Bragança Baraldi

Sobre os autores e as autoras .................................................... 322

Índice remissivo........................................................................... 328


APRESENTAÇÃO
A crise sanitária provocada pelo novo coronavírus alterou a vida
de milhões de pessoas de todo o mundo, gerando desafios em todos
os âmbitos. E o setor educacional é o que, talvez, esteja sofrendo as
consequências de forma mais aguda: escolas fechadas, transição do
ensino presencial para um ensino digital-virtual e incertezas em torno
dos processos habituais de ensino e aprendizagem.

A COVID-19 foi definida pela Organização Mundial de Saúde,


em 2019, como uma enfermidade infecciosa causada pelo novo coro
navírus, que era totalmente desconhecido até ter sido descoberto em
Wuhan – China, causando problemas respiratórios, e levando à morte.
O primeiro caso latino-americano de COVID-19 foi registrado no Brasil,
em 26 de fevereiro, segundo a BBC News Mundo. Esta nova realidade
provocou uma mudança radical na rotina da população brasileira, em
geral, e, desde então, vem causando um grande impacto na saúde, no
contexto social, econômico e na educação.

O impacto no setor educacional é tal que, no final de 2019 e


início de 2020, estávamos questionando como seria o retorno às au
SUMÁRIO
las, algo bastante rotineiro no contexto escolar. Mas, agora, o que se
percebe é que abandonamos este procedimento para indagarmos,
assim como as famílias dos alunos, sobre as preocupações, necessi
dades e propostas para o percurso escolar no término de 2021, e ain
da para o planejamento de 2022. Os resultados mostram duas ideias
sobre as quais gravita a visão da comunidade educativa em geral:
preocupação e esperança. Preocupação pela situação experimenta
da nos últimos 18 meses, e por um futuro incerto, quanto à logística,
as condições de segurança, o desenvolvimento da aprendizagem eo
estado emocional dos alunos. Esperança porque a situação nos fará

1313
mais fortes, e isso se aplica tanto aos docentes quanto aos alunos
e suas famílias, assim como às instituições escolares. Cremos, com
firmeza, que o sistema educacional está demonstrando a capacidade
de resiliência necessária para adaptar-se às necessidades futuras, e
este aspecto redundará em seu fortalecimento.

É neste segundo ponto que repousa a ideia deste livro, que


busca trazer discussões, estudos e conclusões para buscarmos en
tender a posição da comunidade escolar diante do desafio com o
qual nos deparamos, oferecendo ideias para se pensar na atuação
de todos os envolvidos com educação para o próximo ciclo escolar.
Pensado pelos integrantes do Grupo de Pesquisa em Convivência
Democrática: estudos sobre clima escolar e atmosfera moral do Pro
grama de Pós-Graduação em Educação da Universidade Metodista
de São Paulo, o livro destina-se tanto à própria comunidade educati
va, com os gestores, docentes, alunos, funcionários e famílias, como
a outras entidades que estão no entorno do setor educacional.
Com a suspensão das aulas presenciais, a virtualidade passou
a fazer parte da vida dos atores (professores e alunos) do processo de
ensino-aprendizagem, ao que se somou a família de ambos. Podemos
dizer que a pandemia causada pela COVID-19, independentemente
da gravidade da situação da crise, revela certos aspectos de âmbito
SUMÁRIO
educativo, dos quais o nosso país está muito distante. Ainda que o uso
dos smartphones seja algo corriqueiro, o manuseio da tecnologia e da
transmissão de conhecimento por meio virtual é um fator totalmente
distinto, e aspectos importantes são nitidamente evidenciados como
pontos que requerem melhorias, logo após a superação do enfrenta
mento contra o vírus. Além disso, quando esta situação atípica passar,
as escolas vão precisar de pessoas bem formadas e capacitadas, que
possam contribuir para erguer a educação no país.

Assim, convidamos à leitura dos capítulos deste livro com o


objetivo de estabelecer uma reflexão conjunta em torno do impacto

1414
que a COVID-19 está causando nas escolas, e, assim, poder con
tribuir, ainda que de forma singela, a traçar um possível caminho
comum, que permita dividir parte da incerteza gerada, reforçando,
desta maneira, uma educação inclusiva, que integre as necessida
des de todos. Esperamos que estas discussões sirvam para apontar
algumas respostas à comunidade escolar, e que as recomendações,
aqui propostas, tragam luz na construção do nosso futuro educacio
nal. Não podemos prever o futuro, mas podemos sim tentar construir
o melhor futuro possível, dadas as circunstâncias.

Denise D’Auria-Tardeli

Agosto – 2021.

SUMÁRIO

1515
Capítulo 1

Aprendizagem em situação adversa:


reflexões e os seus desdobramentos

Cristofer André Caous

Denise D’Auria-Tardeli

Cristofer André Caous


Denise D’Auria-Tardeli
1
Aprendizagem em situação adversa:
reflexões e os seus
desdobramentos

DOI: 10.31560/pimentacultural/2021.107.16-38
A pandemia causada pelo COVID-19, um vírus que acometeu
toda a população do planeta Terra em 2020, exigiu ações sobre uma
doença pouco conhecida. Vários foram os desdobramentos de cunho
biológico, social e educacional em relação à população mundial. Po
líticas de quarentena, orientação e testagem em massa foram anun
ciadas, principalmente nos países desenvolvidos. Além do impacto na
área da saúde, identificou-se que as políticas públicas também tive
ram um papel determinante nas medidas do distanciamento social, e,
portanto, no consequente impacto econômico mundial. A economia
sofreu mudanças positivas e negativas, uma vez que o comportamento
do consumidor isolado, pelas medidas de prevenção, precisou se rea
daptar em relação ao mercado e fluxo das vendas em vários segmen
tos comerciais (ASHRAF, 2020; HE & HARRIS, 2020; TOMASI, 2020).

Pois bem, no meio desta sociedade tão debilitada por causa


do capitalismo global, explode o vírus. Todos em pânico, voltamos a
levantar muros e fechar fronteiras, porque o inimigo voltou, mas não
mais o inimigo de “carne e osso”, já que não lutamos mais uns com os
outros, mas sim com um inimigo invisível, que vem de fora, e o pânico
instalado é uma reação imunitária social e global contra a nova amea
ça. A reação de imunidade é muito violenta, porque temos vivido há
algum tempo em uma sociedade sem grandes ameaças, desde o “11
de setembro”, em uma sociedade da positividade (HAN, 2015), mas
SUMÁRIO
agora o vírus aparece como um terror permanente.

O pensador coreano Byung-Chul Han, que falou em 2010 sobre


a “sociedade do cansaço” em que vivíamos, diz que, em cada época,
são produzidas patologias, como no século XX, quando tivemos que
vencer a era bacteriológica, com a descoberta dos antibióticos. No
século XXI, já sem a perspectiva bacteriológica ou viral até então, sur
giu um desgaste causado pelos transtornos neurais e pela queima de
energias que se configuraram como patologias emergentes. No início
deste século, destacaram-se não mais as patologias geradas pela ne

1717
gatividade de algo imunologicamente diverso, mas se tornou perceptí
vel o excesso de positividade, a exaustão do desempenho, gerando o
que Han (2015) identificou como infarto psíquico.

Na perspectiva de Han (2015), esta exaustão da contemporanei


dade apresenta-se como sendo um cansaço solitário onde as pessoas
se encontram em constante luta consigo mesmas, proporcionando uma
produtividade sem limites, pois, quando uma meta é alcançada, surgem
muitas outras. Este autor diz que o homem contemporâneo define-se
por ser ‘multitarefeiro’, focado em várias direções, sempre conectado,
hipertenso, acelerado, com grande intolerância ao tédio, sem espaço
para o descanso, incapaz de ver, escutar, falar e pensar por si próprio.

Han (2014) afirma ainda que as novas formas de comunicação


são manipuladas, e o fenômeno da internet alterou os comportamen
tos e atitudes, confundindo o público e o privado, visto que, para ele,
“nestes novos espaços e tempos virtuais, onde já não se acumula a
informação, em vez disso, a informação é adaptada e satisfaz neces
sidades pessoais, gostos, tendências e formas de ser e estar por meio
das TICs” (HAN, 2014, p. 13).

Este era o contexto social em que estávamos acostumados,


um contexto desgastado, sem fronteiras para a intimidade e subje
SUMÁRIO tividade, intensificado pelo mundo digital, e que foi eliminado com a
pandemia e o distanciamento social. Mudanças drásticas foram inter
postas na rotina de diversas áreas que compõem o sistema social e
financeiro. Uma das medidas tomadas, durante o alastramento viral,
foi o distanciamento social, sugerido pela Organização Mundial de
Saúde - OMS - e adotada na maioria dos países parceiros enquanto
não havia vacinação populacional (ADOLPH et al, 2021). Programas
socioeconômicos foram criados para garantir renda mínima à popula
ção mais pobre ou com trabalho informal, assim como a tentativa frus
trada de garantir a proteção ao trabalho formal. Ainda na dimensão
nacional, é notável a importância de se investir no Sistema Único de

1818
Saúde (SUS), na plataforma de divulgação dos índices de contágio,
cura e óbitos, a fim de avaliar a evolução da pandemia e da testagem
em massa, o que foi extremamente mal conduzido enquanto estraté
gia de controle por parte do governo brasileiro. A testagem em massa
tinha por objetivo observar e identificar os sujeitos assintomáticos e
sintomáticos devido à COVID-19 (AQUINO et al, 2020). E o que nos
interessa, nesta discussão, é que a medida provocou o fechamento
das instituições de ensino pelo mundo afora, e um novo modelo edu
cacional se consolidou com base nas tecnologias digitais. No Brasil,
bem como em outros países em desenvolvimento, ficou clara a dis
tância entre as classes sociais com acesso ao ensino remoto.

A modalidade em ambiente virtual de ensino depende exclusi


vamente de uma rede de internet e de aparelhos como computadores
e/ou tablets (AMADO-SALVATIERRA, HERNÁNDEZ, HILERA, 2012).
Dentro deste novo ambiente relacional, milhares de crianças de diver
sas idades, em período escolar, sofreram a imposição da adaptação
necessária para a continuidade dos seus estudos. Da mesma forma,
professores tiveram que reaprender técnicas de ensino a distância ou
remoto, para permitir o nível de aprendizagem desejável em relação
aos seus alunos. Se para aqueles que estudavam em colégios par
ticulares foi uma situação bastante complexa, não é difícil imaginar

SUMÁRIO o cenário que se desenhou para aquelas famílias que deixavam os


seus filhos nas escolas públicas para poderem ir ao trabalho, mas
que agora precisavam ficar em casa devido à crise sanitária instala
da. Inúmeros estudos publicados (PÉREZ DE GUZMÁN, 2002; TRI
GO MUÑOZ, 2000; DELGADO, 2008; FLAQUER, 2000) demonstram
a importância das relações parentais no desenvolvimento neurocog
nitivo e na qualidade do processo de aprendizagem, principalmente
no período que compreende o Ensino Fundamental e o Ensino Médio.
Dentre os aspectos que determinam ou não a qualidade do ensino
remoto com o envolvimento direto dos pais, considera-se um muito
importante: como integrar a comunidade escolar e as famílias.

1919
CONSIDERAÇÕES SOBRE A FAMÍLIA...

Tedesco (2009) argumenta que é necessário um “novo pacto


educacional” que vincule a ação educativa da escola à de outros agen
tes. Somente reconstruindo a comunidade, em primeiro lugar a escola,
e mais amplamente a comunidade educacional, pode-se, de forma
significativa, promover uma educação para a cidadania. Apesar de a
família e a escola serem contextos distintos devido à missão que cada
uma cumpre, aos objetivos que se propõem, aos tipos de relações que
ocorrem no seu interior e às normas que regem as interações, é neces
sária uma comunicação fluida, que permita o desenho de elementos
comuns para que haja a melhoraria na formação dos sujeitos.

A colaboração entre família e escola é um meio para melhor co


nhecer e ajudar os alunos. É muito útil que as famílias conheçam as
orientações educacionais recebidas dos professores, e vice-versa, na
medida em que o estilo educativo familiar tenha seus reflexos na forma
ção escolar das diferentes disciplinas, e as ajude a estabelecer relações
específicas com cada uma delas. A aprendizagem bidirecional é a me
lhor forma de desenvolver capacidade, confiança, empenho e apoio
aos professores, e disso depende o futuro da sua profissionalização. A
análise da continuidade ou descontinuidade de ambas as instituições é
SUMÁRIO
o eixo para compreender a influência que estas provocam no desenvol
vimento pessoal, afetivo e social do ser humano, bem como as barreiras
que estão produzindo uma desconexão e isolamento entre ambas.

É necessário entender a participação dos pais como um


envolvimento comprometido, voluntário e responsável, que possa con
tribuir para a determinação e a tomada de decisão dos objetivos da
instituição escolar, contribuindo e compartilhando com ela, para a sua
realização. Nesse sentido, é preciso participar e desenvolver a própria
capacidade de assumir princípios educacionais, pois o envolvimento da

2020
família tem um caráter social, uma vez que exerce um direito e um dever
de cidadão, acompanhados por um caráter instrumental. Por isso, é im
portante que os pais/responsáveis sejam informados em todos os mo
mentos sobre os assuntos relativos à educação de seus filhos e filhas.

Outra característica relevante é o tipo de programa educacional


ofertado pela instituição de ensino (muitas vezes despreparada para o
ambiente remoto), e o grau de envolvimento dos pais na assistência
prestada aos filhos (JINNAH & WALTERS, 2008; SHUTE et al, 2011). A
problemática da retração social, durante esta fase da vida dos jovens e
das crianças, possui consequências ligadas aos transtornos emocionais
internos, causados principalmente pelo sentimento de solidão expresso.

As mudanças na família e o desenvolvimento das tecnologias


de informação e comunicação fazem com que, aos poucos, a família
tenha cedido competências a outras instâncias de convivência, como
a escola, os amigos e os meios de comunicação, que exercem grande
influência na formação das crianças e adolescentes. É fato que o mun
do da internet e dos smartphones condiciona, em parte, os valores que
são transmitidos da família, e a educação depende, em certa medida,
de como os pais administram esses meios interativos, e de como edu
cam seus filhos na leitura da linguagem audiovisual e no espírito crítico.
Em suma, trata-se de desenvolver um centro educacional a partir da
SUMÁRIO
família, com uma educação que promova o pensamento, a autonomia,
a aceitação e o respeito pelas diferenças, além da imaginação e da
criatividade para procurar novas fórmulas que ajudem a resolver os
problemas que possam surgir na convivência pessoal e grupal. Se,
antes, isto já se constituía como uma tarefa difícil, atualmente, em tem
pos de pandemia e isolamento social presencial, o cenário chega a ser
desolador, já que as posições de todos devem ser fundamentas sem
dogmatismos, e os conflitos devem ser compreendidos a partir de uma
perspectiva positiva na promoção de mudanças, para o crescimento
como seres humanos e membros de uma sociedade mais ética.

2121
Não queremos uma educação que doutrina, que anule a ca
pacidade de analisar, contrastar, pensar e tomar decisões de acordo
com princípios, mas sim uma educação que nos leve a trabalhar em
projetos comuns para nos enriquecer com o conhecimento e as expe
riências dos outros. Trata-se de conceber a educação como um todo,
levando em consideração os quatro pilares (DELORS, 1996), tanto no
sistema educacional como na educação familiar e na educação social.

CONSIDERAÇÕES SOBRE
OS (DES)VÍNCULOS SOCIAIS...

Muito se discute sobre o papel parental no desenvolvimento e


comportamento do jovem estudante, ou seja, sobre a qualidade das
atitudes dos pais, considerada a partir da intensidade das percepções
do afeto e das práticas parentais no âmbito comportamental, de na
tureza internalizada ou externalizada. Questões importantes devem
orientar o nível deste envolvimento parental no aprendizado, como (1)
o motivo do envolvimento na vida escolar do filho, (2) a maneira de
como o processo deve se desenrolar, e ainda (3) as razões pelas quais
este envolvimento produziria melhores resultados na aprendizagem
SUMÁRIO (HOOVER-DEMPSEY & SANDLER, 1997). De certa forma, durante a
pandemia, esta relação foi colocada à prova. Muitos jovens já apresen
tavam o nível de isolamento após o advento dos smartphones, e uma
dependência da internet relacionada aos fatores psicossociais identifi
cados neste âmbito. A investigação que objetivou identificar este grau
de dependência sugere que o uso da internet serve como uma estraté
gia de libertação das normas sociais de expressão dos pensamentos,
sentimentos e emoções, no que tange à falta de convívio social destes
pré-adolescentes e adolescentes. O vício em estar todo o tempo co
nectado à internet apresenta-se na relação psicológica com o adicto

2222
sob duas considerações essenciais: o abuso da tecnologia e os seus
desdobramentos negativos nas vidas dos usuários, e qual o nível apro
priado de utilização da tecnologia tido como um padrão normal ou sau
dável. Na medida em que a internet e as tecnologias digitais avançam,
muitas fragilidades e inabilidades no ambiente virtual são identificadas
pela psicologia educacional (CHOU & CONDRON & BELLAND, 2005).

Tendo em vista o conjunto de fatores que reflete, em tempos


de pandemia, sobre o convívio familiar das crianças e dos adolescen
tes, sobre o ambiente educacional e de aprendizagem, certamente
num futuro próximo aparecerão como um transtorno psicológico. Na
psicopatologia, o transtorno psicológico ou comportamento anormal
é uma disfunção psicológica do indivíduo, normalmente associada a
um grau de sofrimento que desencadeia uma desordem cognitiva,
emocional ou comportamental (HUNOT & CHURCHILL & SILVA DE
LIMA, 2015; THIENGO & CAVALCANTE & LOVISI, 2015). É importante
frisar que, no ecossistema presencial de convívio social e de ensino,
além do conteúdo normativo de cada disciplina ou unidade curricular,
o aluno precisa ter contato com a dimensão da aprendizagem social.
Neste esteio, psicólogos influentes como Albert Bandura, nas déca
das de 70 e 80, relataram que os organismos não precisam passar por
certos acontecimentos em seus ambientes para aprenderem de uma
maneira efetiva (BANDURA, 1969). O indivíduo aprenderá a mesma
SUMÁRIO
coisa apenas observando o que acontece com o outro em uma deter
minada situação. Essa descoberta ficou conhecida como modelagem
ou aprendizagem observacional. Portanto, podemos afirmar que as
emoções relacionais no ambiente da escola contribuem de forma de
cisiva para a saúde psicológica. Ainda no campo da psicopatologia,
podemos nos lembrar dos estudos que trataram das relações causais
com interações da genética e dos efeitos ambientais neste modelo da
correlação gene-ambiente. A vulnerabilidade genética do indivíduo,
em relação a um determinado transtorno, pode torná-lo mais pro
penso a experimentar o estressor que, por sua vez, desencadeará a

2323
vulnerabilidade genética, e, assim, o transtorno psicológico (BISHOP,
2006). Na epigenética, os efeitos imediatos do ambiente influenciam
as células, que ativam e desativam determinados grupos de genes,
logo, esse efeito pode ser transmitido por várias gerações (DOLINOY
& WEIDMAN & JIRTLE, 2007; SCHIELE & DOMSCHKE, 2018).

A COVID-19 trouxe à tona, dentre os transtornos psicológicos,


o transtorno de ansiedade generalizada, bastante prejudicial ao indiví
duo. Dentre os riscos, apresentam-se a chance aumentada de depres
são e do isolamento social destes alunos jovens. De modo geral, os
transtornos de ansiedade podem ser caracterizados por sentimentos
desagradáveis e de preocupação excessiva, o que causa um des
conforto desproporcional em decorrência da antecipação para deter
minadas situações (TEO & LERRIGO & ROGERS, 2013). Estão cada
vez mais frequentes, nas escolas, casos de alunos com transtorno de
ansiedade generalizada, porém, durante a fase pandêmica e de dis
tanciamento social, a ansiedade se agrava, e trará, portanto, prejuízo
ao aprendizado de crianças e adolescentes em idade escolar. A difi
culdade da aprendizagem, através do ambiente remoto de aula, em
um ambiente de estresse social, leva a um conjunto de fatores que
predispõe os alunos à dificuldade de concentração. O e-learning é uma
ferramenta de aprendizado onde o ensino deveria ter uma característi
SUMÁRIO ca criativa, inovadora e, sobretudo, interativa (POKHREL & CHHETRI,
2021). Desta maneira, assimilar informações ditas pelos professores
torna-se algo desafiador, e, normalmente, acarreta numa qualidade de
ensino insatisfatória. Em situações mais graves, este transtorno poderá
ser a principal causa da desistência do aluno naquele ciclo escolar,
uma vez que não atingirá os resultados esperados do ensino.

Outro aspecto é a tarefa de interação com outros colegas em


ambiente remoto de aprendizagem para desenvolver um trabalho em
grupo, o que pode desencadear um sentimento de impotência e pâni
co para o aluno. Em um pouco mais de um ano de pandemia, vivemos

2424
um momento ambíguo: felicidade pelo processo de vacinação e infeli
cidade pelo registro das mortes, e a palavra confinamento nos traz os
empecilhos nas interações sociais e afetivas.

Confinamento nos remete à solidão. Segundo La Taille (2020),


a solidão tem vários desdobramentos, e, no contexto atual, um tipo
de solidão nos faz refletir sobre as crianças e adolescentes, distancia
dos há um ano dos ambientes escolares: a solidão física. Contudo,
o distanciamento social em que vivemos não é radical, pois temos
as mídias interativas para a comunicação cotidiana, tanto profissional
quanto informal. Pior seria se esta pandemia tivesse nos acometido há
uns 50 anos, quando não havia os meios de comunicação que temos
hoje, mas, ainda assim, estamos impedidos do contato físico, do to
que, das trocas afetivas presenciais, e isso tem contribuído para o au
mento de comportamentos depressivos e índices de suicídio. Para La
Taille (2020), este tipo de isolamento “(...) leva à solidão em seu sentido
primeiro: não ter contatos, ou ter muito poucos, com outras pessoas, a
não ser (...) os contatos formais (...)” (p. 58).

Por que, podemos nos perguntar, apesar de tantas possibilida


des de contato virtual com as pessoas a depressão se instalou? E a
resposta é que este fato é inédito nesta geração, e isso faz uma grande
diferença se pensarmos no contato corporal. E as crianças e os ado
SUMÁRIO lescentes são os que mais sofrem com isso, já que o distanciamento
social é antinatural em seus processos de desenvolvimento, e, funda
mentalmente, na construção de suas identidades. O isolamento físico
duradouro modifica as pessoas, pois somos seres gregários, necessi
tamos dos relacionamentos interpessoais para desenvolvermos aquilo
que nos é pertinente, ou seja, habitual: a condição de humanização. A
exclusão do convívio social não ocorre por vontade própria, mas acon
tece por fatores externos, sobre situações que não podemos controlar
(LA TAILLE, 2020), exatamente como estamos vivendo no momento,
e os estudos psicológicos vêm mostrando que o desenvolvimento

2525
das crianças “atestam o lugar incontornável de outrem na progressi
va constituição psíquica de cada indivíduo, constituição tanto afetiva
quanto intelectual e moral” (LA TAILLE, 2020, p. 28).

Muito se discutiu sobre transtornos generalizados de ansieda


de e depressão causarem, como consequência, o isolamento social
do indivíduo, porém, no atual cenário, é exatamente o contrário: o
distanciamento social é a causa do transtorno de ansiedade, tam
bém conhecido como ansiedade social (TEO & LERRIGO & ROGERS,
2013). Neste contexto, há ainda o transtorno de ansiedade debilitante,
denominado transtorno de pânico, o qual pode ocorrer com maior fre
quência. No transtorno de pânico, indivíduos experimentam ataques
de pânico graves e inesperados, nos quais podem achar que estão
prestes a morrer ou que perderam o controle (BARLOW et al, 1989).
Durante a pandemia, um grande número de pessoas desenvolveu o
transtorno de pânico, e, mesmo no momento atual, após o advento
das vacinas, são incapazes de deixar suas casas. O contato com o
mundo externo era sempre por meio das mídias e da internet. Assim,
estas pessoas, na medida em que permaneciam isoladas, tinham a
falsa sensação de estarem relativamente livres do pânico por evitar
o contágio pelo vírus. É importante ressaltar que a subnotificação
de danos neurológicos causados pela COVID-19, mesmo que leves,
dificultará no tratamento de condições neurológicas associadas à
SUMÁRIO
doença, e se faz necessário o acompanhamento neurológico global
para se estudar os potenciais efeitos neurológicos, de longo prazo,
em suas manifestações clínico-psicológicas (BASTOS et al, 2021).

Em alusão ao título de uma coluna recente de Jorge Carrión


(2020): a biologia e não a tecnologia, como era de se esperar, está
acelerando a digitalização do mundo por causas biológicas como no
caso do coronavírus – COVID-19 - e trará profundas implicações em
nosso cotidiano, como o desaparecimento de rituais (HAN, 2020), ati
tudes simples como a aproximação física e a preservação das relações

2626
sociais, apesar do isolamento. Conforme expressou Rosalía Winocur
(2020), o medo de ficarmos sem conexão com a internet, antes da
pandemia, cedeu lugar a um medo impensável pela desconexão da
presença física nas relações sociais. Como isso afeta a educação, e,
particularmente, os processos de ensino e aprendizagem?

CONSIDERAÇÕES SOBRE A APRENDIZAGEM...

Com foco no processo de ensino e aprendizagem, quando as es


colas voltarem ao ensino híbrido ou presencial, os alunos apresentarão
níveis muito diferentes de conhecimento e habilidade relacionados à ma
triz de competências das disciplinas. Mas, primeiro, as crianças e ado
lescentes necessitam se adaptar ao ensino on-line, e as escolas devem
superar um fenômeno que vem inquietando os professores ultimamente,
que é o fato de seus alunos não ligarem as câmeras dos equipamentos
multimídias em que assistem às suas aulas. As hipóteses para tal po
dem ser vergonha da própria imagem, ou de seu ambiente doméstico,
mas, basicamente, estamos inclinados a pensar que o ensino remoto
confunde o ambiente público com o privado, ou seja, o espaço particular
é invadido pelo espaço público, não íntimo, muitas vezes desconhecido.
SUMÁRIO
O ensino remoto priva as crianças e os adolescentes da possi
blidade da cooperação e da participação, e, segundo Piaget (1999), a
grande vantagem da interação entre os pares para o desenvolvimento
cognitivo é principalmente o que este autor chamou de conflitos socio
cognitivos, já que a formação das operações do pensamento neces
sita de um ambiente favorável da manifestação da cooperação, que
aqui denominamos como um trabalho conjunto intenso. No caso dos
ambientes virtuais, esta intensidade se representa pela colaboração
que se associa mais com a participação.

2727
Quando a aprendizagem colaborativa tem lugar num ambiente
virtual, os alunos dispõem de um conjunto de ferramentas tecnológicas
que favorecem a execução deste processo. A condição de deslocamen
to geográfico e temporal implica, ao mesmo tempo, a necessidade de
reparar com instrumentos de gestão, o processo de colaboração que
tende a ser omitido em um contexto presencial, como as normas de pro
cedimento, e uma planificação detalhada do trabalho a se realizar, que
favorece e otimiza, tanto o desenvolvimento como os resultados (GUI
TERT & PÉREZ-MATEO, 2010). Já o trabalho colaborativo, em ambientes
virtuais, é um trabalho qualitativamente melhor que o planejado pelos
esquemas de organização tradicionais. Desta maneira, quando o con
ceito de aprendizagem colaborativa se estende num ambiente virtual, o
conceito permanece, mas as condições se alteram substancialmente.

O ambiente virtual inaugura oportunidades inovadoras para a


colaboração, a comunicação e a produção de conhecimentos, e au
menta as possibilidades para poder aprender e trabalhar em equipe, o
que estava limitado em um ambiente de trabalho presencial (HARASIM
et al., 2000). É por isso que, seja se referindo à cooperação ou à co
laboração em educação, não é questionável que a aprendizagem, ou
qualquer outra atividade desenvolvida em um mundo global, não seja
entendida a não ser como a interação entre os alunos.
SUMÁRIO
Lidar com as lacunas do aprendizado dos alunos, ao estudarem
em casa, ou ainda com a falta de acessibilidade digital à educação re
mota será o principal desafio. Uma pesquisa realizada em parceria com
a Universidade de Oxford identificou que, após o retorno às aulas pre
senciais na Europa, as crianças do Ensino Fundamental aprenderam
muito pouco com aulas 100% à distância (MURAT & BONACINI, 2020).

A resposta acelerada à condição de isolamento obrigatório im


plicou os usos da mediação tecnológica em seus diversos canais, for
matos e dispositivos. O que vivemos no primeiro semestre de 2020 se
assemelha mais a uma educação a distância temporal, ou a uma edu

2828
cação remota ou a um ensino remoto baseado na tecnologia, do que
uma educação virtual propriamente ou educação blended (combinação
de presencialidade e virtualidade). E isto é uma resposta esperada pela
urgência de substituir o que já não era possível: a co-presença física.

Outra preocupação é com relação à aprendizagem no Ensino


Superior, pois causará um impacto negativo no futuro profissional, com
estudantes formados, mas despreparados para o mercado de traba
lho, tanto na dimensão técnica quanto na socioemocional. Uma vez
realizado o diagnóstico destas lacunas na aprendizagem, será neces
sário analisar o rendimento escolar das turmas e do estudante para
traçar o planejamento na recuperação do nível de aprendizado preten
dido (DU PREEZ & LE GRANGE, 2020).

Enfim, um modelo de ensino e aprendizado reforçado durante


a pandemia é aquele que temos chamado de ensino híbrido. No en
sino híbrido, a aprendizagem do conteúdo, disposto na unidade cur
ricular, é apresentada por meio de aulas remotas, livros digitais, tare
fas extracurriculares e avaliações formativas. Neste modelo, as aulas
presenciais terão uma conotação prática, e não mais teórica. As salas
de aula, que antes chegavam a abrigar 90 alunos por turma, darão
lugar aos novos espaços de aprendizagem ativa, já que toda teoria
continuará sendo ministrada pelo ensino remoto (MEYDANLIOGLU &
SUMÁRIO ARIKAN, 2014). Neste formato, a aglomeração de alunos não mais se
fará presente como nos tempos pré-pandemia, alterando de modo
efetivo o convívio social destes alunos após a crise sanitária global.
O desafio que se interpõe, e constitui uma preocupação essencial,
é o modo de acompanhamento do nível de aprendizagem que, sem
dúvida, esbarra nos métodos atuais de avaliação (somativas).

E ainda há outro viés, na vida educacional do aluno, que preci


sará ser tratado pelas escolas: o trato das habilidades socioemocio
nais, voltadas ao acolhimento dos alunos e também das famílias do
corpo docente e demais membros da estrutura escolar.

2929
Mayer e Salovey (1997) definiram, pela primeira vez, o conceito
de inteligência emocional, ainda que posteriormente esta ideia tenha
sido reformulada do original, concedendo mais importância aos com
ponentes cognitivos e às habilidades para refletir sobre as emoções.
Desde então, as publicações sobre o tema são numerosas, nos cam
pos da saúde, bem como no setor educacional e organizacional, e o
conceito se expandiu para incluir conjuntos de competências, traços
ou habilidades, de acordo com a definição enunciada. Na atualidade,
podemos distinguir entre o modo de Inteligência Emocional baseada
no processamento da informação emocional centrada nas habilidades
emocionais básicas (MAYER & SALOVEY, 1997); e o modo denomina
do misto, no qual incluem, entre os seus conteúdos, os diversos traços
de personalidade (GOLEMAN, 1998). Com o modelo da inteligência
emocional pelas habilidades, é proposta uma estrutura hierarquizada
de capacidades cognitivas para o manejo adaptativo das emoções:
perceber, facilitar, compreender e manejar ou regular as emoções.

A definição dada por Mayer e Salovey (1997) diz que a Inteligência


Emocional é a capacidade para perceber, valorar e expressar emoções
com exatidão; é a capacidade para gerar sentimentos que facilitem open
samento e a capacidade para compreender emoções e o conhecimento
emocional, além da capacidade para regular as emoções, promovendo
SUMÁRIO um crescimento emocional e intelectual. Com o modelo misto, se pos
tula que os sujeitos emocionalmente inteligentes possuem, em maior ou
menor grau, uma série de competências mais vinculadas ao construto
da personalidade, e nem tanto às habilidades cognitivas.

Na revisão da literatura, os estudos (CHARBONNEAU & NICOL,


2002; FERNÁNDEZ-BERROCAL & EXTREMERA, 2002; SALMURRI &
BLANXER, 2002) mostram um número pequeno de investigações que
associam diretamente o desenvolvimento socioemocional com esta
aprendizagem cognitiva (inteligência emocional), frente às que não re
lacionam a adaptação emocional e suas implicações ao êxito acadê

3030
mico. Contudo, parece existir uma base científica suficiente para ava
liar as implicações que as aprendizagens socioemocionais têm para a
qualidade satisfatória na educação, assim como para o êxito na vida
pessoal (ZINS et al., 2004). Esses estudos mencionados acima mos
tram, de fato, uma possível relação entre o desenvolvimento socioe
mocional e a aprendizagem, denotada nas indicações das pontuações
obtidas a partir de instrumentos criados para medir as competências
socioemocionais, podendo predizer, de forma significativa, as notas
médias de alunos universitários, por exemplo, com as avaliações de
final de curso. Petrides et al (2002) investigaram os aspectos da inteli
gência emocional na sua relação com o rendimento, como mostra seu
estudo com 650 alunos da escola secundária britânica. Com este estu
do, observa-se que a constelação das emoções, habilidades e dispo
sições do constructo da inteligência emocional implica no rendimento
e no comportamento não produtivo destes alunos.

Aqui, em nossas reflexões, tomaremos as competências so


cioemocionais como um conjunto de habilidades que envolve a auto
consciência, regulação1, empatia, assertividade, motivação, trabalho
em equipe e resolução de conflitos. São as competências básicas
que se definem como um sistema de ação complexo, que engloba
as habilidades intelectuais, as atitudes e outros elementos não cog
SUMÁRIO nitivos, os quais são adquiridos e desenvolvidos pelos indivíduos ao
longo de suas vidas, e que são necessários à eficácia da participação
em vários contextos sociais. Neste sentido, as competências socioe
mocionais trazem benefícios marcantes sobre a aprendizagem, como
a diminuição de condutas disruptivas em aula, ou ainda sobre a qua
lidade pessoal dos alunos nas escolas.

Mas há fragilidades nas formas de avaliação padrão somativas


destas competências, pois ganham destaque as avaliações do tipo
1 Regulação, neste texto, assume o significado piagetiano de um funcionamento de media
ção das estruturas psicológicas, o que é feito pelo próprio sujeito: autorregulação, a qual é
ativa e autônoma.

3131
formativas, uma vez que pais e responsáveis passaram, pelo menos
em parte, a cumprir o papel de tutores no acompanhamento do ensino
remoto dos filhos. Assim, as avaliações do tipo somativas deixam o
seu protagonismo de lado para que a avaliação do tipo formativa te
nha maior peso. O processo avaliativo formativo envolve um percurso
contínuo e longo do aprendizado, em que o erro não tem mais uma
conotação punitiva, e trata-se de um fator de atenção para contribuir ao
processo do ensino-aprendizagem (SHAVELSON et al., 2008).

E, além das dificuldades encontradas nos processos avaliati


vos, destaca-se a própria concepção do erro. Há, nas últimas déca
das, uma reconceitualização do erro no processo de aprendizagem,
que consiste em distinguir o erro construtivo do erro sistemático. Com
a abordagem construtivista piagetiana, o erro construtivo é aquele
que surge a partir de um processo de descoberta ou redescoberta
do conhecimento, e é fundamental a esta construção. Ou seja, o erro
construtivo é isento de culpabilização, já que ele é visto como uma
oportunidade, e não como um conflito. Este erro é abandonado pelo
sujeito assim que este consegue atingir um nível superior de elabo
ração, diferentemente do erro sistemático, que resiste e impede as
possibilidades de aprendizagem porque leva em consideração só o
resultado final, o produto, e não o processo e outros fatores envolvi
dos, o que faz a aprendizagem se estagnar (SILVA, 2008).
SUMÁRIO
Neste cenário, podemos afirmar que a pandemia alterou a dinâ
mica da atividade social, e, portanto, o processo de ensino, para dar
espaço a um modelo pedagógico diferenciado. Neste modelo peda
gógico, em tempos de pandemia ou não, a inclusão digital de todos os
alunos é um fator condicional, uma vez que o acesso às plataformas
digitais faz parte do próprio processo de interação com o corpo docen
te (PRESTON, 2020; WOOLLISCROFT, 2020).

É necessário desenvolver metodologias de ensino específicas


para os ecossistemas digitais de aprendizagem, que sejam engaja

3232
doras e propiciadoras de ambientes dinâmicos de ensino, e, des
ta forma, que contribuam para a aquisição do conhecimento e da
competência profissional do egresso. Neste escopo, a questão que
demanda atenção é, sem dúvida, o treinamento do corpo docente na
aplicação das tecnologias durante a sua interação com os alunos.
Hoje, ainda é muito comum professores ministrarem um determinado
conteúdo de forma remota como se estivessem num ambiente pre
sencial, fato que, sem dúvida, demanda ajustes. Em outras palavras,
é necessário que docentes e discentes aprendam a utilizar a tecno
logia em um contexto educativo de uma forma a permitir melhorias e
inovações em ambientes sustentáveis de aprendizagem.

REFLEXÕES FINAIS

O mundo virtual veio para ficar definitivamente, e aprofundar-se


entre nós, pelas conquistas que traz, tais como: encurtar distâncias,
tornar presentes conferências e congressos internacionais, compar
tilhar espaços, pesquisas, interações e para ampliar a comunicação
com o mundo. Mas, se esta virtualidade não vier acompanhada de
maior acessibilidade, treinamento e suporte, tanto do governo federal
SUMÁRIO quanto da rede privada, a exclusão digital será cada vez maior.

Nesta fase, o presente e o futuro estão inter-relacionados de


forma singular, quase se fundindo. O presente da vida cotidiana se
torna muito exigente, e a incerteza e as possibilidades de mudança
assumem uma importância muito significativa. Não é mais suficiente
repetir os slogans do passado.

Situações inéditas da atualidade se convertem em detonadores


de processos de apropriação, que nos obrigam a enfrentar ou reagir de
imediato, mas, assim que este período passar, entraremos em uma fase

3333
proativa, na qual as reflexões e as decisões se fazem necessárias para
repensar o processo educacional e as relações interpessoais, fase esta
que vai muito além de programas de capacitação, ou da criação de fer
ramentas tecnológicas para atender esta crise e transformar as práticas.

Será necessário conservar essa perspectiva para o que se suce


derá com a educação, sobre o que já se tem afirmado, repetidamente,
que as coisas não voltarão a ser as mesmas, e é possível que have
rá uma grande mudança, não somente pelo efeito impulsionado pela
crise viral, mas, principalmente, pela transformação das concepções
docentes e discentes sobre a aprendizagem em si, e os efeitos que
ela causa na comunicação, tecnologia e nas metodologias de ensino
direcionadas para o desenvolvimento profissional e pessoal.

A experiência encontra a renovação e a descoberta. O isola


mento não é mais solidão, mas também uma nova forma de nos inse
rirmos diante da calamidade ocorrida. Tudo o que acontece, nacional
e internacionalmente, desenvolve novos significados até no que já é
conhecido. Destruição e renovação se interceptam, e se reencontram
mutuamente. Agora, aproveitando o passado-presente, é preciso tra
balhar, produzir, construir, criticar e investigar desde uma plataforma
original até um novo mundo.

SUMÁRIO Por fim, chamamos a atenção sobre o paradoxo que a COVID-19


encerra, assinalado por um estudo recente do Banco Mundial (AZEVE
DO & SAAVEDRA & ARIAS, 2020): é uma catástrofe, mas também um
catalizador potencial para a transformação. Não vamos nos permitir ser
vítimas do bug da lagarta2.

2
“Bug” é um termo inglês, designado para relatar um erro ou uma falha de operação em um
computador ou programa. Seu significado, em tradução literal, é “inseto”. Na década de
40, época em que os computadores não passavam embaixo de portas, e não cabiam no
bolso, não era incomum ter a presença de insetos entrando nas máquinas. Ou seja, esses
insetos obstruíam válvulas ou danificavam componentes que eram essenciais para o bom
funcionamento dos antigos computadores. Os mesmos insetos que causavam danos aos
computadores são os insetos que, dependendo da espécie, causam danos às lavouras:
as mariposas que durante a sua fase de lagarta, causavam o maior estrago.

3434
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3838
com

Capítulo 2

Educação remota e crianças


dificuldades de aprendizagem
em tempos de pandemia

Adriana Pasqualini

2
Adriana Pasqualini

Educação remota e crianças com


dificuldades de aprendizagem
em tempos de pandemia

DOI: 10.31560/pimentacultural/2021.107.39-61
Nos últimos anos, temos observado muitas discussões sobre
a educação e sobre os alunos que precisamos formar para atuar na
sociedade deste século XXI. Hoje, o foco da educação está no de
senvolvimento de competências e habilidades práticas, cognitivas e
socioemocionais na aprendizagem, na mobilização de conhecimen
tos para a solução de problemas da vida cotidiana e para o exercício
da cidadania. Desde a primeira infância, a convivência na escola, a
interação entre alunos e professores e toda comunidade escolar são
pensados e organizados para promover esta formação. Salvo raras ex
ceções, todas as crianças passarão anos dentro das escolas criando
vínculos, construindo a própria identidade, se desenvolvendo.
Com o advento da pandemia e a necessidade do isolamento
social, essa convivência foi interrompida, gerando expectativas sobre
a organização da rotina escolar e de tudo que envolve esse universo.
Algumas ações foram realizadas para possibilitar que os alunos conti
nuassem com as atividades do ano letivo, e, desde então, a realidade
da aula on-line passou a fazer parte da rotina de alunos e professores.

A princípio, as práticas pedagógicas e as metodologias aplica


das nas aulas presenciais foram transferidas para as aulas no ensino
remoto, mas não demorou muito para se perceber que os recursos já
conhecidos e utilizados pelos professores não seriam suficientes para
SUMÁRIO as aulas on-line. E esse foi um momento de transição muito signifi
cativo, tanto para os alunos como para os professores, que se viram
diante do desafio de se apropriar de ferramentas tecnológicas que,
para muitos, ainda eram totalmente desconhecidas.

O aprendizado sobre uma nova maneira de se relacionar num


ambiente escolar virtual, e ter a aprendizagem mediada por ferramen
tas tecnológicas, era novidade para alunos e professores, que pre
cisaram ressignificar o ensinar e o aprender. E, aqui, vale ressaltar a
importância de recuperar a memória e a compreensão sobre os quatro
pilares da educação para o século XXI. Segundo Delors (2003):

4040
A educação deve transmitir, de fato, de forma maciça e eficaz,
cada vez mais saberes e saber fazer evolutivos, adaptados
à civilização cognitiva, pois são as bases das competências
do futuro. Simultaneamente, compete-lhe encontrar e assinalar
as referências que impeçam as pessoas de ficar submergi
das nas ondas de informações, mais ou menos efêmeras, que
invadem os espaços públicos e privados e as levam a orien
tar-se para projetos individuais e coletivos. À educação cabe
fornecer, de algum modo, os mapas de um mundo complexo
e constantemente agitado e, ao mesmo tempo, a bússola que
permita navegar através dele (p. 89).

Assim, pareceu interessante e necessário que a escola retomas


se as suas reflexões sobre os pilares que orientam a educação formal
sob a perspectiva do ensino remoto, e isso passou a dar novos sentidos
sobre o seu espaço de atuação no âmbito da educação, que aconte
ceria de forma remota, e, portanto, novas ações seriam necessárias.

Aprender a Conhecer, o primeiro dos pilares, cuja curiosidade,


a criatividade, o desejo da descoberta e da construção e reconstrução
do conhecimento são o combustível para o aprendizado e para a rein
venção do antigo. Aprender a aprender é a busca pela autonomia do
próprio aprendizado, gerando prazer e satisfação pessoal. Não se trata
de algo passageiro, mas que se mantenha ao longo do tempo como
uma prática de vida.
SUMÁRIO
Aprender a Fazer, o próximo dos pilares deve desenvolver as
habilidades cognitivas para experiências práticas, colaborativas entre
os seus pares, empenhando-se em solucionar problemas e traba
lhando em equipes, ouvindo e discutindo ideias, e buscando solu
ções criativas. Aprender a comunicar-se para explicar suas ideias e
colocá-las em prática.

Em seguida, podemos mencionar o Aprender a Conviver,


que consiste em participar de projetos comuns, incluir os outros
ouvindo e dando opiniões, além de considerar as do grupo, criar

4141
empatia e, com respeito, administrar conflitos, bem como desenvol
ver percepção de interdependência.

Por fim, o pilar Aprender a Ser, o qual desenvolve a sensibili


dade, o sentido estético e ético, numa aprendizagem integral e signi
ficativa. Aprendizagem esta que traz valores voltados para a vida em
sociedade e para a responsabilidade com o próximo e com a natureza.

E o desafio histórico se fez presente numa realidade onde não


houve um processo de adaptação, e sim de urgência. O envolvimento
das famílias nas rotinas escolares de aprendizagem das crianças ficou
ainda mais próximo para alguns grupos de pais e responsáveis, e, para
outros, isso foi uma novidade nas suas atribuições cotidianas.

Para o professor, a mudança no ensino significou buscar conhe


cimento sobre as possibilidades de usos das tecnologias e construir
conhecimento sobre como fazer o uso delas, mantendo a curiosidade
e o interesse dos alunos sobre a ferramenta e sobre as discussões rea
lizadas no ambiente virtual. O educador precisou repensar conceitos,
descobrir métodos e maneiras de ser e compreender essa nova reali
dade profissional para cumprir suas atribuições. Os pais e responsá
veis também se viram com necessidades de adaptar a vida escolar das
crianças às suas rotinas de trabalho, e agora todos, de uma maneira
SUMÁRIO ou de outra, pensariam nas suas atribuições em ressonância com os
saberes da educação, sendo que pensar a educação é refletir sobre a
aprendizagem e o sujeito inserido nesta nova realidade.

Podemos dizer que a aprendizagem acontece a partir da aqui


sição de conhecimentos através do ensino, da experiência, dos es
tudos, e que desenvolve habilidades, orienta atitudes e valores, des
pertando interesses e curiosidades. Dentre tantas teorias sobre como
“o ser humano se desenvolve e aprende”, ou como “o ser humano
aprende e se desenvolve”, algumas são orientadoras do trabalho
pedagógico, de sua prática e de toda organização do ensino e da

4242
aprendizagem, dentro da escola, tanto para as crianças que estão
inseridas nesse contexto, de acordo com sua idade e desenvolvimen
to, como para aquelas que, por alguma razão, estão em nível de es
colaridade não compatível com sua idade, ou seguem com grandes
dificuldades a serem superadas.

De acordo com a teoria cognitivista, a criança atribui significa


do a sua realidade. Os processos de compreensão, transformações,
armazenamento e uso das informações são regulados por processos
mentais. Para Piaget, cuja abordagem é psicogenética, a aprendiza
gem é construída internamente, e depende do nível de maturação ou
estágio de desenvolvimento do sujeito e da sua ação com o meio, pois,
de acordo com Palanga (2015), “[...] ao agir sobre os objetos, o sujeito
não apenas extrai suas características intrínsecas como também lhes
acrescenta algo, na medida em que combina e efetua deduções a
partir dessas características abstraídas” (p. 77).

A criança organiza, estrutura e explica a partir das experiên


cias com o mundo. Esses processos internos são chamados de as
similação e acomodação. A aprendizagem acontece quando há um
desequilíbrio dessas estruturas, ou seja, um conflito cognitivo como
ocorre quando a criança quer realizar uma atividade qualquer e não
consegue, gerando, assim, um conflito e, consequentemente, um novo
SUMÁRIO
esquema mental é criado.

Para Rego (2002), segundo a teoria de Vygotsky, a partir de uma


abordagem sociocultural, a linguagem, o pensamento e a memória
são o que diferenciam os homens das outras espécies, e as relações
do sujeito com o meio são sempre mediadas por elementos culturais,
portanto é na interação com o outro, por meio da cultura, que a crian
ça aprende. Desenvolvimento e aprendizagem ocorrem juntos, e um
estimula o outro. Nesse sentido, Vygotsky traz o conceito da zona de
desenvolvimento proximal, que é quando a criança já possui um co

4343
nhecimento muito próximo àquele que ela está desafiada a superar, e,
assim, avança a partir da interação.

Quanto aos aspectos afetivos, Vygotsky (2002) afirma que a


qualidade das interações vivenciadas entre os sujeitos vai conferir aos
objetos culturais um sentido afetivo.
[...] cognição e afeto não se encontram dissociados no ser hu
mano, pelo contrário, se inter-relacionam e exercem influências
recíprocas ao longo de toda a história do desenvolvimento do
indivíduo. Apesar de diferentes, formam uma unidade no pro
cesso dinâmico do desenvolvimento psíquico, portanto, é im
possível compreendê-los separadamente (REGO, 2002, p. 122).

Para Souza (2003), a afetividade e a cognição, embora distin


tas, são inseparáveis, e podem acelerar ou obstruir o desenvolvimento
cognitivo. O afeto e a necessidade despertam o interesse e a motiva
ção para o desejo de aprender.
Piaget afirma que, em cada nível do desenvolvimento, esse de
senvolvimento se dá por uma equilibração progressiva. Se toda
conduta possui um aspecto afetivo (energético) e um aspecto
estrutural (cognitivo), [...] defende a ideia de romper com a dico
tomia entre afetividade e inteligência e estudar os dois aspectos
no desenvolvimento. Considerando-se que os aspectos afetivos
podem estar associados mais às condutas relacionadas aos
objetos e [...] refere-se ao conjunto dos interesses dos esforços
SUMÁRIO
e dos afetos interindividuais com suas regulações. Nas relações
com as pessoas, o aspecto afetivo ou energético diz respeito
aos diversos afetos interindividuais, e o elemento intelectual ou
estrutural provém da tomada de consciência das relações in
terindividuais e desemboca na constituição das estruturas de
valores. Para marcar a distinção entre o aspecto estrutural e o
energético, Piaget considera importante separar a afetividade
em sentido amplo dos sentimentos, no sentido particular de
condutas determinadas. Considera que não se pode explicar a
inteligência pela afetividade e tampouco a afetividade pela inte
ligência [...] (SOUZA apud AQUINO, 2003, pp. 67-68).

4444
Segundo Galvão (2002), na teoria de Wallon, a afetividade, a
inteligência e o ato motor estão intimamente relacionados, e são res
ponsáveis pelo pleno desenvolvimento do sujeito, mas sofrem modifi
cações ao longo da vida - [...] a afetividade vai adquirindo relativa in
dependência dos fatores corporais. O recurso à fala e à representação
mental faz com que variações nas disposições afetivas possam ser
provocadas por situações abstratas e ideais, e possam ser expressas
por palavras (GALVÃO, 2002, p. 62).

É claro que as concepções que orientam a educação, o fazer


pedagógico e as relações desenvolvidas no âmbito escolar vão muito
além do mencionado até aqui, contudo esse momento de reflexão so
bre a prática pode movimentar pensamentos e ideias para novos e
possíveis fazeres na educação, considerando as necessidades dos
alunos e as possibilidades disponíveis.

O objetivo deste estudo é entender como está o desenvolvi


mento da criança com dificuldades de aprendizagem, nesta realidade
pandêmica à que fomos submetidos. Esta pesquisa visa uma reflexão
sobre os desdobramentos do ensino remoto, sem que tenha havido
um processo de adaptação, especialmente para estas crianças.

A dificuldade de aprendizagem pode ocorrer em algumas cir


SUMÁRIO cunstâncias, e como são conceituadas e compreendidas fazem toda
diferença para o planejamento e elaboração das ações educativas pro
postas para os alunos.
[...] é preciso que a educação esteja - em seu conteúdo, em
seus programas e em seus métodos - adaptada ao fim que se
persegue: permitir ao homem chegar a ser sujeito, construir-se
como pessoa, transformar o mundo, estabelecer com os outros
homens relações de reciprocidade, fazer a cultura e a história
[...] uma educação que liberte, que não adapte, domestique ou
subjugue (FREIRE, 2006, p. 45).

4545
É essencial, para essa reflexão, esclarecer e conceituar so
bre as dificuldades da aprendizagem, para que as necessidades das
crianças e as possíveis ações a serem realizadas possam contribuir
efetivamente para dar prosseguimento ao seu desenvolvimento cog
nitivo, motor, afetivo e social. Embora seja imprescindível reconhecer
a complexidade do tema, devido as suas sutilezas, variáveis e múl
tiplas possibilidades para um desempenho escolar aquém do espe
rado para sua faixa etária. Vale lembrar que o desenvolvimento da
criança é fortemente influenciado pelo meio no qual ela vive, pela
família, pela escola e pela comunidade. Nesse sentido, os impactos
sobre as dificuldades de aprendizagem podem ser minimizados ou
agravados pelo contexto social, afetivo e econômico.
[...] dificuldades de aprendizagem referem-se não a um único
distúrbio, mas a uma ampla gama de problemas que podem
afetar qualquer área do desempenho acadêmico. Raramente,
elas podem ser atribuídas a uma única causa: muitos aspec
tos diferentes podem prejudicar o funcionamento cerebral, e os
problemas psicológicos dessas crianças frequentemente são
complicados, até certo ponto, por seus ambientes doméstico e
escolar. As dificuldades de aprendizagem podem ser divididas
em tipos gerais, mas uma vez que, com frequência, ocorrem em
combinações e também variam imensamente em gravidade,
pode ser muito difícil perceber o que os estudantes agrupados
sob esse rótulo têm em comum (SMITH & STRICK, 2001, p. 15).
SUMÁRIO
As dificuldades de aprendizagem podem ser de origem orgâni
ca, por lesão e desequilíbrios neuroquímicos que podem ter sido pro
vocados por acidente, dificuldades com o parto, desnutrição, uso de
substâncias químicas tóxicas, por hereditariedade ou por alterações
no desenvolvimento cerebral.
[...] do ponto de vista neurobiológico a aprendizagem se tra
duz pela formação e consolidação das ligações entre as célu
las nervosas. É fruto de modificações químicas e estruturais no
sistema nervoso de cada um, que exigem energia e tempo para
se manifestar. Professores podem facilitar o processo, mas, em

4646
última análise, a aprendizagem é um fenômeno individual e pri
vado, e vai obedecer às circunstâncias históricas de cada um
de nós (COSENZA & GUERRA, 2011, p. 38).

As dificuldades de aprendizagem podem ser identificadas inicial


mente por alguns fatores que acabam por se evidenciarem, como falta
de atenção, dificuldades para seguir instruções, imaturidade social,
dificuldades com conversação, inflexibilidade, inabilidade de planeja
mento e de organização, distração, falta de destreza, falta de controle
dos impulsos, mas tais fatores ainda podem ser identificados como
uma falta de esforço e interesse dos alunos. Muitas vezes a desculpa
pode recair sobre o pretexto de uma personalidade forte, e até mesmo
ser algo visto como uma falta de interesse e preguiça para estudar.
Lembrando que as crianças podem parecer que não têm problemas
com a aprendizagem, e sim de comportamento. Contudo, dificuldades
de aprendizagem podem incorrer numa conduta inadequada.

Os transtornos de aprendizagem são considerados como ina


bilidades específicas que estejam ligadas à escrita, à leitura e à ma
temática. São dificuldades que se manifestam por fatores internos à
criança. O transtorno é identificado em alunos que apresentam re
sultados aquém do esperado para o seu nível de escolaridade, de
senvolvimento e capacidade cognitiva, e, ao serem avaliados3, apre
SUMÁRIO sentam resultados alterados no aspecto biológico por tratar-se de
um transtorno no neurodesenvolvimento, incluindo fatores genéticos,
ambientais e epigenéticos4. Estes têm influência direta na capacida
de do cérebro quanto ao processamento e percepção de informa
ções verbais ou não verbais, e podem estar relacionados a aspectos

3 Uma avaliação da aprendizagem deve ser realizada a partir dos 7 anos de idade, quando
a criança já está inserida na escola. Precisa ser realizada por uma equipe multidisciplinar,
liderada por um médico neuropediatra que entenda de transtornos da aprendizagem. Os
outros especialistas, como Psicopedagogos e Fonoaudiólogos, são profissionais que le
vantam hipóteses.
4 Estudo de como são feitas e desfeitas as ligações químicas no DNA e na cromatina. http://
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4747
multifatoriais, dificultando o desenvolvimento intelectual, acadêmico,
profissional e social. Os sintomas aparecem nos primeiros anos da
infância, e em situações específicas de aprendizagem, tornando-se
perceptíveis com maior clareza na idade escolar.

O distúrbio de aprendizagem, de acordo com Ciasca (2006), é


definido como uma disfunção do sistema nervoso central, portanto,
trata-se de um problema neurológico relacionado à falha na aquisição,
processamento ou, ainda, no armazenamento da informação, envol
vendo áreas e circuitos neuronais específicos, em determinado mo
mento do desenvolvimento, o que modifica os padrões de aquisição,
assimilação e transformação, ou seja, trata-se de uma alteração da
ordem natural de como esse processo acontece.

Os distúrbios podem se manifestar por meio das disfunções da


fala, da escrita, do raciocínio lógico, da matemática, da audição e da
disfunção motora. Podem ser identificados separadamente como dis
túrbios específicos, mas também podem aparecer como comorbidades.
A aprendizagem é processo cuja matriz é vincular e lúdica, e sua
raiz é corporal; seu desdobramento criativo põe-se em jogo por
meio da articulação inteligência-desejo e do equilíbrio assimi
lação-acomodação. Para dar conta das fraturas do aprender, é
necessário entender os processos e não os resultados ou ren
dimentos (SUPRIANO, 2014, p. 150).
SUMÁRIO
Nesse sentido, para entender os processos e o que está em jogo,
é mister que uma breve, mas importante, leitura sobre as principais ca
racterísticas dos transtornos e distúrbios seja realizada, para que se pos
sa enfrentar desafios educacionais que estão se apresentando.

A Dislexia é um distúrbio específico da leitura que afeta a escrita


mesmo com o desenvolvimento intelectual adequado. É caracteriza
do por problemas de reconhecimento preciso e fluente de palavras e
de decodificação. Alguns indicativos para a Dislexia, no início da vida
escolar, são: a dificuldade na aquisição da linguagem oral, de memó

4848
ria fonológica; de nomear pessoas, cores e objetos; não reconhecer
vogais com facilidade; evitar mostrar o que aprendeu; em situações
de leitura, omitir palavras, deixando o texto sem significado; e ainda
se confundir com algumas letras, como p, q, d, b. O melhor momento
para identificar este distúrbio é entre 8 e 10 anos, ou quando a criança
está no 3º ano do Ensino Fundamental.

Disgrafia é um transtorno motor do neurodesenvolvimento, ca


tegorizado como um Transtorno do Desenvolvimento da Coordenação.
Conhecido também como ‘Transtorno da Letra Feia’, a disgrafia é uma
dificuldade na habilidade da escrita, ou seja, na sua execução. É uma
descoordenação motora em que, na transmissão de informações vi
suais ao sistema motor, a criança sabe o que quer escrever, mas não
consegue idealizar no plano motor. Pode ser observada em pessoas
sem déficit cognitivo. A qualidade da escrita, das formas e das letras
apresenta-se disforme e com letras rasuradas, e os erros ortográficos
são muito comuns. A construção de frases fica aquém do esperado
para a idade e nível de desenvolvimento. Lembrando que a escrita,
segundo Cardoso e Capellini (2016), é uma atividade complexa, que
exige habilidades de planejamento e execução da ação motora, pro
cessos cognitivos e linguísticos para refinar ainda mais a linguagem, a
alfabetização e as competências motoras.
SUMÁRIO
Outro prejuízo, na expressão escrita, é identificado como Disor
tografia, que se traduz pela dificuldade que a criança tem em com
preender a conexão entre grafemas (letras) e fonemas (sons), além da
caligrafia problemática e da falta de compreensão sobre o conjunto de
regras ortográficas. A “letra feia” pode ser um indício do distúrbio. Em
consequência disso, a criança pode se mostrar apática na produção
de textos, e, geralmente, suas produções são curtas, desorganizadas
e sem pontuação. Além disso, a escrita pode apresentar algumas
omissões de letras, sílabas e até palavras.

4949
A Dislalia é um transtorno específico da articulação da fala, que
se caracteriza por problemas relacionados à consciência fonológica, o
que pode ocorrer por fatores genéticos ou biológicos, os quais estão
relacionados também com as habilidades motoras, a discriminação
auditiva, fatores psicológicos e ambientais, podendo ser associada a
outros transtornos do neurodesenvolvimento. As características mais
evidentes, e que identificam a Dislalia, são os erros nas pronúncias dos
fonemas /r/; /s/; /l/; /k/; /z/; /ch/ por omissão, substituição ou distorção,
e ocorre pela incapacidade de formar ou pronunciar corretamente es
ses fonemas ou grupos deles.

A Discalculia pode ser identificada como a inabilidade em rea


lizar cálculos, operações matemáticas, dificuldades em compreender
sequências lógicas e problemas para interpretar o enunciado dos pro
blemas. Há ainda a dificuldade em realizar comparações, consideran
do que a competência matemática em estimar quantidades e fazer
comparações se manifesta nos primeiros meses de vida. Segundo
Cosenza e Guerra (2011):
Nas crianças que sofrem de discalculia, a capacidade de ad
quirir as habilidades matemáticas está seriamente prejudicada.
Elas não conseguem lidar nem mesmo com o conceito de nú
mero, e as situações que envolvem matemática tornam-se um
problema não só na escola, mas também nas atividades cotidia
SUMÁRIO nas. Para elas, a matemática e seus conceitos são como uma
língua estrangeira desconhecida (p. 114).

A Discalculia pode ser percebida desde muito cedo, mas é na


escola que todos os sinais e dificuldades se expressam de maneira
clara e explícita, pois as exigências são maiores, e a sequenciação de
tarefas que envolvem a matemática passam a ser rotineiras.

O TEA (Transtorno do Espectro Autista) caracteriza-se pelas difi


culdades de comunicação e interação social, evidenciando comporta
mentos repetitivos. O autismo pode ser identificado nos primeiros anos

5050
de vida, e, em algumas crianças, os sintomas aparecem logo após o
nascimento. A intensidade dos sintomas e as características são va
riáveis para cada indivíduo. Esse transtorno, de acordo com Forner
e Rotta (2016), caracteriza-se por perda do contato com a realidade,
decorrendo de dificuldade ou impossibilidade de comunicação, inabi
lidade para estabelecer contato afetivo e interpessoal, inflexibilidade
para rotinas e padrões ritualísticos verbais e não verbais.
Os transtornos e distúrbios mencionados podem ou não ser
acompanhados de comorbidades, o que torna o diagnóstico objeto de
análise e avaliação por uma equipe multidisciplinar, havendo a neces
sidade de posterior orientação para o desenvolvimento de ações e ati
vidades que possibilitem o desenvolvimento adequado, e uma melhor
qualidade de vida para as crianças acometidas por estas dificuldades.

Ainda em relação às possíveis causas para as dificuldades de


aprendizagem, o TDAH (Transtorno do Déficit de Atenção e Hiperati
vidade) impacta fortemente no desenvolvimento de aprendizagem da
criança que se manteve fora da escola e em isolamento social, e isso
ocorre em especial por três de suas características: a hiperatividade,
a desatenção e a impulsividade com algumas variações entre elas,
com predominância de alguma característica em relação às outras ou
de forma combinada.
SUMÁRIO
A atividade motora excessiva, como correr, pular, rolar por todos
os espaços, sem critérios ou atenção necessária, para observar peri
gos e a impulsividade das ações precipitadas, com grande potencial
causador de danos pessoais, colocam a criança em risco de se ferir. As
características do TDAH, associadas ao isolamento social e, muitas ve
zes, no limitado espaço das suas residências, podem ser desastrosos.

Na escola, alguns desses comportamentos são relatados pelos


professores como afirmam Signor e Santana (2016):

5151
As reclamações dos professores, em geral, marcam questões
comportamentais, de atenção e de aprendizagem: “Não con
segue permanecer sentado por muito tempo”; “Pede para sair
da sala constantemente”;“Mostra-se distraído”; “Seu olhar está
sempre distante”; “Não se engaja nas atividades”; “Não copia
do quadro”; “Faltam letras e acentos”; “Seus textos não têm
sentido”; “Tem dificuldade de aprender”; “Não consegue ler”;
“Ninguém quer fazer trabalho em grupo com ele” etc. Esses
relatos muitas vezes sustentam a prescrição de medicamentos
para o controle da “hiperatividade”, da “impulsividade” e da
“desatenção”, “sintomas” característicos do que se conhece
tradicionalmente por TDAH (p. 18).

No entanto, a tríade desatenção, hiperatividade e impulsividade,


isoladamente, não significa defasagem ou falta de compreensão, isto,
em decorrência do TDAH, se caracteriza por níveis de atenção não ade
quados em relação ao esperado, levando a distúrbios motores, cogniti
vos, de comportamento e perceptivos, como afirma Rotta (2006).

Geralmente, o comportamento fora do esperado, para a ida


de e desenvolvimento da criança, é identificado na escola, mas não
unicamente. Em casa, este comportamento também pode ser iden
tificado. A hiperatividade, uma das características do TDAH, faz com
que a criança se distraia muito facilmente, principalmente quando
há muitos estímulos visuais, ambientais, auditivos. A agitação fica
SUMÁRIO incontrolável, o que provoca ansiedade e até agressividade, dificul
tando novos aprendizados. A criança não consegue seguir regras ou
instruções, fala demais e é distraída.

A atenção é um processo cognitivo complexo, que faz com se


direcione àquilo que mais interessa e deixe o que for desnecessário.
Trata-se de um mecanismo seletivo para o que é importante, ou seja,
podemos [...] dirigir a atenção a determinados estímulos enquanto ig
noramos outros. [...] O cérebro está permanentemente preparado para
apreender os estímulos significantes e aprender as lições que daí pos
sam decorrer (COSENZA, 2011, p. 42 e 48). Portanto, a desatenção é
a dificuldade em apreender estímulos significantes.

5252
Completando a tríade que compõe o TDAH, a impulsividade leva
a criança a buscar o prazer imediato, ela não consegue adiar uma gra
tificação para um momento futuro, não consegue esperar sua vez nas
brincadeiras, interrompe e se intromete nas conversas dos outros, e,
geralmente, fala o que lhe vem à cabeça sem um “filtro”. É precipitada
e dá respostas imediatas, sem reflexão. Muitas vezes, não consegue
deixar o outro concluir uma pergunta ou raciocínio, e responde no im
pulso. Essa precipitação ocorre pelo desajuste às situações imprevi
síveis, que vão criando uma tensão, até que não consiga se conter, e,
assim, executa a ação para sentir-se aliviada. Após a ação precipitada,
pode ocorrer o sentimento de culpa por não ter controlado o impulso.

Para os distúrbios e transtornos mencionados neste breve es


tudo, existem ações e atividades específicas e essenciais para cada
um deles, possibilitando que as crianças avancem em seus estu
dos, e se desenvolvam com toda a potencialidade que alcançarem.
Dessa forma, é fundamental que, se a criança apresentar indícios de
qualquer comportamento fora do que se espera para a sua idade e
desenvolvimento, é imperativo que se realize uma avaliação multidis
ciplinar para se certificar das suas necessidades, contudo considero
que as questões emocionais, afetivas e as relacionadas ao movimen
to do corpo impactam fortemente na aprendizagem de todos, com ou

SUMÁRIO sem dificuldades de aprendizagem.

O afeto, que se manifesta através da emoção, tem papel funda


mental no desenvolvimento humano, ainda que cada um compreenda
a afetividade na aprendizagem de maneiras diferentes. Carinhos são a
mínima parte do que a afetividade significa para a aprendizagem. Os
estímulos do meio onde a criança vive, da escola e as influências inter
nas e externas afetam a sua aprendizagem e o seu desenvolvimento.

É substancial considerar esses elementos, e possibilitar que a


criança explore os ambientes e as situações desafiadoras, mas possí
veis de serem suplantadas para que se possa avaliar a sua capacidade

5353
de superar limites com respeito às suas capacidades. Isso é colocar
a afetividade da educação em seu lugar de importância. Logo, o afeto
desenvolve a cognição, e isso requer ação e movimento.

Podemos observar, de acordo com Dantas (1992) e sua com


preensão sobre a teoria de Henri Wallon, que a emoção é que asse
gura a sobrevivência do ser humano, isso porque sua dependência,
desde o nascimento, se prolonga por um grande período, e, na falta de
cuidados, a espécie não sobreviveria. O ser humano possui uma ca
pacidade extraordinária de mobilização para o atendimento das suas
necessidades e o faz, quando bebê, por meio do choro, sinalizando,
desta forma, que precisa de algo.

O afeto é um termo mais genérico, que abrange as sensações


experimentadas, englobando tanto as emoções quanto os sentimen
tos; já a emoção é a expressão afetiva intensa, dirigida a alguém ou
a alguma coisa, sendo, na maioria das vezes, de curta duração, e,
geralmente, acompanhada de reação fisiológica, como o choro, tremor
nas pernas, taquicardia e sudorese. Essas sensações e desequilíbrios
vivenciados pelas crianças, com seus pares, faz com que ela aprenda
sobre si mesma e sobre os outros, observando reações e realizando
uma interpretação particular das mesmas.

SUMÁRIO No que se refere ao movimento do corpo e à aprendizagem, é


através de atividades físicas e mentais que a criança também intera
ge com os seus pares, satisfazendo suas necessidades de realização
e prazer. Para isso, os jogos, as brincadeiras e a recreação são funda
mentais, pois permitem que o cognitivo, o motor, o afetivo e o social
se manifestem, num reflexo dessa interação, de maneira espontânea
e sem a obrigatoriedade. As crianças realizam as atividades com
prazer e sem preocupações, aprendendo a trabalhar em grupo, e
desenvolvendo conhecimentos sobre si mesmas e sobre os outros,
mantendo relações interpessoais, adquirindo hábitos e habilidades, e
aumentando a sua capacidade mental. A escola, com seus espaços

5454
de interação e de socialização, é o lugar onde a aprendizagem se
desenvolve em todas as suas dimensões.

A aprendizagem [...] depende da interação do indivíduo com o


ambiente, as falhas na aprendizagem podem estar relacionadas
ao indivíduo, ao ambiente ou a ambos. Um indivíduo com boa
saúde e todas as suas funções cognitivas preservadas, sem
nenhuma alteração estrutural ou funcional do sistema nervoso
pode, ainda assim, apresentar dificuldades para aprender. O
ambiente, na verdade, leva ao desenvolvimento de comporta
mentos adaptativos que podem dificultar ou propiciar a apren
dizagem (CONSENSA & GUERRA, 2011, p. 130).

Na realidade a que fomos submetidos, elementos essenciais


para a aprendizagem, como o emocional afetivo e o motor, não tiveram
o mesmo espaço. As aulas remotas colocaram os alunos em diversas
situações de aprendizagem, que foram variando conforme o contex
to vivido de cada um e dos recursos disponíveis, mas ficaram longe
da interação que as atividades presenciais em grupo proporcionavam
para o seu desenvolvimento, afinal, o ambiente de encontro com seus
pares não estava acessível, o que tornou o desafio dos professores
ainda maior para ressignificar os conteúdos a serem trabalhados num
ambiente ainda desconhecido.
As atividades de dança, jogos e brincadeiras, desenvolvidas na
SUMÁRIO escola, aproximam as crianças, que simultaneamente vão se entregan
do aos mesmos ritmos e gestos comuns a todos do grupo, estabele
cendo uma sintonia afetiva, e envolvendo todos na mesma emoção.
Essas ações, de alguma maneira, podem e devem ser retomadas em
casa. É claro que, para as crianças que desfrutam de espaços maiores
e convivem com outras crianças, as atividades serão mais interessan
tes, mas há que se considerar também aquelas que se encontram em
espaços completamente diferentes, e só convivem com adultos.

Guardadas as responsabilidades de cada instituição (escola e


família) para com a criança e seu desenvolvimento, os caminhos possí

5555
veis foram explorados e ainda o são, como as aulas de ensino remoto,
materiais impressos, recursos como livros digitais, plataformas de ativi
dades lúdicas e as ferramentas digitais, em geral. Estas são tratativas
que se tornaram necessárias, pois o processo de isolamento ainda con
tinua, embora, aos poucos, as aulas presenciais estejam retornando.
No entanto, o desgaste psicológico e o estresse causados em decor
rência da pandemia foram impactantes para todos. Nesse cenário, as
desigualdades sociais ficaram ainda mais evidentes no que se refere
ao acesso de recursos tecnológicos. As escolas públicas, por meio da
impressão de materiais didáticos com entrega domiciliar e com aulas
on-line, conseguiram alcançar grande parte dos alunos, contudo as
crianças que, por alguma razão, ficam desacompanhadas na sua rotina
escolar, tiveram a sua aprendizagem estagnada ou até em retrocesso.
No período em que as escolas estiveram fechadas e as aulas
foram totalmente on-line, as crianças, com desenvolvimento típico, se
guiram cada uma a seu ritmo, alguns assistindo a todas as aulas e
realizando as atividades, ao passo que outros se recusavam a abrir
a câmera do computador ou do celular, o que é compreensível, prin
cipalmente se estiverem na pré-adolescência ou adolescência, mas
seguiram atendendo as propostas das escolas, respondendo às orien
tações dentro do possível. E, assim mesmo, muitos alunos não con
SUMÁRIO seguiram acompanhar, se dispersaram, ficaram cansados e irritados.

Vale recordar que as dificuldades de aprendizagem também


podem ser em decorrência de metodologia pedagógica inadequada,
ou de uma dificuldade corriqueira e que só requer um pouco mais
de atenção ou revisão, uma dificuldade sem o elemento de limitação
cognitiva. Neste caso, geralmente as crianças conseguem avançar nos
estudos, muitas vezes sem acompanhamento, porém, por tratar-se de
um momento de fragilização e de exposição ao desconhecido, crian
ças que estavam se desenvolvendo satisfatoriamente começaram a
dar indícios de que o caminhar da aprendizagem não estava bem. Mui
tas tiveram seus processos interrompidos.

5656
Para as crianças que já realizavam algum acompanhamento
especializado com psicólogos, fonoaudiólogos, psicopedagogos, psi
comotricistas e terapeutas, devido à impossibilidade de ser realizado
o atendimento presencialmente, ainda que por um curto período, hou
ve algum atraso. Contudo, por tratar-se de atividades desenvolvidas
individualmente, os profissionais foram retomando suas sessões e,
aos poucos, conseguiram dar continuidade ao acompanhamento das
crianças, embora não saibamos o quanto esses tempos possam ter
afetado o emocional das crianças, já que transtornos ou distúrbios ge
ralmente têm como sintoma a autoestima abalada, depressão, ansie
dade, e, por se sentirem diferentes, esses estudantes têm problemas
em se relacionar com as outras crianças.

Fatores econômicos causados pela pandemia fizeram com que


muitas famílias perdessem seus empregos, seus negócios, enfim, fi
cassem com a vida financeira abalada, e, nesse sentido, muitos que
faziam acompanhamento especializado deixaram suas terapias. Ao
meu ver, quando puderem retornar, o início do trabalho será de uma
longa caminhada. Quando pensamos nas crianças que já haviam ma
nifestado suas dificuldades, mas por uma questão de impossibilidade
financeira e estrutural só contavam com a escola para otimizar a sua
aprendizagem, percebemos o quanto ainda temos que aprender com
essa crise. Precisamos lembrar ainda que há crianças em situação de
SUMÁRIO
extrema pobreza e desprotegidas.

Os professores estão ressignificando o seu trabalho, e desco


brindo os recursos digitais, as plataformas de aprendizagem, utilizando
os REA (Recursos Educacionais Abertos), e forjando, em plena pan
demia, outra forma de interagir com o seu aluno e de promover a inte
ração dele com os outros, de repensar a sua carreira, para que tenha
sentido, nos dias de hoje, diante do isolamento e no pós-crise, cons
truindo outros estilos de ensino-aprendizagem. Os cursos de formação
continuada para os professores estarão com novidades, replicando os

5757
conhecimentos adquiridos nesses tempos. Primeiramente, foi a adapta
ção do que se fazia em sala de aula para o ensino remoto, e, ao mesmo
tempo, foi-se buscando novos conhecimentos, incluindo as câmeras de
vídeo dentro das salas de aula e os aplicativos, dentre outros recursos.

As salas de aula nunca mais serão as mesmas, e as crianças


com transtornos ou distúrbios de aprendizagem também ganham com
os novos conhecimentos, construídos pelos professores diante da cri
se que se iniciou em 2020 e mudou o cenário mundial.

Os profissionais que estão ligados aos processos de aprendiza


gem, de alguma forma, sofreram influência da dinâmica imposta pela
pandemia, alterando a sua rotina, e, provavelmente, a aplicação dos
seus conhecimentos também. Foi preciso formar-se e informar-se so
bre o mundo digital para lidar com uma geração de nativos digitais.

Num passado recente, era improvável pensar em um atendi


mento psicológico, psicopedagógico ou psicomotor a distância, mas
a necessidade fez com que se pensasse em algumas possibilidades.
É claro que isso se deu com muitas restrições, mas criou-se o espaço
para desenvolvimento de novas ferramentas. E quanto aos cursos de
formação? O uso dos computadores, a interação on-line e por aplicati
vos foram a saída para as áreas da educação e da saúde.
SUMÁRIO
Com tantos desafios a serem enfrentados, o psicopedagogo
contribui com o desenvolvimento da aprendizagem da criança e do
adolescente com distúrbios e transtornos. Ele investiga, analisa e ava
lia; faz um planejamento de ação; e, por meio de técnicas e atividades,
concentra o seu trabalho na dificuldade da criança.

O trabalho psicopedagógico atua considerando as dimensões:


social, cognitiva e afetiva. O seu objeto de estudo é a aprendizagem, e,
por isso, se algo neste processo se apresenta inadequado, ele conse
guirá detectar, tanto nos transtornos e distúrbios como em altas habili

5858
dades, que também possuem necessidades diferentes, exclusivas para
cada caso. A autoestima baixa, a depressão, o estresse e o isolamento
do grupo são comuns aos casos, pois a criança superdotada também
pode sentir que não pertence ao grupo, inibindo a sua participação nas
aulas para não se sobressair aos demais, negligenciando suas aptidões.
É da natureza humana a curiosidade, o desejo de aprender, e cada um, a
seu modo, constrói seus conhecimentos. Para Maturana e Varela (2005),

[...] sob a premissa de que “viver é conhecer e conhecer é vi


ver”, a vida apresenta-se como condição necessária e, ao mes
mo tempo, suficiente para o aprender. Nessa perspectiva, a
aprendizagem é um elemento intrínseco à condição humana.
Aprendemos a todo o momento, em um processo de intera
ção permanente com o meio, manifestando diferentes níveis de
complexidade referentes ao conhecimento construído (p. 17).

A mediação pedagógica consciente, planejada, com objetivos e


intencionalidade clara é fundamental para a aprendizagem significativa
de todos, mas ainda mais para aqueles com dificuldades e limitações.
Nesses tempos de mudanças nas rotinas, de tantas preocupações e
incertezas, o compromisso com a construção de conhecimento deve
superar as barreiras do espaço físico e outras mais. Pudemos sentir
que as desigualdades sociais ficaram ainda mais evidentes, principal
mente no que se refere aos acessos, contudo é possível aproveitar os
SUMÁRIO avanços do conhecimento para minimizar essas diferenças.

A princípio, o pensamento foi de uma adaptação da sala de


aula para o ensino remoto, mas com todas as tecnologias disponíveis
e todo esforço empenhado para que ela se realizasse, e não terá sido
para poucos. Os processos de aprendizagem e de mediação forjados
na urgência precisam alcançar toda a sociedade, e promover a educa
ção socialmente equalitária.

5959
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SUMÁRIO

6161
Capítulo 3

Lugar e papel da relação pedagógica


em tempos de pandemia: sentidos,
desafios e aprendizados a partir
da compreensão de professores

Joice Maria de Oliveira

Maria Teresa Ceron Trevisol

Vanessa Maghry de Andrade


3
Joice Maria de Oliveira
Maria Teresa Ceron Trevisol
Vanessa Maghry de Andrade

Lugar e papel da relação pedagógica


em tempos de pandemia:
sentidos, desafios
e aprendizados a partir da
compreensão de professores
DOI: 10.31560/pimentacultural/2021.107.62-88
SUMÁRIO

Ensinar é um exercício de imortalidade. De alguma for


ma continuamos a viver naqueles cujos olhos apren
deram a ver o mundo pela magia da nossa palavra. O
professor, assim, não morre jamais (Rubem Alves).

A educação exige os maiores cuidados, por


que influi sobre toda a vida (Sêneca).

6363
INTRODUÇÃO

A COVID-19 impactou a vida das pessoas em todo o mundo, a


convivência, as relações, os modos de agir em diferentes espaços e
ambientes. No que se refere às instituições educativas e às relações
nesses espaços, evidenciaram-se significativas mudanças. A obser
vância de normas de segurança e proteção imprimiu ao cotidiano no
vas formas de organização do tempo e espaço, a necessidade do dis
tanciamento social e a implementação de modalidades de ensino não
presenciais, em formato virtual. Todo esse cenário de mudanças impli
cou o contexto e dinâmica das salas de aula e a relação pedagógica.

E é justamente esse cenário que envolve a sala de aula, a relação


pedagógica, os processos de ensinar e de aprender, que constituem o
foco deste texto. Objetiva-se analisar o lugar e papel da relação peda
gógica em tempos de pandemia, os sentidos, desafios e aprendizados
desse tempo a partir da compreensão de professores que atuam na
educação básica, na rede pública de um município localizado na região
serrana catarinense. Compreende-se que a relação pedagógica possui
lugar de organizar, projetar, criar, impelir. Ressalta-se que esse lugar é
demarcado por verbos que incitam a ação dos e entre os envolvidos
nos processos de ensino e aprendizagem. E quanto ao papel, atribui-se
SUMÁRIO
a ele o sentido de energia, motivação, encorajamento, permanência e,
particularmente, não abandono. Enfatiza-se a importância do papel da
relação pedagógica, como também uma das variáveis que mobilizou a
permanência ou abandono de muitos estudantes do contexto escolar.

Ter um(a) professor(a) como referência, um(a) condutor(a) dos


processos, permite e favorece um sistema de trocas e relações, sem dei
xar de enaltecer a dimensão do profissional que acolhe as dificuldades
dos alunos(as) e contribui para a sua dissolução, constituem aspectos
que demandam um olhar atento e comprometido de todos os envolvidos
com o contexto educacional. Em tempos de distanciamento – social,

6464
cultural, cognitivo, afetivo - entre os envolvidos nos processos de ensinar
e de aprender, enfatiza-se, sobremaneira, a importância da análise, dis
cussão e reflexão a respeito do lugar e do papel da relação pedagógica.

Em consonância com Meirieu (2004, p. 17): “Ninguém ensina so


zinho”. Essa afirmação, mais do que nunca, é válida para os tempos
atuais. Mesmo que não se ensine sozinho, é possível que, muitas ve
zes, o professor “se encontrou sozinho” para ensinar nas salas virtuais,
com câmeras e áudios fechados, silêncio, ausência de engajamento e
disposição para interagir e aprender. Com certeza, esse consistiu em um
dos desafios da prática docente, e implicou muitas situações de mal-es-
tar docente, desespero e ansiedade de muitos profissionais. O que fazer
diante dessas manifestações? Como engajar os alunos nas atividades?
Como seguir motivando-os? E, do ponto de vista dos professores, como
seguir motivados? Que aprendizados foram necessários para o(s) a(s)
professor(es/as) e alunos(as) seguir(em) com o ensinar-aprender? O
distanciamento físico dos alunos comprometeu os vínculos entre eles?
O que foi efetuado para manter a relação pedagógica com os alunos?

Buscando respostas a essas questões, efetuou-se uma pesqui


sa de natureza qualitativa, envolvendo a coleta e recorte da realidade
educacional, com o objetivo de investigar a compreensão de profis
sionais que atuam com alunos de diferentes níveis de ensino, em um
SUMÁRIO
município localizado na região serrana de Santa Catarina, a respeito
do lugar e papel da relação pedagógica em tempos de pandemia.
Para favorecer a coleta dos dados, utilizou-se de um questionário,
composto por quatro questões abertas, enviado por e-mail, em que
os profissionais responderam às questões, e o devolveram, também,
utilizando-se do e-mail como recurso.

Todos os profissionais foram consultados a respeito dos objeti


vos da coleta de dados, de que suas manifestações contribuiriam para
a constituição de um texto, e manifestaram o seu aceite em constituí
rem a base empírica do mesmo.

6565
Os professores que constituíram a amostra foram oito, sendo
um professor e sete professoras, com faixa de idade entre vinte e cin
co e cinquenta e cinco anos, cuja formação de cinco professores é a
Pedagogia, uma em Letras Português/Inglês, uma em Matemática e
Química e ainda há outra profissional formada em Ciências Sociais
e Pedagogia. Todos eles possuem Especialização nas áreas em que
atuam. Em relação ao nível de ensino em que atuam, duas professoras
trabalham na Educação Infantil, três no Ensino Fundamental, em séries
iniciais, e três nos anos finais do Ensino Fundamental e Ensino Médio.
Na sequência, o texto está composto pelas seguintes partes:
levantamento e análise das questões fundantes dessa produção a
partir da compreensão de autores; análise e discussão dos dados
coletados com os profissionais da escola; considerações em relação
ao objetivo do texto.

UM NOVO CENÁRIO NAS SALAS DE AULA:


TEMPO DE MUDANÇAS E DE APRENDIZADOS

Não há dúvidas de que o cenário atual trouxe muitas incertezas

SUMÁRIO e inseguranças para todas as pessoas, em todas as áreas. A Covid-19


impactou a vida da população em escala mundial, e a fragilidade do
humano ficou em evidência.
As pandemias mostram de maneira cruel como o capitalismo
neoliberal incapacitou o Estado para responder às emergên
cias. As respostas que os Estados estão a dar à crise variam
de Estado para Estado, mas nenhum pode disfarçar a sua in
capacidade, a sua falta de previsibilidade em relação a emer
gências que têm vindo a ser anunciadas como de ocorrência
próxima e muito provável (SANTOS, 2020, p. 32).

6666
Em se tratando do cenário educacional, a pandemia exigiu uma
reinvenção do ensinar. Novas metodologias, novas ferramentas, prin
cipalmente tecnológicas, tiveram que ser incorporadas às atividades
pedagógicas. Toda comunidade escolar teve que se adaptar ao mo
delo híbrido de ensino, mesmo sem o preparo suficiente das gestões
educacionais e dos profissionais de educação. Também os espaços
de ensino, para a atuação dos professores nas escolas, foram instala
dos nas casas dos profissionais.

Iniciou-se uma luta contra o tempo para se aprender a utilizar


ferramentas tecnológicas e inseri-las no planejamento das aulas. O
discurso de que as ferramentas tecnológicas iriam ser incorporadas às
salas de aula se tornou real. Mas ninguém imaginava que seria em tal
proporção, e muito menos como isso afetaria a relação pedagógica.

Para Goergen (2014):


Nosso presente e futuro estão nas mãos da ciência e tecno
logia, ironicamente para o bem e para o mal. Com isso, mais
um paradigma festejado como absoluto alcança seus limites.
As dúvidas e incertezas sinalizam uma nova ordem cujo fio
condutor será compreender e assumir as responsabilidades
frente aos impactos materiais e sociais do chamado científi
co-tecnológico. Aos poucos, emerge em nossa consciência
a necessidade de perguntar pelo sentido humano e social da
SUMÁRIO ciência e tecnologia. Até o momento, a comunidade científi
ca e as instituições dedicadas à produção de conhecimentos
e à formação de pesquisadores ou profissionais de alto nível
ainda pouco se preocupam com esta questão. Se o mundo
se produz e reproduz, se a vida depende da produção do co
nhecimento e de sua aplicação, é hora de refletir sobre as con
dições sob as quais se criam e usam os conhecimentos. As
possibilidades de superação que ciência e tecnologia aportam
não necessariamente são efetivadas como progresso (p. 567).

Mesmo antes da pandemia, já havia indícios de que o avanço


científico-tecnológico estaria modificando nossas rotinas e relações,
trazendo-nos questionamentos e reflexões acerca desses impactos

6767
em nossa vida. A aproximação do tecnológico e o afastamento do
ambiente escolar acentuaram essas dúvidas e incertezas no contexto
educacional. A percepção que temos é de que o que afirmava Goergen
se configurou na produção e reprodução de conhecimentos, em detri
mento do sentido humano e social da ciência e tecnologia.

Enquanto a produção e reprodução do conhecimento foram sa


nadas, através do ensino, por meio de ferramentas tecnológicas, pouco
foi pensado no sentido de atender às necessidades de interação entre
professores, alunos e famílias, para que este conhecimento fosse reali
zado com qualidade. As angústias e anseios dos protagonistas escola
res ficaram em segundo plano. O importante era dar conta de cumprir
com os conteúdos e horas de estudo, e o “ano não seria perdido”.
Contudo, como ficou a relação pedagógica neste contexto? Os
professores e alunos sentiram-se motivados a aprender? As suas dúvi
das e incertezas foram respondidas? Ou podemos dizer que houve um
“faz de conta” na educação, que consiste na escola da ilusão, onde o
professor finge que ensina e o aluno finge que aprende?

Como salienta Meirieu (1998): “Sob pena de falhar na sua fun


ção essencial, a escola não pode se desinteressar da força que leva a
mensagem até a criança e pelas motivações que levam esta a escolher
SUMÁRIO aquela” (p. 85). Mas, para que o aluno escolha a escola, é preciso de
sejo, motivação e interesse.

Todavia, nas escolas em que se observa a valorização pelo co


nhecimento científico, em que o professor cumpre com o extenso cur
rículo, trabalhando de forma fragmentada somente os conteúdos de
sua disciplina, questiona-se se isto é suficiente para despertar o desejo
e o interesse por estudar tais conteúdos. Para Strieder et. al (2017), a
resposta a esse questionamento é negativa:

A ciência precisa, proposta pela modernidade, com sua forma


de pensar simplificadora e firmada na perspectiva de separa

6868
ções, é progressivamente considerada insuficiente e repleta
de carências. Em vários âmbitos dos sentires e dos fazeres
humanos, que intencionalmente reforçam a instrumentalização
e os conhecimentos voltados para fins técnicos, se reconhe
cem limites e insuficiências. As ciências, sejam as naturais, as
sociais ou as humanas, reconhecem que seu desenvolvimento
ultrapassa a forma racional, linear e amparada em base unifi
cada, pois o pensamento que simplifica também promove um
conhecimento fragmentado, e este alimenta um pensamento
simplificador (pp. 1245-1246).

Em relação aos âmbitos dos sentires e dos fazeres humanos,


com o advento da pandemia, em que as metodologias se deram, prin
cipalmente de forma linear e fragmentada, através do distanciamento
entre professores e alunos do ambiente escolar, permite-nos questio
nar se esses entraves vieram a acentuar o desinteresse pela escola.
Para Meirieu (1998): “o mais simples é, certamente, ignorar o desejo.
O professor ensina, não tem que se preocupar com o que o aluno
quer, procura ou pensa. Cada um pode receber, em virtude de uma
liberdade interior que não é questionável, o saber dispensado” (p. 87).

Não se pode generalizar, uma vez que a utilização de novas


ferramentas possui potencial de despertar o interesse da geração tec
nológica, mas até que ponto pode-se dizer que elas substituem as
relações construídas por meio da interação, do diálogo, dos debates
SUMÁRIO que envolvem a atuação dos sujeitos. Ainda segundo Meirieu (1998, p.
85): “O que realmente faz a diferença na atividade pedagógica parece
fugir a qualquer definição e não pode ser descrito em termos de dis
positivo ou tecnologia”.

Para ele, os instrumentos pedagógicos são muito importantes,


mas só adquirem valor por meio das pessoas que estão no ambiente
e dão sentido a eles. Na perspectiva sociointeracionista de Vygotsky,
construir conhecimentos implica uma ação partilhada, uma vez que é
através dos outros que as relações entre sujeito e objeto de conheci
mento são estabelecidas (REGO, 1995, p. 110).

6969
Em consonância com ele, Nussbaum (2015) enfatiza que:
Educação é para gente. Antes de podermos planejar um siste
ma educacional, precisamos entender os problemas que en
frentamos para transformar alunos em cidadãos responsáveis
que possam raciocinar e fazer uma escolha adequada a res
peito de um grande conjunto de temas de importância nacional
e internacional (p. 143).

Para tanto, é preciso repensar o processo de ensino e aprendi


zagem. Pensar na necessidade de promover um diferente fazer peda
gógico e educativo, que não esteja pautado na transmissão passiva
de conhecimentos, mas que leve em conta a interação do sujeito com
o mundo em que vive. É preciso pensar a aprendizagem como uma
experiência formativa, que coloca os colaboradores na trilha da res
ponsabilidade, como participantes do processo, uma vez que a sala
de aula deve ser muito mais um espaço de encontro entre indivíduos
do que entre disciplinas, ou conteúdos, de forma a qualificar o poten
cial humano. Para Rego (1995), parafraseando Vygotsky, intelecto e
afeto não se separam, porque o autor busca uma abordagem abran
gente, que seja capaz de entender o indivíduo em sua totalidade. De
acordo com ele, os desejos, as necessidades, as emoções, as mo
tivações, os interesses, os impulsos e as inclinações do indivíduo é
que dão origem ao pensamento, e este, por sua vez, exerce influência
SUMÁRIO sobre o aspecto afetivo. Ainda, segundo Rego (1995, p. 122):

Como é possível observar, na sua perspectiva, cognição e afeto


não se encontram dissociadas no ser humano: pelo contrário,
se inter-relacionam e exercem influências recíprocas de toda a
história do desenvolvimento do indivíduo. Apesar de diferentes,
formam uma unidade no processo dinâmico do desenvolvimen
to psíquico, portanto, é impossível compreendê-los separada
mente. É justamente por isso que aponta para a necessidade
de uma abordagem unificadora dos aspectos intelectuais e afe
tivos no estudo do funcionamento psicológico.

Para Wallon (1975, p. 397):

7070
A vida afetiva apresenta certas particularidades essenciais que
necessitam ser conhecidas por todos os que possam estar em
relação com estas crianças ou adolescentes, a fim de que pos
sam entender melhor a maneira como se processam estas re
lações de afetividade em relação ao seu desenvolvimento e de
que maneira estas estão influenciando nos processos de ensino
e da aprendizagem.

É incontestável como o cenário de pandemia mundial, ocasionado


pelo novo coronavírus, impactou a dimensão humana, as relações so
ciais, as interações entre os indivíduos, a afetividade, principalmente no
que tange aos processos de ensino e de aprendizagem. Aqueles alunos
que possuem acesso à internet, e podem acompanhar as aulas ao vivo,
mesmo de forma remota, têm um contato maior com o professor. Há cer
ta interação entre os indivíduos, mas, para aqueles que não têm acesso,
o distanciamento da escola e do professor, principalmente em escolas do
interior, as desigualdades sociais ficaram em evidência. Como dizer que
algumas mensagens de voz, ou atividades enviadas pela plataforma ou
mesmo as atividades impressas podem substituir o papel fundamental
que a mediação do professor tem na relação pedagógica?

Neste contexto, em que a tecnologia prevaleceu por tanto tem


po, pode-se dizer que a afetividade, as emoções, os desejos foram
deixados de lado, para atender às exigências do currículo.
SUMÁRIO

IMPLICAÇÕES DA PANDEMIA NO COTIDIANO


ESCOLAR: COMPREENSÃO DE PROFESSORES
QUE ATUAM NA EDUCAÇÃO BÁSICA

Na coleta de dados da investigação, o instrumento utilizado foi


um questionário enviado por e-mail, contendo os dados de identificação
dos participantes e quatro questões discursivas relacionadas à temáti

7171
ca. As perguntas elaboradas para alcançar o objetivo de investigação
foram: (1) Quais os principais impactos do período de pandemia nos
processos de ensinar e de aprender na escola? Destaque e comente,
ao menos, um desses impactos que você vivenciou e precisou enfrentar;
(2) Nesse período de pandemia, em que grande parte das atividades
escolares se realizaram no formato virtual, você observou que a relação
pedagógica com os seus alunos se manteve de igual forma em relação
ao período presencial?; (3) Você verificou que o distanciamento físico
dos alunos comprometeu os vínculos com eles? O que você fez para
manter a relação pedagógica com seus alunos? Essa foi uma preocu
pação sua? Sim, não, por quê? Posicione-se a respeito; (4) Esse período
de pandemia, de distanciamento dos alunos, da adoção de outras for
mas de ensinar que não as presenciais, lhe permitiram aprendizados? O
que você considera que tenha sido um aprendizado em relação a como
encaminhar os processos de ensino com os seus alunos?
Os 8 participantes da pesquisa, que nos permitiram uma aproxi
mação com o contexto escolar e as vivências dos profissionais nesse
período de pandemia, foram professores da rede municipal e estadual
de uma cidade serrana catarinense, sendo 7 do sexo feminino, com
os seguintes nomes fictícios em prol do sigilo ético de divulgação dos
dados: Ana, Lívia, Andrea, Cátia, Denise, Érica e Marina. E um do sexo
SUMÁRIO masculino denominado Marcelo. Possuem entre 28 e 53 anos de ida
de, e atuam na profissão de 5 a 20 anos.

Dentre os participantes, duas são pedagogas da Educação In


fantil (EI) na rede municipal de ensino, três do Ensino Fundamental I,
Anos iniciais (EFI) - sendo dois da rede municipal e um da estadual, e
três atuantes no Ensino Fundamental II, Anos finais da rede estadual,
sendo que elas também atendem ao Ensino Médio (EFII-EM). Em rela
ção ao nível de formação dos profissionais, todos possuem especia
lização, e aqueles que atuam no EFII-EM possuem duas graduações.

7272
Por meio das questões, foi possível verificar que, mesmo atuando
em diferentes níveis de ensino, os professores possuem percepções,
sentimentos e compreensões semelhantes sobre o seu papel na relação
pedagógica e os impactos nessa relação, causados pelas novas organi
zações e regras de distanciamento devido à pandemia de COVID-19. A
análise de dados foi baseada na análise de conteúdo de Bardin (2011),
utilizando a análise qualitativa do tipo classificatória das respostas de
perguntas abertas do questionário, viabilizando o cruzamento de ele
mentos como a percepção e relação psicológica e emocional dos parti
cipantes com as condições de trabalho em que se encontram.

Para tanto, a análise passou por três fases, compreendidas pela


autora como pertinentes para alcançar resultados adequadamente in
terpretados a partir das hipóteses e objetivos de pesquisa idealizados
pelas investigadoras: (1) a pré-análise, contemplando a organização
do material coletado e primeiro contato com as informações; (2) a
exploração do material, caracterizada como “longa e fastidiosa” por
demandar aprofundamento no material coletado; (3) o tratamento dos
resultados, a inferência e a interpretação, dando formato ao desfecho
da análise (BARDIN, 2011). A categorização dos dados coletados par
tiu das questões, que estão organizadas aqui nos seguintes subtítulos.

SUMÁRIO
OS PRINCIPAIS IMPACTOS DO PERÍODO
DE PANDEMIA NOS PROCESSOS
DE ENSINAR E DE APRENDER NA ESCOLA

O objetivo, com essa questão, era compreender o que os pro


fessores, dos diferentes níveis de ensino, sentiram e identificaram
como principais impactos decorrentes das adequações na educação
no período de pandemia, e seis fatores foram identificados nas res
postas, sendo alguns em comum entre os docentes. Os dados que
compõem essa categoria encontram-se disponibilizados no Gráfico 1.

7373
Gráfico 1 - Impactos da pandemia no processo de ensino aprendizagem.

Fonte: Dados organizados pelas autoras, 2021.

O fator que impactou a maioria dos professores foi a dificulda


de, “para quem sempre atuou em sala de aula com afeto e carinho”
(sic Marina, EFI), de adaptar-se à modalidade on-line de ensino. Cátia
(EI) questionou-se “E agora? Como ensinar crianças de quatro e cinco
anos através de aulas gravadas?”. Os participantes manifestaram o
despreparo, tanto dos profissionais quanto dos alunos, para utilizar as
ferramentas tecnológicas digitais, além de alguns alunos não possuí
rem fácil acesso à internet. Sugerem também que as aulas passaram
SUMÁRIO
a ser monótonas e “quase mecânicas”, tornando difícil a manutenção
de gerar interesse, motivação e atrair a atenção dos alunos. Não obs
tante, alguns docentes consideram que, em paralelo às dificuldades,
puderam se reinventar e refletir sobre as suas práticas pedagógicas,
encontrando na tecnologia ferramentas facilitadoras de aprendizagem,
que favorecem a elaboração de aulas dinâmicas e criativas.

Lívia (EFI) destacou que teve a oportunidade de se aproximar


das famílias, e identificou como sendo uma fragilidade no processo
de alguns alunos a falta de organização de uma rotina de estudos em

7474
casa, bem como a pouca autonomia desenvolvida por eles. Aspectos
estes que desencadearam o sentimento de angústia e preocupação
com a continuidade e qualidade do processo de ensino-aprendiza
gem. Dados que justificam as preocupações dos participantes da in
vestigação foram encontrados por Tavares e Lisboa (2021), na pesqui
sa que visou pensar o papel da escola pública e das professoras
e professores nos processos de formação humana de crianças, jovens
e adultos no Brasil. Dos 27 estados, praticamente todos ainda não
possuem uma política sistemática de Ensino a Distância (EAD) que ga
ranta minimamente os direitos de acesso à educação dos alunos das
redes públicas municipais e estaduais de ensino, sendo que o EAD exi
ge a conexão com internet, e mais da metade da população não possui
conexão de qualidade e permanente, comprometendo diretamente o
acesso à informação, cultura e educação (TAVARES; LISBOA, 2021).

A RELAÇÃO PEDAGÓGICA COM OS


ALUNOS NO PERÍODO DE PANDEMIA
COMPARADO AO PERÍODO PRESENCIAL

A metade dos participantes considera que nas aulas presenciais


SUMÁRIO é possível manter o contato de vínculo com os alunos, de forma mais
direta e afetiva, favorecendo trocas de experiências, comunicação, so
cialização e mediação nas relações humanas enquanto via on-line. Al
guns consideram que o vínculo se manteve com o auxílio do incentivo
dos pais para realizar as atividades. Duas das professoras do Ensino
Fundamental II e Ensino Médio corroboraram em suas respostas ao
descrever que os conteúdos mais complexos e abstratos eram mais
difíceis de serem aprendidos nas aulas remotas, portanto os selecio
naram para serem aplicados apenas quando as aulas voltassem ao

7575
presencial, para garantir a aprendizagem. Os dados que compõem
essa categoria encontram-se disponibilizados no Gráfico 2.

Gráfico 2 - Relação pedagógica entre aluno e professor.

Fonte: Dados organizados pelas autoras, 2021.

Afirma-se, portanto, que os professores identificam que as re


lações pedagógicas, durante a pandemia, não se mantiveram com
a qualidade que possuíam no ensino presencial, influenciando nas
relações interpessoais e, consequentemente, no processo de ensi
no-aprendizagem. Na perspectiva sociointeracionista de Vygotsky
SUMÁRIO
(1984), a criança possui dois níveis de desenvolvimento e aprendi
zagem: o real e o potencial ou proximal. Para chegar ao nível real, no
qual a criança já apresenta autonomia em determinada habilidade
ou tarefa, primeiro ela passará pelo nível proximal, onde, por meio
da interação com outras pessoas, desenvolverá a aprendizagem. O
autor nomeia como “conceitos cotidianos” aquelas aprendizagens
via observação e manipulação da própria criança no seu dia a dia,
e “conceitos científicos” aqueles conhecimentos construídos no
contexto escolar, sendo que ambos estão diretamente relacionados
(REGO, 1995). Respaldando a percepção de Denise (EFII-EM), que

7676
relata que “os alunos com dificuldades e que mereciam mais atenção
não tiveram o êxito satisfatório na aprendizagem”, justifica-se que “a
interação aluno-professor, que ocorre no presencial, facilita muito o
entendimento dos conceitos mais complexos”.

Nas respostas referentes à questão dois, apareceu novamente


o fato de alguns alunos não possuírem acesso à internet, além de
alguns alunos do Marcelo (EFI) não terem condições de locomoção,
nem os contatos atualizados na escola, fazendo com que as ativida
des entregues não retornassem com a frequência esperada. Essa
realidade não é apenas a dos participantes dessa investigação, está
presente no contexto nacional de educação.

Em junho de 2020, a Undime publicou o relatório do “mapea


mento da oferta de atividades educacionais não presenciais nos
municípios durante a pandemia”. A coleta de dados da instituição
ocorreu por meio de um questionário no ambiente virtual, que ficou
disponível pelo período de uma semana para ser respondido pelas
redes de ensino públicas do Brasil. Neste estudo, apresentaram que
79% dos alunos das redes públicas do Brasil têm acesso à internet,
mas 46% acessam apenas por celular, e, a partir disso, 60% das re
des municipais adotam o ensino remoto, no entanto a maioria utiliza
materiais impressos como parte das estratégias (DESAFIOS DAS SE
SUMÁRIO CRETARIAS MUNICIPAIS DE EDUCAÇÃO, 2020).

Outro fator que esteve presente de forma repetida entre as res


postas das questões um e dois, é a participação e mediação da família
no processo de ensino-aprendizagem no contexto domiciliar, incluindo
o pouco envolvimento das famílias, dificuldade na organização de uma
rotina de estudos e na mediação das atividades propostas, sendo algo
descrito por Marina (EFI), que, nas devolutivas das atividades, mui
tas vezes não soube quem ou como foram conduzidas, e alega que
nem todas as famílias estavam envolvidas. As situações destacadas
pelos participantes podem ser melhor compreendidas a partir da con

7777
cepção Bioecológica do desenvolvimento de Bronfenbrenner (1996),
contribuindo para uma percepção mais contextualizada do aluno, con
siderando que a família e a escola são microssistemas nos quais ele
interage, e só será possível conhecê-lo integralmente se o professor
estiver atento ao seu mundo social, histórico, temporal e ambiental. A
partir desse reconhecimento, laços entre os sistemas serão gerados
de forma que favoreça os processos de ensino-aprendizagem (BRON
FENBRENNER, 2011; SANTOS, 2019).

Dados semelhantes foram publicados em janeiro de 2021 pela


UNICEF, no “Relatório de enfrentamento da cultura do fracasso esco
lar”, com o objetivo de, neste ano em específico, relacionar a temática
com a realidade das escolas públicas durante a pandemia pela CO
VID-19. Indicando, assim, que os estudantes e suas famílias tiveram
grandes dificuldades na realização das atividades remotas, corrobo
rando com o relato do participante da nossa pesquisa (ENFRENTA
MENTO DA CULTURA DO FRACASSO ESCOLAR, 2021).

COMPROMETIMENTO NO VÍNCULO
COM OS ALUNOS MOTIVADO PELO
DISTANCIAMENTO DURANTE A PANDEMIA,
SUMÁRIO E AS ESTRATÉGIAS DOS DOCENTES
PARA MANTER A RELAÇÃO COM ELES.

A maioria dos participantes compreendeu que o vínculo com os


alunos, de alguma forma, ficou comprometido, totalizando sete dos oito
profissionais. Estes relataram comprometimento ou descreveram algum
impacto negativo no âmbito da aprendizagem e quanto ao emocional.
E apenas Denise não se preocupou com este aspecto, pois considera
que “o vínculo é refeito a cada momento, e, assim que houve o retorno

7878
gradual das atividades presenciais, este vínculo surge naturalmente, no
vamente”. Dados a respeito aparecem ilustrados abaixo, no Gráfico 3.

Gráfico 3 - Vínculo com os alunos durante a pandemia

Fonte: Dados organizados pelas autoras, 2021.

No âmbito emocional, Marcelo relatou que “A sensação de


medo, em virtude da contaminação, fez com que nos afastássemos,
mas os alunos sentem saudades de seus professores e amigos de es
cola. Respeitamos as regras sanitárias”. No primeiro informe, “Retratos
SUMÁRIO da Educação no Contexto da Pandemia do Coronavírus – Perspectivas
em Diálogo”, no qual a Undime e o Consed, em parceria com CIEB,
Itaú Social, UNICEF, Fundação Lemann e CONVIVA, consolidou 5 es
tudos realizados entre março e maio de 2020, apresentando dados
correspondentes sobre a percepção dos alunos sobre os próprios sen
timentos durante a pandemia: dentre alguns sentimentos citados no
estudo, os alunos relatam estar mais entediados do que estimulados,
mais ansiosos do que calmos, mais sobrecarregados do que tranqui
los, mais tristes do que felizes, além de mais solitários, assustados,
depressivos e frustrados (RETRATOS DA EDUCAÇÃO, 2020).

7979
Érica (EFII-EM) abordou um aspecto bastante relevante para o
estudo, descreveu que manteve contato virtual “quase que diariamen
te, mas muitos infelizmente se distanciaram a ponto de reprovarem ou
desistirem de estudar e optarem apenas por trabalhar”. Demonstrando
a importância da relação professor x aluno para sustentar a motivação
de aprender e permanecer na escola. Para Meirieu (1998, p. 86): “O
que mobiliza um aluno, o que o introduz em uma aprendizagem, o que
lhe permite assumir as dificuldades da mesma, ou até mesmo as pro
vas, é o desejo de saber e a vontade de conhecer. Sem esse desejo,
só a mecânica pode responder”.

De acordo com as pesquisas publicadas em “Retratos da Edu


cação (2020)”, um a cada quatro jovens do ensino médio já pensou
em não retomar as aulas presenciais, sendo uma proporção maior de
escolas públicas em comparação com privadas, dados que corrobo
ram com as pesquisas da publicação “Enfrentamento da Cultura do
Fracasso Escolar” (2021, p. 18), que apresentam a informação de que
48% dos alunos do Ensino Médio e 46% do Ensino Fundamental estão
menos envolvidos e interessados nas aulas, e “2.115.872 crianças e
adolescentes foram reprovadas(os) nas escolas públicas municipais
e estaduais e 623.187 abandonaram a escola durante a pandemia”.

Referente às estratégias utilizadas pelos docentes para manter


SUMÁRIO relação com seus alunos, a maioria citou o uso de redes sociais,
a
possibilitando a aproximação por meio de ferramentas como vídeos
e mensagens de voz. Em pesquisas do Instituto Península, que con
templaram a publicação “Retratos da Educação no Contexto de Pan
demia do Coronavírus”, houve maior incidência de manter o contato
com os alunos na rede privada (sendo 88% das participantes), mas
com pequena diferença da rede estadual (85%), possuindo números
menores (76%) na rede municipal, pois a maioria do seu público é
de Educação Infantil, com o qual os professores mantiveram contato

8080
mais direto com os pais/responsáveis das crianças. Ana (EFII-EM)
utilizou de uma estratégia bastante pertinente, pois buscou “por meio
de aplicativos de redes sociais como: WhatsApp e TikTok interagir
de forma não só pedagógica, mas também dinâmica com os meus
alunos”, para, desta forma, se aproximar da realidade deles e “manter
uma relação pedagógica mais amigável”.

Andrea relatou a importante atuação dos profissionais assis


tentes sociais e psicólogos, que, por meio do “Projeto Busca Ativa”,
visitaram as famílias dos alunos que não estavam fazendo as ativida
des, de modo a incentivar seus filhos a continuarem seus estudos,
mesmo durante a pandemia. Com este trabalho, foi possível reconhe
cer o contexto social do aluno e alcançar, como resultado, um núme
ro considerável de alunos que voltaram a participar das atividades
realizadas pela escola.

APRENDIZADOS NO PERÍODO
DE PANDEMIA COM A ADOÇÃO
DE OUTRAS FORMAS DE ENSINAR
DEVIDO AO DISTANCIAMENTO SOCIAL.
SUMÁRIO
A questão que possui maior variabilidade de respostas é em
relação às aprendizagens que os participantes da investigação consi
deram ter adquirido no decorrer do período de pandemia. Todos con
sideram que aprenderam algo, no entanto é uma questão que não
depende apenas do fator “pandemia”, mas que, somado às vivências
anteriores deles, gerou novas aprendizagens. Os dados que compõem
essa categoria encontram-se disponibilizados no Gráfico 4.

8181
Gráfico 4 - Aprendizagens dos participantes no período de pandemia

Fonte: Dados organizados pelas autoras, 2021.

Ana, Andrea e Cátia destacaram que o momento de pandemia


SUMÁRIO lhes permitiu se reinventarem como docentes, com práticas pedagó
gicas mais criativas, e que trabalham mais a autonomia dos alunos.
Para Érica: “O mundo virtual em sala de aula foi aprendizado, já que
muitos de nós professores usamos apenas livros, giz e quadro; o
uso da plataforma deixou as aulas mais interessantes, pois hoje a
hiperconectividade faz parte do mundo dos jovens o tempo inteiro”. A
cultura docente constantemente passa por exigências de mudanças
e inovação, atravessando períodos marcantes de conflito originados
por duas forças, uma é a força da pressão sobre si, das exigências
de mudanças de uma sociedade em rápida transformação e cada

8282
vez mais complexa, e a outra é a inércia e rigidez do sistema educati
vo, que permanece burocrático e inflexível. As mudanças não podem
partir da iniciativa isolada dos professores, é necessário desenvolver
culturas colaborativas nas escolas (MORGADO, 2005).

Cátia relatou que observa que alguns pais passaram a valorizar a


importância do professor no processo de ensino-aprendizagem, e Mar
celo menciona que “houve aprendizado, mas foi desagradável”. Esse
olhar para o professor, durante o período de pandemia, é essencial e
pouco comum. Buchweitz (2021), em sua pesquisa intitulada “Um olhar
para o professor no processo de ensino e aprendizagem remoto”, visou
analisar o processo de ensino-aprendizagem durante a pandemia, mas
sob a perspectiva do professor, que, assim como todas as pessoas,
passou por conflitos cotidianos, oriundos da nova realidade social. Fren
te aos resultados obtidos via questionário on-line para professores de
três estados do Sul do Brasil, chamam a atenção das instituições de
ensino as mudanças nas políticas de trabalho, com o intuito de minimi
zar a sobrecarga, dar voz e melhores condições de atuação, e mudar
a concepção de “uma obrigação por parte do professor em virtude de
estar recebendo salário remete a um pensamento que pretende diminuir
a dimensão do que se está vivendo” (BUCHWEITZ, 2021, p. 19).

Outro relato que corrobora com a discussão é o da Ana: “Para


SUMÁRIO
mim, este período foi de grande aprendizado, tanto num sentido de
autoconhecimento e reflexão, como também de novas práticas e me
todologias de ensino”. Destacamos aqui as aprendizagens para a vida
pessoal, é possível dialogarmos com as questões abordadas pela au
tora do estudo supracitado, e compreendermos que o professor pas
sou pelas angústias, depressões e anseios causados pela pandemia,
tanto quanto seus alunos e os familiares deles.

Além de um olhar acolhedor e sensível para o professor, é neces


sário que este seja direcionado também para o outro lado da tela do
computador ou celular. Em sua resposta, Marina descreve que aprendeu

8383
a direcionar o seu olhar para a realidade do aluno e sua família. Gomes
(2021) realizou uma pesquisa para refletir sobre as impressões quanto
ao ensinar e ao aprender em pandemia, sob a percepção de professo
res, pais e alunos de escolas privadas do Rio de Janeiro. Verificou que
os três papéis realizaram esforços para criar um ambiente de aprendiza
gem “minimamente funcional e, sobretudo, acolhedor”, transformando
essa experiência em uma “nova postura diante do processo de ensi
no-aprendizagem como um todo, e descobriram novas possibilidades
para ensinarem e aprenderem”, pois, assim como ensinar remotamente
não é uma tarefa fácil, aprender também não é. Certos dados se apro
ximam das percepções de Lívia e Denise, que relatam que, assim como
elas passaram a ensinar de uma forma à qual não foram formadas para,
os alunos precisaram se adaptar a uma nova forma de aprender.

CONSIDERAÇÕES FINAIS

Dialogando com as demais investigações e autores sobre o con


texto atual da educação, especificamente das condições de trabalho
dos professores, identifica-se um cenário de inovação e desafios para
encontrar práticas pedagógicas que possam, minimamente, garantir o
SUMÁRIO direito de acesso à educação e cultura das crianças e estudantes, e sus
tentar a relação professor/aluno. Cenário este composto também pelas
angústias e incertezas geradas pela pandemia de COVID-19, presente
no sentir dos alunos e seus familiares, mas também no cotidiano dos
professores, e que permeiam o âmbito da vida pessoal e ocupacional.

Unindo a percepção de 8 docentes, de diferentes níveis de en


sino, de uma cidade serrana catarinense, sobre a relação pedagógica
durante o período de pandemia, foi possível responder às problemati
zações iniciais que direcionaram essa investigação. Analisando quais
movimentos e aprendizados foram necessários para dar sequência

8484
nos processos de ensino-aprendizagem frente às novas demandas
educacionais, dentre elas: a adaptação às aulas remotas, com distan
ciamento físico e uso de ferramentas tecnológicas; seguir motivados
e motivando os alunos; acessar os alunos que não possuíam acesso
à internet; olhar e envolver as famílias na aprendizagem, garantindo
condições de qualidade no contexto domiciliar; e minimizar o impacto
de relações pedagógicas não presenciais.

O impacto nas relações pedagógicas abrangeu todos os envol


vidos, no entanto, de diferentes formas e intensidades. Certamente, as
ferramentas tecnológicas viabilizaram a continuidade nas aulas, muitas
vezes em formatos mais dinâmicos e criativos, mesmo que on-line,
e as redes sociais, bem como o WhatsApp, possibilitaram manter o
contato entre os professores e os alunos ou seus responsáveis. Ainda
assim, o ambiente “escola” e o sujeito “professor” possuem papéis
insubstituíveis no processo de aprendizagem dos conhecimentos cien
tíficos e acadêmicos, papel hoje reconhecido pelos demais integrantes
da comunidade escolar.

Neste formato remoto, o professor se disponibilizou a “entrar


na casa do seu aluno”, olhar para a realidade social, e então reco
nhecê-lo, compreendendo as suas necessidades e especificidades de
aprendizagem e desenvolvimento. As perspectivas sociointeracionis
SUMÁRIO tas e bioecológicas de aprendizagem e desenvolvimento que susten
tam a discussão proposta, aqui, nos indicam um caminho de sucesso
nesses processos, quando possibilitamos a união entre o ambiente es
colar e o reconhecimento do contexto e história de vida reais do aluno.

Mesmo que ocorridas de forma não tão agradável, as aprendi


zagens supracitadas foram evidentemente fundamentais para que os
participantes da pesquisa e demais profissionais da educação con
seguissem minimamente alcançar os seus alunos. O que não elimina
o impacto negativo que averiguamos nas relações interpessoais, na
aproximação e vínculo entre professores e alunos, que são fundamen

8585
tais para que o conhecimento faça sentido para quem o media e para
quem o está construindo, chegando a números elevados de desmoti
vação, falta de interesse, repetências e evasão escolar.

Posto isso, alguns questionamentos em relação ao processo


de ensino-aprendizagem, durante e pós-pandemia, sugerem possibi
lidades futuras de investigação, como: quais serão as consequências
do processo do ensino-aprendizagem remoto, nas aulas presenciais,
quando forem retomadas? De que forma as mudanças, de toda natu
reza, vivenciadas neste tempo de pandemia, serão implementadas no
ensinar e no aprender? A relação pedagógica, que vinha desgastada,
com posicionamentos duvidosos e práticas distantes da realidade e
história de vida dos alunos, será de fato valorizada e ressignificada?
O resgate da importância do papel do profissional da educação será
sustentado e refletirá na melhora de condições de trabalho?

Toda experiência de aprendizagem se inicia com uma experiên


cia afetiva. É a fome que põe em funcionamento o aparelho pen
sador. Fome é afeto. O pensamento nasce do afeto, nasce da
fome. Não confundir afeto com beijinhos e carinhos. Afeto, do
latim “affetare”, quer dizer “ir atrás”. É o movimento da alma na
busca do objeto de sua fome. É o Eros platônico, a fome que faz
a alma voar em busca do fruto sonhado (Alves, 2002).

SUMÁRIO
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Paulo, 29 out. 2002. Colunistas, pp. 1-2. Disponível em: https://www1.folha.
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SUMÁRIO

8888
as
Capítulo 4

Em tempos de confinamento,
os desafios em lidar com
competências socioemocionais nos
cursos de educação profissional

Simone Balsamo
4
Simone Balsamo

Em tempos de confinamento,
os desafios em lidar com as
competências socioemocionais nos
cursos de educação profissional
DOI: 10.31560/pimentacultural/2021.107.89-108
Em meados de março de 2020, iniciou-se um cenário de pan
demia de Covid-195, onde, repentinamente, o mundo teve que se “re
inventar” e se adaptar conforme as medidas sanitárias de proteção
básica, sob recomendação da OMS6. Uma das prevenções a esta
doença foi o distanciamento social, no qual as pessoas não deveriam
se aglomerar, em especial em ambientes fechados, sendo este um
dos motivos para as escolas trabalharem com aulas remotas (on-line).
Diante desta situação atípica, as escolas, os docentes, os alunos e a
comunidade, em geral, tiveram que se adaptar às estratégias educa
cionais impulsionadas pela tecnologia.

O desenvolvimento das práticas pedagógicas dos docentes da


educação profissional de nível técnico estava diante do desafio de utili
zar as ferramentas digitais para viabilizar o desenvolvimento da prática
docente, forçando a educação, em específico neste segmento, a se
“reinventar”, principalmente considerando-se os cursos desta modali
dade. Para isto, os docentes estruturaram as aulas virtuais nos cursos
para a formação profissional, o que requer uma prática pedagógica
com ênfase na interação com seus alunos, relacionando a teoria e a
demonstração prática à distância full time.
Um grande desafio foi desenvolver competências socioemo
cionais nos cursos de educação profissional, durante a pandemia de
SUMÁRIO
Covid-19, que, por ser altamente contagiosa, obrigou as pessoas ao
confinamento em suas casas, impossibilitando o acesso às escolas,
e, consequentemente, não sendo possível a interação presencial para
o convívio social, uma das propostas de trabalhar as competências.

5
A Covid-19 é uma infecção respiratória aguda causada pelo coronavírus, SARS-CoV-2, po
tencialmente grave, de elevada transmissibilidade e de distribuição global. Disponível em: <
https://www.gov.br/saude/pt-br/coronavirus/o-que-e-o-coronavirus>. Acesso em: jul. 2021.
6 OMS: Organización Mundial de La Salud. Disponível em: <https://www.who.int/es/emer
gencies/diseases/novel-coronavirus-2019/advice-for-public>. Acesso em: jul. 2020.

9090
De acordo com o sociólogo e filósofo Edgar Morin, em entrevista
cedida ao Le Monde, em abril de 2020:
Vivemos numa sociedade na qual as estruturas tradicionais de
solidariedade se degradaram. Um dos maiores problemas é
restaurar as solidariedades entre vizinhos, entre trabalhadores,
entre cidadãos... Com as restrições que sofremos agora, as so
lidariedades vão ser reforçadas, por exemplo, entre os pais e os
filhos que não estão indo às escolas. As possibilidades de con
sumo vão ser reduzidas e podemos aproveitar a oportunidade
para repensar o consumo desenfreado ou, melhor dizendo, a
dependência, o “consumo drogado”, essa intoxicação concer
nente a produtos sem utilidade real e substituir a quantidade
pela qualidade (MORIN, 2020).

Para uma prática pedagógica eficiente e eficaz, o docente, além


de possuir o domínio do conteúdo, deve criar um vínculo afetivo, mo
tivando e estimulando os alunos a aprenderem melhor, independen
temente de técnicas. Um dos desafios de conquistar a atenção dos
alunos pelas aulas remotas (on-line) é vencer a “quebra do vínculo
afetivo”, pois, os docentes, não estando presencialmente, ficam im
pelidos de sentir e ver as expressões dos alunos, o que limita muito
o uso das ferramentas digitais, muitas vezes sendo totalmente im
perceptíveis. Por característica do perfil de formação, os docentes da
educação profissional de nível técnico possuem, em sua maioria, uma
SUMÁRIO formação restrita à técnica, porém, os desafios destes docentes da
educação profissional de nível técnico vão além, dado que devem lidar
com a prática pedagógica, onde, frequentemente, as dificuldades são
mais complexas, pois lidam com aspectos de ordem pedagógica e a
utilização dos meios digitais para promover o desenvolvimento teórico
e prático dos cursos de educação profissional.
No cotidiano escolar, presencial ou virtual, outro desafio cons
tante, tanto para os docentes como para a gestão escolar e a comu
nidade, é a violência, que, no âmbito escolar, toma proporções exa
cerbadas, seja pelo choque de culturas, nível socioeconômico, entre

9191
outros fatores geradores de conflito. O isolamento social promoveu um
aumento considerável desta violência, por não permitir interação social
e potencializar questões particulares.

A interação é muito importante para criar um vínculo afetivo no


processo de ensino e aprendizagem, e, com as aulas remotas, fica
mais difícil estabelecer esses laços. Vygotsky (2001, p. 63) afirma: “o
comportamento do homem é formado por peculiaridades e condições
biológicas e sociais do seu crescimento”.

Devido ao aumento de casos de violência escolar, distúrbios psi


cossociais, bullying, depressão, automutilação, desafios atuais intensi
ficados pelo mundo moderno, onde os pais ou responsáveis, quando
existem, estão no trabalho ou em busca dele, dado o número de de
sempregados que se elevou com a pandemia.

As interações sociais, que devem ocorrer naturalmente desde


o início da vida, quando suprimidas das relações humanas, podem
desencadear dificuldades de competência social que impactam nas
relações interpessoais, afetando a qualidade de vida, o desenvolvi
mento social e a saúde emocional.

De acordo com Del Prette et al. (2011, p. 19), “as habilidades


sociais, os avanços no desenvolvimento de procedimentos e estraté
SUMÁRIO
gias permitiram estruturar programas de Treinamento de Habilidades
Sociais (THS)”.
Esses programas se baseiam em dois constructos-chave, per
mitindo afirmar que:

• as habilidades sociais são classes de comportamentos so


ciais que somente podem ser classificadas como tais na medi
da em que contribuem para a competência social;

• a competência social é um atributo avaliativo de um comporta


mento ou episódio de comportamentos bem-sucedidos no am

9292
biente social, conforme critérios de funcionalidade que incluem
(Del Prette & Del Prette, 2001):

- consecução do objetivo, em termos de consequências espe


cíficas obtidas na interação social;

- manutenção ou melhora da autoestima dos envolvidos;

- manutenção ou melhora da qualidade da relação;

- maior equilíbrio de ganhos e perdas entre os participantes da


interação; respeito e ampliação dos Direitos Humanos básicos
(DEL PRETTE et al., 2011, p. 20).

Sanchis e Mahfoud (2007) retratam o conceito de interação e


construção, com base na epistemologia.
Piaget opôs-se ao mesmo tempo ao apriorismo, que considera
o processo de conhecimento como fruto de uma estrutura pron
ta do sujeito; e ao empirismo, que parte do princípio que o co
nhecimento provém exclusivamente do que é externo ao sujeito.
No primeiro caso, o sujeito já nasce “pronto”; enquanto que no
segundo, o sujeito é dissolvido, se transforma no próprio objeto,
por adquirir como conhecimento uma cópia do real (SANCHIS;
MAHFOUD, 2007, v. 12, p. 165).

Os autores citados trazem, em suas pesquisas e experiências


sobre comportamento social, habilidades cognitivas, teorias sociointe
SUMÁRIO racionistas, e teorias do comportamento humano, auxiliam e consolidam
práticas oriundas desses estudos aplicáveis ao contexto contemporâ
neo, em especial ao que se relaciona com a abordagem deste estudo.

Para tratar a questão de violência escolar, é necessário verificar


os distúrbios psicossociais, bullying, depressão, automutilação, desafios
atuais, intensificados pelo mundo moderno, onde os pais estão no traba
lho, enquanto que a formação dos jovens e a tecnologia da informação
contribuem para as dificuldades no processo de ensino e aprendizagem.

9393
Diante de várias interpretações, Neves e Damiani (2006, p. 8)
afirmam que, para Vygotsky (1982), o sujeito é ativo, ele age sobre o
meio. Para ele, não há a “natureza humana”, mas a “essência huma
na”. Somos os “primeiros sociais”, e depois nos individualizamos. Em
característica e aspectos moldados pelas experiências sociais experi
mentadas durante a jornada do desenvolvimento humano, com suas
individualidades e particularidades, bem como com as características
pessoais e de valor do indivíduo.

A pesquisa não somente reconstrói o conhecimento sobre o uni


verso de interação docente, como também arquiteta sua autonomia no
sentido da cidadania ativa cientificamente fundamentada.

Além dos distúrbios já descritos, com a pandemia, relatos e


agravamento do quadro biopsicossocial: cyberbullying, bullying, ansie
dade, stress, automutilação, depressão, irritabilidade, pânico, tentativa
de suicídio, entre outros chamaram a atenção para uma sondagem
sistematizada e descrita no decorrer deste capítulo.

O profissional, denominado de orientador educacional, tem a


formação superior em pedagogia, e uma de suas funções é realizar o
acompanhamento da situação escolar dos estudantes, tanto a frequên
cia como o aproveitamento médio, e, de acordo com as considerações
SUMÁRIO publicadas por Pascoal (2013)7 no Portal Nova Escola, evidencia-se que:
Por tratar diretamente das relações humanas, o orientador edu
cacional pode ter suas funções confundidas com as de um
psicólogo. Essa confusão, no entanto, deve ser evitada, por
que, embora também lide com problemas de convivência e
com dificuldades de aprendizagem das crianças, a função do
orientador se aproxima mais do aspecto pedagógico e não da
dimensão terapêutica do atendimento (PASCOAL, 2013).

7 Revista Nova Escola, 1 out. 2013. Disponível em: https://gestaoescolar.org.br/conteu


do/233/o-papel-do-orientador-educacional. Acesso em: jul. 2021.

9494
Com o surgimento de relatos de muitas questões comporta
mentais, o Serviço Nacional de Aprendizagem Industrial (SENAI),
através da figura e orientação pedagógica do orientador educacional,
viu a necessidade de criar um projeto para lidar e conduzir as mais
adversas situações de violência e transtornos emocionais no âmbito
escolar, em especial aqueles decorrentes ou agravados por “trans
tornos emocionais”. Assim, o “Programa Dimensão 360” foi instituído
pela Gerência de Educação do SENAI, constituído por uma rede de
apoio para o enfrentamento de ocorrências dessa natureza nas uni
dades escolares. A dificuldade em compreender que as diversidades
enriquecem e promovem experiências nos aspectos socioemocio
nais, como resultado de não entender as diferenças entre as pes
soas, se observa nos atos de violência dirigidos a si ou aos outros,
como uso de substâncias psicoativas, suicídio, bullying, e, em casos
extremos, a chacina ocorrida no município de Suzano-SP, ocorrida
em 13 de março de 2019, na Escola Estadual Professor Raul Brasil.

Além das consequências individuais e sociais de ordem violenta,


esses comportamentos contribuem para o aumento da evasão, uma
vez que a inabilidade em lidar com suas caraterísticas podem impactar
os estudantes quanto às suas atitudes.

O fenômeno da violência no cotidiano escolar sempre existiu,


SUMÁRIO porém, com o passar do tempo, foi se agravando em decorrência dos
fatores que envolvem a modernidade, o avanço das tecnologias, e o
próprio crescimento populacional. Um dos desafios encontrados pelos
professores e alunos são as relações interpessoais, ou seja, saber lidar
com as diferenças de cada um.

Com a pandemia, a preocupação com a violência nas escolas


aumentou, e se tornou inquestionável a ideia de que as origens do fe
nômeno não estão apenas do lado de fora da instituição. A ideia de que
todos os problemas seriam oriundos de uma realidade social extramu

9595
ros é algo, em certa medida, reconfortante para alguns, porque dilui
responsabilidades, e evidencia que somos impotentes diante dos fatos.

No mundo, as fronteiras não mais protegem, os problemas


existem no interior das pessoas, que os carregam consigo, onde quer
que estejam.

As relações humanas são tudo. Ou nada. Entre tais extremos,


existimos todos nós. Não é um “remédio miraculoso”, mas não pode
ser um “placebo”, e, para isto, o Programa envolve as Analistas de
Qualidade de Vida, profissionais com a formação em Psicologia, As
sistência Social, ou Pedagogia, que tratam das diversas situações com
violência no cotidiano escolar.

O foco do programa são as relações humanas, e um alerta:

• Resistir à tentação de medicar a educação, como uma tendên


cia a reduzir todos os problemas de uma pessoa a um diagnós
tico e a um medicamento.
Há situações médicas, mas a imensa maioria é resolvida com
diálogos, não com pílulas.

Os docentes dos cursos de educação profissional estão se ade


quando à utilização da tecnologia digital para levar o conhecimento
SUMÁRIO
técnico, tanto teórico quanto prático, as complexidades aumentam
consideravelmente. Diante desses relatos e experiências vividas para
o momento atual, e em um cenário de pandemia, Balsamo (2020) faz
a seguinte afirmação:
O desabafo de um docente diante desta situação: “Realmente
a cada aula é um desafio [...] mas aula remota é muito diferen
te, tem suas particularidades [...] o que me motiva a cada dia
é quando termino a aula e um aluno escreve: ‘Pro, me senti
como se estivesse na sala de aula, aprendi bastante, obrigada’.
Ou quando um aluno do curso de aprendizagem industrial me
agradece pela aula “leve” que teve... Estes dias, um aluno me

9696
mandou, depois da aula, um vídeo tocando violino. [...] Essas
demonstrações de carinho por parte dos alunos fazem a dife
rença neste momento tão difícil”8 (BALSAMO, 2020, p. 135).

Mesmo com toda situação atípica, os docentes buscaram cons


tantemente a melhoria das suas práticas pedagógicas, com aulas re
motas, estimulando e interagindo com os alunos, arquitetando estra
tégias às dificuldades no processo de ensino e aprendizagem virtual.

Libâneo (2011) menciona sobre o professor que procura o cami


nho para chegar ao conhecimento do aluno:
[...] numa formulação sintética, a boa didática significa um tipo
de trabalho na sala de aula em que o professor atua como me
diador da relação cognitiva do aluno com a matéria. Há uma
condução eficaz na aula quando o professor assegura, pelo seu
trabalho, o encontro bem sucedido entre o aluno e a matéria de
estudo. Em outras palavras, o ensino satisfatório é aquele em
que o professor põe em prática e dirige as condições e os mo
dos que asseguram um processo de conhecimento pelo aluno
(LIBÂNEO, 2011, p. 88).

É uma visão realista e uma projeção otimista, a rotina mudou,


forçando as pessoas a repensarem suas vidas, suas atitudes, e, de
repente, tudo isso foi acarretando em novas descobertas interiores,
reconstruindo comportamentos para o convívio com si próprio e os
SUMÁRIO outros, o que antes beirava o egoísmo.

Edgar Morin (2020) define a frase que resume a vinda da pan


demia, na qual as pessoas necessitam se ajustar às mudanças para
uma melhor qualidade de vida em todos os aspectos: “A mensagem do
vírus é clara. Pior para nós, se não quisermos entendê-la”.

Com essas reflexões, faremos um paralelo com o desenvolvimento


das competências socioemocionais nos cursos de educação profissional.

8
Depoimento por e-mail realizado dia 25 jun. 2020, no SENAI Mario Amato, localizado em
São Bernardo do Campo – SP.

9797
De acordo com a BNCC9 (Base Nacional Comum Curricular):
Ao adotar esse enfoque, a BNCC indica que as decisões pe
dagógicas devem estar orientadas para o desenvolvimento de
competências. Por meio da indicação clara do que os alunos
devem “saber” (considerando a constituição de conhecimentos,
habilidades, atitudes e valores) e, sobretudo, do que devem “sa
ber fazer” (considerando a mobilização desses conhecimentos,
habilidades, atitudes e valores para resolver demandas com
plexas da vida cotidiana, do pleno exercício da cidadania e do
mundo do trabalho), a explicitação das competências oferece
referências para o fortalecimento de ações (BNCC, 2020, p. 15).

Durante as aulas remotas, foram realizados dois questionários


para sondar sobre a vivência dos alunos durante o confinamento, os
alunos que participaram da amostragem fazem parte dos cursos:

• Aprendizagem industrial - mecânico de usinagem para moldes


plásticos,

• Técnico em química,

• Técnico em plásticos,

• Superior em tecnologia de polímeros.

Todos os respondentes estudam na Escola e Faculdade de tec


SUMÁRIO nologia SENAI Mario Amato, localizada em São Bernardo do Campo,
região do Grande ABC em São Paulo, unidade do Serviço Nacional de
Aprendizagem Industrial (SENAI), de natureza privada, criado confor
me Decreto-Lei n. 4.408/42, de 22 de janeiro de 1942.

Para o primeiro questionário, utilizou-se, pela plataforma for


ms, doze questões fechadas, e, para uma melhor sondagem, cinco
abertas, possibilitando um universo de respostas mais amplo, e que

9 Base Nacional Comum Curricular. Educação é a base. Disponível em: <http://basenacio


nalcomum.mec.gov.br/images/BNCC_EI_EF_110518_versaofinal_site.pdf>. Acesso em
07 fev. 2021.

9898
desse conta de particularidades desta abordagem. O questionário foi
aplicado em maio de 2020, durante a pandemia de Covid-19, onde se
obteve o número de 391 pessoas, e, em setembro do mesmo ano, uma
segunda sondagem de 154 respondentes que optaram por responder
às questões que envolviam suas possíveis “desordens emocionais”.
Estas perguntas abordam sobre como os alunos estavam referentes
às suas emoções, divididas entre: ansiedade, tristeza, medo, irritabili
dade e stress, além de “nenhuma destas opções”.

Com o objetivo de acompanhar o quadro psicossocial dos res


pondentes à Sondagem 01, totalizou-se 391alunos, onde 169, nos últi
mos três meses, sofreram ansiedade; 106 irritabilidade; 31 tiveram de
pressão; 30 pânico; 6 tentaram suicídio; 4 se automutilaram; 3 sofreram
bullying; e 188 não tiveram nenhum transtorno, lembrando que alguns
relatos envolvem um ou mais transtornos para o mesmo respondente.
Na questão perguntada sobre se houve ocorrências anteriores, 67 apon
taram que sim, e 324 não, mostrando um aumento de 302% dos casos.

Tabela 01 - Ocorrências de transtornos emocionais.

Tentativa de
Nenhum Ansiedade Irritabilidade Depressão Pânico Automutilação Bullying
Suicídio

SUMÁRIO Afirmativos 188 169 106 31 30 6 4 3


Fonte: A autora.

Em consequência do confinamento, algumas pessoas intensi


ficaram suas emoções, outras reagiram de maneira destrutiva, mas,
antes da pandemia, não estavam abaladas. A maioria dos relatos
enfatiza que os respondentes já sofriam quadro de ansiedade, mas
com a pandemia isso se acentuou ou reapareceu, causando estresse
emocional e físico, pois se encontravam preocupados com a saúde,
situação política, principalmente a financeira do país.

9999
Destes 154 respondentes, apenas nove não relataram nenhu
ma situação relacionada a “desordens emocionais”, e, curiosamente,
todos estes declarados como sexo masculino, conforme a tabela 02
apresenta abaixo:

Tabela 02: Relação gênero e “desordens emocionais”

Universo da %
Universo da Sondagem Vs. “Desordens emo % “Desordens
Sondagem 1 Sondagem 2 cionais” declaradas emocionais”
Resp. “desordens
na sondagem 2 na sondagem 2
emocionais”
Feminino 188 86 45,7 86 100%
Masculino 203 68 33,5 59 13,2%
Total 391 154 39,4 145 94%
Fonte: A autora.

RESULTADOS E DISCUSSÃO

Com estes resultados, podemos idealizar formas de trabalhar


remotamente nos cursos de educação profissional, e criar estratégias
para lidar com os desafios emergentes do confinamento das pessoas,
principalmente nas questões das competências socioemocionais.
SUMÁRIO
Em entrevista ao Le Monde, em abril de 2020, o sociólogo e fi
lósofo Edgar Morin define com clareza o confinamento proporcionado
pela pandemia:

A experiência do confinamento domiciliar duradouro imposto a


uma nação é uma experiência surpreendente. O confinamento
do gueto de Varsóvia permitia que seus habitantes lá circulas
sem. Mas o confinamento do gueto preparava a morte e nosso
confinamento é uma defesa da vida (MORIN, 2020).

Diante deste cenário, Balsamo (2020) faz a seguinte afirmação:

100100
A interação é muito importante para criar um vínculo afetivo no
processo de ensino e aprendizagem, e, com as aulas remotas,
fica mais difícil ter esses laços, porém na experiência do con
texto escolar, somada à pessoal, os docentes redefinem suas
estratégias e métodos de desenvolver a prática pedagógica
(BALSAMO, 2020, p. 131).

Um dos desafios enfrentados nas escolas é o comportamento de


alguns alunos, gerando desconforto e insatisfação, tanto nos professo
res quanto aos colegas de turma. Uma das variáveis que se verifica é a
criação, desde a infância e a adolescência, na interação com a família,
primeiramente, depois na escola e com outras crianças. Em tempos de
pandemia, em que as pessoas estão enclausuradas em suas próprias
casas, enfatizam-se os sentimentos de insegurança e medo, afetando
principalmente a aprendizagem nas aulas remotas (on-line).

Prete et al. (2011) relata que:

A aprendizagem de habilidades sociais e o aperfeiçoamen


to da competência social constituem processos que ocorrem
“naturalmente”, por meio das interações sociais cotidianas ao
longo da vida. Na infância e na adolescência, as práticas edu
cativas da família e da escola, juntamente com a experiência
de convivência com os colegas, são as principais condições
para a aquisição e o aperfeiçoamento das habilidades sociais
e da competência social. Porém, quando essas práticas são
SUMÁRIO desfavoráveis, podem surgir déficits de habilidades sociais e
problemas de competência social que impactam negativamente
as relações interpessoais e, portanto, a qualidade de vida das
pessoas (PRETE et al., 2011, p. 19).

E Martinelli et al. (2016) define, com clareza, a importância do


desenvolvimento das competências para favorecer a aprendizagem
nas escolas.

A competência envolve a compreensão e a realização eficaz de


ações necessárias para alcançar resultados externos e internos,
ou seja, a capacidade do organismo de interagir satisfatoriamen
te com o seu meio, o que favoreceria o seu desenvolvimento e
aprendizagens mais eficazes (MARTINELLI et al., 2016, p. 3).

101101
Em setembro de 2020, com a segunda sondagem sobre as
emoções dos alunos durante os últimos três meses, se destacou que
a maioria dos respondentes estava com ansiedade e, consequente
mente, estresse diante do cenário em que estão vivendo. Alguns estão
com irritabilidade, moderada tristeza e poucos têm medo.

Figura 1 – Dados sobre o estado emocional dos


alunos nos cursos de educação profissional.

Fonte: print screen do resultado do forms sobre


questionário de emoções (set. 2020).

Figura 2 – Resultados para “se você conversou


com alguém sobre seus sentimentos”.
SUMÁRIO

Fonte: print screen do resultado do forms sobre


questionário de emoções (set. 2020).

102102
Figura 3 – Resultados sobre se tiveram acompanhamento
de algum profissional nos últimos três meses.

Fonte: print screen do resultado do forms sobre


questionário de emoções (set. 2020).

Figura 4 – Resultados sobre “Você perdeu alguma


pessoa próxima durante a pandemia?”

Fonte: print screen do resultado do forms sobre


questionário de emoções (set. 2020).

No detalhamento da sondagem sobre perdas por falecimento,


a maioria relata como pessoa mais próxima do círculo social os avós,
SUMÁRIO comprovando as estatísticas da faixa etária com maior mortalidade da
doença de Covid-19.

Para a questão: Durante o período de isolamento social, houve


alguma mudança positiva em sua vida? Por exemplo: começou a fazer
exercícios físicos, teve uma maior proximidade com familiares, novo
trabalho... Conte-nos um pouco a respeito.

Algumas respostas:

“Início do curso técnico de química pelo SENAI”.

103103
“Proximidade com familiares, pois, nesse momento, pude per
ceber a importância de preservar as pessoas que gostamos e
também protegê-las”.

“Melhorei meu convívio com minha família”.


“Consegui um trabalho, o que está me motivando cada dia mais”.

“Eu voltei a dançar e comecei a pintar, não que eu faça essas


coisas bem, mas já é um meio de me conectar comigo mesma,
e fugir do mundo a minha volta”.

A maioria das respostas foi:

1. Maior aproximação com pais;

2. Retomada dos estudos;

3. Atividades físicas e musicais.

Abaixo, em entrevista ao Le Monde, em abril de 2020, o soció


logo e filósofo Edgar Morin responde ao questionamento do jornalista
Nicolas Truong.
Jornalista: “Em que medida podemos tirar proveito da crise?”

Morin: “O confinamento estimula as capacidades auto-organi


zadoras para remediar através da leitura, da música, dos filmes a per
SUMÁRIO
da de liberdade de movimento. Assim, autonomia e inventividade são
estimuladas pela crise”.

A resposta de Morin descreve o cenário em que vivemos, corro


borando com os resultados obtidos da sondagem realizada, onde se
evidenciam as pessoas reinventando suas rotinas e dinâmicas sociais,
criando estímulos para lidar com o confinamento e a crise.

104104
CONSIDERAÇÕES FINAIS

Os autores estudados neste trabalho embasam a pesquisa so


bre o comportamento social das pessoas, principalmente dos alunos,
na condição de vivenciar a pandemia gerada pelo coronavírus (SAR
S-CoV-2), responsável pela Covid-19, devendo se submeter a distan
ciamento social, confinamento em suas casas, utilização de máscara
facial, impactando em crises globais de saúde, política e financeira. Na
escola e Faculdade SENAI Mario Amato, se aplicaram questionários
para acompanhar o quadro psicossocial dos alunos e criar estratégias
para amenizar a situação de distanciamento e confinamento social,
proporcionando eventos culturais, técnicos à distância, conversas com
agentes de apoio pedagógico da escola, ou encaminhamentos a pro
fissionais significativos a cada situação.

Ainda recorrendo à entrevista de Edgar Morin (2020) ao Le Monde:


Sei que um confinamento prolongado será cada vez mais vivido
como um impedimento. Os vídeos não podem substituir perma
nentemente as idas ao cinema, os tablets não podem substituir
permanentemente as visitas ao livreiro. Skype e Zoom não per
mitem contato carnal, o tilintar do copo quando brindamos. A
comida doméstica, mesmo excelente, não suprime o desejo de
um restaurante. Os documentários não suprimem o desejo de ir
SUMÁRIO lá para ver paisagens, cidades e museus, eles não tirarão meu
desejo de reencontrar a Itália e a Espanha. A redução ao indis
pensável também dá sede de supérfluo (MORIN, 2020).

A reflexão do autor sobre o confinamento ser longo gera cada


vez mais ansiedade, porém permeia um caminho em que as pessoas
possam valorizar e transformar suas vidas, visando uma melhor qua
lidade, investindo em estudo, cultura e temas mais profundos, que fa
zem a diferença.

105105
O autor ainda conclui:
Que fique bem claro, precisamos de uma solidariedade nacio
nal que é essencial, mas se não compreendermos que é preciso
uma consciência comum do destino humano, se não ampliar
mos os laços de solidariedade, se o pensamento político não
mudar, a crise de humanidade se agravará cada vez mais. A
mensagem do vírus é clara. Pior para nós, se não quisermos
entendê-la (MORIN, 2020).

Trabalhar com “Inteligência emocional, hábitos da mente, soft


skills, competências para o século XXI… todas essas características
são sinônimos para as competências socioemocionais, conhecidas
como as habilidades” (PAR PLATAFORMA EDUCACIONAL, 2018).

Uma das soft skills importante nesse processo de ressocializar é a


colaboração, habilidade de compartilhar tarefas e problemas em grupo.

“Habilidades ligadas ao desenvolvimento do indivíduo no sentido


de formação de um cidadão integral, preparado para agir de forma res
ponsável e ativa, e, assim, alcançar o sucesso em todas as áreas de sua
vida - pessoal e profissional” (PAR PLATAFORMA EDUCACIONAL, 2018).

Com o cenário de pandemia e outras situações adversas que


surgirão, torna-se clara a necessidade de desenvolver as competências
SUMÁRIO socioemocionais nas escolas. O recorte foi numa escola de educação
profissional, porém deve contemplar todas as escolas formais e não for
mais para colaborar com o sucesso profissional e pessoal dos alunos.

De acordo com a LDB10, artigo 35-A § 7º: “Os currículos do ensino


médio deverão considerar a formação integral do aluno, de maneira a
adotar um trabalho voltado para a construção de seu projeto de vida e
para sua formação nos aspectos físicos, cognitivos e socioemocionais”.

10
Lei nº 9.394, de 20 de dezembro de 1996, que estabelece as diretrizes e bases da educa
ção nacional (LDB). Disponível em: < http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/L9394com
pilado.htm>. Acesso em: 1 jul. 2021.

106106
O desenvolvimento das competências socioemocionais está
definido em legislação, sendo proposta a construção de um projeto de
vida aos alunos, embasados em autoconhecimento, para identificar as
habilidades e potencialidades, favorecendo os aspectos emocionais,
e tendo uma melhoria em sua qualidade de vida.

REFERÊNCIAS
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educação profissional vivenciando o mundo virtual. CADERNOS DE EDUCA
ÇÃO (UMESP), v. 19, pp. 127-139, 2020.
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site.pdf>. Acesso em 07 fev. 2021.
BRASIL (1942). Decreto-Lei n. 4.408, de 22 de janeiro de 1942. Cria o Serviço
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www2.camara.leg.br/legin/fed/declei/1940-1949/decreto-lei-4048-22-janeiro
1942-414390-normaatualizada-pe.pdf>. Acesso em: 4 jul. 2018.
BRASIL (1942). Lei nº 9.394, de 20 de dezembro de 1996, que estabelece as
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Edgar Morin: “Essa crise nos leva a questionar nosso modo de vida, nossas
reais necessidades mascaradas nas alienações da vida cotidiana”. Carta
Maior/Le Monde. Disponível em: <https://www.cartamaior.com.br/?/Editoria/
Sociedade-e-Cultura/Edgar-Morin-Essa-crise-nos-leva-aquestionar-nosso-mo-
do-de-vida-nossas-reais-necessidades-mascaradas-nas-alienacoes-da-vida-
cotidiana-/52/47272>. Acesso em 07 fev. 2021.

LIBÂNEO, José Carlos. Didática e trabalho docente: a mediação didática do


professor nas aulas. In: LIBÂNEO, J.C.; SUANNO, M.V.; LIMONTA, S.V. (Org.).
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VIGOTSKY, L. Psicologia pedagógica. São Paulo: Martins Fontes, 2001.

108108
Capítulo 5

Os desafios causados pela


excepcionalidade da covid-19
e o clima escolar

Adriano Moro

Telma Pileggi Vinha


5
Adriano Moro
Telma Pileggi Vinha

Os desafios causados pela


excepcionalidade da Covid-19
e o clima escolar

DOI: 10.31560/pimentacultural/2021.107.109-139
INTRODUÇÃO

A pandemia causada pela COVID-19 nos impôs, a cada dia, no


vos desafios, e causou rupturas em diferentes atividades do dia a dia,
pela privação de nossa liberdade, o que traz efeitos às características
descritas por diversos autores, pela proximidade ou experiência com
uma doença grave, pelo isolamento social e pela intensificação dos
meios virtuais nas relações interpessoais (SINGH et. al., 2020).

A pandemia tem durado muito mais tempo do que prevíamos


inicialmente. Enfrentamos um problema complexo, ainda imprevisível,
e não tivemos preparo para isso. Ela chegou e mudou a vida de todos,
gerou e ainda gera inseguranças, incertezas, e, embora estejamos em
meio à campanha de vacinação da população brasileira, não temos
uma perspectiva clara de quando tudo isso vai acabar.
As pessoas tiveram que se adaptar em muito pouco tempo. Mui
tos precisaram reorganizar seus espaços e rotinas para incorporar o
trabalho e aulas remotas, outros perderam seus empregos e trabalhos,
e tiveram que reorganizar suas vidas. A ordem era nos atentarmos aos
cuidados para que pudéssemos garantir a proteção à saúde. Afas
tamo-nos dos amigos, conhecidos, colegas de trabalho, de pessoas
SUMÁRIO queridas da família. Milhares de pessoas vivem o luto pela perda de
seus entes queridos. Sem dúvida, todo esse movimento tem gerado sé
rias consequências. Diversas pesquisas (FIOCRUZ, 2020; IBGE, 2020;
RODRIGUES, 2020, FÓRUM BRASILEIRO DE SUGURANÇA PÚBLICA,
2020; FILGUEIRAS, A. STULTS-KOLEHMAINEN, M., 2020; HOLMES, E.
A. et al., 2020; ORNELL, F. et al., 2020; FUNDAÇÃO CARLOS CHAGAS,
2020; GESTRADO, 2020; INSTITUTO PENÍNSULA, 2020) têm registra
do o aumento da vulnerabilidade social, das desigualdades e perda
de rendimentos e de empregos, afetando, principalmente, parcelas
mais pobres da população. Isso tudo também impacta as relações. As

110110
pessoas têm vivido um contexto de medo e insegurança constantes, e
convivência intensa com o grupo familiar. Nesse contexto, não raro, há
dificuldades de autorregulação e de autopercepção de seus estados
emocionais. Há o aumento da irritabilidade e de episódios de conflitos,
gerando maior estresse no cotidiano.

Quanto mais tempo dura a pandemia e o isolamento social,


maior o impacto psicológico. Os casos de ansiedade, depressão, mais
do que dobraram para homens e mulheres nos últimos meses (FIL
GUEIRAS, A. STULTS-KOLEHMAINEN, 2020). As mulheres são mais
propensas a sofrer com ansiedade e depressão durante a epidemia,
principalmente as que continuam trabalhando, porque se sentem ain
da mais sobrecarregadas acumulando tarefas domésticas e cuidados
com os filhos. O custo emocional de gerir conflitos, organizar a rotina
da família, acompanhar as tarefas escolares dos filhos, atender as so
licitações e cuidar afetivamente de todos, trabalho que acaba sendo
invisível, trazem exaustão, é a fadiga pelo cuidado.

Identifica-se também o aumento das violências domésticas (física


e psicológica) e sexuais (crimes de estupro e estupro de vulnerável). O re
gistro de denúncias sobre abusos sexuais e maus-tratos, nos Conselhos
tutelares do Estado de São Paulo, triplicou (RODRIGUES, 2020). Para
muitos, o isolamento coloca em contato direto o agressor e o agredido.
SUMÁRIO
Nascimento e Maia (2021), ao realizar uma revisão da literatura
com o objetivo de avaliar o comportamento suicida durante a pande
mia de COVID-19, encontraram que a pandemia exacerbou alguns fa
tores de risco, como a presença de transtorno psiquiátrico associado,
isolamento social, desemprego, uso de álcool, violência doméstica,
estigma social, notícias negativas, doenças neurológicas, transtornos
do sono, acesso restrito a serviços de saúde e outros. As autoras aler
tam que é esperado que haja um aumento proporcional nas taxas de
comportamento suicida durante e após o cenário de COVID-19 atual.

111111
Durante a pandemia, nos sentimos mais esgotados, mais do
que de costume. O home office ou estudo remoto cansa, ainda mais
do que trabalhar na escola ou escritório. É extenuante trabalhar ou es
tudar sozinho, passar o dia todo sentado de pijama na frente da tela do
computador até bem tarde da noite. Também nos esgotamos com as di
versas lives, solicitações pelas mensagens instantâneas, informações
chegando a todo momento nas redes sociais. O prolongamento desse
período de pandemia gera exaustão física e mental, chamada de “fadiga
pandêmica”, que é quando se sente um cansaço constante, como se “a
bateria não carregasse mais”. Não nos recarregamos também pela falta
de contatos sociais, de abraços e de contato corporal com os outros.

A pandemia se arrastou, e o estado agudo de angústia deu lu


gar a um abatimento crônico, que foi denominado “definhamento” por
Grant (2021). O definhamento é um sentimento de estagnação, de va
zio, de modo que parece que a gente está se arrastando pelos dias, e
não funcionamos com plena capacidade. Não é o mal-estar, mas sim
a ausência de bem-estar, que sequer percebemos o embaçamento do
prazer ou a diminuição do impulso.

OS DESAFIOS NO CONTEXTO EDUCACIONAL


SUMÁRIO

A educação tem sido um dos campos mais sensíveis a esse


contexto, na medida em que houve a necessidade de uma ampla
adaptação rapidamente ao cenário das aulas no formato remoto e
híbrido (UNESCO, 2020; SENHORAS, 2020). Após mais de um ano,
os efeitos da pandemia na educação vêm demostrando preocupação
crescente e constante em todo o mundo, sobretudo pelas possíveis
defasagens em saberes acadêmicos que deveriam ser construídos
pelos alunos para a continuidade em suas trajetórias escolares (BUR
GESS, SIEVERTSEN, 2020).

112112
Recentemente divulgado pelo Instituto Nacional de Estudos
e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira (INEP), os resultados da
pesquisa “Resposta educacional à pandemia de COVID-19 no Brasil
(2021)” trouxeram dados sobre os impactos e as respostas educacio
nais decorrentes da pandemia. O estudo foi realizado entre fevereiro
e maio de 2021, por meio de um questionário vinculado à etapa do
Censo Escolar 2020.
Ao todo, 94% (168.739) das escolas responderam ao questio
nário. Deste total, 97,2% (134.606) e 83,2% (34.133) são escolas das
redes pública e privada, respectivamente. De acordo com os dados
analisados, 99,3% das escolas brasileiras suspenderam as ativida
des presenciais, e 90,1% não retornaram às atividades presenciais no
ano letivo de 2020. As escolas públicas sentiram uma necessidade
maior de fazer a adequação. Pouco mais de 53% delas mantiveram o
calendário. Por outro lado, cerca de 70% das escolas privadas segui
ram o cronograma previsto.

O percentual de escolas brasileiras que não retornaram às ati


vidades presenciais no ano letivo de 2020 foi de 90,1%, sendo que,
na rede federal, esse percentual foi de 98,4%, seguido pelas escolas
municipais (97,5%), estaduais (85,9%) e privadas (70,9%). E, desse
modo, mais de 98% das escolas do país adotaram estratégias não
SUMÁRIO
presenciais de ensino (INEP, 2021).

No referente às estratégias dos docentes brasileiros para dar


continuidade ao trabalho durante a suspensão das aulas presenciais,
houve: reuniões virtuais para planejamento, coordenação e monitora
mento das atividades; reorganização ou adaptação do planejamento
ou do plano de aula, com o objetivo de priorizar habilidades e conteú
dos específicos (INEP, 2021).

Na rede estadual, 79,9% das escolas treinaram os professores


para usarem métodos ou materiais dos programas de ensino não

113113
presencial, 43,4% disponibilizaram equipamentos, como computa
dor, notebooks, tablets e smartphones aos docentes, e 15,9% viabi
lizaram o acesso gratuito ou subsidiado à internet em domicílio para
seus estudantes. Por outro lado, na rede municipal, 53,7% fizeram o
treinamento, 19,7% disponibilizaram tais equipamentos e 2,2% pos
sibilitaram o acesso à internet (INEP, 2021).

Com relação à comunicação com os estudantes, os docentes


utilizaram e-mail, telefone, redes sociais e aplicativo de mensagem para
orientações e oferecimento de apoio tecnológico para o acompanhamen
to das aulas. Para o desenvolvimento das atividades de ensino-aprendi
zagem, as escolas adotaram as seguintes estratégias: disponibilizaram
materiais impressos para retirada na unidade escolar e estes também
foram dispostos na internet; atendimento virtual ou presencial escalona
do e suporte aos alunos, seus pais ou responsáveis (INEP, 2021).

No geral, gestores, professores, estudantes e seus familiares


têm sido extremamente exigidos para tentarem minimizar os efeitos ne
gativos da suspensão das aulas presenciais, em função do necessário
distanciamento social. Passados mais de 12 meses de quarentena,
e com as escolas fechadas para as aulas presenciais, alguns aspec
tos, para além das perspectivas das aprendizagens, são observados,
como: maior vulnerabilidade emocional, em razão dos diversos con
SUMÁRIO textos que se misturam, por exemplo, a estrutura doméstica, que teve
que se adaptar ao ambiente de trabalho dos pais e ambiente escolar
dos filhos, muitas vezes compartilhando os mesmos equipamentos; a
dificuldade em se promover e se reorganizar quanto à rotina domés
tica, profissional e escolar, gerando mais ansiedade pelo necessário
acompanhamento dos pais nas atividades remotas dos filhos.

Os estudantes, crianças e adolescentes perderam espaços


de lazer, e tiveram forte redução do convívio com colegas. Foram se
perdendo os “laços fracos”, isto é, a relação com pessoas que não
são amigos próximos ou pertencentes à família, são aqueles conheci

114114
dos, pessoas que são vistas com menor frequência, quase estranhos
com quem se compartilha alguma familiaridade, como, por exemplo,
os colegas na escola. Amigos mais distantes, colegas e conhecidos
casuais, podem ser tão importantes ao bem-estar como a família, par
ceiros românticos e amigos íntimos. Por meio dos laços fracos, nos
conectamos a outras realidades, oportunidades e somos expostos a
novas possibilidades de inovar, de exercitar a empatia.

Essa redução do convívio com colegas, com os pares da tur


ma escolar, pode provocar um sentimento de não pertencimento, de
afastamento de amigos, solidão, inadequação social e aumento da
“inabilidade social”. São inúmeros os efeitos psicológicos negativos
vivenciados por crianças e adolescentes, decorrentes do momento
sensível que vivemos: dificuldade de concentrar-se, irritabilidade, té
dio, perturbações no sono, transtornos de humor e ansiedade, que
pode ser manifestada de diferentes formas, tais como: choro fácil,
condutas agressivas e autolesões.

Polanczyk e colegas (2021) pesquisaram o impacto da pan


demia na saúde mental, investigando quase 7.000 estudantes, com
idade média de 10 anos, e suas famílias. Encontraram que quase 1/5
dos pais apresentaram sintomas graves ou muito graves de ansieda
de (19%), estresse (15%) e depressão (15%). Chama a atenção que
SUMÁRIO 27% das crianças apresentaram sintomas clínicos de ansiedade e
depressão, sendo 16% ansiedade, 20% quadros depressivos e 20%
ambos (ansiedade e depressão). Esses sintomas podem se mani
festar de várias formas, como, por meio de medo e ansiedade, por
exemplo, situações em que sentem que vão morrer, taquicardia e/ou
dificuldade de respirar; irritação frequente, a criança não consegue
ficar sentada, comportamentos de raiva, brigas e enfrentamentos;
apatia, indisposição, não querer brincar, entre outros. O estudo indi
ca um aumento de três vezes na gravidade dos sintomas emocionais
das crianças pertencentes às famílias de baixa renda se comparadas

115115
com as de renda mais altas. Os fatores que mais afetaram o adoeci
mento mental das crianças foram o nível de renda e a psicopatologia
dos pais. Os autores identificaram ainda que 20% das crianças dor
miam depois da 1h da manhã em dias da semana, e que, em média,
elas ficavam oito horas por dia nos aparelhos eletrônicos.

Como recomendações, destaca-se a importância de fortalecer


o atendimento médico e psicológico público, a articulação da escola
com o sistema de proteção das crianças e dos adolescentes, a orien
tação e apoio às famílias e a promoção de espaços de acolhimento,
cuidado, diálogo e participação nas escolas, além do trabalho com o
desenvolvimento socioemocional e de prevenção à saúde mental, que
serão aprofundados posteriormente.

COMO OS PROFISSIONAIS DA ESCOLA


ESTÃO LIDANDO COM A CRISE?

Alguns estudos (ABED, 2020; FUNDAÇÃO CARLOS CHAGAS,


2020; GESTRADO, 2020; INSTITUTO PENÍNSULA, 2020; NOVA ESCO
LA, 2020; PANTANO, T., ROCCA, C. C. A., 2020; INSTITUTO PENÍNSU
LA, 2020; BERTONI, E., 2020) indicam mudanças intensas nas rotinas
SUMÁRIO
dos gestores e professores, que passou a ser ocupada pelo aumento
de horas dedicadas às tarefas domésticas e aos cuidados com a famí
lia, ao trabalho relacionado à escola e também aos estudos.

A grande maioria dos docentes não tinha experiência com en


sino remoto ou híbrido, ou seja, encararam o desafio com enorme es
forço e empenho, tentando ensinar remotamente, e procurando ativa
mente manter contato com seus estudantes. É como se tivessem que
“trocar o pneu com o carro andando”.

116116
Tais estudos mostram que, em 2020, eles se sentiam ansiosos,
tristes, cansados, estressados e sobrecarregados. Não surpreende
um dado que indica que estavam mais preocupados com a saúde
de suas famílias e com o bem-estar dos alunos do que com a própria
saúde física e mental. Tudo isso preocupa, ainda mais pelo fato de que
poucos afirmam que receberam suporte emocional.

Grandisoli e colegas (2020) pontuam que a grande maioria dos


docentes tem a percepção de que os estudantes aprendem menos
via educação mediada por tecnologia. Apesar da insegurança com
relação à atuação nesse novo modelo de educação, mais tecnológico,
aparecem as sensações de desafio, aprendizado e inovação. Nesse
sentido, os professores se sentem apoiados pelos processos forma
tivos que têm recebido, e se sentem cada vez mais aptos. A maior
parte deles considera que a atuação como docente e a educação, em
sentido mais amplo, vão mudar para melhor no período pós-pandemia.

Um dos aspectos mais relevantes trazidos à tona pela pes


quisa é a resiliência, a persistência e o idealismo do educador
brasileiro, que se mostra pronto e disposto a desempenhar
seu papel com coragem e otimismo, mesmo frente a desafios,
os quais, muitas vezes, estão fora do seu controle imediato”
(GRANDISOLI ET. AL, 2020).

SUMÁRIO
O PLANEJAMENTO PARA O RETORNO
DAS AULAS PRESENCIAIS

Ao planejar o retorno às aulas presenciais, ainda que de maneira


escalonada e híbrida, é fundamental considerar que vamos nos depa
rar com alunos, professores e funcionários, além dos pais dos alunos,
vindos dessa realidade de crise, e muitos deles acometidos de senti
mentos de vulnerabilidade e frustração, além de sofrimento emocional,
como anteriormente apresentado.

117117
Alguns estudantes demonstram medo de sair de casa e voltar à
escola, algo agravado pela pandemia (“síndrome da gaiola”). Jovens co
meçaram a trabalhar ainda que informalmente para ajudar suas famílias,
e há também o receio de retornar, porque sabem que não aprenderam
e temem as avaliações e as demandas de estudos. Isso indica a impor
tância de se atuar para reconstruir o vínculo do estudante com a escola.

Será fundamental refletirmos e articularmos os planos de ações


no sentido de enfrentarmos os desafios em lidar com: as questões sa
nitárias e o receio do contágio; o cuidado e a vigilância para o devido
distanciamento; identificação dos evadidos e os procedimentos de bus
ca ativa; avaliação diagnóstica e formativa; identificar as dificuldades
individuais, implantando processos de reforço e recuperação; a reor
ganização curricular, com foco no que é essencial e o desenvolvimento
do ensino remoto e híbrido. Todavia, considerando que ainda estamos
em pandemia e que os efeitos dela perdurarão por muito tempo, é fun
damental que a preocupação central das instituições escolares seja o
cuidado com os mais vulneráveis e com o bem-estar psíquico, além da
promoção do desenvolvimento socioemocional. Vale ressaltar a impor
tância da acolhida com relação ao sentimento de insegurança e estra
nhamento à nova configuração da escola. Essas questões não podem
competir umas com as outras, devendo ser olhadas de forma integrada.
SUMÁRIO Mesmo diante desse cenário caótico, precisamos contribuir
para que os profissionais da escola, alunos e família desenvolvam fer
ramentas para elaborar e ressignificar suas vivências. Isso não acon
tecerá ignorando-se a realidade e atuando de forma semelhante ao
que fazíamos, por exemplo, nos preocupando exclusivamente com
o ensino do currículo ou com as notas das avaliações. Faz-se ne
cessário favorecer o fortalecimento dos vínculos por meio do desen
volvimento de um ambiente de apoio, na valorização e cuidado uns
dos outros. A mudança de uma cultura em direção ao cuidado não
acontecerá com ações pontuais e assistemáticas, ou seja, é preciso

118118
planejamento das relações com intencionalidade, com a criação de
espaços institucionais de diálogo e apoio que sinalizem claramente
que as pessoas, os sentimentos, o bem-estar e cuidado são valores
para a escola. É preciso, portanto, que a escola busque informações
para fazer um diagnóstico adequado, e que conheça, o quanto possí
vel, as diversas realidades vividas por seus atores, suas percepções,
seus sentimentos, de modo a investir na melhoria do clima escolar e
no acolhimento a todos de forma respeitosa, justa e generosa.

Nesse sentido, cabe aqui analisarmos como poderemos refletir


sobre o clima escolar, como têm sido desenvolvidas as pesquisas so
bre esse fenômeno e a sua importância para um retorno escolar pre
sencial de forma saudável e acolhedora de todos os atores escolares.

O FENÔMENO DO CLIMA ESCOLAR

O conceito de Clima Escolar é complexo, polissêmico, multifa


cetado, e se baseia em uma variedade de aspectos culturais, contex
tuais, perceptuais e comportamentais. Não há, na literatura nacional e
internacional, um consenso sobre o seu aporte conceitual.

SUMÁRIO Profissionais da educação e pesquisadores costumam usar


uma variedade de termos para caracterizar o clima escolar, incluin
do atmosfera, sentimentos, tom, ética, saúde ocupacional, saúde or
ganizacional, ambiente, meio, cultura e condições de aprendizagem.
Alguns se concentraram na natureza “subjetiva” do clima, em compa
ração com uma faceta “objetiva” da vida escolar, dado que as percep
ções desempenham um papel capaz de influenciar o comportamento.
Os aspectos perceptivos, subjetivos do clima escolar, normalmente
desempenham um papel mais central do que os elementos objetivos
da escola (O’BRENNAN E BRADSHAW, 2017).

119119
Nos Estados Unidos, um dos países pioneiros no desenvol
vimento das investigações sobre o clima escolar, há diferentes con
ceitos e, por vezes, complementares conceituações. Uma definição
comumente citada de clima escolar é “a qualidade e consistência das
interações interpessoais dentro da comunidade escolar que influen
ciam o desenvolvimento cognitivo, social e psicológico das crianças”
(Haynes et al., 1997, p. 322).

Há mais de uma década, o Conselho Nacional do Clima Escolar


Americano (NSCC) criou a definição agora mais amplamente usada
nos Estados Unidos: “O clima escolar é a qualidade e o caráter da
vida escolar e é baseado em padrões de experiência de vida escolar
dos alunos, pais e funcionários da escola. Reflete normas, objetivos,
valores, relações interpessoais, práticas de ensino e aprendizagem e
estruturas organizacionais” (ROSS, et al. 2020).

De acordo com os autores, a definição ampliada do NSCC reco


nhece que climas escolares equitativos (que contemple a todos) são
fundamentais para a igualdade na educação, e convida educadores
e formuladores de políticas a aprofundar a consciência de raça, et
nia, gênero, status socioeconômico e diferenças geográficas. Nesse
sentido, os autores pontuam que um clima escolar equitativo apoia o
caminho de cada aluno para uma identidade pró-social, sendo cultu
SUMÁRIO
ralmente responsivo aos padrões e ampla gama de normas, objetivos,
valores, relacionamentos interpessoais, práticas de liderança e estrutu
ras organizacionais dentro da escola e da comunidade em geral.

A vida escolar em um clima equitativo exibe uma qualidade e


caráter que promove o acesso total dos alunos, famílias e funcionários
ao seguinte: no apoio, efetivamente, as altas expectativas de ensino,
nas aprendizagens e realizações; nos ambientes de aprendizagem
saudáveis, emocional e fisicamente seguros para todos; nos relacio
namentos afetuosos, corajosos e autorreflexivos entre pares e adultos;
e nos caminhos múltiplos e culturalmente responsivos para a participa

120120
ção, que melhoram significativamente o desenvolvimento acadêmico,
social, emocional, cívico e moral (ROSS, et al., 2020).

Recentemente, o Departamento de Educação dos EUA, Office


of Safe and Healthy Students (US DOE, OSHS, 2016), apresentou um
modelo de clima escolar que “reflete como os membros da comunida
de escolar vivenciam a escola, incluindo relações interpessoais, práti
cas de professores e outros funcionários e arranjos organizacionais. O
clima escolar inclui fatores que servem como condições para a apren
dizagem, e que apoiam a segurança física e emocional, a conexão
e o apoio e o engajamento” (p. 1). O modelo US DOE concentra-se
em três dimensões centrais do clima escolar: segurança, envolvimento
dos atores e ambiente educacional (BRADSHAW et. al., 2021).

De acordo com Osher Neiman e Williamson (2020), o clima es


colar é o termo que define como as pessoas vivenciam o ambiente
escolar, incluindo suas interações e experiências umas com as outras
em ambientes educacionais, o que nos permite alguns questionamen
tos: Elas se sentem respeitadas e apoiadas? Eles têm confiança rela
cional? O clima também abrange como os membros da comunidade
escolar vivenciam as normas, cultura e estruturas da escola, e como
sentem que pertencem a uma unidade escolar. O clima afeta os resul
tados com os quais os gestores e docentes se preocupam: frequência,
SUMÁRIO
aprendizagem, desempenho e segurança dos alunos, bem como fre
quência, desempenho e segurança dos professores.

O clima escolar, por conseguinte, abrange as condições sociais


e emocionais para aprendizagem, ensino e bem-estar - experiência de
segurança, apoio, pertencimento, conexão, envolvimento, foco acadê
mico e respeito individual e cultural. Essas condições multifacetadas
interagem dinamicamente, e afetam o comportamento, o desempenho
e o bem-estar do aluno e do professor. Por exemplo, quando alunos
e professores se sentem inseguros, eles são mais propensos a expe
rimentar níveis de estresse que ameaçam a saúde, e menos propen

121121
sos a prestar atenção ao aprendizado ou às necessidades de outras
pessoas. O estresse limita a memória de trabalho. Por outro lado, as
emoções positivas afetam o bem-estar mental e físico, e ajudam na
retenção de conhecimento (OSHER, et al. 2020).
Na perspectiva de Kraft e Falken (2020), o clima escolar consiste
em uma constelação de características organizacionais que moldam as
experiências de professores e alunos. O clima escolar forte caracteriza-se
por liderança de apoio, colaboração de professores, altas expectativas
para os alunos e um compromisso coletivo para apoiar a aprendizagem
dos estudantes. A docência é uma carreira social, e os relacionamentos
que os professores têm com aqueles que apoiam o seu trabalho em sala
de aula - gestores e colegas - influenciam fortemente a satisfação e o
sucesso dos professores (KRAFT & FALKEN, 2020).

De modo geral, podemos pontuar que o clima escolar tem relação


com a qualidade da vida na instituição educativa, e reflete a percepção
dos alunos, professores, gestores, demais funcionários e família sobre
o dia a dia do trabalho na escola, os valores compartilhados, as regras
estabelecidas e acordadas, as metas propostas, o desenvolvimento do
ensino e da aprendizagem, as relações interpessoais e estruturas orga
nizacionais (COHEN, 2006, 2010, 2012). Toda escola possui um clima
próprio, percebido por quem faz parte dela. Inúmeros estudos indicam
SUMÁRIO
uma associação entre a qualidade do clima e o bem-estar dos atores da
escola, especificamente com respeito aos alunos, mostrando uma rela
ção entre a qualidade do clima e o desempenho acadêmico, a motiva
ção para aprender, os comportamentos, o sentimento de pertencimento
e de justiça, a satisfação com a escola, o valor pelo conhecimento e o
autoconceito (FAN et al., 2011; CUNHA; COSTA, 2009; GOMES, 2005;
GAZIEL, 1987; LOUKAS, 2007; COHEN et al., 2008; COHEN, 2010).

As escolas que possuem clima escolar positivo apresentam


bons relacionamentos interpessoais, um ambiente de cuidado e con
fiança, qualidade no processo de ensino e aprendizagem, espaços

122122
de participação e de resolução dialógica dos conflitos, proximidade
dos pais e da comunidade, uma boa comunicação, senso de justiça
(as regras são necessárias e obedecidas e as sanções são justas),
um ambiente estimulante e apoiador, centrado no aluno, no qual os
indivíduos se sentem seguros, apoiados, engajados, pertencentes à
escola e respeitosamente desafiados (FREIBERG, 1998, 2005; BRU
NET, 2001; COHEN et al., 2009; DEBARBIEUX et al., 2012; SHER
BLOM et al., 2006; VINHA et al., 2017).
Isto posto, cabe aqui refletirmos: como podemos considerar o
clima escolar neste momento de pandemia, com as aulas remotas e/
ou híbridas? Como vimos anteriormente, diversos têm sido os esfor
ços, seja por parte das secretarias; ou equipes gestoras; corpo docen
te; familiares e estudantes para que o processo educacional – ainda
que considerando todas as dificuldades – que não são poucas – que
ele continue. Ou seja, o processo educativo deve continuar, e várias fo
ram as estratégias para que o ensino pudesse chegar até os estudan
tes. Nesse sentido, muitas escolas ainda estão trabalhando de forma
remota e outras em um modelo híbrido, portanto, temos alunos e pro
fessores participando do ensino e aprendizagem de suas casas, longe
dos muros da escola, e, assim, como poderemos pensar o clima?

O Conselho Nacional do Clima Escolar Americano (NSCC) pon


SUMÁRIO tua que o clima escolar é essencialmente uma medida da saúde geral
de uma comunidade escolar; enquanto os prédios podem estar va
zios, a comunidade escolar permanece viva, necessitando de tantos
cuidados e atenção quanto quando reunida no mesmo espaço físico.
Assim, as necessidades básicas dos alunos por segurança física, so
cial e emocional e conexão com adultos atenciosos permanecem, e,
em alguns casos, são ainda mais urgentes agora que as escolas estão
fisicamente fechadas para eles. É mais importante do que nunca lem
brar aos alunos, funcionários e famílias que eles não estão sozinhos,
proporcionando-lhes maneiras de se conectar com a escola e uns com
os outros para que possam ver e sentir a sua força coletiva.

123123
Diante disso, uma possível proposta de reflexão seria contem
plarmos o clima educacional. Ou seja, é plausível pensarmos, por
exemplo, na dimensão das relações. Isto é, como têm sido percebi
das, por alunos, professores, gestores e familiares, as relações inter
pessoais (alunos entre pares nas comunidades educativas virtuais;
entre alunos e seus professores na condução das aulas remotas; no
planejamento e organização das ações escolares entre professores
e gestores; no contato da escola com os pais e responsáveis pelos
alunos etc.). Outra admissível dimensão refere-se à relação com o
ensino e a aprendizagem: como os alunos e professores perceberam
o desenvolvimento das aulas on-line; a compressão, concentração,
motivação, organização e fixação por parte dos alunos no desenvol
vimento das aulas; como foi a organização dos ambientes virtuais, a
comunicação professor-aluno, escola-família etc.). Outra dimensão
diz respeito às questões emocionais (como os alunos e professores
se sentiram nesse período de distanciamento social, quais foram os
sentimentos mais presentes nesse período, como foram abordadas
as questões sobre ansiedade, medo, insegurança etc.). Ou seja, são
vários elementos que podemos contemplar para refletirmos o clima
educacional, quais foram e como foram trabalhadas as percepções
dos envolvidos na educação remota e/ou híbrida.

SUMÁRIO Embora ainda não tenhamos desenvolvido instrumentos de me


dida para mensurar tais elementos (esperamos que, em breve, pos
samos contar com questionários dessa natureza), são questões que
podem ser refletidas, discutidas, compartilhadas e vivenciadas pelos
atores escolares no retorno às atividades presenciais. Não temos
dúvidas de que serão reflexões e oportunidades fundamentais de
acolhimento, compartilhamento e suporte mútuo entre alunos, profes
sores e gestores, de modo que possamos todos voltar para o ambiente
escolar considerando todos esses elementos, e, juntos, nos apoiarmos
e caminharmos para o fortalecimento geral da comunidade escolar.

124124
Diante dessas considerações sobre as possíveis reflexões a
respeito do clima educacional, voltemos ao Clima Escolar, como foi
conceituado e operacionalizado para o estabelecimento de instrumen
tos de medida para o seu diagnóstico nas escolas brasileiras. Sem
dúvida, estas informações serão essenciais para o diagnóstico das
percepções no ambiente escolar neste retorno.

CONCEITO DO CLIMA NO BRASIL

A partir dos estudos da literatura na área e das pesquisas que


temos desenvolvido com o clima escolar, compreendemos o clima es
colar como o conjunto de percepções e expectativas compartilhadas
pelos integrantes da comunidade escolar, decorrente das experiências
vividas nesse contexto, quanto aos seguintes fatores inter-relaciona
dos: normas, objetivos, valores, relações humanas, organização e es
truturas física, pedagógica e administrativa, que estão presentes na
instituição educativa. O clima corresponde às percepções dos docen
tes, discentes, equipe gestora, funcionários e famílias, em função de
um contexto real comum, portanto, constitui-se por avaliações subje
tivas. Refere-se à atmosfera psicossocial de uma escola, sendo que
SUMÁRIO cada uma possui o seu clima próprio. Ele influi na dinâmica escolar e,
por sua vez, é influenciado por ela; desse modo, interfere na qualidade
de vida e na qualidade do processo de ensino e de aprendizagem
(VINHA; MORAIS; MORO, 2017).

Há inúmeras ações que podem ser desenvolvidas para a pro


moção do “bem-estar” de todos, investindo na melhoria da qualidade
do clima escolar. Isso pode ser feito por meio de uma gestão aberta às
mudanças; da implantação de estratégias sistêmicas que promovam
a valorização e a promoção do apoio de todos, na escola; de um olhar
contínuo para os processos de melhoria do ensino; da garantia de uma

125125
escola acolhedora, segura e justa; do exercício constante do diálogo e
do trabalho coletivo; do cuidado com uma boa comunicação e trans
parência; do estímulo à participação estudantil e da comunidade nas
decisões da instituição (criação de comunidades democráticas), de
maneira a possibilitar o desenvolvimento da sociabilidade e do perten
cimento (COHEN, 2006, 2010; FREIBERG, 1998, 2005; THAPA, 2012;
THAPA et al., 2013; VINHA et al., 2017).

Além do estabelecimento do construto teórico do clima escolar,


após pesquisas na literatura especializada, análise e comparação de
diversos estudiosos, no que se refere ao âmbito nacional, membros
do Gepem (MELO, MORAIS, 2019; MORO, 2018, 2020; MORO et al.,
2018; MORO, VINHA, MORAIS, 2019; VINHA et al., 2016) elaboraram
uma matriz de referência composta por oito dimensões consideradas
constituintes do clima escolar. No Quadro 01, abaixo, apresentamos
cada um dos conceitos atribuídos às referidas dimensões.

QUADRO 01 – Matriz de Referência do clima escolar.

Clima Escolar – Matriz


Dimensão Conceito Grupo
1. As relações A boa qualidade desta dimensão se assenta na percepção da escola como um lugar de trabalho efetivo
e como aensino com o conhecimento, que investe no êxito, motivação, participação e bem-estar dos alunos, promove o
com
aprendizagem Aluno
valor da escolarização e o sentido dado às aprendizagens. Supõe também a atuação eficaz de um corpo Professor
SUMÁRIO
docente estável e a presença de estratégias diferenciadas, que favoreçam a aprendizagem de todos, e o Gestor
acompanhamento contínuo, de maneira a que nenhum aluno fique para trás.

Refere-se às relações, aos conflitos e à percepção quanto à qualidade do tratamento entre os membros
2. As relações da escola. Abrange também a identificação pelos adultos das situações de intimidação e maus tratos
Aluno
sociais e vivenciadas nas relações entre pares, e a corresponsabilidade dos profissionais da escola nos problemas
os conflitos de convivência. A boa qualidade do clima relacional é resultante das relações positivas que ocorrem Professor
Gestor
na escola nesse espaço, das oportunidades de participação efetiva, da garantia do bem-estar, respeito e apoio
entre as pessoas, promovendo continuamente o sentimento de pertencimento.
3. As regras, as Esta dimensão diz respeito às percepções dos gestores, professores e alunos em relação às interven
Aluno
sanções e a ções nos conflitos interpessoais na escola. Abrange a elaboração, conteúdo, legitimidade e equidade
Professor
segurança na aplicação das regras e sanções, identificando também os tipos de punição geralmente empregados.
Gestor
na escola Compreende, ainda, a ordem, justiça, tranquilidade, coerência e segurança no ambiente escolar.

126126
4. As situações Esta
de intimidação dimensão trata da identificação de situações de intimidação e maus tratos nas relações entre pares
Aluno
e bullying percebidos pelos alunos e dos locais em que ocorrem
de
entre alunos

5. A família, a Refere-se à percepção da qualidade das relações entre escola, família e comunidade, compreendendo Aluno
o respeito, a confiança e o apoio entre esses grupos. Abrange a atuação da escola, considerando as ne
escola e a Professor
cessidades da comunidade. Envolve o sentimento de ser parte integrante de um grupo que compartilha
comunidade objetivos comuns. Gestor

6. A infraestrutura Trata-se da percepção da qualidade da infraestrutura e do espaço físico da escola, de seu uso, adequação Aluno
da rede física e cuidado. Refere-se a como os equipamentos, mobiliários, livros e materiais estão preparados e organi
e aescola Professor
zados, para favorecer a acolhida, o livre acesso, a segurança, o convívio e o bem-estar nesses espaços. Gestor
comrelações
7. As o trabalho Trata-se dos sentimentos dos gestores e professores em relação a seu ambiente de trabalho e às insti
tuições de ensino. Abrange as percepções quanto à formação e qualificação profissional, às práticas de Professor
estudos e reflexões sobre as ações, à valorização, satisfação e motivação para a função que desempe Gestor
nham, e ao apoio que recebem dos gestores e demais profissionais.
A gestão e a
8. participação Abrange a percepção quanto à qualidade dos processos empregados para a identificação das necessida
des da escola, intervenção e avaliação dos resultados. Inclui também a organização e articulação entre Professor
os diversos setores e atores que integram a comunidade escolar, no sentido de promover espaços de Gestor
participação e cooperação, na busca de objetivos comuns.

Fonte: VINHA, T. P.; MORAIS, A.; MORO, A. Manual de orientação para a


aplicação dos questionários que avaliam o clima escolar. Campinas: FE/
UNICAMP, 2017. Disponível em: http://www.bibliotecadigital.unicamp.
br/document/?code=79559&opt=1. Acesso em: 22 mai. 2021.

Podemos observar que, além do nome, da definição e do con


ceito de cada uma das dimensões, indica-se o que seria uma boa
SUMÁRIO
percepção da dimensão. Podemos notar também que há dimensões
mais relacionadas ao ensino e aprendizagem (dimensão 1), outras
tratando da qualidade dos relacionamentos dos alunos e seus pares
ou destes com seus professores, bem como sobre as intervenções
nos conflitos interpessoais e o estabelecimento de regras e sanções
na escola (dimensões 2, 3 e 4), outras administrativas ou organiza
cionais (7 e 8), as relativas às famílias e seus relacionamentos com a
escola (5), e a voltada a aspectos físicos da escola (6). É viável, por
tanto, abarcar o máximo possível do que se percebe na escola, como
ela é sentida, avaliada e como tudo isso influi sobre seus membros,

127127
tornando-se fundamental para uma reflexão conjunta com gestores e
professores, e para uma tomada de ações baseada em dados sobre
o que nós, da escola, percebemos.

Considerando essas dimensões, vemos que se pode ter per


cepções positivas sobre parte das vivências escolares e não se ter de
outras, e isso pode variar em cada grupo que compõe a escola. Além
disso, alunos podem ter percepções diferentes de seus professores
e gestores sobre as mesmas dimensões. Dessa forma, olhar para o
clima da escola, entre todos os seus membros, é ver essa instituição
como um todo, entendendo que não é só a parte pedagógica da esco
la que deve se estruturar, mas toda a instituição, para que os que nela
convivem a vejam, sintam e se comportem de forma positiva.

A partir dessa matriz de referência, os questionários que avaliam


o clima escolar foram compostos de itens no formato Likert de quatro
pontos, direcionados aos alunos a partir do 7º ano do Ensino Funda
mental, seus professores e gestores. Vale destacar que, no conjunto
de itens elaborados, constam os itens específicos para cada grupo
(alunos, professores e gestores), e também os itens de relação, os
quais dizem respeito aos enunciados propostos para os três questio
nários, visando a conhecer as diferentes perspectivas dos participan
tes sobre um mesmo tema. Ou seja, eles têm o mesmo sentido para
SUMÁRIO os diferentes grupos avaliados.

Será essencial que as escolas, nesse retorno às aulas presenciais,


após aproximadamente 3 meses, realizem o diagnóstico do clima da es
cola, juntamente para terem um retrato de como têm sido as percepções
dos alunos, professores e gestores sobre todas essas dimensões, e, a
partir disso, planejar um movimento de melhoria do clima. Vale destacar
que as escolas também podem adaptar os questionários de acordo com
o momento que estamos vivendo. Mesmo sendo validados, o importante
é que os itens atendem às realidades e necessidades de cada escola.

128128
Os dados referentes ao diagnóstico do clima escolar, a partir
das diferentes perspectivas dos atores escolares, podem ser usados
para informar a tomada de decisão baseada em dados e evidências,
bem como para o monitoramento dos resultados das ações para me
lhoria do ambiente educacional. O uso dos dados do clima de forma
válida, confiável, articulando as diversas dimensões é fortemente en
corajado para o monitoramento contextual (BRADSHAW et. Al., 2021).
Nesse sentido, poderemos compreender nossos pontos fortes
(o que nossa escola já tem feito bem) e desafios atuais (nossas fragi
lidades percebidas por nossos alunos, professores e também gesto
res), o que permitirá o delineamento dos objetivos de toda a escola,
instrucionais e/ou relacionais, bem como estratégias de melhoria vin
culadas, e, em seguida, avaliar os ganhos e desafios contínuos.

Bradshaw e colaboradores (2021) sugerem que as escolas


considerem as cinco etapas para a melhoria do clima escolar, inde
pendentemente dos objetivos específicos de melhoria que uma deter
minada escola pode decidir focar, estrategicamente no “agora”, por
exemplo: Primeiro, aprender sobre práticas baseadas em evidências
que potencialmente apoiam esforços de melhoria em toda a escola,
instrucionais e/ou relacionais. Em segundo lugar, considere que você
e sua escola podem já estar envolvidos em alguns desses esforços.
SUMÁRIO E, na medida em que for esse o caso, reconheça, compartilhem e
celebrem esses esforços. Terceiro, entenda como as práticas de ava
liações podem lançar luz sob a utilidade desses esforços de melhoria
atuais. Quarto, use essas tendências e descobertas de dados para
desenvolver o próximo conjunto de metas e estratégias de melhoria
sistêmica, instrucional e/ou relacional. E, finalmente, como outros es
forços de melhoria escolar, há um forte impulso para que as escolas
usem “intervenções baseadas em evidências” para o planejamento e
replanejamento de suas ações para melhorar o clima escolar.

129129
CONSIDERAÇÕES FINAIS

É fundamental que haja um planejamento institucional para re


cepcionar toda a comunidade escolar de forma humanizada e com
prometida com a redução das desigualdades, com um olhar sensível
às fragilidades emocionais geradas por esse momento sensível que
vivenciamos. Essa recepção pode ser traduzida como um movimento
de acolhida empática e respeitosa. Nesse planejamento, que deve ser
um processo de construção coletiva, é preciso considerar o que é mais
imediato, o que deve ser mantido em médio prazo, e o que deve ser
incorporado na cultura escolar de forma a favorecer um clima cada
vez mais positivo, em que sejam efetivamente vivenciados o diálogo, a
escuta, o apoio, o cuidado e a participação.

De forma presencial, remota ou híbrida, podemos organizar11 os


momentos frequentes que podem ser desenvolvidos, tanto com pro
fissionais da escola quanto com os estudantes, como por exemplo,
espaços: de escuta e expressão de sentimentos, por meio de círculos
de paz ou rodas de sentimentos; de discussão sobre problemas cole
tivos apresentados por quem desejar falar com pauta aberta, como as
assembleias ou rodas de diálogo, de forma a envolvê-los nos proble
mas e nas propostas de solução; para o trabalho com as habilidades
SUMÁRIO
socioemocionais como objeto de conhecimento; entre outros.

É importante introduzir momentos para desenvolver com os


estudantes, atividades ou jogos para a expressão dos sentimentos;
rodas de convivência em que se discutem dilemas, literatura, vídeos,

11 Alguns materiais que detalham como fazer: Instituto Unibanco, 2020. Protocolo de acolhi
mento: ações híbridas e contínuas. Disponível em: https://bit.ly/3liJ4Df. Acesso em: 12 mai.
2021. Instituto Península, 2021. Orientações de acolhimento para professores. Disponível
em: https://www.institutopeninsula.org.br/wp-content/uploads/2020/08/instituto-peninsula_
rp_08-ago_nota-tecnica_arte_programa-de-acolhimento-v4.pdf. Acesso em: 10 jun. 2021.
Convivere Mais, 2020. Protocolo de Acolhimento para o Retorno das Escolas. Disponível
em: https://www.conviveremais.com.br/. Acesso em: 10 mai. 2021.

130130
entre outros; expressão por meio das artes e jogos cooperativos. Vale
a pena fomentar o protagonismo com os alunos mais velhos, por
meio dos grêmios, dos movimentos autônomos, dos coletivos, das
equipes de ajuda, de tutoriais etc.

Tais ações devem imprimir valores para mim e para os que estão
a minha volta, o que é imprescindível para dialogar e refletir sobre as
experiências vivenciadas, reconhecer e compartilhar os sentimentos -
o que poderá, inclusive, favorecer o autoconhecimento, promovendo
um clima positivo, justo, respeitoso e solidário para todos.

É válido também contemplar as necessidades coletivas e indivi


duais referentes aos problemas de convivência no âmbito familiar, que
podem ter ocorrido durante o período de hiperconvívio, e observar os
aspectos emocionais trazidos pelos alunos, professores e funcionários
em geral. Isso implica em identificar e acolher os sentimentos trazidos,
e propiciar espaços de diálogo, momentos de troca, de escuta ativa,
de reflexões e compartilhamento entre pares.

Além do trabalho com o coletivo e com os grupos, nesse proces


so, é preciso ainda estar atento e ter procedimentos de acompanhamen
to individuais para aqueles que estão necessitando de maior cuidado
(tanto adultos quanto estudantes), identificando casos que necessitam
SUMÁRIO de maior atenção, introduzindo pautas de observação, planejamento de
intervenção e acompanhamento. Todavia, há situações que extrapolam
as possibilidades de intervenção na escola, e precisam de encaminha
mento para atendimentos em instâncias específicas, acionando, se ne
cessário, a rede de proteção da criança e adolescente. Um exemplo
são as situações de risco, de violências e suspeitas de violações de
direitos. Outro é quando são identificados sinais de gravidade que indi
cam a necessidade de atendimento e avaliação pelos profissionais da
saúde, como, por exemplo, quando se percebe a presença de condutas
autodestrutivas, como abuso de substâncias lícitas e ilícitas e violência
autoprovocada (lesões autoprovocadas e pensamento suicida); trans

131131
tornos alimentares; mudanças bruscas, como o aumento ou diminui
ção das horas de sono; e sofrimento emocional acentuado e frequente,
como agitação progressiva, tristeza contínua, crises de choro constan
tes, medo excessivo; perda de funcionalidade, como a dificuldade de
manter a rotina de higiene pessoal, cansaço e desânimo excessivos,
incapacidade de se concentrar em atividades rotineiras e laborais.

Sem dúvida, trata-se de um trabalho complexo, em que será


necessária a construção coletiva, estudo, diagnóstico, discussão das
prioridades e urgências, planejamento, compartilhamento das respon
sabilidades e acompanhamento. Mais do que nunca, a pandemia mos
tra como a escola tem um relevante papel social, e será este o espaço
coletivo em que nossas crianças e jovens vão elaborar as experiências
vividas. Será preciso, portanto, considerar o que é essencial para to
dos nós enquanto comunidade escolar. A pandemia vai passar, e que
aprendizagens queremos que fiquem? Nossas ações e relações edu
cativas vão possibilitar que nossos estudantes aprendam a lidar com
incertezas? Com a importância da responsabilidade individual para o
bem-estar coletivo? Com o poder das redes sociais/aplicativos promo
vendo crises, mas também esclarecimentos? Em como interpretar as
informações e interagir? Para compreenderem o valor da ciência? Com
a sua própria capacidade de promover o bem? Em como expressar o
SUMÁRIO que se sente, e a saber ouvir? Com o autocuidado e também saber
cuidar dos outros? Com a união e solidariedade para enfrentamento
de crise? Com a ética, desigualdade e bem comum?

São muitas questões que estarão em nosso radar, de modo a


projetarmos a educação que queremos para os nossos alunos. Se
quisermos uma sociedade melhor no futuro, precisamos investir na
educação que promovemos para nossos alunos hoje.

Para além de todo esse movimento, é preciso considerar, no


tempo certo, o período necessário ao reestabelecimento da dinâmica
educacional presencial, o tempo para as interações, relações e aco

132132
modações dos sentimentos, para que possamos operacionalizar um
diagnóstico do clima escolar.
Uma avaliação sobre o clima permite que cada indivíduo expres
se as suas impressões, vivências e sentimentos na e sobre a institui
ção de ensino. O conjunto das percepções de todos os indivíduos, na
escola, fornece um retrato do ambiente socioeducativo, possibilitando
um reconhecimento do que está acontecendo (seja dos pontos fortes,
seja também dos vulneráveis), e, com isso, se favorece a hierarquiza
ção das prioridades e das áreas para as quais os esforços de melhoria
e as intervenções sejam direcionados.

Reiteramos que a investigação sobre o clima pode ser uma fer


ramenta de grande valia nas escolas, pois possibilita que a equipe
pedagógica considere a relevância de se olhar para o clima escolar,
e de se pensar em estratégias de melhoria, instituindo mecanismos e
metas, quer quanto ao desempenho escolar, quer, sobretudo, direcio
nados a promover a escola como um lugar mais saudável, respeitoso
e justo para todos. É nesse sentido que sublinhamos o valor dos instru
mentos elaborados, visto que revelam particularidades complexas da
instituição, ao contemplar as dimensões do clima escolar e, com isso,
viabilizar as informações que contribuem para tais ações.

SUMÁRIO Vale destacar, diante de tudo que foi exposto, uma questão que
deve estar sempre no nosso horizonte ao refletirmos sobre o proces
so de melhoria de nossas escolas: Que tipo de escola nós queremos
que a nossa escola seja? Uma pergunta que parece simples, porém, é
cheia de significados. Nessa pergunta, há um disparador psicológico
intrínseco, na medida em que o enunciado da pergunta traz, implicita
mente, o convite ao reconhecimento e ao pertencimento àquela ins
tituição. Essa escola é NOSSA e todos NÓS, enquanto comunidade
escolar, QUEREMOS que ela seja cada vez melhor, ainda mais consi
derando o contexto de pandemia, de forma que todas as especificida
des contidas nas dimensões do clima, aqui apresentadas, possam ser

133133
refletidas e contempladas no constante movimento de melhoria de tudo
que envolve a instituição. Essas informações também contribuirão para
a melhoria da qualidade das relações e ao planejamento das ações e
constituição dos espaços referentes ao diálogo, escuta, participação,
expressão de sentimentos, apoio mútuo, entre outros fatores relaciona
dos ao bem-estar, cuidado, pertencimento e proteção na escola.

Com o diagnóstico do clima escolar, ao propiciar o conheci


mento das percepções dos atores da instituição de ensino, por ve
zes convergentes e outras divergentes, sobre o universo da escola,
pode revelar informações fundamentais, para que a escola possa se
conhecer, sob as diferentes e compartilhadas perspectivas, de modo
a implementar ações e intervenções de melhoria, com base em dados
de pesquisas, confiáveis, levando em conta o que já fazem bem e o
que precisa de melhoras, e tendo em vista a concepção de todos, em
benefício de ações mais assertivas e objetivas. Que possamos nos
unir, neste momento tão doloroso, para fortalecer a cultura do diálogo,
pertencimento, apoio, confiança e bem-estar na escola.

REFERÊNCIAS

SUMÁRIO ABED. (2020). Pesquisa sobre ensino remoto na Educação Básica. ABED, Ins
tituto Casa Grande e SIESP. Disponível em: http://abed.org.br/arquivos/Pes
quisa_Educacao_Basica_ABED_Casagrande.pdf. Acesso em: 20 mai. 2021.
BERTONI, E. (2020) Professores: o risco da volta às salas e a ansiedade na
pandemia. São Paulo: Nexo, 01 de jul. de 2020. Disponível em: https://www.
nexojornal.com.br/expresso/2020/07/01/Professores-o-risco-da-volta-%
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139139
Capítulo 6

Educação, pandemia e
desigualdades: gestão em
tempos de mudanças

Marcelo dos Santos

Maria José de Oliveira Russo

Marcelo dos Santos


6
Maria José de Oliveira Russo

Educação, pandemia e desigualdades:


gestão em tempos
de mudanças

DOI: 10.31560/pimentacultural/2021.107.140-166
INTRODUÇÃO

A pandemia causada pelo novo coronavírus – COVID-19 – trou


xe consigo uma série imensurável de adversidades em escala global.
No Brasil, as crises sanitária e socioeconômica, cercadas por embates
políticos, impactaram de forma significativa vários setores. Além da re
percussão epidemiológica, intimamente relacionada ao temor do risco
de contágio, adoecimento e morte, passamos a assistir a uma onda
desenfreada de opiniões e orientações divergentes. Qual a prioridade:
saúde ou economia? O isolamento social e a quarentena, necessários
para a contenção do vírus, não se articulavam ao fator trabalho para a
grande maioria da população, que precisava sair para ganhar o sus
tento, mesmo sem as condições e estruturas adequadas para tanto.
O luto, o desemprego, a alteração da rotina, o sofrimento psicológico
e o crescente índice de violência doméstica estão entre os diversos
aspectos sobre os quais a pandemia se assentou.

A educação não ficou à parte desse cenário caótico. Dados da


Organização das Nações Unidas para a Educação, Ciência e Cultura
– Unesco – destacam que, em mais de 180 países, cerca de 1,5 bilhão
de estudantes tiveram déficit em seus estudos desde o início da pan
demia, anunciada oficialmente pela Organização Mundial da Saúde
SUMÁRIO
– OMS – em março de 2020.
As desigualdades alcançaram níveis muito mais elevados em
relação àqueles que já vinham sendo registrados. Observamos aí um
paradoxo, pois, no mesmo instante em que, para a proteção da saú
de, a possibilidade de acesso à educação só seria possível por meios
virtuais, a falta de acessibilidade às tecnologias, a carência de um am
biente adequado aos estudos ou a dificuldade de adaptação ao ensino
remoto fez com que muitos alunos, desfavorecidos economicamente,
passassem a ser excluídos de um de seus direitos sociais basilares: a
educação, da qual não podiam mais, de fato, participar.

141141
Em face do exposto, nossa pretensão neste capítulo é realizar
inicialmente uma abordagem sociológica para a compreensão das de
sigualdades sociais, que se avultaram sobremaneira na pandemia, e
que demandam reflexão, planejamento, políticas públicas e um olhar
atento de educadores. Na sequência, considerando o enfrentamento
de desafios emergentes da pandemia, apresentamos alguns conceitos
relacionados à gestão/administração, que, como parte de um sistema
complexo, de mudanças e de incertezas como as que vivemos, exige
tomadas de decisão rápidas, e determinadas competências de lide
rança, com vistas a minimizar conflitos e possíveis perdas observadas,
principalmente no cenário educacional.

AS DESIGUALDADES SOCIAIS

A discussão sobre a desigualdade social não é algo recente.


Em seus escritos12 sobre o Estado do Bem-Estar Social, publicados na
década de 1960, o sociólogo britânico Thomas Humfrey Marshall já fa
zia importantes apontamentos a esse respeito, ao mencionar que seria
possível aceitar a desigualdade do sistema de classes sociais desde
que a igualdade de cidadania fosse reconhecida. Em sua obra clássica
SUMÁRIO “Cidadania, classe social e status”, o autor apresenta os fundamentos
do Welfare State e o processo evolutivo dos direitos sociais, afirman
do que, para compreender a cidadania, é preciso analisar a natureza
humana, em diferentes grupos de interação, em contextos sociais e
processos culturais também distintos.

Ao trazermos a teoria marshalliana como ponto de partida


para as nossas proposições, consideramos que, apesar de ela ter
sido contextualizada na metade do século XX, apresenta elementos

12
Cf. duas obras de Thomaz Marshall: “Cidadania, classe social e status” e “Política social”,
ambas publicadas pela Editora Zahar, em 1967.

142142
hodiernos, uma vez que, na obra de Marshall, pode ser observada
referência à desigualdade social, problema que ainda assola a rea
lidade brasileira, inserida em um contexto capitalista, o qual produz
notadamente a elevação do nível de pobreza, e, por consequência, a
vulnerabilidade social, isto é, a exclusão de grupos que são coloca
dos, cada vez mais, à margem da sociedade.

Nessa linha de pesquisa, Marshall investigou o desenvolvimento


da cidadania até o fim do século XIX e na primeira metade do século
XX, dividindo o seu ponto de vista em três grandes elementos ou par
tes: civil, político e social. Em relação ao elemento civil, Marshall (1967)
o descreve como composto pelos direitos necessários à liberdade indi
vidual, liberdade de ir e vir, de imprensa, de pensamento e fé, o direito
à propriedade, o direito de concluir contratos válidos e o direito à jus
tiça, sendo que este último se distingue dos demais, porque se refere
ao direito de defender e afirmar todos os demais direitos em termos
de igualdade com outras pessoas. Por sua vez, o elemento político
compreende o direito de o cidadão participar, no exercício do poder
político, como membro de um organismo investido da autoridade polí
tica, ou como um eleitor dos membros de tal organismo. O último ele
mento destacado pelo autor é o social, que se refere a tudo o que vai
do direito a um mínimo de bem-estar socioeconômico, ao direito de o
SUMÁRIO indivíduo participar da sociedade, levando a vida com dignidade, den
tro dos padrões que nela se estabelecem. As instituições ligadas ao
direito social são as que nos interessam trazer para esta análise, pois
envolvem, além dos serviços e políticas sociais, o sistema educacional.

Marshall (1967) ressalta que, em outros tempos, esses três direi


tos estavam fundidos em um só. Desta forma, não havia nenhum prin
cípio sobre a igualdade dos cidadãos para contrastar com o princípio
da desigualdade de classes. Na Idade Média, por exemplo, a partici
pação nos negócios públicos era mais um dever do que um direito. Os
elementos da cidadania – civil, político e social –, ao se distanciarem
uns dos outros, passaram a parecer estranhos entre si. Conforme da

143143
dos apresentados pelo autor, o período de formação dos direitos civis
se deu no século XVIII, os direitos políticos no século XIX, e os direi
tos sociais no século XX. Contudo, cabe-nos considerar que há algum
entrelaçamento destes períodos, especialmente entre os dois últimos.

À medida que os direitos foram se estabelecendo, foi ocorrendo


uma adição gradativa de novos direitos a um status já existente. Quan
do os direitos políticos começaram a se firmar (século XIX), os direitos
civis já tinham um desenvolvimento progressivo, isto é, já haviam ad
quirido um status geral de cidadania. Entretanto, no século XVIII, os di
reitos políticos eram deficientes pelos padrões de cidadania democrá
tica. Poucos tinham direito ao voto, e os eleitores somavam menos de
um quinto da população masculina adulta. Ao mesmo tempo em que
os cidadãos recebiam remuneração, podiam adquirir propriedades ou
alugar uma casa, e gozar de seus direitos políticos, associados a seus
feitos econômicos. A ampliação dos seus direitos civis capacitava-os
a efetivar os seus direitos políticos. Desse modo, era característica da
sociedade capitalista do século XIX considerar os direitos políticos
como um produto secundário dos direitos civis (ibid.).

O século XIX pôde ser considerado um período em que se fun


daram os direitos sociais, e, nesse contexto, a educação estava dire
tamente relacionada à cidadania. O Estado, ao oferecer educação aos
SUMÁRIO
indivíduos, deveria garantir as exigências e a natureza da cidadania.
O direito à educação constituiu-se, portanto, como um direito social
de cidadania, sendo condição essencial para o seu exercício, e visto
como um pré-requisito necessário à liberdade civil.

Se, por um lado, cidadania é um status concedido àqueles que


são membros integrais de uma comunidade, por outro, classe social é
um sistema de desigualdade, e ambas, classe social e cidadania, estão
baseadas em um conjunto de ideias, crenças e valores. Tais aspectos
permitem-nos compreender que o impacto da cidadania sobre a clas
se social tenha a forma de um conflito entre princípios opostos. Afinal,

144144
quanto mais se concebe a riqueza como mérito, mais se está inclinado
a considerar a pobreza como prova de fracasso (MARSHALL, 1967).

Nesse cenário, considerando-se alguns pressupostos que fun


damentam determinados serviços sociais nas áreas da educação, da
saúde e da habitação, encontram-se as dificuldades em se oferecer
uma educação de qualidade a todos os indivíduos, o que é sinônimo
de equiparação de oportunidades no trabalho profissional, com aces
so aos bens materiais e culturais. Do mesmo modo, não se observa um
tratamento médico adequado às reais necessidades da população. No
caso da habitação, embora o direito de o cidadão possuir uma mora
dia, seja lá qual for, é mínimo, o sistema se tornou complicado, haja
vista o seu crescimento gradativo, o que dificulta que os benefícios
sejam igualmente distribuídos.

Assim, a cidadania tem se tornado, em si mesma, o elemento


criador da desigualdade social, uma vez que os direitos e oportuni
dades, não raras vezes, são debatidos em um número cada vez mais
limitado de categorias, especialmente quando se trata da educação e
da inserção no mundo do trabalho, fazendo com que a população total
de trabalhadores esteja estratificada e padronizada.

A desigualdade social, portanto, pode ser considerada como o


SUMÁRIO resultado de um processo sócio-histórico emergente do sistema capi
talista, que, por seu caráter exploratório, sobretudo pela estratificação
social que provoca, implica a privação do direito de muitos a uma vida
digna, menos excludente e mais igualitária. Dito de outra forma, o ca
pitalismo ocasionou a negação do direito ao exercício da cidadania.

Pesquisas como as de Barbalet (1989); Arretche (1995), Cury


(2002); Bobbio (2004); Behring e Boschetti (2008), Saes (2016), entre
outras, apontam para a relevância dos trabalhos de Marshall, no sen
tido de reconhecer os direitos por ele apontados, que se traduzem, na
prática, como fundamentais, independentemente do território no qual

145145
devem ser exercitados. De fato, essa teoria é essencial para a com
preensão dos fenômenos sociais ao longo da história. Todavia, é im
prescindível mencionar o contexto histórico, socioeconômico, político
e social em que este autor viveu quando escreveu sobre o bem-estar
social, cidadania e políticas sociais, isto é, em condições totalmente
diversas das que observamos em nosso país, principalmente se consi
derarmos aqui a lentidão e a gradatividade do processo democrático.
Esta argumentação se faz necessária para que não corramos o equívo
co de generalizar o discurso marshalliano, sem levar em conta as suas
especificidades, principalmente porque Marshall acreditava que a con
quista da cidadania, a partir dos direitos civis, políticos e sociais, seria
um instrumento regulador da sociedade de classes, o que, podemos
afirmar, é algo utópico por dois aspectos: primeiro, porque é preciso ter
consciência dos conflitos entre os princípios de igualdade, pretendidos
pelos direitos sociais, e as reais desigualdades, próprias do capitalismo
e da estratificação social de cada país; segundo, porque a classe domi
nante simplesmente não permitirá uma igualdade absoluta de direitos
com as classes populares. Trata-se, pois, de um processo de interface
de contrastes, no qual as diferenças são desprezadas e excluídas.

NA ESTEIRA DAS DESIGUALDADES,


SUMÁRIO
A DIALÉTICA INCLUSÃO/EXCLUSÃO

Para avaliar as desigualdades sociais, devemos compreender


os vieses desse fenômeno. Em obra organizada por Arretche (2015),
podemos encontrar, como bem determina o título, as “Trajetórias das
Desigualdades” no território brasileiro. Com base nas edições dos
Censos Demográficos dos anos de 1960 a 2010, os autores realiza
ram uma análise das mudanças ocorridas no Brasil a partir de con
textos econômicos e políticos distintos para tratar da participação

146146
política, educação e renda, políticas públicas, demografia e mercado
de trabalho. Os textos apresentam estudos comparativos relativos
aos últimos cinquenta anos, e fazem referência às desigualdades de
renda, à estrutura familiar, aos níveis de escolaridade, à urbanização,
à saúde, à inserção da mulher no mercado de trabalho e nas univer
sidades, assim como aos rearranjos familiares em função dessa in
serção, ao ingresso, ainda tímido, de pretos e pardos nas instituições
de Ensino Superior, à desigualdade salarial entre homens e mulheres,
além de outros aspectos geradores da exclusão social. De acordo
com Arretche (2015), o termo desigualdade...
[...] ainda é excessivamente abstrato. No mundo social existem
múltiplas desigualdades: entre pobres e ricos, entre mulheres
e homens, entre categorias de raças, as quais, por sua vez, se
manifestam na renda, no acesso a serviços, na participação po
lítica. [...] o fenômeno da desigualdade é muito mais complexo
do que apenas sua dimensão monetária. Portanto, entender a
desigualdade requer examinar suas múltiplas dimensões (p. 6).

As dimensões às quais esta autora faz referência dizem respeito


à pobreza, à discriminação, mas também à falta de equidade e de
acessibilidade. Trata-se da privação de bens de consumo, de empre
go, de bem-estar e de direitos sociais, devendo estes elementos ser
considerados como essenciais a uma vida digna.
SUMÁRIO
Nesse sentido, a exclusão é considerada como um processo
social, e não individual, pois é sinônimo de privação de determinados
grupos, não só a bens e serviços, uma vez que se encontra nas várias
formas de relações econômicas, sociais, culturais e políticas. Por essa
razão, criticamos as políticas públicas que, na sua incompletude, fra
cassam, muitas vezes, ao provocarem uma inclusão precária e margi
nal, não conseguindo minimizar muitas dessas desigualdades.

Sawaia (2001) aponta a desigualdade social como uma das di


mensões da exclusão, que nada mais é do que um produto do funciona

147147
mento do sistema capitalista, e não uma falha deste. Em suas palavras,
“a sociedade exclui para incluir e esta transmutação é condição da or
dem social desigual, o que implica o caráter ilusório da inclusão” (p. 8).

Não sem frequência, o conceito de exclusão focaliza o aspecto so


cial, que tem a ver com a discriminação, e o aspecto econômico, que se
destaca em detrimento dos demais, como se a exclusão fosse apenas si
nônimo de pobreza. Para muito além destes fatores, é preciso ressaltar a
dimensão ética da injustiça social, pois a grande maioria da humanidade
está inserida em um cenário de insuficiências e de privações, que trans
cendem o aspecto socioeconômico. É necessário, também, estar atento
quando se faz referência ao direito à igualdade. Não se pode ressaltar as
diferenças a partir de uma ótica superior, que coloca os “diferentes” como
inferiores, pois esse viés pode evidenciar ainda mais as desigualdades
sociais e dificultar as ações que se denominam como inclusivas.

A sociedade é excludente, seletiva e discriminatória, mas pre


cisamos viver juntos, como afirma Touraine (1998), pois iguais e dife
rentes são obrigados a conviver, e temos a necessidade de pertencer
a um grupo. Muito tem se discutido sobre a necessidade de se pen
sar e disseminar a inclusão em todos os espaços sociais, para que
sejam verdadeiramente acolhedores e respeitadores das diferenças,
sejam elas relativas a classes sociais distintas, a características físi
SUMÁRIO cas, à ordem religiosa, à etnia, às questões de gênero, entre outras
diversidades. Embora não tenhamos aqui a pretensão de categorizar
os diferentes grupos sociais, até porque tal procedimento pode in
citar discriminações e estigmatizações, além de imputar um status
marginalizado aos indivíduos pertencentes a esses grupos. No en
tanto, não há como negar a exclusão hoje como um fenômeno social,
que gera debates em torno das políticas sociais. Como tal, demanda
que as ações sejam pensadas tendo-se em vista a proteção social a
essas categorias, que têm direitos grupais específicos, como aponta
Bobbio (2004), ao afirmar que há necessidade de proteger mais o

148148
grupo em seu conjunto do que o indivíduo singular. Em consonância
com este autor, Habermas (2007) cita as competências do Estado, as
políticas de equiparação de oportunidades e as ações protecionistas
das minorias. A análise da inclusão exige, pois, que tenhamos em
mente o complexo processo de exclusão e de desigualdades, um
tema associado intimamente ao modo de produção capitalista, que
se coloca em debate há muitos anos, e vem se acentuando de forma
significativa nas últimas décadas, sobretudo na atualidade, em tem
pos de pandemia como os que estamos vivenciando.

É o reconhecimento da injustiça social que determina a inter


venção do poder público na ordem social, de modo a assegurar a
melhoria das condições de vida dos cidadãos para uma existência
compatível com um mínimo de padrão de equidade, por meio de
ações de caráter compensatório, que buscam minimizar os efeitos
perversos das desigualdades sociais.

A exclusão não pode conviver com a cidadania. Desde a Consti


tuição Federal, a cidadania passou a se consolidar ao afirmar as bases
para a responsabilidade coletiva, por meio da cooperação entre União,
Estados e Municípios. Esse importante momento pelo qual o país pas
sou a viver, a partir da proclamação desse documento, ressalta, entre
outros aspectos, a garantia de direitos de cidadania (acesso à saúde,
SUMÁRIO
à educação e à assistência social), o processo de redemocratização, o
compromisso com a democracia, por meio da participação popular na
gestão pública, a ênfase na descentralização e no fortalecimento dos
municípios, e os princípios para a erradicação da pobreza e redução
das desigualdades sociais. A Constituição estabelece que a sociedade
seja livre, justa e solidária. Devemos, pois, nos referir aqui também à
democracia, que tem como pressuposto a concepção da igualdade,
revigorando o conceito de cidadania. Para Touraine (1998), a demo
cracia se concretiza por meio da luta dos sujeitos, na sua cultura e
sua liberdade, contra a lógica dominadora dos sistemas sociais, e é

149149
representada pela criação de espaços participativos e pela garantia do
respeito às diferenças individuais, bem como à pluralidade dos grupos.
A liberdade do sujeito é o princípio central sobre o qual se as
senta a democracia e esta não pode reduzir-se a um laissez-faire
cultural, à tolerância generalizada, pois uma política puramente
negativa culminaria na completa fragmentação da sociedade,
noutras palavras, no agravamento das desigualdades e da se
gregação. A defesa da liberdade deve ser ativa, garantir a igual
dade de oportunidades, criar as condições do reconhecimento
mútuo e fazer aparecer também a consciência de se pertencer
a uma sociedade livre (TOURAINE, 1998, p. 240).

Nesse cenário de lutas para a defesa das igualdades como prin


cípio da cidadania, encontra-se a educação. Destacada em diversos
estudos, seja como norte para a redução das discriminações e desi
gualdades, seja por razões políticas ou sociais, a educação é vista
como um direito social dos mais importantes para a cidadania, e um
exercício profissional.

Cury (2002) discute o direito à educação, à igualdade e à dife


rença, e defende a educação como uma dimensão fundante da cida
dania. Ao fazer uma análise teórica da evolução do direito à educação,
o autor aponta para a importância da racionalidade, isto é, da capaci
dade cognitiva do homem, necessária para a interação sobre os fatos
SUMÁRIO ao seu redor. Assim, é a educação que possibilita a mobilidade social,
e constitui-se como forma de obter a garantia de direitos, sendo um
pré-requisito para o exercício dos direitos civis, políticos e sociais. O
combate à ignorância e à efetivação da razão é que fazem com que
os indivíduos tenham consciência de que podem participar, como ci
dadãos, das tomadas de decisão: “o direito à educação passa a ser
politicamente exigido como uma arma não violenta de reivindicação e
de participação política” (p. 261). É somente por meio da educação
que as mudanças podem ter uma amplitude de fato.

150150
A EDUCAÇÃO E AS DESIGUALDADES
SOCIAIS NA PANDEMIA

Se pensarmos nas transformações decorrentes da globaliza


ção, observamos a integração cada vez mais intensa e mais dinâmica
das relações socioespaciais em nível mundial. Assim, as distâncias
hoje são virtuais, a difusão do conhecimento rompe barreiras antes
intransponíveis, com destaque para os aparelhos eletrônicos, sobre
tudo para a internet. Nesse novo panorama, o discurso sobre Direitos
Humanos, cidadania e democracia é legitimado mundialmente, e es
tes aspectos são, obviamente, positivos. Contudo, isso não significa
que a globalização pode nos conduzir a uma sociedade única, pois
esse processo também traz consigo a desigualdade social, na qual
a cultura, valores e princípios dos diferentes territórios acabam sen
do reproduzidos seguindo-se a ordem de uma ideologia dominante,
como característica do capitalismo, que exerce controle sob territó
rios menos favorecidos econômica e culturalmente.

Sem dúvida, a educação avançou radicalmente com o advento


das novas Tecnologias de Informação e Comunicação (TICs), mas esse
avanço é relativo. Atualmente, muitas pessoas já conseguem comprar

SUMÁRIO computadores a preços mais acessíveis do que há alguns anos. En


tretanto, na realidade brasileira, ainda fica evidente o contraste nas
condições de acesso à internet, que reflete a desigualdade econômica
e educacional no país. Kenski (2015), ao tratar sobre a evolução das
novas tecnologias no nosso país, chama a atenção para o fato de que:
Apesar de o Brasil já ter alcançado posições de destaque no
cenário internacional com relação à utilização da internet, a si
tuação do país ainda deixa muito a desejar. Há necessidade
de estratégia nacional para o uso da Banda Larga para sanar
muitos dos problemas existentes com relação à inclusão digital,
velocidade, qualidade e um custo altíssimo, mesmo nas regiões
mais desenvolvidas (p. 138).

151151
Tais aspectos têm sido trazidos à tona de maneira muito ex
pressiva, desde o início da pandemia causada pelo novo coronavírus.
Como fica a questão das desigualdades, escancarada na educação,
se pensarmos nas dificuldades do ensino remoto, que esbarra exata
mente na falta de acesso à internet, como aponta Kenski?

A despeito disso, em reportagem recente na Folha de São Pau


lo, dados apontam que, apesar de a prefeitura de São Paulo ter inves
tido 600 milhões em tablets com chips para os estudantes, cerca de
100 mil deles não conseguem se conectar por falta de sinal em vários
distritos da capital, e muitos, inclusive, nem aceitaram o equipamento.
Nessa matéria, a pesquisadora do departamento de Ciência Política da
USP, Lorena Barberia, afirmou que, para além dos direitos básicos de
cidadania, a internet também deveria ser um bem público.
Estas considerações nos remetem ao processo “em escada”
para a evolução da cidadania, como relata Saes (2016), no qual a con
quista de um direito é vista como um degrau, como um apoio neces
sário à conquista de outro direito, que lhe dê significado e concretude.
Tem a ver, também, com a complementaridade das políticas públicas,
conforme descreve Russo (2018). Trata-se de um direito a ser criado
para complementar o já existente, ou seja, quando um direito é criado,
se não se implantar outro que o complemente, o primeiro não se efeti
SUMÁRIO va. Em outras palavras, de nada adianta oferecer tablet com chip para
os alunos, e não complementar com um sinal de wi-fi de qualidade.

Nesse contexto, os professores também precisaram se reinven


tar para poderem se adequar ao ensino remoto, e se capacitar para
a utilização de plataformas digitais, reformulando suas práticas com
vistas a garantir um aprendizado efetivo, ainda que a distância. Contu
do, muitos alunos, sem acesso a recursos eletrônicos, têm se sentido
prejudicados e desmotivados, o que pode influenciar diretamente nos
rendimentos escolares, e, por consequência, nos índices dos sistemas

152152
nacionais de avaliação, independentemente do segmento educacio
nal, seja na Educação Básica, seja no Ensino Superior.
São muitos os vieses existentes neste período de mudanças de
correntes da pandemia. A seguir, interessa-nos trazer para esta discus
são as ações sob a perspectiva da gestão, quando esta se encontra in
serida em um ambiente de transformações, que demandam alternativas
rápidas, e que deem conta dos problemas que nos são apresentados.

GESTÃO E EDUCAÇÃO
EM TEMPOS DE MUDANÇA

Esperança também é uma forma de resistência!

(Edgar Morin)

A Administração ou Gestão, de forma mais moderna, é caracteri


zada por fazer com que as pessoas façam o que deve ser feito. Aparen
temente, observamos algo simples, como distribuir papéis e tarefas para
as equipes. Assim sendo, os administradores ou gestores não teriam
muito mais a acrescentar. Ledo engano, pois a administração passa por
mudanças constantes, e devemos afinar a sinergia da equipe, que nos
SUMÁRIO faz sentir que realmente a soma das partes é maior que o todo. O correto
é administração ou gestão? Qual a diferença entre elas?

Como Schein (1982) aborda, é muito difícil definir uma organi


zação. A figura de organizar está pautada no fato de que o indivíduo
sozinho não consegue ou é incapaz de atender a todas as suas ne
cessidades e desejos, uma vez que o ser humano não é uma ilha.
Assim, podemos entender que o termo organização leva ao esforço
concentrado e coordenado de diversos indivíduos em prol de um ob
jetivo comum, e esta coordenação de esforços nos leva à figura do
gestor da unidade escolar.

153153
Este gestor deve exercer a liderança da equipe, coordenando os
esforços na consecução de tarefas, com o objetivo de entregar melho
res pessoas à sociedade, de modo a facilitar o processo de ensino e
aprendizagem para que professores e professoras consigam desem
penhar o seu papel, fomentando e maximizando, assim, a promoção
do conhecimento, dentro de suas diversas matizes na unidade escolar.

ADMINISTRAÇÃO OU GESTÃO?

Aqui temos dúvidas entre os estudiosos das ciências organi


zacionais, pois os próprios dicionários trazem os dois termos como
sinônimos. Para diferenciarmos administração de gestão, podemos
dizer que a gestão está ligada às equipes, ao fluxo e ao planejamento
operacional em curto prazo, dentro da unidade de educação, enquan
to que a administração está ligada aos aspectos estratégicos da orga
nização, a médio ou longo prazo. Alguns autores também diferenciam
a gestão, apontando-a para as organizações privadas, ao passo que
a administração, para as instituições, está atrelada ao serviço público.
Na área das Ciências Sociais Aplicadas, temos as Ciências Organiza
cionais, e nestas encontra-se a gestão, ou seja, a gestão está inserida
SUMÁRIO na administração, assim como o operacional (Gestão – Curto prazo) e
o estratégico (Administração – Longo Prazo), visto que são os pilares
que fazem com que a empresa se perpetue ao longo do tempo.

Gerenciar equipes em tempos normais não é algo fácil. O dia


a dia operacional implica em gostarmos de conversar com pessoas,
procurarmos consensos entre as partes, construirmos pontes e deno
minadores comuns, e sermos solucionadores de problemas. Como em
qualquer projeto, teremos a escassez de recursos como companheira.
Assim, precisamos pensar não só na possibilidade da insuficiência de
recursos financeiros, humanos, como também na carência de tempo.

154154
Um dos grandes segredos da gestão é tentar obter o melhor
resultado com a sua equipe com um mínimo de recursos. Neste caso,
passamos ao objetivo de qualquer empresa, organização ou institui
ção, mas qual o objetivo de uma empresa?
Com base no senso comum, uma provável resposta, usual
para o capitalismo, seria a de que o objetivo de uma organização é ter
lucro. Contudo, podemos melhorar esta questão se a ela atrelarmos o
Triple Botton Line, ou o tripé da sustentabilidade, no qual observamos
as esferas Social, Ambiental e Econômica. Podemos perceber que o
lucro, ligado ao fator econômico, é apenas uma perna que deixa de
pé uma empresa, mas somente isto não é suficiente para uma orga
nização ser perene. Temos que pensar em sua manutenção ao longo
do tempo. Portanto, em uma definição mais ampla, dizemos que uma
instituição tem como objetivo maior a sua perpetuação com susten
tabilidade, com vistas ao meio ambiente, à sociedade e também a
resultados financeiros positivos.

Atualmente, temos o conceito ESG (Enviromental, Social Gover


nance) como uma evolução do conceito anterior, pois adiciona ao Tri
ple Botton Line a dimensão de governança, que, em última análise, ga
rante que a organização faça a coisa certa em prol do meio ambiente e
da sociedade, e se esta não adere às boas práticas de administração
SUMÁRIO
e governança, deve explicar por que não as faz; é o chamado Comply
or Explain, em tradução livre: Cumpra ou Explique.

A Gestão ou Administração são pautadas pelo ciclo PDCA


(Planejamento, Operacionalização ou fazer, do inglês Do, Checagem
e Ações corretivas). Para implementar este ciclo, nas atividades com
escassez de recursos, o gestor ou administrador se vê sempre à fren
te do processo de tomadas de decisão, que precisam ser comuni
cadas com rapidez, mas de forma democrática e participativa, por
mais que possam parecer antagônicos estes dois quesitos: reflexão
democrática e curto prazo. No ambiente externo, passamos por rápi

155155
das mudanças, o que pressiona o gestor por desempenho, tomadas
de decisão, gestão de recursos e equipes.

Atualmente, vivemos em um mundo VUCA (Volatility, Uncerta


ninly, Complexity and Ambiguity) ou VICA (Volatilidade, Incerteza, Com
plexidade e Ambiguidade). As decisões não são adotadas de forma
fácil, mas temos que sempre nos inserir neste contexto de ambiente
externo para a adoção da melhor opção possível, ou da que maximize
o retorno e/ou minimize a perda. O termo VUCA não é recente. Foi pri
meiramente utilizado pelo exército norte americano dos EUA, no final
da década de 1980, com o fim da Guerra Fria, e as transformações
pelas quais o mundo passava, deixando de ser dual (Comunismo x
Capitalismo) para apresentar interfaces de diversas concepções.

O ambiente externo é volátil, ou seja, muda muito depressa. A


volatilidade é a propriedade dos líquidos transformarem-se em gás ra
pidamente, como o álcool, por exemplo. Ao passar por essa volatilida
de, o ambiente testa a adaptabilidade do gestor, que não pode mais ter
o mesmo tipo de solução para todos os problemas; ao contrário, deve
pesar fora da caixa de um modo prático, tentando analisar o problema
em três dimensões externas a ele, visando adaptar-se e gerar um maior
número de possíveis caminhos para lidar com os problemas.

SUMÁRIO Incerteza na gestão moderna é outro item que precisa ser con
siderado nas decisões do gestor, pois o líder consegue ponderar os
impactos e probabilidades, mensurando o risco e adotando a decisão
de maior ganho ou menor perda individual ou coletiva. No entanto, na
incerteza, temos casos únicos que podem ser chamados de ‘cisnes
negros’, assim como mencionado por Nassim Tale, em seu livro de
mesmo nome. Cisne Negro, segundo Taleb (2015), são eventos atí
picos e não previstos, que podem ser positivos, como invenções ou
inovações que fomentam a evolução da sociedade, ou negativos como
guerras, epidemias, desastres naturais, entre outros.

156156
Estamos inseridos, também, em ambientes complexos com
múltiplas variáveis. Não observamos mais uma dualidade somente no
espectro decisório, pois temos um amálgama de decisões multiface
tadas. A Teoria da Complexidade nos leva à compreensão de que não
existe linearidade certa, como explica Morin (2000):
[...] a necessidade de pensar em conjunto na sua complemen
taridade, na sua coerência e no seu antagonismo as noções
de ordem, de desordem e de organização obriga-nos a res
peitar a complexidade física, biológica, humana. Pensar não é
servir às ideias de ordem ou de desordem, é servir-se delas de
forma organizadora, e por vezes desorganizadora, para con
ceber nossa realidade [...]. A palavra complexidade é palavra
que nos empurra para que exploremos tudo e o pensamento
complexo é o pensamento que, armado dos princípios de or
dem, leis, algoritmos, certezas, ideias claras, patrulha no ne
voeiro o incerto, o confuso, o indizível (pp. 180-181).

Ainda em relação ao mundo VUCA, encontramos a ambiguida


de, que, em seu sentido mais amplo, pode ser interpretada de diversas
formas. Como no mundo complexo não possuímos somente uma ótica
para interpretar algo, neste caso, temos ambiguidades em que uma ver
são não exclui a outra. Na interpretação de cenários para o planejamento
estratégico ou no dia a dia dentro do planejamento operacional, a leitura
de cenários é muito importante para a administração e gestão, e, dentro
SUMÁRIO desta, está inserida a ambiguidade, o que nos leva a um grau maior de
dificuldade na busca de arquiteturas de soluções para problemas.
Um dos maiores trunfos do gestor de unidade educacional é exer
citar todos os dias a liderança, que deve apresentar, no cenário VUCA,
vários quesitos dentro da Liderança Situacional, ou seja, não podemos
apresentar uma tipologia de liderança. Na Liderança, todos querem ser
um líder democrático, admirado pelos colaboradores, mas a liderança
muitas vezes nos obriga a tomadas de decisão rápidas, o que não nos
permite, na maioria das vezes, momentos de reflexão e debate.

157157
Uma boa analogia para entendermos o caso da Liderança Situa
cional é aquela em que exercitamos a liderança democrática e debate
de forma reflexiva de todas as decisões com a equipe, porém, se esti
vermos no quarto andar de um prédio em chamas, não teremos tempo
de sentar e debater de forma reflexiva com a equipe qual a melhor
alternativa a se adotar. Teremos que confiar em nossa experiência e
feeling para adotar a melhor forma de sair daquela situação.

O estilo de liderança é mutável. Muitas vezes, precisamos tomar


decisões top dow, ou seja, de cima para baixo, por pura falta de tempo
para realizar um debate amplo com a equipe, mas, mesmo que seja de
forma breve, é sempre bom ter um comitê de crise instaurado e com
reuniões periódicas, até em épocas de bonança. No planejamento, ob
servamos a máxima de que estudamos diversos cenários, e, ainda que
nenhum deles ocorra, ao fazermos essa análise, teremos a construção
ferramental de respostas para cenários intermediários entre um e outro.

A Gestão de uma unidade escolar requer uma pessoa com tena


cidade, mas o que é a tenacidade? Trata-se de uma propriedade dos
materiais, que nos dá a ideia da capacidade de energia que determinado
material pode absorver antes de se romper. Por analogia, o gestor deve
ser uma pessoa perseverante, que não desiste facilmente ao primeiro
revés encontrado. A tenacidade, portanto, está ligada à obstinação na
SUMÁRIO
busca por soluções de problemas de forma criativa e democrática.

Diferente da tenacidade, temos a resiliência como capacidade


ou propriedade física de certos materiais que, após deformados, con
seguem voltar à forma original. A resiliência apresenta certa conota
ção junto à perseverança e obstinação, na busca de soluções criativas
para a organização e para a equipe, mas, quando nos referirmos ao
líder, esta propriedade ou característica está ligada ao fato de ele se
adaptar às mudanças de forma constante, superar obstáculos na roti
na diária e suportar as pressões de decisões difíceis.

158158
Observamos estas características de liderança dentro da Ges
tão Ágil, e um dos principais frameworks deste tipo de gestão é a Lide
rança Antifrágil, que, de forma sintética, podemos dizer que é o líder
que oferece melhores resultados para a equipe em momentos de crise.

Há diversos métodos de gestão de unidades escolares. Um de


les, muito utilizado na atualidade, é a Gestão Ágil, que contém como
principais frameworks ou componentes: Execução, Estratégia, Inova
ção e Gestão. No quesito Execução, encontramos o Scrum e o Kan
ban; na Estratégia, temos o OKR; para inovação, utiliza-se o Design
Thinking, e, no caso da Gestão, temos a Liderança Antifrágil. O quadro
1, a seguir, explicita essa estrutura:

Quadro 1 – Componentes da Gestão Ágil.

SUMÁRIO
Fonte: elaborado pelos autores.

O Sistema Lean Manufacturing surgiu na evolução dos siste


mas industriais, passando do artesanal para o sistema de produção
massificado na pós-revolução industrial. Estas transições entre siste
mas são sempre marcadas por crises de todos os tipos. Sob a ótica
de Manfredini e Suski (2010), as alterações na cultura das organiza
ções e de seus processos produtivos e de gestão têm origem em
problemas urgentes, causados por diversos fatores, como aumento
da demanda, redução da demanda, competição agressiva, influên
cias para o consumo, entre outros.

159159
Neste momento, traçamos aqui um paralelo com a gestão, em
bora cientes de que uma unidade escolar não é uma fábrica, e alunos
não são produtos. Na educação, tem-se uma visão de que a unidade
escolar forma pessoas multifacetadas e com múltiplos saberes. Den
tro das diversas fases escolares, observamos um enorme impacto e
influência na vida futura dos alunos, o que, muitas vezes, moldará o
caráter e a ética nas relações destas pessoas na sociedade. A gestão
da unidade escolar, enquanto trato junto aos docentes, administrado
res e alunos, deve ser democrática e reflexiva, abrindo espaço para
a expressão máxima da comunidade escolar, e dando voz aos seus
anseios e desejos na construção e fomento do conhecimento.

O Lean Manufacturing, chamado de Sistema Toyota de Produ


ção, teve como origem a grande crise no Japão no fim da Segunda
Guerra Mundial, e precisava de alterações urgentes, pois, do contrário,
sucumbiria mais uma vez. Estes modelos têm o enfoque centrado na
criação e desenho de um fluxo de processo de produção limpa, que
minimiza os desperdícios e reduz também o tempo entre o pedido
e a entrega ao cliente final. Temos, com este modelo, a redução de
sete dos principais problemas geradores de desperdícios no processo
produtivo: Tempo de Espera, Superprodução, Excessos no Processo
Produtivo, Controle de Inventário, Transporte, Movimentações e Defei
tos (MANFREDINI; SUSKI, 2010, p. 5).
SUMÁRIO
A chamada Gestão Ágil teve sua origem na Cultura Lean para
evitar o desperdício, e se iniciou com as ideias desenvolvidas por Hiro
taka Takeuchi e Ikujiro Nonaka, e disseminadas no artigo The New New
Product Development Game, publicado em 1986, na Harvard Business
Review, fixando a tese de que uma produção interativa, e que divide
o projeto em fases e microfases, com entregas validadas e refinadas
a cada movimento, seria mais ágil e ofereceria mais valor ao cliente
(TAKEUCHI; NONAKA, 1986).

160160
A Gestão Ágil, desde 2009, vem alterando a maneira de pensar
dos gestores em todas as áreas. Ser ágil não significa fazer com maior
velocidade ou mais rápido; ser ágil está ligado a se adaptar rapida
mente a mudanças, e entregar sempre maior valor ao cliente. Sob a
ótica de Welch (2003), não há nada mais ineficiente do que fazer mais
rápido aquilo que não precisa ser feito.

O Scrum não é uma sigla, mas sim uma jogada de rugby, na


qual todos os jogadores, de cabeça baixa, se abraçam e disputam
a posse em volta da bola, ou seja, uma equipe unida indo na mes
ma direção. Caso pudéssemos criar um acrônimo em português para
Scrum, pedindo aqui uma licença poética às aldravias portuguesas,
poderia ser assim demonstrado:

Figura 1 – SCRUM.

SUMÁRIO Fonte: elaborada pelos autores.

Conforme Sutherland (2020), o termo Scrum foi criado em 1993,


e formalizado por seus dois criadores, Jeff Sutherland e Ken Schwaber,
em 1995. Este método, que se tornou comum na época, inicialmente
veio para resolver um problema de desenvolvimento de softwares que
não apresentassem uma grande taxa de falhas, haja vista que estas
impregnavam os processos de evolução.

Esta metodologia na Gestão Ágil tem, então, no Scrum um dos


seus principais componentes básicos de execução. Sua origem está

161161
calcada na área de sistemas e programação. O seu objetivo maior é
o de entregar um projeto de programa factível e atualizado no menor
prazo possível. Quando se pensa na entrega de um programa ou sis
tema, temos que considerar a rapidez com que as mudanças ocorrem.
Os programadores e gestores de projetos não poderiam ficar meses
trabalhando para entregar uma ferramenta, que no momento da sua
entrega poderia não ser mais útil, dada a desatualização. O Scrum
vem como resposta para a pergunta de como implementar uma me
todologia que fizesse sentido de entrega no prazo, e um sistema ou
programa atualizado para o contratante e para o fornecedor.

O Kanban auxilia a transparência no Scrum como sendo uma


ferramenta de gestão organizada, e baseada em elementos visuais
(LIFF; POSEY, 2004). Todos os envolvidos têm a visão global do que
está acontecendo e o que falta ser feito, bem como os gaps existentes
no processo, como prazos, etapas faltantes, recursos aplicáveis, entre
outros. Toda a equipe tem todas as informações em um único quadro,
conforme demonstrado na Figura 2, a seguir:

Figura 2 – Kanban em Home Office.

SUMÁRIO

Fonte: elaborada pelos autores.

162162
Em relação ao OKR, há um método de gerenciamento que foi
disseminado dentro do Google, e organizado através de objetivos
e resultados-chave que se almejam. Tem origem no acrônimo Ob
jectives and Key Results. Os resultados-chave podem ser encarados
como metas ou pontos de controle que auxiliarão o atingimento do
objetivo principal, podendo dividir um grande projeto em micro eta
pas, tendo indicadores-chave e pontos que levam à consecução do
principal objetivo do projeto.

Na construção de inovação, dentro das organizações, temos o


Design Thinking, que pode ser compreendido dentro das corporações
como “Pensar como um Designer” ou “Pensamento do Design”. Tem
sua disseminação com o CEO da Ideo, Tim Bronw. Na empresa de con
sultoria em design, ele destaca a diferença entre ser um designer e pen
sar como um designer para buscar soluções criativas e inovadoras para
problemas. Tem como base encontrar uma solução através da coletivi
dade dos colaboradores e experiência do consumidor, podendo ser di
vidido nas fases de: imersão, ideação, prototipagem e desenvolvimento.

O matemático Nassim Taleb contribui para a gestão com dois li


vros que podem ser referência para lideranças em tempos reconhecida
mente como VUCA (sigla em inglês) ou VICA (sigla em português - Volati
lidade, Incerteza, Complexidade e Ambiguidade), como já mencionado.
SUMÁRIO No primeiro livro, intitulado de “A Lógica do Cisne Negro”, Taleb (2008)
alega que a percepção é muito limitada no aprendizado baseado em
observações ou experiências, e na sustentação frágil do conhecimento.
No livro “Antifrágil: Coisas que se beneficiam com o Caos”, como o mun
do VUCA em que todos estão inseridos, o frágil é aquilo que se quebra
com facilidade, mas o seu oposto seria o antifrágil, ou seja, na liderança
antifrágil há líderes que possuem melhor performance em ambientes de
alta volatilidade e complexidade (TALEB, 2013). Vale ressaltar que não é
possível confundir aqui o antifrágil com o resiliente, que suporta diversos
choques e permanece o mesmo. O antifrágil é, na verdade, aquele que
se torna cada vez mais forte quanto mais caótico é o ambiente.

163163
CONSIDERAÇÕES FINAIS

Com a pandemia, passamos a viver outros tempos. Um con


ceito muito utilizado neste momento é o termo “reinventar”. De fato,
frente aos desafios presentes, decorrentes das transformações causa
das pelo novo coronavírus, precisamos nos adequar e pensar novas
formas de ação, para darmos conta de todas as demandas presentes
nos diferentes setores e nos diversos ambientes, sejam eles políticos,
econômicos, históricos, culturais ou educacionais.

Contudo, essa reinvenção não pode ocorrer sem antes nos de


bruçarmos sobre a necessária reflexão para tudo o que está ocorrendo
ao nosso redor. Em se tratando de educação, não podemos deixar de
considerar, como gestores, que uma grande parte da população, ex
cluída por suas condições socioeconômicas desfavoráveis, está inse
rida em um panorama de desvantagens e desafios, que nos remetem
à responsabilidade de buscar resgatar seus direitos à educação. Por
essa razão, trazer para esta discussão as questões dos direitos sociais
e das desigualdades constitui-se em um compromisso ético-político,
pois é preciso ter um olhar atento a toda a comunidade escolar, sobre
SUMÁRIO tudo, às camadas mais vulneráveis neste cenário.

Ao mesmo tempo, principalmente nos momentos permeados


de complexidade, volatilidade, incertezas e ambiguidades, considera
mos que devemos exercer o nosso importante papel, procurando so
luções de forma rápida para os problemas emergentes. Nesse sentido,
buscamos apresentar propostas e conceitos atuais relativos à gestão,
que precisa estar preparada para o enfrentamento de tais desafios, de
modo a adequar-se a essas transformações.

164164
REFERÊNCIAS
ARRETCHE, Marta T. S. Emergência e Desenvolvimento do Welfare State:
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SUMÁRIO

166166
Capítulo 7

Projetos de vida de professores


frente à pandemia da covid-19:
entre sentidos e significados

Valéria Arantes

Beattriz Guedes de Seixas


7
Valéria Arantes
Beattriz Guedes de Seixas

Projetos de vida de professores


frente à pandemia da covid-19:
entre sentidos e significados

DOI: 10.31560/pimentacultural/2021.107.167-188
SUMÁRIO

“Quando a situação for boa, desfrute-a. Quando a si


tuação for ruim, transforme-a. Quando a situação
não puder ser transformada, transforme-se”.

Viktor Frankl

168168
A pandemia de Covid-19 modificou, de maneira repentina, a ro
tina da maioria da população mundial. Para prevenir a transmissão do
coronavírus, o isolamento social foi recomendado por médicos e espe
cialistas, fechando-se escolas, universidades, academias, bares, lojas,
shoppings e demais locais cujo serviço é considerado não essencial.
Enquanto uns puderam migrar para o home office, outros ficaram desem
pregados. Muitos, ainda, não tiveram escolha senão continuar em seus
serviços presenciais e se expor ao vírus, como os motoristas de ônibus,
por exemplo. As aulas passaram a ser on-line, e parte do corpo estudan
til do país ficou de fora da migração para o ambiente digital, refletindo
e acentuando a desigualdade presente em nosso sistema educacional.
As mudanças, é claro, não foram só no trabalho, escola e la
zer, tampouco param na aquisição de máscara e no uso constante de
álcool em gel. Além das novidades facilmente reconhecidas quando
olhamos ao redor, a pandemia também tornou diários os temas não
tão concretos: o medo, o luto e a ansiedade. Viver com as notícias
sobre hospitais lotados, o aumento incessante do número de mortes,
a perda de pessoas queridas, sem a chance de se despedir, e ainda
com outros sofrimentos psicológicos, oriundos da crise sanitária, não
é uma situação para a qual um dia nos preparamos.

Embora a crise sanitária, iniciada em 2020, provoque sensações


SUMÁRIO inéditas – como as citadas anteriormente – não é a primeira vez na
história da humanidade que um evento de comparáveis dimensões
acontece, pois esse tipo de situação já ocorreu a diversas gerações.
Em seu livro “Em busca de sentido”, o psicanalista Viktor Frankl conta
o que viveu como prisioneiro em campos de concentração durante a
2ª Guerra Mundial, e analisa as percepções que fez de si mesmo e de
seus companheiros naqueles três anos de grandes sofrimentos. Diante
da violência, do trabalho pesado, do frio intenso, da fome, da epidemia
de tifo exantemático e da falta de notícias sobre seus familiares e ami
gos, muitos prisioneiros entregavam-se ao desespero e ao desânimo.
Outros mantinham-se firmes e não ousavam desistir.

169169
Após três anos de enormes sacrifícios nos campos de concen
tração, apoiando-se em suas reflexões e observações, e acreditando na
importância delas, Frankl compreendeu que a busca de sentido na vida
é a principal força motivadora no ser humano. Aqueles que tinham cons
ciência sobre o “porquê” da sua existência, o motivo de não poder ser
substituído ou representado por outra pessoa, conseguiam suportar me
lhor a situação em que estavam, ainda que ela fosse carregada de dor.

Citando uma frase de Nietzsche, em diversos momentos de


sua obra, Frankl enfatiza que “Quem tem por que viver aguenta quase
qualquer como”, inclusive nos campos de concentração, sem saber o
prazo para a libertação, e até mesmo se esta sequer aconteceria algum
dia. Frankl deu início ao que viraria uma coletânea de estudos sobre o
sentido da vida, que é alimentado até os dias de hoje.

Ainda que a comparação entre o que os prisioneiros viveram


nos campos de concentração e o que experimentamos em função
da pandemia de Covid-19 tenha muitas limitações, em alguns pontos
ela é possível. Nestas situações atípicas, e sem um prazo para o fim,
convive-se diariamente com a morte e/ou com notícias a respeito, e a
percepção da realidade e do tempo sofrem alterações. O futuro, por
sua vez, parece mais imprevisível do que nunca. O bem-estar físico,
emocional e psicológico são colocados à prova, e, curiosamente, al
SUMÁRIO guns lidam com essas adversidades melhor do que outros.

Além da dimensão existencial, a pandemia lançou luzes, pelo


menos no Brasil, para o sistema educacional. Muitos pais e respon
sáveis, que até então ignoravam o que seus filhos faziam na escola,
passaram a acompanhar de perto as suas aulas e atividades remotas.
O trabalho dos professores ganhou evidência, e muitos passaram a
considerá-los verdadeiros heróis. A educadora que transformou a pa
rede de sua cozinha em um quadro para dar aula on-line viraliza nas
redes sociais, o que não seria necessário caso o seu trabalho fosse de
fato valorizado, e não lhe faltassem recursos.

170170
Quando as salas de aulas deixam de ser o ambiente onde as
trocas entre docentes e discentes acontecem, aqueles que possuíam
dispositivos eletrônicos com acesso à internet passam a ter aulas
remotas. As carteiras das instituições escolares foram substituídas
pelas cadeiras de casa, e o contato físico deu lugar às telas. Nesse
sentido, quem experimentou a educação remota, seja como aluno
ou professor, se viu diante de novas – talvez nem tão novas assim –
problematizações. Enquanto alguns questionam a eficácia das aulas
expositivas, outros contestam o sentido de uma avaliação que é fa
cilmente realizada com consulta, e não exige esforço intelectual. Os
alunos, privados do encontro com seus colegas e da divisão entre
o espaço acadêmico e o familiar, passam a ter, por outro lado, mais
liberdade sobre o que fazer durante os encontros síncronos. Os pro
fessores, por sua vez, se veem diante da necessidade e urgência em
aprender a usar recursos tecnológicos com os quais tinham pouca ou
nenhuma intimidade, além de muitos outros desafios.

É claro que a pandemia e o isolamento social impactaram os 2


milhões de professores e 47,3 milhões de alunos brasileiros13 de for
mas muito diversas. Para além das diferenças entre escolas públicas e
privadas, classes socioeconômicas e localização – cidade ou campo
e centro ou periferia –, ou seja, das diferenças no contexto desses
SUMÁRIO protagonistas, os sentimentos que emergem desse cenário e os signi
ficados atrelados a ele são múltiplos.

Em entrevistas realizadas por nós com docentes14, em meio à


pandemia de Covid-19, chamam-nos atenção, em especial, a diversi
dade de significados atribuídos pelos participantes às adversidades
enfrentadas no contexto da pandemia. Enquanto uns se animam e
enxergam no contexto uma possibilidade para repensar o seu fazer
13 Dados referentes à Educação Básica (Censo de 2020).
14
Projeto coordenado pela Profa. Valéria Arantes, e financiado pelo Instituto Iungo, denomi
nado Valores e Projetos de Vida de estudantes de licenciatura, de pedagogia e de profissio
nais da educação (ARANTES, 2020).

171171
docente, relatando que se sentem determinados, confiantes, confor
táveis, felizes, esperançosos, otimistas e motivados, outros revelam
grande desânimo e baixas expectativas sobre o futuro, evocando sen
timentos de tristeza, preocupação, insegurança, angústia, ansiedade,
apreensão, medo, frustração e cansaço. Esse contraste nos lembra o
que Viktor Frankl observou nos campos de concentração.

Com dados coletados em diversos estados e municípios brasi


leiros, durante o primeiro semestre de 2021, a variedade de respostas
foi constatada inclusive entre participantes de uma mesma região e
rede de ensino, indicando que esses fatores não atuam sozinhos na
atribuição de significados estabelecidos pelos professores. Dessa for
ma, parece-nos oportuno olharmos para aspectos que não são visíveis
ou palpáveis, e que dizem respeito ao mais íntimo dos docentes.

POR QUE FALAR EM PROJETOS DE VIDA?

A busca pelo sentido da vida acompanha o ser humano há mui


tos séculos, sendo objeto de reflexões na filosofia, na ciência e na
religião. Acreditando que a busca de sentido na vida é a principal força
motivadora no ser humano, o psicanalista Viktor Frankl, mencionado
SUMÁRIO
no início deste capítulo, fundou a terceira escola vienense de psicote
rapia. Nomeada Logoterapia (“logos” em grego significa “sentido”), ao
concentrar-se no sentido da existência humana, e na busca da pessoa
por este sentido, contrastou a vontade de prazer da qual parte a psi
canálise freudiana com a vontade de poder da psicologia adleriana.

Levando os fundamentos dessa vertente da psicologia para a


prática clínica e social, Frankl e seus seguidores eliminaram os ca
sos de suicídio em escolas, mostrando a força da busca por sentido
na promoção da saúde mental e na prevenção do que a logoterapia

172172
chamava de “vazio existencial”. Tendo o terapeuta o papel de mostrar
ao paciente que a vida nunca deixa de ter um sentido, a busca por ele
faz parte tanto de cenários habituais quanto de situações trágicas e
difíceis, incluindo o fim da vida.

A doutrina terapêutica de Frankl foi um marco importante para


uma série de estudos sobre propósito e sentido15, que perduram até os
dias de hoje. Nos anos 2000, com o surgimento da psicologia positiva,
os trabalhos no campo da psicologia ganham mais notoriedade. Uma
das descobertas dessa nova área foi o paradoxo de que as pessoas
mais felizes raramente são aquelas que fazem muito esforço para al
cançar a satisfação. O dinheiro –exceto no caso da pobreza extrema–,
o status, a fama e similares, que alimentam o ego, não tornam as pes
soas significativamente mais felizes, provocando apenas alterações po
sitivas temporárias. É o comprometimento com algo que a pessoa con
sidere atraente, desafiador e envolvente, especialmente quando isso
gera uma contribuição para o mundo, que importa para a felicidade.

William Damon, professor da Universidade de Stanford (Califór


nia-EUA), percebeu que, para algo mobilizar o indivíduo e, ao mesmo
tempo, lhe trazer satisfação e felicidade, deveria atender tanto aos in
teresses pessoais do sujeito quanto aos valores oriundos da cultura
na qual ele está inserido, incluindo a influência das pessoas que estão
SUMÁRIO ao seu redor. E é nessa interseção, entre os interesses individuais e
coletivos, que está o que Damon chama de projeto de vida16.

15 Em seu livro, Frankl utiliza sentido (meaning) e propósito (purpose) como sinônimos.
16
Utilizamos o termo “projeto de vida” como tradução para purpose, conforme proposta justifi
cada por Araújo no prefácio do livro de William Damon: “O que o jovem quer da vida? Como
pais e professores podem orientar e motivar os adolescentes”, publicado no Brasil, em 2009.
Araújo explica que os significados de purpose e de projeto se aproximam por ambos desig
narem uma das condições para dar sentido ético à vida das pessoas e à sociedade. Com a
necessidade de qualificar esse projeto, de modo que ele se torne o centro dos interesses de
uma pessoa e seja constituinte de sua identidade, o complemento “de vida” (anteriormente
optou-se por “vital”) vem complementar o que Damon define como purpose.

173173
Ressignificando o que Frankl sinalizou como uma busca pela
autotranscedência, ou seja, por algo que esteja orientado e ordenado
para além de si mesmo, Damon incorpora o sentido ético à definição de
projeto de vida. Segundo ele, projeto de vida é “uma intenção estável
e generalizada de alcançar algo que é ao mesmo tempo significativo
para o self 17 e gera consequências no mundo além do self” (DAMON,
2009, p. 53). Sendo o professor Damon considerado, atualmente, o
autor mais relevante no mundo sobre projetos de vida, a definição dele
é bastante aceita e adotada entre os pesquisadores da temática.
Em seu livro “Purpose in Life - A Critical Component of Optimal
Youth Development”, publicado em 2014, Kendall Bronk faz um levan
tamento do estudo científico do conceito de projeto de vida (purpose).
A autora, membro do grupo de pesquisa do professor Damon, aponta
que a maioria das definições de projeto de vida, tanto as antigas como
as mais atuais, apresentam três elementos-chave: compromisso (com
mitment), direcionamento ao objetivo (goal-directedness) e significado
pessoal (personal meaningfulness).

Bronk também chama a atenção para o fato de Frankl sugerir


um quarto componente: o foco em impactar o mundo além do self (the
beyond-the-self component). Trabalhar em direção a um objetivo pessoal
mente significativo, e não centrado exclusivamente no sujeito, ou seja,
SUMÁRIO
que impacte também a família, a comunidade ou o país, por exemplo, é
uma forma de estar ativamente engajado no mundo além de si mesmo.
Esse quarto componente, como podemos ver, está presente na definição
do professor Damon, assim como os outros três elementos-chave.

Matthew Bundick (2009), que também trabalhou ao lado de Da


mon, sistematizou as ideias do professor e defendeu que o projeto de vida
só pode ser assim compreendido se contemplar os seguintes aspectos:

17
Do inglês, a palavra self refere-se à dimensão do eu, das características individuais, persona
lidade e interesses do próprio sujeito. No presente texto, optamos por manter o termo original
pela falta de um vocabulário na língua portuguesa que expresse o mesmo significado.

174174
1. Estabilidade ao longo de certo período, ainda que possa sofrer
alterações e ajustes;

2. Objetivos de longo prazo que operam a vida do sujeito, articu


lando múltiplas metas concretas;

3. Ser organizador e motivador da vida do sujeito, orientando de


cisões, objetivos de curto prazo e o engajamento em atividades
necessárias para a sua concretização.

Em pesquisa com educadores altamente engajados e reconhe


cidos publicamente por seus trabalhos voltados para a educação, Parra
(2018) percebeu que nem sempre as ações do sujeito, que foram de
finindo o seu percurso, eram precedidas por uma intenção; a intenção
poderia nascer da ação, em vez do contrário. Mesmo que, a priori, al
guns deles não planejassem atuar na educação, quando se veem neste
lugar e, ao longo do tempo, experienciam situações que fortalecem os
seus valores e despertam bem-estar, desenvolvem um significado para
o que fazem, o que passa a constituir a sua identidade. Nesse proces
so, o envolvimento com a educação começa a atuar, integrando as di
mensões pessoal, profissional e social das vidas desses professores, o
que lhes proporcionava grande prazer e satisfação. Essa pesquisa nos
mostra que o processo de construção dos projetos de vida nem sempre
SUMÁRIO acontece de forma linear, e que este não é um processo simples.

Partindo da definição de Damon, e a ela somando as suas pró


prias descobertas, Parra compreende o projeto de vida como “um
conjunto dinâmico de intenções e ações que se constroem e se trans
formam ao longo da vida levando uma pessoa a dar sentido a sua
existência e as suas atividades cotidianas a partir da construção de um
laço afetivo com o mundo” (PARRA, 2018, p. 58).

É importante ressaltar que um projeto de vida pode ter sentido


ético sem ser “heroico”, ou seja, sem impactar uma sociedade inteira

175175
ou incluir ações corajosas e arriscadas. Podemos encontrar projetos
de vida com sentido ético na rotina que permeia a vida comum, em
uma mãe que cuida de seu filho, em um professor que ensina seus
alunos ou em um médico que trata os seus pacientes.

Outro ponto que vale a pena frisar é que não é a profissão de


uma pessoa que determinará se ela tem ou não um projeto de vida.
Assim como existem cardiologistas, por exemplo, que se sentem reali
zados com o que se prestam a fazer, é possível que outros indivíduos
com a mesma profissão, seja a sua carreira curta ou longa, sintam
-se infelizes, e desejem mudar de ocupação. Podemos estender esse
exemplo para as outras áreas: advogados, professores, motoristas,
dançarinos, atletas, economistas, artistas etc. O que vai fazer a dife
rença é o sentido que aquilo tem para a pessoa, e se o significado que
ela atribui orienta e motiva as suas ações diárias. O projeto de vida é a
resposta às questões “Por quê? Por que estou fazendo isso? Por que
isso é importante para mim?”. Ele é a razão dos objetivos e motivos
imediatos que orientam a vida diária.

Perguntas como “Quem eu quero ser? O que quero fazer? Que


contribuição posso oferecer ao mundo? Para que estou aqui?” estão
presentes no pensamento da maioria dos jovens de hoje em dia, e
não sem razão. Se, num passado não muito distante (e em algumas
SUMÁRIO
culturas mais do que em outras), muitos jovens já tinham clareza sobre
onde iriam morar, quais seriam suas ocupações e com quem iriam se
casar, as perspectivas de vida de um jovem no mundo de hoje estão
cada vez mais incertas. As possibilidades são incontáveis, sem fechar
os olhos, é claro, para o fato de que os obstáculos que compõem o
caminho de cada jovem estão intimamente relacionados com o seu
contexto social e econômico. Para muitos, o leque de futuros possíveis
é mínimo. Entre aqueles que se veem no lugar de fazer escolhas, há
jovens optando por mudar de país, possuir mais de uma fonte de ren
da e não se casar, enquanto outros passam por longos períodos de
questionamentos e de autodescoberta.

176176
Mas esse assunto não mobiliza apenas os jovens. Muitos adul
tos se encontram desanimados com o caminho em que estão, e não
possuem a menor ideia de quem são ou do que querem fazer. E como
apontamos anteriormente, essa insatisfação não depende da ocupa
ção do adulto, mas relaciona-se com o que vem de seu íntimo. E com
os professores não é diferente.

PROJETOS DE VIDA DE DOCENTES

A baixa atratividade da carreira docente tem se tornado objeto


de preocupação nos últimos anos. Fatores como falta de reconheci
mento social, má remuneração, violência nas escolas, precarização e
flexibilização do trabalho docente, falta de apoio familiar aos alunos,
jornadas de trabalho com múltiplos empregos etc. fazem poucos jo
vens se interessarem em seguir a profissão docente.

A pouca procura pelos cursos de Pedagogia e Licenciatura, o


número de vagas na graduação ser maior que a demanda e a alta eva
são nos cursos de formação de professores (média de 38%), segundo
Araújo et. al. (2020), é influenciada por outro fator além dos listados aci
ma. De acordo com os pesquisadores, “as universidades e faculdades
SUMÁRIO
não vêm cumprindo o seu papel de oferecer uma formação docente
coerente com os objetivos educacionais almejados e legitimados pelas
sociedades atuais” (ARAÚJO et. al., 2020, p. 60).

Se, para muitos jovens, atuar em sala de aula não faz parte de
suas escolhas, temos também aqueles que abraçam a profissão do
cente, constroem longas carreiras, e sentem-se felizes e realizados com
suas escolhas. Apesar disso, é preciso reconhecer que, para além dos
sentimentos envolvidos, a escolha profissional é um processo comple
xo, que envolve aspectos culturais, econômicos, sociais, políticos etc.

177177
Muitas mulheres, no passado e ainda no presente – embora isso venha
mudando –, tornam-se professoras para ter uma fonte de renda e pela
jornada de trabalho, vislumbrando conciliar a profissão com os afaze
res domésticos e a maternidade. A grande presença de mulheres na
docência possui relação também com a crença popular de que elas,
por natureza, são mais aptas para essa função do que os homens. Às
mulheres ainda é delegado o papel de cuidadoras, o que constatamos
no uso frequente do vocativo “tia” em vez de “professora”.

Para além dos diversos aspectos que envolvem a escolha da


profissão docente, uma vez tomada a decisão e exercida sua prática,
vemos professores infelizes, e planejando sair das salas de aula, mas
outros demonstrando satisfação e bem-estar, e, ainda, aqueles engaja
dos em aprender mais a cada dia para fazer o melhor trabalho possível.

Ainda que muitos profissionais já refletissem diariamente sobre


os significados que atribuem ao seu trabalho, a pandemia intensifi
cou essas reflexões. As mudanças na rotina, não estar na escola e
não ter contato físico com os alunos e colegas de trabalho despertou
inúmeros e complexos sentimentos nos profissionais da educação. A
partir das narrativas de mais de dois mil professores que participaram
de nossa pesquisa, cujo objetivo era investigar os projetos de vida de
docentes brasileiros, aproximamo-nos do universo cognitivo-afetivo
SUMÁRIO desses profissionais e tivemos a oportunidade de conhecer mais a
fundo como a terrível crise sanitária que estamos atravessando tem
impactado suas vidas e seus projetos futuros.

Entre as falas coletadas, chama a nossa atenção a variedade


de pensamentos, atitudes, emoções e significados que um mesmo
evento – a pandemia e suas implicações – provocou nos entrevistados.
Sem a intenção de ocasionar um reducionismo nos relatos, nos atreve
mos a trazer trechos de alguns deles, que ilustram a diversidade dos
múltiplos aspectos evocados nas entrevistas.

178178
Da mesma forma que os jovens mencionados há pouco passam
por grandes períodos de questionamentos e autodescoberta, sem sa
ber o que querem ser, fazer e para quê estão aqui, uma situação seme
lhante foi relatada pelos docentes. Ao relacionarem a pandemia com a
falta de planos para o futuro, e trazerem discursos desesperançosos,
alguns docentes aparentam não ter encontrado um sentido para o que
fazem, sugerindo que se veem sem rumo.

Fazendo referência à crise sanitária, uma professora nos revela:


“Ultimamente estou desmotivada. No momento, estou sem inspiração,
estou sem projetos”. Além da falta de motivação, a preocupação re
sultante do pensamento no futuro parece paralisar esta outra docente:
“Diante do momento em que estamos vivendo, fica difícil ter planos. Me
sinto preocupada em como será, se estarei aqui num futuro próximo”.

O cenário adverso também colocou os sonhos e planos de al


guns professores à prova, indicando certa dúvida em relação ao ca
minho que eles vêm trilhando: “Sinceramente, diante do cenário que
estamos vivendo, estou refletindo bastante, revisitando meus sonhos,
meus objetivos e planos. Eu me sinto um pouco insegura e perdida
diante de tudo que estamos vivendo, pois muitas coisas e concepções
estão sendo postas à prova a cada dia, e me sinto vivendo um dia de
cada vez, aguardando na esperança de melhores dias”.
SUMÁRIO
Enquanto alguns docentes sentem-se perdidos, outros demons
tram ter certeza do que querem, e, principalmente, do que não querem:
“Para a realização de meus objetivos e planos, pretendo para um futuro
não tão distante desligar-me do trabalho que exerço. Um projeto de
vida, de forma saudável, exercitando a memória, ao fazer algum curso,
que não esteja ligado ao meu trabalho”. Essa professora afirma com
clareza que para ela ter satisfação é preciso afastar-se do seu lugar
atual, sem mencionar o porquê disso.

179179
Também vimos professores justificando que planejam dedicar
-se a outros campos por estarem descontentes e desmotivados com a
área da educação: “Ando bem descontente com o entorno da educa
ção, o que vem me desmotivando muito. Tenho o desejo de sair da ins
tituição pública, e trabalhar a arte e educação vinculadas a minha outra
área de atuação, que é a clínica psicanalítica. [...] [Tenho] investido em
ferramentas para fortalecer a minha outra área de atuação”.

A saída que muitos docentes apontaram para solucionar o desâ


nimo de trabalhar com a educação é a aposentadoria: “Meu objetivo é
me aposentar, me sinto desanimada em saber o tanto que eu trabalhei
e não sou valorizada”. Além de ser significada como um caminho alter
nativo por aqueles que se sentem insatisfeitos em seguir na profissão,
outros professores significam a aposentadoria como um meio de atin
gir outros objetivos de vida. A professora a seguir declara que se sente
feliz com o seu trabalho, mas que gostaria de ter mais tempo livre, e
que a aposentadoria permitiria isso: “Meus planos são me aposentar
daqui três anos. Meu objetivo é conquistar esse feito. Me sinto feliz com
minha profissão, mas pretendo parar de trabalhar oito horas por dia.
Gostaria de ter mais tempo livre”.

Relatos como esses parecem indicar certa controvérsia, mas po


dem ser compreendidos sob a ótica dos valores18. Tomando o último
SUMÁRIO
trecho como exemplo, ainda que a profissão evoque sentimentos de
satisfação na entrevistada, no atual momento de sua vida, isso se con
figura como um valor periférico. Por outro lado, a busca por mais tempo
livre para se dedicar a outras tarefas apresenta-se como um valor central
para ela, atrás do qual ela vai em busca ao planejar a sua aposentadoria.

18
Aprimorando a definição apresentada por Piaget, Araújo (2007) apresenta que um valor é
aquilo sobre o qual projetamos um sentimento positivo, seja um objeto, uma pessoa, uma
relação ou sob si mesmo. Segundo o autor, os valores se organizam de maneira complexa:
alguns valores podem se posicionar de forma mais central em nossa identidade, enquanto
outros são mais periféricos, dependendo da intensidade da carga afetiva vinculada a esse
determinado valor (ou contravalor).

180180
Ao revelarem os seus planos para o futuro, muitos professo
res falaram sobre atividades e planejamentos que estão relacionados
com a profissão docente e a vontade de continuar estudando. Por não
mencionarem a pandemia, parece-nos que tais intenções já eram an
teriores ao contexto, e que se mantiveram, apesar dele: “Meus objeti
vos são concluir meu Mestrado, logo em seguida o meu Doutorado, e
estou bem confiante e esperançoso, e fazer o possível para deixar meu
legado na educação de minha cidade. [...] [Quero] proporcionar dentro
de minha cidade momentos de palestras para a formação de outros
profissionais”. Nestes trechos, podemos perceber que o professor dá
bastante importância para o impacto positivo que o seu trabalho pode
ter na comunidade em que faz parte, lembrando-nos do que Frankl
chamou de autotranscendência:
“Ela [a autotranscendência da existência humana] denota o
fato de que o ser humano sempre aponta e se dirige para algo
ou alguém diferente de si mesmo - seja um sentido a realizar
ou outro ser humano a encontrar. Quanto mais a pessoa es
quecer de si mesma - dedicando-se a servir uma causa ou a
amar outra pessoa - mais humana será e mais se realizará”
(FRANKL, 2007, p. 76).

Vimos, em outros relatos, que lembrar a influência que exercem


na vida de seus alunos ajuda os professores a lidarem com os altos
SUMÁRIO e baixos da profissão docente: “Gosto de encontrar um jovem ou uma
jovem trabalhando de forma digna, muitas vezes em cargos socialmen
te elevados, e ouvir: olá professora, a senhora se lembra de mim? Mui
tas vezes não somos reconhecidos ou recompensados de forma justa
pelas autoridades competentes, mas ajudamos jovens a ter um futuro
melhor, e isso é muito gratificante”.

Com este sentido da docência claro em suas mentes, os pro


fessores apontam que ganham ânimo para seguirem na carreira: “Mui
tas vezes é difícil pensar a educação em um país que não a vê como
prioridade, mas quando penso no quanto já caminhei, quantas vidas já

181181
mudaram por causa da minha dedicação, e, principalmente, o quanto
ainda posso fazer... É o que me dá ânimo. Historicamente, a vida de
professor nunca foi fácil, são muitos desafios tanto emocionais quanto
financeiros, mas são barreiras que enfrentamos e superamos quando
temos amor, dedicação, conhecimento e muito profissionalismo. Acre
dito em dias melhores e, por isso, não desisto nunca!”.

Falas como essas, que atrelam a vontade de continuar na profis


são docente com o impacto positivo na vida dos alunos, foram frequen
tes entre os entrevistados: “O que eu mais gosto é ver a transformação
que um ambiente educacional causa no indivíduo. Ver a evolução de
postura no decorrer do ano e vida escolar é interessante e impressio
nante. O devido estímulo faz com que o indivíduo se liberte, busque e
cresça através do conhecimento. Ver o desenvolvimento da autonomia
nos estudantes é maravilhoso, e dá um ar de esperança para o futuro”.

Ainda que o seu trabalho não impacte o mundo inteiro, a pos


sibilidade de impactar o “mundo” de seus estudantes parece ser um
sentido suficiente para esta professora: “Querer mudar o mundo é algo
que parece tão distante. Com a minha profissão eu posso mudar vários
mundos, e ampliar a percepção [que os alunos têm] de si e das possi
bilidades, e, sempre que posso, faço isso”.

SUMÁRIO Nos discursos dos entrevistados, a relação com as pessoas que


fazem parte do ambiente escolar recebeu outros significados, além
dos apresentados acima. Vimos que os colegas de profissão, ao traba
lharem em colaboração, ajudam a superar os desafios que fazem parte
do dia a dia: “Felizmente temos parceria, liberdade e boa comunicação
no ambiente onde trabalho, isso me faz ter mais disposição e vontade
de estar lá todos os dias, e enfrentar juntos os desafios da profissão”.

O encontro com figuras inspiradoras também foi apresentado


como um importante fator para se querer e buscar evoluir: “Me sinto
motivada quando encontro verdadeiros líderes, aqueles que sabem o

182182
que fazem, elogiam nos momentos certos, e constroem junto comigo
um ambiente favorável ao crescimento e realização de projetos comuns,
como num casamento, onde há amor e cumplicidade. Isso me motiva a
ser cada dia melhor, a servir melhor, a querer agradar”.

Outro aspecto que parece motivar alguns docentes a continua


rem na profissão e, mais do que isso, a realizarem o seu trabalho de
forma engajada, é a percepção que eles têm sobre si mesmos. Ao pro
porcionar experiências que fortalecem os valores do indivíduo, e que
despertam sentimentos de satisfação e de bem-estar nele, o trabalho
com a educação passa a constituir a identidade de alguns professo
res, de modo que as dimensões pessoal, profissional e social de suas
vidas se integram: “Visto que procuro ter um senso de realização na
minha vida profissional e realmente escolhi fazer o que gosto na minha
profissão (e me esforcei muito pra alcançar esse objetivo), estou sem
pre procurando formas de fazer melhor o que escolhi fazer. Talvez, por
isso, trabalho e lazer às vezes se misturam no meu dia a dia”.

Para alguns, é difícil desassociar essas três dimensões (pes


soal, profissional e social): “Vejo que a satisfação pessoal caminha jun
to com a satisfação profissional. Procuro projetar ambas para que possa
ter uma vida plena em família, e a cada dia acordar e não sentir que é
um fardo estar na educação. Assim, vejo que vamos formando nossa
SUMÁRIO
identidade profissional e o desenvolvimento pessoal”.

Para aqueles que puderam continuar lecionando na pandemia,


a partir da migração para o cenário digital, aprender a trabalhar com o
computador tornou-se um imperativo. Diante do desconhecido, vimos
professores com vontade de aprender, mas cansados: “[Quero] enten
der melhor a tecnologia. Tenho dificuldade em assimilar tanta tecnologia
em tão pouco tempo. É tudo muito rápido, quando aprendi uma coisa,
ela já está ultrapassada. Me sinto esgotada mentalmente”.

183183
Ao mesmo tempo, outros professores animaram-se com o de
safio, e o enxergam como um aspecto positivo da crise sanitária, pois
possibilitou avanços em sua prática pedagógica: “O ano de 2020 trou
xe essa lição [de me atualizar]. Acredito que seja muito importante man
ter-me atualizada, fazer cursos de aperfeiçoamento, conhecer novas
metodologias e tecnologias educacionais. [...] Tenho buscado cursos
de atualização - especialmente sobre metodologias ativas. Reorganizei
o meu planejamento individual para incluir tempos de cursos e busca de
conhecimento. Certamente melhorei muito minha prática pedagógica
desde o início da pandemia, em função do aperfeiçoamento. Isso me
deixa satisfeita, feliz por conseguir melhorar”.

A situação também motivou alguns a aprenderem e/ou aperfei


çoarem os seus conhecimentos sobre os recursos tecnológicos: “[Pla
nejo] buscar mais conhecimento na área da tecnologia [...] Temos que
aprender a caminhar juntos desses novos conceitos tecnológicos. Sou
uma pessoa muito motivada pelo desejo de aprender!”.

O objetivo de adquirir mais intimidade com as tecnologias foi atre


lado também à intenção de ajudar os alunos e suas famílias: “O objetivo
e desafio maior no momento é me atualizar, me adaptar para essa nova
fase de distanciamento, fazer bom uso dos recursos tecnológicos exis
tentes e dos que ainda provavelmente estão por vir. Apesar das dificulda
SUMÁRIO
des, quero poder me capacitar para que assim possa orientar as famílias
das crianças envolvidas com mais propriedade, com mais clareza”.

Com a variedade de discursos que apresentamos, queremos cha


mar a atenção para a singularidade de cada indivíduo, que, diante do
mesmo cenário pandêmico, atuando na mesma profissão, e, portanto,
enfrentando desafios semelhantes no ensino remoto, apresentam pen
samentos, emoções e atitudes tão particulares. Ao mesmo tempo em
que o contexto desperta dúvidas nos docentes, por que alguns deles
partem das inseguranças e sentem-se motivados a superá-las, e outros

184184
sentem-se perdidos e sem rumo? Por que angústia e desconforto trazem
coragem para alguns, mas fazem com que outros desistam da profissão?
Retornamos à cena apresentada no início do capítulo. O psica
nalista Viktor Frankl se viu diante de questões semelhantes ao observar
os prisioneiros que com ele conviveram nos campos de concentração.
E, conforme o próprio psicanalista nos mostra em suas obras, não é
porque não conhecemos o sentido do que fazemos que ele não existe.
Às vezes, precisamos de recursos para conhecermos a nós mesmos.

DISCUTINDO OS SENTIDOS19

As narrativas dos participantes de nossa pesquisa evidenciam


a multiplicidade de sentidos inerentes ao trabalho com a educação e
os aspectos que dele derivam. Vimos docentes que, diante da pande
mia, sentem-se perdidos, e revisitam os seus planos, sem clareza do
que lhes traz sentido. Vimos docentes certos de que não querem mais
trabalhar com a educação, planejando uma mudança de área. Vimos
docentes que enxergam a aposentadoria como uma saída para a insa
tisfação com a carreira.

SUMÁRIO Em contraste, vimos docentes cujos projetos não foram modi


ficados pelo cenário pandêmico, e que demonstraram firmeza diante
das escolhas feitas. Vimos docentes cuja motivação está relacionada
com o impacto positivo que causam na vida de seus alunos e comuni
dade. Vimos docentes engajados em aprenderem a usar os recursos

19
Ao longo do último tópico, principalmente, optamos por empregar a palavra “sentido” no
lugar de “projeto de vida”, com o objetivo de evitar o estranhamento que esse termo pode
causar ao ser aplicado em determinados contextos. Apesar de estarem intimamente relacio
nados, “sentido” e “projeto de vida” não são exatamente sinônimos, o que pode ser com
preendido no início do capítulo, com a explicação do segundo conceito. No entanto, os dois
termos servem de resposta às questões “Por quê? Por que estou fazendo isso? Por que isso
é importante para mim?”, o que nos levou à escolha por “sentido” nessa discussão final.

185185
tecnológicos como aliados de seu trabalho, preocupados em se aper
feiçoarem e auxiliarem o outro.

A partir dos relatos, compreendemos que os professores que atri


buem um sentido para a sua profissão, significando-a como algo que
consideram importante para si e para o mundo, encontram motivação
e vontade de continuar na docência, ainda que experimentem dificulda
des e que se decepcionem com a desvalorização da categoria. É pos
sível perceber que esses professores não consideram o seu trabalho
como “qualquer outro”, ou que seja apenas uma fonte de renda, mas
possuem consciência, e assumem com responsabilidade a participa
ção na formação de alguém. Para eles, o significado de trabalhar com a
educação ultrapassa o compromisso que estabelecem com as escolas,
os pais e alunos. Esse significado relaciona-se com a satisfação de
estar com os estudantes, de acompanhar o seu desenvolvimento, de
compartilhar as próprias experiências e conhecimentos, de aprender
com o outro, de se enxergar como ser incompleto, e que tem sempre
mais para conhecer. São esses os significados, que variam de sujeito
para sujeito, e não se esgotam com os exemplos, aqui listados, que mo
vem cada um em direção a atuar no que lhe traz sentido, de modo que
exista uma coerência com os valores que constituem a sua identidade.

É o reconhecimento do sentido por trás do que fazemos que


SUMÁRIO nos ajuda a vivenciar os momentos de crise equipados por mais de
uma perspectiva. Com o termo “crise” não nos referimos apenas à
situação pandêmica, mas também a outros cenários que geram
desconforto, e nos colocam diante do desconhecido. É comum, por
exemplo, encontrarmos instituições cujos valores e metodologias não
se alinham com os nossos, e é importante pensarmos que não existe
uma só forma de lidar com o incômodo.

Optamos por trazer como epígrafe uma citação de Viktor Frankl


que está permeada por vários significados. Ao vivermos uma situação
boa, que nos proporciona satisfação e felicidade, e que está alinhada

186186
com os nossos valores, é importante que desfrutemos dela perceben
do como nos impacta, e que sentidos atribuímos a ela. Por que me
sinto bem? Por que considero essa situação boa? Quais dos meus
valores estão sendo mobilizados?

Por outro lado, em uma situação que julgamos ruim, devemos


nos questionar: Por que a significo dessa maneira? Que desconforto
ela me causa? Por que me sinto dessa forma? Diante de situações que
nos desagradam, dois caminhos são sugeridos por Frankl, a depender
das circunstâncias: a transformação externa e a transformação interna.
No caso de não ser possível mudar o nosso entorno, a mudança deve
vir de dentro. Como primeiro passo, podemos sair em busca de conhe
cer o que nos traz sentido.

São com essas reflexões que queremos convidar vocês, profis


sionais da educação, a pensarem no sentido de seu trabalho. Por que
você faz o que faz? Qual o seu compromisso com a educação e com a
formação das futuras gerações? Que sentimentos o seu trabalho des
perta em você?

Ao fazermos esse convite, não podemos deixar de abordar o pa


pel que os cursos de formação de professores possuem, seja esta for
mação inicial ou continuada. Uma carreira que não nos permita refletir
SUMÁRIO sobre as escolhas de vida que fazemos precisa ser revista. Carecemos
de um processo educacional que estimule o autoconhecimento dos
docentes, a reflexão sobre os seus projetos de vida, tanto na dimensão
profissional quanto pessoal e social. É necessário termos espaços que
provoquem a nossa reflexão e conscientização sobre o sentido que a
educação tem para cada um de nós.

Acreditamos que momentos de crise, com todos os seus de


safios e dificuldades, podem servir como um ponto de virada para os
profissionais da educação e instituições escolares, de modo que os
tirem de seu lugar comum, renovando seus pensamentos, sentimentos

187187
e atitudes. As mudanças podem se traduzir na busca por novos sen
tidos para o que já fazem ou por novos caminhos, que proporcionem
um alinhamento com os sentidos que já enxergam. Encontrar incômo
dos, impasses, angústias e dificuldades faz parte de toda carreira, e
queremos chamar a atenção para a importância de socializarmos e
trabalharmos a partir desses contratempos, para que possamos avan
çar enquanto comunidade escolar e sociedade.

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS:
ARAÚJO, U., ARANTES, V., PINHEIRO, V. Projetos de Vida: fundamentos psi
cológicos, éticos e práticas educacionais. Summus Editorial, 2020.
BRONK, K. Purpose in Life: a critical component of optimal human develop
ment. Springer International Publisher, 2014.
BUNDICK, M. J. Pursuing the good life: an examination of purpose, meaningful
engagement, and psychological well-being in emerging adulthood (unpubli
shed doctoral dissertation). Stanford: Stanford University, 2009.
DAMON, W. O que o jovem quer da vida? Como pais e professores podem
orientar e motivar os adolescentes. São Paulo, Summus, 2009.
FRANKL, V. (1946). Em busca de sentido: um psicólogo no campo de con
centração. 35. ed. Petrópolis: Vozes, 2017.

SUMÁRIO PARRA, A. Vidas plenas: um estudo dos projetos de vida éticos de educado
res brasileiros. 2018. Dissertação (Mestrado em Educação) - Faculdade de
Educação, Universidade de São Paulo, São Paulo, 2018.

188188
de

em
Capítulo 8

Projeto entre nós: rodas


conversa com educadores
tempos de pandemia da covid-19

Cristina Maria D’Antona Bachert

Mara Cristina Normídio Bini

Maria Cristina do Nascimento

Cristinade
Lucas GóesMaria
Ribeiro
8
D’Antona Bachert
Beatriz FavinchiMara CristinaRossi Normídio Bini
Maria Cristina do Nascimento
Lucas de Góes Ribeiro
Beatriz Favinchi Rossi

Projeto entre nós:


rodas de conversa com
educadores em tempos de
pandemia da Covid-19

DOI: 10.31560/pimentacultural/2021.107.189-212
INTRODUÇÃO

Ao refletir sobre o papel da escola, do professor e da Educação,


nos deparamos com muitos desafios provocados pela velocidade de
mudanças sociais, econômicas, tecnológicas e culturais que impac
tam diretamente em todos os níveis de ensino. Para identificar os
pontos a serem modificados, utilizamos, além de fatos, conhecimen
tos científicos e resultados de pesquisas que permitem uma melhor
compreensão dos fenômenos, e indicam caminhos possíveis para
uma intervenção. No entanto, é preciso enfatizar que as soluções não
são imediatas, pois a reorganização da Escola deve atender situa
ções que não se originaram no contexto escolar (MARCHESI, 2008).
No ano de 2020, a necessidade de mudança foi exponencialmente
aumentada com o advento da Pandemia da Covid-19, envolvendo
toda a comunidade escolar e, especialmente, os professores.

A epidemia da Covid-19 teve o seu início em dezembro de 2019,


quando a Organização Mundial da Saúde (OMS) foi notificada sobre
um surto de pneumonia causada pelo novo coronavírus (SARS-Cov-2),
na cidade de Wuhan, província de Hubei, República Popular da China.
Em janeiro de 2020, a OMS declarou Emergência de Saúde Pública
de Importância Internacional (ESPII), visando interromper a propaga
SUMÁRIO
ção do vírus. Essa medida tensionou uma cooperação global imediata
(OPAS, 2021). Segundo os dados da OMS, na primeira semana de
julho de 2021 (quando foi realizada a redação deste texto), a situação
global contava com mais de 184 milhões de registros de casos con
firmados, sendo mais de 3.95 milhões de mortes em todo o mundo.
Só no Brasil, foram mais de 525 mil mortes registradas. Por ser uma
doença altamente contagiosa, e incluir hospitalização e morte, as re
percussões da Covid-19 são inúmeras. Além das medidas sanitárias
protetivas, como lavar as mãos com sabão, complementar a higieniza
ção com álcool em gel volume 70% e usar máscara que cubra o nariz

190190
e a boca, é primordial fazer distanciamento social (WHO, 2021), pois o
contágio se dá pelo ar e pelo contato próximo com os demais.

Apesar da sua fundamental importância para o momento atual,


o distanciamento social trouxe consigo uma preocupação com a saú
de mental da população mundial. As mudanças na rotina, somadas
às incertezas e medos oriundos da doença, tendem a prejudicar o
bem-estar emocional de muitas pessoas, gerando sofrimento mental,
ansiedade e sintomas de depressão, podendo incluir até mesmo o
Transtorno de Estresse Pós-Traumático - TEPT (SCHMIDT et al, 2020).

Com o distanciamento social, muitos cenários foram alterados


em um curto período. A casa das pessoas transformou-se em ambiente
de trabalho (home office) e de estudo. Em 13 de março de 2020, o Go
verno do Estado de São Paulo, em entrevista coletiva, informou a inter
rupção gradual das aulas presenciais na rede estadual de ensino até a
sua completa paralisação, e recomendou que a mesma medida fosse
tomada nas escolas particulares do estado. A partir da paralisação, as
escolas tiveram que aderir ao método de ensino emergencial, ou seja,
as aulas e atividades educacionais foram necessariamente realizadas
pela internet, por meio do Ensino a Distância - EaD (BRASIL, 2020). Com
essa iniciativa, sobreveio uma grande mudança na rotina das pessoas,
e muitos desafios para a economia, para a ciência, para os órgãos de
SUMÁRIO
saúde e, sobretudo, para a Educação, que é o foco deste estudo.

Algumas repercussões diretas que a pandemia instaurou no


ambiente escolar incluem a necessidade de os professores, gesto
res, alunos e pais terem que utilizar novos recursos tecnológicos para
ensinar e aprender, sem que tenham tido formação para tal (BIMBATI,
2020). Os professores relataram dificuldades para orientar e avaliar o
desempenho dos alunos, pois o contato virtual com os discentes muitas
vezes impede que a realização da atividade possa ser acompanhada
enquanto é realizada. Com isso, o professor não tem dados para ana
lisar o processo, e fazer as intervenções necessárias (VOZES DOCEN

191191
TES, 2020). São citadas também dificuldades em transpor o currículo
da sala de aula para o meio remoto, pois muitos professores e alunos
demonstram poucas habilidades para lidar com tecnologias de infor
mação e comunicação. Além disso, o acesso à internet é precário para
grande parte dos alunos das escolas públicas, e, quando possuem um
computador em casa, seu uso é compartilhado com outros membros
da família. Conforme colocado por Gatti (2020), os fatores citados são
obstáculos à acessibilidade. A falta de recursos financeiros e humanos
para reverter esta situação, por meio de mudanças na infraestrutura
e nas metodologias de ensino, amplia cada vez mais a desigualdade
social, cultural e educacional no país (FAUSTINO & SILVA, 2020).
Considerando o contexto da escola pública, ainda que inúmeros
esforços estejam sendo feitos para que seus estudantes possam man
ter um ritmo de estudo semelhante ao anterior à pandemia, as dificul
dades citadas no parágrafo anterior indicam que ainda estamos longe
desta meta (GUIZZO; MARCELLO; MÜLLER, 2020). E, na maioria das
vezes, os docentes não contam com uma oferta de suporte emocional
adequada para o enfrentamento destes desafios, o que aumenta ainda
mais sentimentos de medo, ansiedade e insegurança, conforme apon
ta um estudo feito pelo Instituto Península (2020 a, b). Estes medos
estão associados às exigências para se dominar o uso de plataformas

SUMÁRIO e aplicativos, visto que, em pesquisa realizada em 2019, apenas 33%


dos professores disseram ter participado de formações voltadas ao
uso de tecnologias de informação e de comunicação para a elabora
ção de atividades didáticas (MACEDO, 2021). Além do medo de não
corresponder às exigências de performance, há aqueles temores as
sociados ao risco, cada vez maior, de adoecer e morrer. Está evidente
também a insegurança quanto às novas configurações das relações
sociais provocadas pelo isolamento social (ALMEIDA; DALBEN, 2020).

Mesmo em escolas em que o clima escolar é colaborativo, o pro


blema com a saúde mental vem aumentando. Dar conta do conteúdo

192192
proposto não depende apenas das habilidades didáticas do professor,
e muitos sentem-se pressionados com as cobranças da escola, da
sociedade e dos pais. Terminar o conteúdo no prazo, com um mínimo
de aproveitamento, tem se tornado desafiante e desgastante demais,
tanto para os docentes quanto para os alunos. O ritmo dos estudos
pelo meio remoto é outro, a virtualidade exige uma rapidez que o emo
cional muitas vezes não acompanha, e, com isso, o cansaço físico e
mental são pungentes (VOZES DOCENTES, 2021).

De modo semelhante aos professores, os alunos também so


frem com o cansaço físico e mental. O medo da possibilidade de adoe
cer ou de que seus pais adoeçam, visto que os casos de Covid-19 em
adultos jovens e de meia-idade têm aumentado (CASTRO, 2021), faz
com que os estudantes muitas vezes se apresentem estressados, e até
mesmo com pânico, fato que exige dos educadores uma habilidade
emocional e uma posição de continência, algo que acaba pressionan
do-os a, muitas vezes, deixarem de lado as suas próprias questões
emocionais para dar conta das demandas dos alunos (VOZES DO
CENTES, 2021). Diante disso, urge a necessidade de criar um espaço
para que os docentes possam refletir sobre questões emocionais, saú
de mental e formas de enfrentamento adaptativas.

Visando contribuir com o cenário atual da Educação, foi criado


SUMÁRIO
o “Projeto Entre Nós: Rodas de Conversa com Professores”, como ati
vidade prática do Estágio Específico em Psicologia Escolar/Educacio
nal, componente curricular do curso de Psicologia da Universidade de
Sorocaba – UNISO, que iniciou com um projeto piloto no ano de 2020,
objetivando oportunizar aos docentes, da Educação Básica dos muni
cípios de Sorocaba, Votorantim, Araçariguama, Cesário Lange, Tatuí e
Itapetininga, um espaço de fala e reflexão sobre os impactos emocionais
causados pelo distanciamento social, focando as atividades no cuidado
com a saúde mental dos docentes, seu bem-estar e crescimento pes

193193
soal e profissional, condições fundamentais para o enfrentamento deste
momento de crise e mudanças na rotina em todas as áreas de vida.
Planejar estes momentos é uma experiência que favorece a
formação de futuros psicólogos, pois permite o exercício de identifi
cação e compreensão das necessidades específicas de cada grupo,
buscando caminhos para atendê-las a partir dos objetivos do Projeto
Entre Nós. Ao planejarem, executarem e avaliarem as intervenções
previstas, os estagiários exercitam habilidades de comunicação e de
trabalho em equipe (BRASIL, 2019). Esta experiência oportuniza re
fletirem também sobre a sua atuação, como psicólogos escolares,
cujo contexto será atravessado por questões sociais, econômicas e
políticas (SANTA-ROSA & MIGUEL, 2020).

A roda de conversa oferece um ambiente propício para trocas


dialógicas, nas quais todos possam partilhar os seus sentimentos livre
mente e sem julgamentos. Oferece um momento singular de atenção,
escuta e fala. As colocações são construídas por meio da interação com
o outro, permitindo uma reconstrução de conceitos através do diálogo
e da escuta de si e do outro, por meio de um exercício reflexivo, uma
forma de apreender e refletir coletivamente (MOURA & LIMA, 2014).
Esta metodologia favorece o fortalecimento da resiliência comunitária
(YUNES, 2015), criando condições para que as pessoas possam se
SUMÁRIO unir para enfrentar e superar situações adversas graves, como a pan
demia da Covid-19, para construir um futuro possível. Nesse sentido,
as rodas de conversa do Projeto Entre Nós favorecem a aproximação
de educadores, fortalecendo o sentimento de pertencimento a uma co
munidade que enfrenta os mesmos desafios e dificuldades e que, por
meio da solidariedade, autoestima coletiva, identidade cultural e humor
social, associados a uma gestão transparente desta crise, poderão ter
melhores condições de enfrentamento e recuperação.

A pandemia transformou a situação global, e mesmo que não


haja perspectivas concretas de como o mundo estará depois que ela

194194
passar, uma coisa ficou clara, só haverá saída por meio do fortale
cimento das redes de apoio social e afetivo, possíveis por meio da
formação de grupos de pessoas que visam atravessar juntas este
momento de crise. Esta condição indica que medidas de proteção
tomadas não só para se proteger, individualmente, mas para prote
ger o outro, tornam-se mais eficazes (DENWORTH, 2020). Aprende
-se, por meio das vivências, a ética do gênero humano, baseada em
princípios de compreensão, solidariedade e respeito (MORIN, 2002),
favorecendo o reconhecimento das interdependências sociais – en
tende-se, assim, que as ações de pessoas do outro lado do planeta
podem repercutir no nosso cotidiano (SINGER, 2020). Nesse sentido,
a incorporação de valores mais solidários são premissas que nos le
vam a pensar em um novo modelo de Cidadania e, por conseguinte,
de Educação, a qual requer ações assertivas, tomadas coletivamente
para cumprir o seu papel (PASINI; CARVALHO; ALMEIDA, 2020). Com
isso, as rodas de conversa foram entendidas como ferramenta estra
tégica, visando intervenções coletivas ao invés de individuais.

Além disso, estudos mostram que práticas de generosidade,


altruísmo e apoio social podem contribuir para o bem-estar, e aprimo
rar uma expectativa mais positiva sobre si mesmo, produzindo outras
formas de lidar com as pessoas e com as adversidades. Pessoas com
alto afeto positivo são menos propensas a sofrer condições deliberan
SUMÁRIO
tes de ansiedade e fobia social, sendo mais propensas ao compor
tamento de ajuda (LYUBOMIRSKY & DIENER, 2005). Esses achados
subsidiaram intervenções de estratégias adaptativas para o enfrenta
mento dessa crise sanitária e humanitária, tais como promover auto
compaixão, criatividade, otimismo, motivação, resiliência, esperança,
autocuidado e acolhimento, que podem contribuir para a redução da
ansiedade, depressão e estresse, aumentando o bem-estar para que
possam atravessar a crise (ZANON et al., 2020).

195195
Neste contexto de crise, faz-se necessário apoiar os docentes,
e fortalecê-los para um futuro pós-pandemia. A partir de habilidades
relacionadas ao autoconhecimento e ao autocuidado, oportunizar a
elaboração dos lutos causados pela perda de pessoas queridas, de
rotinas, do contato com amigos e familiares, das restrições de sua
liberdade e atividades de lazer. Exercitar a empatia ao conhecer e
apoiar colegas que compartilham suas dificuldades, medos e triste
zas durante as rodas. É preciso revisitar o seu projeto de vida e es
colha profissional, a fim de revigorar seus ideias e valores pessoais,
para que se possa ressignificar a sua prática em um processo de
aprimoramento constante (PASINI; CARVALHO; ALMEIDA, 2020).

A FIOCRUZ (2020) recomenda algumas estratégias de cuida


do psíquico em tempos de pandemia, que podem ser abordadas nas
rodas de conversa. Podem ser citados como exemplo: reconhecer
os medos e anseios; conversar com pessoas de confiança; retomar
estratégias que ajudaram em momentos difíceis já enfrentados; prati
car exercícios que auxiliem na redução de estresse agudo, tais como
ler, meditar, fazer exercícios de respiração e práticas que auxiliem a
situar o pensamento no momento presente; manter contato com a
rede socioafetiva, mesmo que virtual; buscar colegas de trabalho que
vivenciam as mesmas dificuldades, e que possam tomar decisões
compartilhadas; estimular ações compartilhadas de cuidado, e que
SUMÁRIO
visem sentimentos de pertencimento social, como ações comunitá
rias, solidárias e de cuidado familiar; readaptar os planos de acordo
com as possibilidades, de forma a seguir produzindo; evitar o uso
de drogas para lidar com as emoções; buscar fontes confiáveis de
informação; compartilhar estratégias de cuidado e de solidariedade.
E, caso as estratégias de cuidados não forem suficientes para se
manter a estabilidade emocional, buscar por ajuda profissional.

Com base no exposto, este relato de experiência buscou anali


sar os resultados iniciais do Projeto Entre Nós, que tem como objetivo

196196
oportunizar aos docentes e gestores de escolas públicas um espaço de
fala e de reflexão quanto aos impactos emocionais do período de afas
tamento social em razão das medidas de enfrentamento à Covid-19.
Para isso, foca-se, principalmente, no bem-estar dos participantes e
no desenvolvimento de habilidades a serem exercitadas, como o auto
conhecimento, a autorregulação, a escuta ativa, empatia, cooperação,
visão positiva de futuro e apoio social por meio dos semelhantes.

METOLOGIA

O uso das rodas de conversa como instrumento metodológico


foi explorado por uma variedade de autores do campo da educação,
ao longo das últimas décadas, tanto na perspectiva da pesquisa bási
ca, na qual a roda de conversa se demonstra um recurso válido, tanto
para a produção de dados acerca de determinada população (MOURA;
LIMA, 2014) quanto na pesquisa aplicada com objetivos diversos, como
a comunicação assertiva entre grupo (MELO; CRUZ, 2014), produção
de cuidado em saúde (SAMPAIO et al., 2014) e também nas práticas
de educação popular (SILVA; VASCONCELOS, 2019). Em ambas as
perspectivas de produção científica, a utilização das rodas de conversa
SUMÁRIO como instrumento é interessante, pois permite um processo de com
pressão e/ou intervenção em uma dada realidade de um determinado
grupo, revelando representações, crenças, preconceitos, valores, hábi
tos, entre outros fatores de relevância científica (MELO; CRUZ, 2014).

As rodas de conversa são ambientes propícios para o diálo


go, no qual os participantes possam se sentir à vontade para partilhar
e escutar, de modo que o falado seja relevante ao grupo, e, desta
forma, socializando saberes, bem como construindo e reconstruindo
suas perspectivas a respeito das temáticas propostas (MOURA; LIMA,
2014). É importante salientar que a nomenclatura “roda de conversa”

197197
não é um consenso acadêmico, podendo ser referida com devidas
considerações teóricas, como “grupo operativo” ou “grupo focal”, to
davia a utilização do primeiro termo cria uma atmosfera de informalida
de e descontração, que é interessante ao objetivo proposto, além de
adequado ao ambiente escolar (HENARES DE MELO; CRUZ, 2014).

Tal perspectiva epistemológica está alinhada às contribuições


do autor Paulo Freire (1987), quando ele coloca a educação como re
sultante dos “homens se educando entre si”, e não necessariamente
um processo formativo verticalizado. Por este motivo, a utilização de
rodas de conversa é considerada por Sampaio et al. (2014) e Silva e
Vasconcelos (2019) como uma estratégia política libertadora que, por
meio da sua potência metodológica, favorece a emancipação huma
na, política e social dos coletivos historicamente oprimidos. Em outras
palavras, favorece ao indivíduo se reconhecer como construtor da sua
própria história. Assim sendo, a escolha desta metodologia se deu
pautada no objetivo da produção de cuidado em saúde, direcionado
a professores da rede pública do estado de São Paulo no momento
de crise pandêmica. A intersecção entre saúde e educação se dá pelo
reconhecimento de saúde como um modo de cuidar de si, que precisa
ser apreendido, pois se afasta das perspectivas biomédicas que his
toricamente constituem as práticas em saúde (SAMPAIO et al., 2014).
SUMÁRIO
O resgate em contexto interventivo da Psicologia de sentimen
tos positivos como esperança, otimismo, autoeficácia, orgulho, au
toestima, gratidão, entre outros, além de condições positivas como
relações saudáveis, objetivos significativos e espiritualidade, tem efi
cácia comprovada no tratamento de uma variedade de psicopatolo
gias, bem como na promoção de saúde e bem-estar (RASHID; SE
LIGMAN, 2019). Tendo o referencial da Psicologia Positiva ao longo
das intervenções do projeto Entre Nós, buscou-se promover os fatores
previamente citados, que são empiricamente relacionados à saúde e
ao bem-estar, bem como o fortalecimento dos professores, para que

198198
estes pudessem ter melhores condições de enfrentamento dos seus
desafios e problemas resultantes da realidade pandêmica.

As intervenções descritas foram provenientes das rodas de con


versa que ocorreram em dois semestres distintos: na segunda metade
de 2020 e na primeira de 2021, contando com a atuação de estagiários
de Psicologia no Estágio Específico de Psicologia Escolar/Educacio
nal, sob a supervisão de sua professora, que é psicóloga escolar. Os
encontros ocorreram de forma on-line, por meio da Plataforma Teams,
com duração de uma hora. Foram oferecidas opções de horários varia
dos, visando atender a disponibilidade dos profissionais da educação.
Em cada período, o Projeto teve a duração de dois meses, havendo, ao
todo, oito encontros semanais. No segundo semestre de 2020, foram
formadas 26 rodas de conversa, com 391 inscritos. No primeiro semes
tre de 2021, foram 15 rodas de conversa, com 152 inscritos.

O grupo de participantes de 2020 era composto por profissionais


da área da educação, provenientes de quatro cidades do interior do es
tado de São Paulo: Sorocaba, Votorantim, Cesário Lange e Araçarigua
ma. Dentre os integrantes, 70 exerciam a função de gestores, (coordena
dores e diretores de escola), e 321 eram professores, abrangendo todos
os níveis da Educação Básica (Educação Infantil, Ensino Fundamental
1, Ensino Fundamental 2, Ensino Médio) e EJA (Educação de Jovens e
SUMÁRIO
Adultos), sendo a maioria dos participantes do gênero feminino. Dos 26
grupos compostos, oito foram de gestores escolares (coordenadores,
vice-diretores, diretores e supervisores de ensino) e 18 de professores.

No primeiro semestre de 2021, o grupo de participantes contou


com 152 inscritos, sendo 26 gestores e 126 professores que trabalha
vam nas cidades de Cesário Lange, Sorocaba, Ibiúna, Itapetininga, São
Roque e Votorantim. Para a formação dos grupos das rodas de conver
sa, foram formados três grupos de gestores e 12 de professores, com o
predomínio de participantes do sexo feminino. Quanto à fase de ensino,

199199
destacou-se o Ensino Fundamental 1, seguido pela Creche e o Ensino
Fundamental 2, depois a Educação Infantil, o Ensino Médio e EJA.

A percepção dos professores a respeito de suas vivências nas


rodas de conversa foi coletada por meio de uma pesquisa de rea
ção, enviada aos participantes após o fechamento, com o objetivo
de avaliação e aprimoramento do projeto. O questionário foi enviado
por meio de um formulário eletrônico. As questões visavam identificar
quais temas trabalhados foram percebidos como mais significativos,
os motivos para participar do projeto, os pontos que precisam ser me
lhorados, quais seriam os pontos favoráveis das rodas de conversa e o
que cada participante pode aprender a partir das dinâmicas propostas.
Ressalta-se que não foram todos os participantes que responderam à
pesquisa, sendo 127 respostas em 2020 e 72 em 2021.

RESULTADOS: DESCRIÇÃO E ANÁLISE

A pesquisa de reação disseminada, ao final das intervenções


semestrais, obteve retorno de 54,3% em 2020, e 68,5% em 2021, ge
rando desta forma uma amostra significativa do grupo participante nos
dois momentos de realização do Projeto Entre Nós. Os dados coleta
SUMÁRIO
dos foram tabulados, e passaram por um processo de agrupamento
por semelhança para que, em seguida, o seu conteúdo fosse analisa
do. Os resultados estão descritos a seguir.

Em relação a dados demográficos, um fator interessante foi em


relação à distribuição de gênero dos participantes. No segundo se
mestre de 2020, 89% dos participantes se declararam do gênero femi
nino, e, em 2021, este percentual foi de 87,5%, ilustrando a tendência
de uma maioria feminina na busca pelo serviço prestado. A pequena
diferença estatística notada entre a amostra que buscou o serviço da

200200
Psicologia e dados do Censo Escolar 2020 condiz com a pesquisa
divulgada pelo Instituto Península (2020), que notou as docentes do
gênero feminino ligeiramente mais preocupadas com a própria saúde
no momento de pandemia do que os docentes do gênero masculino.
A composição da amostra, majoritariamente feminina, pode ser expli
cada também pelo fato de que a docência, no Brasil, é historicamen
te associada ao gênero feminino. E, segundo o Censo Escolar (INEP,
2021), as mulheres representam 81% dos docentes no Brasil, com con
centração de 96% na Educação Infantil, 88% no Ensino Fundamental I,
67% no Ensino Fundamental II e 58% no Ensino Médio.

Os dados em relação à disparidade de gênero nos docentes


que buscam os serviços da Psicologia precisam ser melhor investi
gados por pesquisas específicas. Todavia, os resultados obtidos são
relevantes por sinalizar a importância da criação e/ou adaptação de
intervenções para que estas possam também abranger a população
do gênero masculino, que, embora possa ter necessidade de cuidado,
aparenta ter mais dificuldade em buscá-lo. Os motivos podem estar
associados a uma variedade de fatores, como medo ou vergonha em
relação à vulnerabilidade. E também existe a consideração social do
autocuidado como um atributo feminino, ou a tendência do gênero
masculino na priorização do trabalho, mesmo que isso implique o de
terioramento da saúde (GARCIA; CARDOSO; BERNARDI, 2019).
SUMÁRIO
Percebe-se que os profissionais da educação que mais recor
reram às intervenções das rodas de conversa se encontravam na fase
do Ensino Fundamental 1, o que pode ocorrer devido à dificuldade em
adaptar as estratégias de ensino-aprendizagem ao ambiente on-line,
principalmente no quesito da alfabetização (BIMBATI, 2020). Assim
como é notável a dificuldade em manter o contato e interagir com os
alunos mais novos por meio das mídias tecnológicas (BIMBATI, 2020;
INSTITUTO PENÍNSULA, 2020), atividade que não parece condizente
às características de desenvolvimento cognitivo e psicossocial desta
faixa etária (PAPALIA; FELDMAN, 2013).

201201
Outro dado destacado é a quantidade expressiva de docentes
mais experientes que buscaram o Projeto em 2021. A idade média dos
participantes foi de 48 anos, com cerca de 17 anos de experiência na
docência. Embora não seja possível comparar este resultado com a
amostra de 2020, esta característica da amostra de 2021 pode estar
relacionada à dificuldade dos professores mais experientes para se
adaptar aos meios digitais, sendo este um fator de estresse mencio
nado nas rodas de conversa. Ou seja, esta queixa dos docentes pode
estar associada à idade, capital cultural e falta de domínio e segurança
para fazer pesquisas na internet, utilizar plataformas digitais e aplicati
vos necessários à elaboração das aulas e atividades (MACEDO, 2021).

Foi detectado que cerca de dois terços dos participantes não


conseguiram participar de todas as rodas de conversa, sendo 66% em
2020 e 68% em 2021. Dentre os motivos citados, as questões pessoais
foram as de maior incidência em 2020 (31%), e de 23,4% em 2021. O
percentual menor de 2021 pode indicar tanto um maior engajamento
dos participantes quanto uma melhoria na organização de sua agenda
de compromissos, um fator que, em 2020, era mais difícil para alguns
educadores. Em 2020, 28% dos participantes justificaram a sua au
sência por conta das demandas de trabalho, como atendimento aos
alunos, pais e reuniões de equipe. No grupo do primeiro semestre de
2021, a porcentagem foi menor, 14,3%. Esta diferença pode ser expli
SUMÁRIO
cada quando consideramos que, no segundo semestre de 2020, os
educadores ainda estavam se adaptando às mudanças bruscas em
sua rotina de trabalho e ao ritmo e demandas do ensino remoto. Por
isso, eram necessárias mais reuniões de alinhamento da equipe pe
dagógica, bem como horários de atendimento aos alunos e pais mais
estendidos. Estes resultados confirmam os da pesquisa realizada pelo
Instituto Península (2020b), na qual os educadores responderam que
se sentiam sobrecarregados (35%), estressados (34%) e cansados
(38%). Os professores ressaltaram a drástica mudança em suas roti
nas, ao precisarem conciliar as novas demandas educacionais com os

202202
seus afazeres domésticos e a preocupação com a saúde própria e dos
familiares. E, além de mais horas dedicadas ao trabalho, as novas prá
ticas exigiam mais tempo de estudo e formação. Entretanto, mesmo
com as faltas, os docentes demonstraram o seu interesse em continuar
a participar das rodas de conversa, por meio de recados, justificando
a ausência e confirmando o comparecimento nas reuniões seguintes.

Questões relacionadas à saúde dos educadores ou de seus


familiares foram citadas como motivo de ausência por 12,5% dos
participantes de 2020. No primeiro semestre de 2021, este índice
também foi menor (10,3%). Já os problemas relacionados à tecnolo
gia, como, por exemplo, conexão à internet e dificuldade de acesso
pela plataforma utilizada, correspondem à 25% das justificativas de
ausência nas rodas de 2020, e 9,1% em 2021. Um dos fatores que
podem explicar esta queda pode ser o fato de que alguns profes
sores participavam das rodas, na escola, por estarem em atividade
presencial. Também relataram ter melhorado o plano de internet em
sua residência dada a demanda familiar, além de que, com o tempo,
as reuniões virtuais tornaram-se mais familiares a todos.

Em ambas as pesquisas de avaliação do Projeto Entre Nós, os


temas trabalhados que foram percebidos como mais significativos en
volveram rede de apoio (20,4% em 2020 e 8,1% em 2021), autoconheci
SUMÁRIO
mento (18,4% em 2020 e 11,1% em 2021), resiliência (11,8% em 2020 e
9,1% em 2021). Os dados indicam que houve aumento no interesse dos
educadores por temas como autocuidado (9,9% em 2020 e 12,1% em
2021) e autorregulação (10,5% em 2020 e 16,1% em 2021). Segundo
as referências adotadas, a autorregulação pode ser entendida como o
reconhecimento de suas emoções e a busca por meios mais adaptati
vos de se lidar com elas (BATISTA; NORONHA, 2018). Ressalta-se que,
segundo Melo e Cruz (2014), assim como Moura e Lima (2014), que,
ao possibilitar o diálogo e a troca de experiências a partir do tema em
discussão, o espaço das rodas de conversa propiciou o compartilha

203203
mento de vivências, percepções e sensações, as quais, muitas vezes,
são semelhantes às de alguns colegas. Isto foi percebido pelos profes
sores como um fator de fortalecimento, pois outras pessoas passavam
por desafios semelhantes, e isso favorecia a discussão e a busca de
soluções que pudessem ser utilizadas por eles. O acolhimento, o sigilo
e o não julgamento favoreceram, segundo os participantes, a criação
e fortalecimento de um vínculo afetivo entre as pessoas do grupo. E o
apoio foi percebido como generosidade e respeito mútuo, facilitando
também o exercício da empatia e a construção da rede de apoio, fato
res que podem propiciar a resiliência comunitária (YUNES, 2015).

Em 2020, os principais pontos favoráveis do Projeto Entre Nós


apontados pelos participantes foram: rede de suporte (51,1%), pos
sibilidade de falar sobre os sentimentos (11,8%) e autoconhecimento
(7,7%). Em 2021, os principais pontos favoráveis foram, novamente,
rede de suporte (55,3%), autoconhecimento (11,4%) e acolhimento
(12,9%). O autocuidado foi citado diversas vezes como tema signifi
cativo abordado (9,9% em 2020 e 12,1% em 2021), motivo pelo qual,
segundo os respondentes, o projeto deve ser continuado (11% em
2020 e 4% em 2021). E, em 2021, 16,2% dos professores relataram
que aprenderam a importância do autocuidado a partir das rodas de
conversa, e que, para cuidar de si próprio, é antes necessário conhe
SUMÁRIO cer-se. Para Rashid e Seligman (2019), um indivíduo que reconhece
os seus pensamentos, sentimentos, emoções e responsabilidades é
mais propenso a tomar atitudes em consonância com os seus valores,
lidando melhor com seus desafios, crises e dificuldades. Logo, a partir
do espaço das rodas de conversa foi possível estimular o autocuidado,
visando à promoção da saúde desses indivíduos por meio de ativida
des prazerosas, que diminuiam o estresse enfrentado nesse momento
de pandemia (ZANON et al., 2020).

No que tange aos pontos a serem melhorados, 50,9% dos


usuários, em 2020, e 63,3%, de 2021, afirmaram que não era neces

204204
sário realizar melhorias nas intervenções do Projeto Entre Nós. Os
participantes dos dois períodos afirmaram que as rodas devem con
tinuar (98,8%), e que a sua duração deve ser ampliada, segundo os
participantes de 2020 (17,1%) e 2021 (5,3%). O índice mais baixo dos
participantes do primeiro semestre de 2021 pode ser explicado pela
expectativa de continuidade das rodas no próximo semestre, e pela
possibilidade de que os grupos permaneçam com a mesma configu
ração, sendo realizados de forma virtual, mesmo que as aulas pre
senciais sejam retomadas por todos. Percebe-se aqui que uma das
potencialidades do uso da roda de conversa, realizada de modo vir
tual, foi prover acolhimento a um grande número de professores de
forma rápida e efetiva, favorecendo melhores condições de enfrenta
mento ao estresse, ansiedade e tristeza por meio do fortalecimento
de relações de apoio (ALMEIDA; DALBEN, 2020). Entretanto, o desejo
dos participantes por intervenções mais prolongadas ilustra uma das
limitações do projeto, vinculado ao modelo de estágio, que é descrita
por Sampaio et al. (2014) como uma condição resultante da realidade
objetiva, neste caso, de ordem institucional – o calendário acadêmico.

Em relação aos temas para a continuidade do projeto, em 2021,


as principais respostas foram saúde mental/emocional do professor
(26,2%), autorregulação (12,6%), qualidade dos relacionamentos in
terpessoais (9,7%), acolhimento e orientações à família dos alunos
SUMÁRIO
(7,8%), apoio aos alunos pós-pandemia e retorno às aulas presenciais,
ambos com 6,8%. A preocupação dos professores não somente com
a própria saúde, mas com os aspectos envolvendo também a família,
escola e alunos demonstra uma consideração coletiva de saúde. Algo
que vai além do biológico, englobando também as relações sociais
dos indivíduos (SOUZA, 2020), especialmente em um momento de
pandemia, no qual diversos grupos sociais são afetados ao mesmo
tempo. Ou seja, a preocupação com a proteção e cuidado com a saú
de será mais efetiva na medida em que se considera o bem comum
e a importância e responsabilidade de cuidar do outro para que cada

205205
um possa ser também protegido e cuidado, o que favorece o reco
nhecimento da interdependência (MORIN, 2002; SINGER, 2020) e das
ações coletivas (PASINI; CARVALHO; ALMEIDA, 2020).

Ademais, pela demanda em relação aos tópicos “retorno às aulas


presenciais” e “apoio aos alunos pós-pandemia”, foi notada uma preo
cupação em relação à nova realidade que se aproxima para a maioria
dos professores da rede pública. Muitos relataram sentir-se inseguros,
sentimento este que poderá trazer novas demandas, e ilustra, novamen
te, a necessidade de explorar intervenções que permitam a continuidade
dos cuidados para os professores e gestores. As rodas de conversa
podem ser indicadas para a elaboração deste novo momento, conside
rando a realidade objetiva e a realidade possível (SAMPAIO et al., 2014)
para a construção de práticas de cuidado, considerando a cooperação e
a sinergia coletiva como uma força do ambiente escolar (SINGER, 2020).
Para isso, é fundamental o contato social com pessoas de confiança,
que podem ser os colegas da roda de conversa, com quem é possível
compartilhar dificuldades semelhantes, criar e adaptar estratégias de en
frentamento, vivenciar momentos de lazer e distração (FIOCRUZ, 2020).

CONSIDERAÇÕES FINAIS
SUMÁRIO

O Projeto Entre Nós foi criado a partir da necessidade crescente


de apoio, solicitada por educadores da rede pública de cidades do
interior do Estado de São Paulo a uma das supervisoras de Estágio Es
pecífico em Psicologia Escolar/Educacional da UNISO – Universidade
de Sorocaba, a partir de maio de 2020. Naquele momento, estávamos
a pouco mais de dois meses do início do afastamento social, e os
índices de morte por Covid-19 subiam a cada dia. Além do desafio
das aulas remotas, e da busca por novas formas de ensinar e engajar
os alunos, por meio de novas propostas de atividades, era preciso

206206
descobrir como resolver as dificuldades de acesso e uso de tecnolo
gias de informação e comunicação para acompanhar o processo de
aprendizagem. No ensino presencial, avaliar já era um desafio que, no
ensino remoto, tornou-se fonte de estresse e frustração para os do
centes. Havia também questões sobre como vai ficar a escola e como
seria o retorno às aulas presenciais. Quinze meses depois, temos um
cenário que começa a ser mais favorável, pois a população está sendo
vacinada de modo rápido graças à excelência do Sistema Único de
Saúde (SUS). Mas os desafios ligados à sala de aula e às relações
interpessoais entre professores e alunos, que precisam ser resgatados
e fortalecidos, se intensificam com a aproximação do retorno às aulas
presenciais, condição já vivenciada por uma parcela expressiva de es
colas públicas e particulares em nosso estado.

Mas, para além dos desafios aqui colocados por professores


e gestores escolares, era necessário criar um espaço para que estes
educadores, mobilizados por tantas demandas externas, pudessem
encontrar um tempo em sua atribulada rotina para se olhar e poder
refletir sobre o impacto emocional de todas as mudanças provocadas
pela pandemia da Covid-19 nas diferentes dimensões de sua vida.
Como cada um percebia e reagia às alterações, por vezes abruptas,
em sua rotina? Como lidavam com os desafios do isolamento social,
da busca por novas formas de ensinar e de se relacionar com seus
SUMÁRIO
alunos? Com as novas formas de convivência familiar? Onde ficou o
espaço do lazer e da diversão? E a visão de futuro?

Nos dois semestres em que foram oferecidas as rodas de con


versa, o Projeto Entre Nós contou com um total de 543 inscrições, ten
do, efetivamente, participado dos encontros 339 educadores. Ao longo
dos encontros, foi possível identificar alguns impactos do isolamento
social associados à baixa autoestima, tristeza, irritação, raiva, estres
se, ansiedade e casos de depressão, que puderam ser encaminhados
para atendimento. A escuta ativa e o acolhimento, proporcionados pe

207207
los estagiários-coordenadores das rodas de conversa, oportunizaram
aos educadores falar sobre sentimentos e emoções vivenciados, perce
ber que muitos dos problemas enfrentados eram comuns aos colegas
de grupo. E, por meio desta identificação de afinidades e valores em
comum, construíram redes de apoio que permitiram aos participantes
perceber a importância de se fortalecer para poder dar suporte aos
colegas e pessoas com quem convivem – seus familiares, alunos e
professores com quem trabalham. Considerando o conceito de resi
liência comunitária, foi possível oportunizar melhores condições de en
frentamento e recuperação a partir da união de esforços, pensando
de forma coletiva, considerando que estamos próximos, senão de um
desfecho da pandemia da Covid-19, de uma situação de maior controle
e segurança para todos. Considerando o fortalecimento de habilidades
pessoais que pudesse promover a resiliência, ao longo dos encontros,
foram trabalhados também temas ligados ao projeto de vida dos edu
cadores, visando criar expectativas positivas de futuro e um melhor ge
renciamento dos níveis de estresse por meio do desenvolvimento da
criatividade na busca de condições que favoreçam a adaptação.

Conforme os resultados da pesquisa de reação, tanto os partici


pantes de 2020 como os de 2021 manifestaram interesse para a conti
nuidade das rodas de conversa, com índice de aprovação de 98,7%. Em
SUMÁRIO relação aos encontros, ficou evidente que o modelo atual pode ser man
tido, conforme opinião de 50% dos respondentes em 2020, e 63% dos
grupos do primeiro semestre de 2021. Mas colocam que as reuniões
podem tornar-se melhores, caso todos os colegas se disponham a ficar
com as câmeras ligadas e o número de encontros possa ser maior do
que os oito oferecidos atualmente. Outro ponto colocado é a possibilida
de de que possam continuar no mesmo grupo, o que evidencia a impor
tância das relações interpessoais construídas e do suporte percebido.

Foram identificadas também algumas limitações do Projeto En


tre Nós, sendo a mais citada a necessidade de que a realização das

208208
rodas de conversa fique limitada pelo calendário acadêmico, por ser
uma atividade vinculada ao Estágio Específico em Psicologia Escolar/
Educacional, componente curricular do curso de Psicologia. Esta li
mitação temporal demanda a busca por alternativas que estão sendo
estudadas junto à Coordenação do curso.

Por fim, considerando que toda crise traz também oportunidades,


o afastamento social, uma medida de proteção à pandemia da Covid-19,
deixou evidente o valor das relações interpessoais, tanto para o enfren
tamento das adversidades quanto como condição estruturante para os
processos de ensinar e de aprender. O quão custoso ainda é para todos
nós construir conhecimentos e nos relacionarmos por intermédio de te
las! Nesse sentido, é pertinente a criação de projetos de acolhimento
e acompanhamento de alunos e professores às aulas presenciais, vi
sando à construção coletiva de um novo modelo de educação, onde
a solidariedade entre as pessoas e o senso de comunidade possam
garantir melhores condições de convivência e de valorização da Escola.

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212212
Capítulo 9

Intervenção on-line com a


equipe gestora na escola pública
em tempos de pandemia

Daniela Crepaldi Molás

Karen Naomi Cardoso Kubo

Renata Thurler Lessa


Daniela
Carlos Henrique Ferreira

Letícia LovatoKaren
da Silva
9
Crepaldi Molás
Dellazzana-Zanon
Naomi Cardoso Kubo
Renata Thurler Lessa
Carlos Henrique Ferreira da Silva
Letícia Lovato Dellazzana-Zanon

Intervenção on-line com a


equipe gestora na escola pública
em tempos de pandemia

DOI: 10.31560/pimentacultural/2021.107.213-236
INTRODUÇÃO

A pandemia da COVID-19 causou estressores relacionados à


duração da quarentena, ao distanciamento social, à frustração, ao
tédio e ao acúmulo de tarefas, incluindo a realização de atividades,
normalmente feitas fora de casa, dentro do domicílio (DELLAZANA-ZA-
NON et al., 2020; ZANON et al., 2020). Apesar de um evento ser ava
liado como um estressor a partir da interpretação e do julgamento dos
indivíduos, o atual contexto pandêmico tem se mostrado um estressor
comum, pois promove incertezas, ameaça à vida e desestabiliza roti
nas (ENUMO et al., 2020), independentemente do contexto.

No que se refere ao contexto educacional, a educação a distân


cia (EAD) passou a ser a metodologia utilizada após a reorganização
das atividades escolares e acadêmicas em todo o mundo. Na educa
ção pública, essa metodologia de ensino tem exacerbado as desigual
dades que antes eram niveladas no ambiente escolar, porque muitos
alunos não possuem equipamentos digitais ou acesso à internet, im
prescindíveis para que a EAD seja efetiva, o que piora a aprendizagem
a curto e a médio prazo (DIAS; PINTO, 2020). A dificuldade de garantir
o acesso ao ensino provoca conflitos entre todos os atores sociais que
compõem o ambiente escolar (MIRANDA et al., 2021).
SUMÁRIO
O prolongamento do confinamento, a falta de contato com os
colegas de classe, a falta de espaço em casa, o medo de ser infectado
e a falta de merenda para os alunos são fatores de estresse que atingem
tanto a saúde mental quanto a saúde física dos estudantes da Educação
Básica e de suas famílias (DIAS; PINTO, 2020). A desigualdade é mais
evidente em situações em que não há possibilidade de acessar o ma
terial on-line, e os pais não conseguem auxiliar os filhos nas atividades
escolares em função de seu horário de trabalho, ou por não possuírem
conhecimento sobre o conteúdo escolar de seus filhos (DIAS; PINTO,
2020). Essas situações geradas pela pandemia agravaram os proble

214214
mas enfrentados pelos profissionais da educação pública, que precisam
dar conta de novas demandas, para as quais não estão preparados
(DIAS; PINTO, 2020; MIRANDA et al., 2021). Este capítulo tem como ob
jetivo apresentar uma intervenção psicológica realizada on-line com a
equipe gestora de uma escola pública de Ensino Fundamental II e En
sino Médio, promovida por um grupo de três estagiárias do quarto ano
do Curso de Psicologia de uma universidade do interior de São Paulo.

EDUCAÇÃO PÚBLICA
NO CONTEXTO DA PANDEMIA

As mudanças na forma como ocorrem as interações sociais


são um potencial estressor para o período de isolamento social, pois
muitas pessoas, inclusive os profissionais da educação, foram im
pedidas de desenvolver suas atividades profissionais, tendo que in
terrompê-las sem terem tempo de se adaptarem ao novo contexto
(SCHMIDT et al., 2020). Nesse sentido, um dos principais desafios da
pandemia tem sido trabalhar em home office (PAN; CUI; QIAN, 2020;
SOUZA, 2021). No âmbito escolar, esse é um desafio enfrentado co
tidianamente pelos professores e gestores escolares, que vivenciam
SUMÁRIO sentimentos intensos, como angústia e ansiedade, necessitando de
recursos para autorregulação emocional diante da frustração de não
estarem sendo produtivos (DIAS; PINTO, 2020).

Encontrar equilíbrio entre as responsabilidades familiares e as


atividades profissionais têm gerado novas situações estressoras que
interferem no cotidiano dos trabalhadores (DELLAZANA-ZANON et
al., 2020). Em função dessas questões, é necessário pensar na saú
de mental de todos os atuantes do contexto escolar: alunos, famí
lias, professores e funcionários. Considerando-se especificamente os
educadores, esse cuidado com a saúde mental é fundamental, pois

215215
se eles desenvolverem esgotamento físico e/ou mental, não poderão
ajudar os alunos (DIAS; PINTO, 2020).

Nesse sentido, recomenda-se aos professores que estão en


frentamento os desafios do ensino remoto que (D’ANDRÉA et al.
2020): (a) comuniquem-se de forma efetiva com os gestores escola
res e com seus alunos, compartilhando sentimentos e dificuldades;
(b) conversem com amigos, familiares e demais professores, fortale
cendo sua rede de apoio; (c) planejem suas atividades, considerando
os diversos contextos e realidades de seus alunos; (d) apresentem al
ternativas para o acompanhamento das aulas e atividades dos alunos
que não tem acesso às ferramentas e plataformas digitais; (e) evitem
cobranças excessivas diante das atividades escolares; e (f) realizem
atividades que promovam bem-estar, reservem um momento para
descanso, e busquem apoio profissional, se sentirem necessidade.
Além dos professores, a equipe gestora também viu a sua rotina e a
sua demanda de trabalho alteradas em função da pandemia.

IMPACTOS DA PANDEMIA
NO TRABALHO DA EQUIPE GESTORA
SUMÁRIO
Assim como profissionais de outras áreas, os professores e ges
tores de escolas foram obrigados a paralisar as suas operações pre
senciais e trabalhar em home office. Essa mudança repentina da rotina
ocasionou a fusão entre o ambiente de trabalho e o familiar, bem como
a dificuldade de delimitar um horário de trabalho (havendo uma extensão
do horário previsto), no não desligamento do trabalho e na percepção
de que todos os dias são “segundas-feiras”. Gerou-se uma sensação de
que há muitas tarefas para realizar ao mesmo tempo, pois a delimitação
do espaço de trabalho e o familiar, o deslocamento para a escola e o
sino de entrada e de saída pararam de existir (ZANOL et al., 2020).

216216
Não há dúvida de que todas essas mudanças repentinas, cau
sadas pela adoção do modelo de ensino remoto, geraram novos de
safios para todos os componentes da equipe gestora. Pode-se citar,
como uma das dificuldades geradas pelo ensino remoto, a falta de
acesso à internet estável e de qualidade dos estudantes. Isso impos
sibilitou o acesso deles às aulas e atividades on-line, o que ocasionou
o retorno presencial de alguns funcionários - principalmente a equipe
gestora e administrativa - para a impressão e disponibilização dessas
tarefas aos alunos, aumentando o risco dessas pessoas de serem in
fectadas pela Covid-19 (JASKIW; LOPES, 2021).

A equipe gestora, composta por diretor, vice-diretor e coorde


nador pedagógico, é responsável pela elaboração de conjunturas que
permitam a atuação consciente dos educadores, desde o planejamento
até a efetivação do seu trabalho, fundamentadas nos princípios do pro
jeto pedagógico em vigor (ARANHA, 2015). É também função da equipe
gestora: (a) implementar políticas públicas de formação de educadores
e articulá-las com as especificidades e necessidades de cada contexto
(ARANHA, 2015); e (b) diagnosticar, planejar, acompanhar e avaliar con
tinuamente os afazeres coletivos do contexto escolar (REIS; RAYMUN
DO; PACHECO, 2012). Um gestor escolar deve possuir habilidades e
competências para lidar com os desafios e as demandas que a esco
SUMÁRIO la enfrenta, na medida em que a escola é um espaço pedagógico de
formação, que possui uma função social (PEREIRA; CARLOTO, 2016).
Dessa forma, ao assumir a posição de líder, o gestor deve saber lidar
com as redes de relações e práticas sociais do espaço escolar, funda
mentais para criar condições de segurança e confiança em sua equipe
(PEREIRA; CARLOTO, 2016; REIS; RAYMUNDO; PACHECO, 2012).

A volatilidade e a necessidade de ação e respostas rápidas,


próprias do contexto da pandemia, causaram mudanças constantes
e dificuldades extras ao trabalho da equipe gestora (LEAL; MELO;
SALES, 2021). Conforme Zanol et al. (2020), a equipe gestora tem

217217
tido que lidar com problemas dos educadores e com os seus pró
prios sentimentos de tristeza, solidão, angústia, raiva, ansiedade e
frustração. Para tais autores, esses sentimentos são adequados ao
contexto pandêmico, porém podem se intensificar ao ponto de serem
difíceis de controlar, atrapalhando a realização do trabalho, os cuida
dos com a casa, o tempo para a família e o tempo pessoal.

Considerando-se que: (a) a equipe gestora tem um papel cen


tral na condução e organização da escola e (b) houve um aumento de
demanda e uma consequente sobrecarga de trabalho para a equipe
gestora em função das consequências do ensino remoto, causado
pela pandemia, o objetivo desta intervenção foi compreender e iden
tificar os desafios, demandas ou dificuldades enfrentadas pela equi
pe gestora e pela mediadora escolar, com base nos conhecimentos
teóricos da Psicologia Escolar. De forma específica, a presente inter
venção visou estabelecer uma relação construtiva com o campo de
estágio, bem como acolher as demandas psicológicas advindas da
sobrecarga das participantes, a fim de planejar e desenvolver ativi
dades relacionadas às questões identificadas como prioritárias no
grupo da gestão e mediação escolar.

SUMÁRIO MÉTODO

Caracterização do Campo

A intervenção foi realizada, no ano de 2020, em uma Escola Es


tadual, de uma cidade do interior de São Paulo, que contempla, em
sua grade curricular, o Ensino Fundamental II e o Ensino Médio. Partici
param da intervenção a diretora, a vice-diretora e a coordenadora pe
dagógica, que compunham a equipe gestora, e também a mediadora
escolar. Mais informações sobre a formação de cada uma delas estão

218218
presentes no Quadro 1. O espaço físico possuía quadra esportiva co
berta, laboratório de informática, no qual há 19 computadores para uso
dos alunos e oito para uso administrativo, internet e banda larga, sala
de leitura, pátio coberto, sala do professor e refeitório.

Quadro 1 - Informações das participantes

Nome Cargo Formação


Psicologia, Filosofia
Amanda20 Diretora (Equipe Gestora)
e Pedagogia
Bruna Vice-diretora (Equipe Gestora) Psicologia
Coordenadora pedagógi
Carla ca (Equipe Gestora) Pedagogia

Filosofia, Sociolo
Débora Mediadora gia e Pedagogia

Na escola em questão, em 2019, o Índice de Desenvolvimento


da Educação Básica (IDEB) foi de 4,6 (MINISTÉRIO DA EDUCAÇÃO,
2019). Tal índice é calculado com base no aprendizado dos alunos em
português e matemática (Prova Brasil) e no fluxo escolar (taxa de apro
vação). Assim, encontra-se 0,7 pontos abaixo da meta esperada de
5,3, o que indica uma dificuldade por parte dos alunos nos processos
de aprendizagem e realização das provas.

SUMÁRIO
Levantamento de Necessidades

Realizou-se um levantamento de necessidades (FREITAS, 1998;


NEIVA, 2010) por meio de entrevistas com as componentes da equipe
gestora. Os objetivos das entrevistas foram: (a) iniciar o estabeleci
mento de um vínculo com o campo, (b) levantar dados sobre a escola,
(c) compreender as demandas existentes no ambiente escolar (com
destaque para o atual momento da pandemia da Covid-19), (d) com
20
Os nomes das participantes deste capítulo são fictícios para preservar a identidade das mesmas.

219219
preender a dinâmica e demandas do grupo em questão e (e) investigar
o entendimento que os participantes têm do trabalho do psicólogo es
colar. O levantamento de necessidades tem como objetivo compreen
der a dinâmica da escola, o conhecimento dos componentes da esco
la sobre o seu funcionamento e a identificação da demanda com a qual
cada grupo de estagiários irá trabalhar (DELLAZZANA-ZANON, 2019).

Propôs-se a cada uma delas, em conversas particulares no


WhatsApp, uma entrevista de 50 minutos de forma individual e semies
truturada, a partir de um questionário investigativo (Anexo A), em acor
do de dia e horário com as participantes. O questionário mencionado
foi criado pelas estagiárias, em parceria com o estagiário de docência
e com a supervisora, e tem como conteúdo 24 perguntas divididas em
cinco tópicos. Tal instrumento é composto por: aspectos gerais, alu
nos, familiares, professores e funcionários, bem como evasão escolar.

Três das quatro componentes da equipe gestora se disponibi


lizaram e participaram deste momento. Carla optou por responder às
perguntas da entrevista por e-mail. As outras três participantes (Aman
da, Bruna e Débora) aceitaram fazer a entrevista via plataforma Google
Meet. O tempo disponibilizado não foi suficiente para Amanda, razão
pela qual ela precisou de outra entrevista de 50 minutos. Com Bruna e
Débora, a entrevista ocorreu conforme o planejado.
SUMÁRIO

Resultados do Levantamento de Necessidades

Os resultados do levantamento de necessidades mostraram a


realidade da escola no contexto pandêmico, a partir da visão das com
ponentes da equipe gestora. As principais preocupações mencionadas
por elas foram: (a) a dificuldade dos estudantes de acompanhar as aulas
do Centro de Mídias de São Paulo, disponíveis no canal do YouTube, e
realizar as tarefas propostas, (b) as incertezas em relação à formulação
das notas e aprovações e à possibilidade de um retorno presencial. Por

220220
outro lado, a equipe gestora ressaltou a importância de manter os ca
nais de comunicação estabelecidos em função do ensino remoto: via
Microsoft Teams com os professores, via Facebook com os pais e via
WhatsApp com os alunos. Tal vivência foi descrita, especialmente pela
diretora, como um aprendizado relevante que será mantido no futuro.

Ainda a partir dos dados coletados, foi possível identificar as


principais demandas enfrentadas pela gestão durante a pandemia: (a)
falta de espaço de escuta para os professores, para a equipe gestora
e para a mediadora; (b) dificuldades de comunicação entre os próprios
alunos; (c) sobrecarga da gestão e da mediação; e (d) desconheci
mento sobre o papel e a prática de psicólogos escolares. Com base
nessas demandas, o foco da intervenção apresentada neste capítulo
foi a gestão e a mediação escolar com o objetivo de oferecer um espa
ço de escuta e de auxílio para os desafios da sobrecarga de trabalho
e as incertezas do futuro causadas pela pandemia.

Planejamento da Intervenção

A partir do objetivo mencionado, a intervenção foi idealizada em


três encontros on-line (via plataforma Google Meet), com a proposta de
SUMÁRIO duração de 50 minutos, em três dias distintos. A princípio, foi definido um
horário comum para todas as participantes. Apesar disso, considerando
as experiências anteriores, havia a possibilidade de os encontros ocor
rerem separadamente, a depender da disponibilidade das participantes.
Os encontros foram organizados por dia, e com a mesma estru
tura: abertura, atividade e encerramento. Cada abertura teria espaço
para troca e escuta ativa das demandas da semana, dado que o con
texto escolar é marcado pelo dinamismo e inúmeras necessidades.
As atividades foram planejadas para serem discussões norteadas por
perguntas específicas, dispostas a seguir no cronograma, e contariam
com o estímulo visual das obras de arte “Relatividade”, obra do artista

221221
Escher, de 1953, e “A Grande Onda de Kanagawa” de Hokusai, de
1830. Por fim, os encerramentos seriam uma breve retomada do que
foi discutido, acrescida de um fechamento com uma palavra represen
tativa do encontro para cada participante e estagiária.

Quadro 2 - Cronograma

Encontro Data Objetivo Resultados Esperados Material Referências

- Apresentação das estagiárias


Espera-se que as partici
e do objetivo dos encontros; Entrevistas realizadas PETRONI; SOU
pantes tragam informações
- Feedback das entre com a equipe gestora ZA, 2014; ZANOL
1 17/11 vistas realizadas; relevantes acerca das et. al, 2020.
e mediadora.
entrevistas realizadas e
- Pergunta norteadora: “Como me
senti refletindo sobre a escola?” reflitam sobre as atuações.

Espera-se que as partici


- Apresentação da imagem;
pantes tragam informações
- Discussão norteada pela “Relatividade” PETRONI; SOU
2 24/11 relevantes acerca das
pergunta “Como me sinto diante de Escher (1953). ZA, 2014.
das demandas do dia a dia?” demandas diárias e reflitam
sobre as atuações.

- Encerramento norteado pela


questão “o que eu espero do
pantes reflitam sobre as “A Grande Onda
futuro?”; Espera-se que as partici de Kanagawa” de PETRONI; SOU
3 01/12 - Apresentação da imagem; Hokusai (1830). ZA, 2014.
- Feedback e avaliação possibilidades do futuro.
da intervenção por par
SUMÁRIO te das participantes.

RESULTADOS E DISCUSSÃO

Ao longo de 2020, a sociedade enfrentou situações complexas,


como o distanciamento físico e social, o aumento das demandas e
atividades profissionais, os diversos sentimentos angustiantes, prove
nientes desse período, e o término incerto do isolamento (ENUMO et

222222
al., 2020). Todos esses aspectos relativos à pandemia da Covid-19 im
pactaram diretamente o desenvolvimento do presente trabalho. Além
dos pontos apresentados anteriormente, como resultado do levanta
mento de necessidades, foram identificados como agravantes do con
texto escolar: a dificuldade de infraestrutura da escola, a dificuldade
de acesso à internet de alunos e funcionários da escola, a falta ou
pouco conhecimento da equipe sobre as tecnologias necessárias para
o ensino remoto, a vulnerabilidade da realidade da vida de alunos, a
sobrecarga e as inconsistências nas funções da equipe e, sobretudo,
a resistência frente à atuação da psicologia no âmbito escolar on-line.

Esse último aspecto foi evidenciando desde a dificuldade de


realizar contato com as participantes da equipe gestora e da mediado
ra até a realização da intervenção: apesar das estagiárias oferecerem
diferentes horários para agendar as entrevistas do levantamento de
necessidades com as participantes, elas não tinham disponibilidade
para participar. A participante Carla, que afirmou não ter disponibilida
de em nenhum horário da semana, solicitou o envio das perguntas da
entrevista para responder por escrito. O grupo de estagiárias enviou as
perguntas, conforme solicitado, mas a participante não respondeu no
prazo combinado. Algumas perguntas solicitavam justificativas, mas
SUMÁRIO as respostas de Carla foram somente “Sim” ou “Não”, o que tornou
suas informações insuficientes para o levantamento. Destaca-se que
as demais participantes informaram as estagiárias um dia e período,
afirmando que era o único momento disponível para a realização da
entrevista. Com base nessas informações, as estagiárias conseguiram
agendar e realizar as entrevistas com essas participantes. Apresen
tam-se, a seguir, os aspectos da intervenção com ênfase para o im
pacto causado pelo contexto pandêmico, denominados: dificuldade
de comunicação, nova proposta, negligência do estado, inserção do
psicólogo na escola e saúde mental dos profissionais da educação.

223223
DIFICULDADE DE COMUNICAÇÃO

A comunicação entre as estagiárias e a equipe gestora não


foi efetiva, primeiro, porque todo o contato entre elas foi realizado
via WhatsApp, e segundo porque todas as componentes da equipe
gestora e a mediadora estavam visivelmente sobrecarregas duran
te o período em que o estágio foi realizado. Um dos aspectos que
pode ter tornado a comunicação mais difícil foi o fato de que não se
criou um grupo de WhatsApp desde o início para tratar da interven
ção. Cada estagiária ficou responsável por contatar uma ou duas
participantes, o que descentralizou o trabalho do grupo. Como essa
estratégia foi avaliada como não efetiva, decidiu-se criar o grupo com
toda a equipe gestora e as estagiárias na fase final do estágio. A de
mora na criação desse grupo para centralizar as combinações sobre
a intervenção, a ausência de respostas da equipe gestora e o fato
de todas as envolvidas apenas se conhecerem no ambiente virtual,
dificultou o estabelecimento do vínculo necessário para o sucesso da
intervenção. Não por acaso, esse foi um dos temas mais discutidos
ao longo da supervisão acadêmica que ocorreu semanalmente.

SUMÁRIO NOVA PROPOSTA

Em função das dificuldades de comunicação, da resistência e


da indisponibilidade da equipe gestora, o cronograma planejado previa
mente não pôde ser seguido. Após inúmeras tentativas sem sucesso de
se realizar a intervenção, as estagiárias apresentaram uma contrapro
posta, de estabelecer apenas um encontro, que foi, por fim, aceita pela
equipe gestora. Esse encontro ocorreu no final de novembro de 2020,
e durou 1 hora. Estavam presentes as três estagiárias e três das quatro
participantes. Ainda que tenha se mostrado disponível durante o início
dos trabalhos, com um discurso receptivo e com a realização de duas

224224
entrevistas iniciais, a diretora não se mostrou disponível para participar
do encontro, não tendo avisado previamente que não estaria presente.

Após a reestruturação do trabalho, os objetivos estabelecidos


para o encontro foram: (a) fornecer um feedback para a equipe acerca
das entrevistas realizadas, (b) disponibilizar um espaço de escuta qua
lificada, (c) compreender quais as perspectivas futuras das gestoras
e da mediadora escolar em relação à escola, (d) dar e solicitar devo
lutivas do período de estágio, e (e) fazer um fechamento do trabalho
das estagiárias na escola. No Quadro 3, encontra-se o Plano de Ação
utilizado para o encontro em questão.

Quadro 3 - Novo plano de ação.

Resultados
Encontro Data Objetivo Material Referências
esperados
- Apresentação das estagiá
rias e do objetivo do encontro;
são as expectativas para o fu- Espera-se que as partici- Cartilha de apoio à saú
- Pergunta norteadora: “Quais de mental do (a) profes- ZANOL et al., 2020.
pantes reflitam sobre as
1 24/11 possibilidades do futuro sor (a) durante a pande
turo?”.
e conversem sobre ele- mia de COVID-19.
- Feedback e avaliação da
mentos ansiosos.
intervenção por parte das par
ticipantes.

Assim sendo, após a realização do encontro, foi possível refletir


sobre três tópicos essenciais: negligência por parte do Estado, inser
SUMÁRIO
ção do psicólogo na escola e a saúde mental dos profissionais da
educação no período de pandemia.

NEGLIGÊNCIA DO ESTADO

Após serem questionadas sobre a sua percepção acerca do fu


turo, o principal ponto trazido foi o aspecto das incertas, pois as instru
ções fornecidas pelo governo são dadas repentinamente, e sem mais
subsídios, o que dificulta a organização escolar. Com isso, foram ob

225225
servados dois pontos principais: (a) a falta de autonomia das escolas
e, com isso, a sensação de abandono do governo de gerir as escolas;
e (b) a desorganização estrutural da hierarquia da escola.

A falta de autonomia foi mencionada na medida em que as esco


las precisam seguir, à risca, as recomendações do governo, o que impe
de que a equipe gestora atue de forma personalizada em relação às de
mandas dos alunos. A desorganização estrutural da hierarquia da escola
pode ser observada a partir do emaranhado de funções observado, que
atua, possivelmente, como um reflexo da sobrecarga gerada pela pan
demia. Observou-se que, em muitos momentos, a vice-diretora tendia a
atuar como responsável pela escola, tomando decisões que caberiam à
diretora. A falta de uma liderança definida é preocupante, pois o papel é
o articulador das diferentes esferas da escola (ARANHA; CALLAS; PLAC
CO, 2020; REIS; RAYMUNDO; PACHECO, 2012), e tem impacto direto no
desempenho dos professores e estudantes (LIMA, 2013).

Outra preocupação da equipe gestora foi quanto à sobrecarga


para 2021, considerando que muitos alunos não têm acesso à inter
net, e não aprenderam o conteúdo durante o ano de 2020. De acordo
com o plano do governo, a recuperação deveria suprir as defasagens
ocasionadas pelo contexto de 2020, o que as participantes não acre
ditam que aconteceria. Essa preocupação da equipe gestora quanto
ao aproveitamento dos estudantes é legítima, pois é seu dever refletir
SUMÁRIO
sobre o que deve ser feito para que os alunos participem do processo
de aprendizagem, mesmo sem os recursos necessários para estudar
em casa (QUEIROZ; MUNIZ; ABREU-MÓL, 2020).

INSERÇÃO DO PSICÓLOGO NA ESCOLA

A impossibilidade de realizar a intervenção de acordo com o


planejamento inicial e a necessidade de buscar vias alternativas para a
sua execução indicam a dificuldade do psicólogo em se inserir e ser re

226226
conhecido no contexto escolar, e a resistência da equipe gestora frente
à inserção do psicólogo escolar na escola. Essa resistência era espe
rada, pois, apesar da atuação do psicólogo ser essencial no contexto
escolar (SILVA; 2018; PETRONI; SOUZA, 2014), o estágio curricular no
campo da psicologia escolar é um desafio, principalmente na escola
pública. Isso ocorre porque ainda não há a presença legitimada do
psicólogo na rede pública21, razão pela qual falta clareza sobre o papel
do psicólogo escolar, muitas vezes confundido com o psicólogo clínico
(DELLAZZANA-ZANON, 2019).

Além do provável desconhecimento sobre o que é, e como atua


o psicólogo escolar, a tradição clínica arraigada na matriz curricular
dos cursos de Psicologia, que direciona o profissional para uma prática
clínica, psicopatológica e individual, pode explicar por que profissio
nais da psicologia, como Amanda e Bruna, concordam com uma atua
ção clínica do psicólogo na escola (SZYMANSKY; CURY, 2004). Nesse
sentido, a atuação das estagiárias objetivava romper com a lógica na
turalizante de atuação clínica na escola, desenvolvendo um trabalho
preventivo e interventivo, não pautado na psicoterapia (SZYMANSKY;
CURY, 2004). Devido ao modelo tradicional vigente na escola, a flexibi
lização e inovação de novos modelos e atuações, como a intervenção
do psicólogo escolar, é uma tarefa complexa que requer: (a) o avanço
do sistema educacional brasileiro em relação à criação de políticas
SUMÁRIO
públicas que permitam o ingresso dos profissionais da psicologia na
escola e (b) o preparo dos profissionais no percurso formativo, para
que, gradualmente, o psicólogo possa desempenhar o seu papel no
campo, sem se deparar com as barreiras de um ambiente que desco
nhece a sua atuação profissional (SZYMANSKY; CURY, 2004).

Observou-se também que o desconhecimento quanto ao traba


lho do psicólogo escolar impactou nas expectativas quanto ao estágio
21
Até o período do estágio, no segundo semestre de 2020, a Lei nº 13.935 (BRASIL, 2019),
que dispõe sobre a inserção dos psicólogos nas escolas públicas de educação básica,
ainda estava em processo de regulamentação.

227227
de Psicologia, tanto no que se refere às expectativas da equipe gestora
em relação à escola como nas expectativas das estagiárias frente à
escola. Houve momentos de reconhecimento de frustrações quando
Bruna disse “vão nos deixar ano que vem”, referindo-se ao término
do vínculo entre a escola e as estagiárias, e quando Débora disse “o
trabalho da psicologia poderia ser mais efetivo se não fosse pela pan
demia. É um trabalho que vem para somar. Sabemos que não pudemos
responder de acordo com o que vocês precisavam, assim como vocês
não puderam auxiliar a escola como nós precisávamos”. Essas falas
causaram surpresa nas estagiárias, pois demonstram ambivalência
quanto às atitudes da equipe gestora e às expectativas que não foram
bem evidenciadas por parte da equipe gestora em relação ao trabalho
das estagiárias. Apesar da frustração, a avaliação feita pela escola foi
de uma parceria bem-sucedida e de crescimento por parte das partici
pantes, a partir da vivência dessa elaboração de sentimentos.

SAÚDE MENTAL DOS PROFISSIONAIS


DA EDUCAÇÃO

Evidencia-se que o cenário pandêmico existente pode suscitar


SUMÁRIO emoções como tristeza, solidão, angústia, raiva, ansiedade e/ou frus
tração, devido à desestabilização de rotinas, às incertezas e ao acú
mulo de tarefas (ZANOL et al., 2020). Nos relatos da vice-diretora e da
coordenadora, pode-se perceber que algumas dessas emoções estão
presentes, sendo a sobrecarga um dos aspectos mais mencionados
durante todo o trabalho com a equipe gestora.

Ao serem questionadas sobre como cuidam da saúde mental,


dois tipos diferentes de respostas apareceram. Um deles é a busca
ativa e explícita por cuidados, como Bruna, que informou que faz uso
de medicamentos com receita médica, e Carla, que disse se utilizar

228228
de esportes para se cuidar. Outro tipo foi a resposta de Débora, que
informou saber separar as coisas, e buscar válvulas de escape, mas
não foi explícita sobre que formas de autocuidado usa. Ainda que to
das reconhecessem a importância da psicoterapia, afirmaram que não
eram atendidas por psicólogos.

A literatura indica que a saúde mental dos profissionais da edu


cação está cada dia mais comprometida (MACAIA; FISCHER, 2015).
Assim, faz-se necessário discutir os transbordamentos das demandas
do trabalho na vida pessoal (SILVA, 2018). Como exemplo, tem-se o
caso de Bruna, ao afirmar que faz uso de medicação, e que não con
segue se desligar do ambiente escolar. Uma equipe gestora funcional
é essencial para o desempenho da instituição educacional. Nesse sen
tido, é preciso que a saúde mental destes profissionais seja priorizada
e cuidada pelo Governo, uma vez que ele é seu empregador.

CONSIDERAÇÕES FINAIS

Este capítulo teve como objetivo apresentar uma intervenção psi


cológica realizada com a equipe gestora de uma escola pública de En
sino Fundamental II e Ensino Médio, que foi promovida por um grupo de
SUMÁRIO
três estagiárias do quarto ano do Curso de Psicologia. A intervenção foi
realizada durante o segundo semestre de 2020, e, em função da pande
mia da Covid-19, precisou ocorrer totalmente on-line. Dessa forma, as
dificuldades inerentes ao estágio de psicologia na escola pública foram
acentuadas pelo contexto de estágio remoto, que trouxe desafios extras
ao grupo de estagiárias. Todo o trabalho que antes era realizado dire
tamente na escola, precisou ser reorganizado para o contexto on-line,
sem que houvesse tempo para planejamento nem experiências prévias
que fundamentassem o trabalho. Houve momentos em que a sensação
foi de que não seria possível realizar a intervenção. Entretanto, depois

229229
de vários ajustes e contrapropostas, a intervenção pôde ser realizada,
mesmo que num formato mais curto do que o planejado.

A relação construída com o campo de estágio para a elabora


ção integral do projeto interventivo foi prejudicada devido ao distan
ciamento físico e social, causado pela pandemia da Covid-19, mas
não apenas por isso. Antes de o projeto desenvolvido com a equipe
gestora e a mediadora escolar ser efetivado, alguns impasses impe
diram que o planejamento prévio fosse estruturado. Por exemplo, a
dificuldade no estabelecimento da comunicação e a falta de conces
sões das participantes em disponibilizar horários para a realização
dos encontros da intervenção foram empecilhos que ocasionaram
um sentimento de frustração nas estagiárias. Essa resistência dos
profissionais da educação frente à inserção e ao trabalho do psicólo
go no contexto escolar não foi surpresa para as estagiárias. Entretan
to, deve-se salientar que a resistência esperada somada às dificulda
des inerentes à pandemia tornaram o estágio ainda mais desafiador.

Ressalta-se que a intervenção em questão permitiu o desen


volvimento profissional das estagiárias, pois, apesar do sentimento
constante de frustração, o trabalho no campo escolar on-line permitiu
a vivência de como é a rotina da escola durante o período pandêmico.
Poder discutir sobre resistência, sobrecarga da equipe gestora, e as
SUMÁRIO
especificidades/papéis da escola fortaleceu a atuação da Psicologia
e a importância do trabalho do psicólogo escolar. Mesmo que tenha
sido feita em um único encontro, a intervenção teve um caráter posi
tivo, visto que possibilitou um espaço para a fala e a elaboração de
sentimentos concernentes ao trabalho da equipe gestora, agravados
pela pandemia. Assim, considerando-se que houve aprendizagem e
ganhos, tanto para as estagiárias quanto para a equipe gestora, con
clui-se que o estágio cumpriu seus objetivos. Sugere-se que a inter
venção proposta neste estudo seja desenvolvida no modo on-line ou
presencialmente, no futuro, pois o apoio à equipe gestora da rede pú

230230
blica, via de regra sobrecarregada, é essencial para que o seu trabalho
possa ser realizado com mais tranquilidade e serenidade.

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SUMÁRIO

234234
ANEXO

Anexo 1: Questionário investigativo (elaborado pelos autores).

SUMÁRIO

235235
SUMÁRIO

236236
Capítulo 10
experiência
Juventudes, tecnologiase
formação profissional emtempos
de pandemia: uma
com jovens de são paulo-sp

Lucian da Silva Barros


10
Lucian da Silva Barros

Juventudes, tecnologias e formação


profissional em tempos de pandemia:
uma experiência com
jovens de são Paulo-SP

DOI: 10.31560/pimentacultural/2021.107.237-260
INTRODUÇÃO

A formação para o trabalho é uma pauta constante quando nos


referimos à educação de jovens no Brasil. Incluir as juventudes bra
sileiras no mercado de trabalho formal, em especial, a socialmente
vulnerável, parece ser um desafio presente nas agendas de governo
nas últimas décadas. Esta inclusão visa reduzir as mazelas das desi
gualdades sociais existentes em nosso país, possibilitando acesso ao
trabalho e à educação pelas novas gerações. A pandemia, provocada
pelo novo coronavírus, parece agravar ainda mais tal situação. Coloca
como urgente a emergência de novas estratégias de inclusão e de
educação destas juventudes, perante o novo cenário mundial.

O presente capítulo tem por objetivo relatar e discutir, em uma


perspectiva crítica e libertadora, uma experiência on-line de educação
para o trabalho, desenvolvida com jovens da cidade de São Paulo-SP
(Brasil), durante a pandemia provocada pela Covid-19, no segundo
semestre de 2020. A turma em questão é composta por 35 jovens, com
idades entre 16 e 21 anos, moradores de diversas regiões da cidade
de São Paulo, em sua maioria em situação de vulnerabilidade social,
que fazem parte de um curso de formação de jovens aprendizes, con
forme preconizado pela Lei n. 10.097/2000 (BRASIL, 2000).
SUMÁRIO
A lei em questão traz a obrigatoriedade da contratação de jovens
pelas empresas de todos os segmentos, oferecendo ainda a estes um
curso de formação profissional, o qual deve ser concomitante ao tem
po de trabalho. Este curso, até então realizado de modo totalmente
presencial por uma instituição educacional, passou a ser realizado, em
parte, de maneira remota devido à pandemia. Tal situação obrigou jo
vens e professores a se adaptarem a uma nova realidade, buscando,
de maneira conjunta, novas estratégias de ensino e aprendizagem.

238238
Perante este novo desafio, indagou-se a questão: como conti
nuar a oferecer uma formação profissional de qualidade, desenvolven
do as competências dos jovens, de modo on-line (remoto)? Após inú
meras tentativas, discussões, adaptações, reflexões, erros e acertos,
inevitáveis em um processo como este, apresenta-se o relato de uma
experiência, considerada ainda em processo. Tal experiência buscou
ouvir as vozes dos jovens, acolher seus sentimentos e angústias pe
rante a nova realidade, e propor alternativas para o seu desenvolvi
mento pessoal e profissional, visando a sua autonomia, protagonismo
e análise crítica da situação.

UMA COMPREENSÃO DAS JUVENTUDES

A definição de juventude pode ser desenvolvida por uma série


de pontos de partida: como uma faixa etária, um período da
vida, um contingente populacional, uma categoria social, uma
geração... Mas todas essas definições se vinculam, de algum
modo, à dimensão de fase do ciclo vital entre a infância e a
maturidade. Há, portanto, uma correspondência com a faixa de
idade, mesmo que os limites etários não possam ser definidos
rigidamente (FREITAS, LÉON e ABRAMO, 2005, p. 6).

SUMÁRIO A compreensão do termo juventude “envolve vários grupos e


classes sociais entre as faixas etárias da adolescência e os primeiros
anos da maturidade, mas sem limites precisos de idade” (RIDENTI,
2000, p. 266). As abordagens realizadas por organismos internacionais
ligados à Organização das Nações Unidas (ONU) definem a juventude
como sendo a fase do ciclo de vida compreendida entre 15 e 24 anos
de idade. No Brasil, o Estatuto da Juventude (EJ), aprovado em 2013,
compreende que esta vai dos 15 aos 29 anos.

Porém, mais do que a demarcação de uma faixa etária, na qual


se encaixam determinados membros de uma sociedade, a juventude é

239239
repleta de sentidos e significações, construídas pelo meio social e re
vividas pelos sujeitos em seus grupos e individualmente. A juventude é
uma experiência psicossocial, produzida por meio da intersecção entre
condições sociais, culturais, artísticas, psicológicas, históricas e eco
nômicas, que perpassam o sujeito jovem. Não existem experiências
únicas e iguais para todos os sujeitos, desta forma, a ideia de juven
tudes auxilia na compreensão de como, subjetivamente, cada jovem
vive tal experiência. Portanto, não há uma única juventude, capaz de
ser descrita e estudada. Há sim juventudes.

Esta afirmação faz refletir a respeito das diversidades presentes


neste momento da vida, que é atravessado pela demarcação históri
ca de um tempo e espaço, e por diferentes marcadores sociais – de
gênero, cor, classe social, entre outros. Portanto, a utilização do termo
juventudes (no plural) busca tornar visível essas diversidades e as dife
renças presentes às vivências dos jovens. Busca-se, portanto, ampliar
a concepção vigente de uma juventude única e singular, vivida por to
dos igualmente, compreendendo, então, a multiplicidade de experiên
cias e vivências das juventudes no Brasil e no mundo e a diversidade
de modos de ser jovem existentes.

A juventude, segundo Pais (1993), é uma categoria socialmente


construída, sujeita, portanto, a se modificar ao longo do tempo. Arantes
SUMÁRIO et al (2016) destaca que, a ONU, por meio da proposição de um critério
etário, auxilia a delimitar, apenas, os sujeitos jovens, como todos aque
les que se encontram neste período etário. Mas, para estas autoras, a
questão etária seria, provavelmente, a única regularidade partilhada en
tre todos os jovens, sem exceção, os diferenciando dos demais grupos.

A experiência psicossocial, denominada juventude, vai além de


classificar sujeitos coetâneos, pois requer captar os modos de vida, a
condição social, modos de expressão artística e cultural, entre outros.
Portanto, cada jovem tem uma experiência única e particular da juven
tude. “Acreditamos que é no ‘modo de viver a vida’ que os jovens des

240240
frutam a juventude ao mesmo tempo em que constroem seus planos
futuros” (ARANTES et al, 2016, p. 79).

Segundo Abramovay (2015), as ideias a respeito das juventudes


vêm sendo modeladas na construção social de um tempo histórico,
nas quais as mudanças de paradigmas, os avanços e retrocessos
sociais, o surgimento de novas tecnologias e de diversas demandas
para os indivíduos, em um mundo cada vez mais globalizado, são ca
talisados de forma especial pelos mais jovens. Para esta autora, cada
jovem, de maneira particular, materializa a sua juventude, tendo como
referência tais marcas sociais, seus contextos de vida, seus grupos de
sociabilização e os produtos culturais aos quais tem acesso.

A sociedade tende a construir um modelo de juventude, valoriza


o ser jovem, mas desvaloriza os sujeitos jovens, muitas vezes ridiculari
zando as suas existências, e negando-lhes direitos. Para Dayrell (2016),
os valores considerados ligados à juventude, como estética corporal,
energia e a busca pelo novo, são perseguidos pelo mundo adulto. A
eterna “fonte da juventude”, buscada por tantos nas histórias e lendas,
como algo mágico capaz de proporcionar uma eterna juventude, é
hoje buscada por meio de procedimentos estéticos e tecnológicos,
que visam driblar as consequências do tempo sob as pessoas. Manter
-se jovem, parecer jovem, são reflexos dos tempos atuais. A televisão,
SUMÁRIO
o cinema, a moda, as diversas expressões artísticas e culturais, se
apropriam e são apropriadas pelas juventudes. Ao ligar a televisão ou
navegar na internet, não é incomum ver uma representação do que é
ser jovem em uma determinada sociedade, em um tempo histórico.

Ao propor metáforas a respeito das juventudes, Novaes (2007)


destaca que esta pode ser compreendida como espelhos que refletem
as sociedades em que se desenvolvem. Refletem avanços, retrocesso,
angústias, medos, desejos e potencialidades dos seus tempos.

241241
O CONTEXTO EDUCACIONAL
ANTES DA PANDEMIA

A inserção laboral de adolescentes e jovens, no Brasil, tem aten


dido a diferentes interesses econômicos e políticos, conforme o mo
mento histórico vigente. A partir dos anos 2000, com a consolidação do
ECA (BRASIL, 1990) e outras políticas de governo, nota-se a eminência
de movimentos sociais dos jovens, na qual vemos a possibilidade de
construir novos significados para esta prática social que, além de ga
rantir o acesso dos jovens às vagas de emprego, precisa também as
segurar o seu desenvolvimento de maneira plena e saudável, por meio
da qualificação profissional e formas de trabalho mais justas.

A Lei n° 10.097, de 19 de dezembro de 2000 (BRASIL, 2000),


conhecida como a Lei da Aprendizagem Profissional, surgiu como uma
proposta para realizar, de modo assegurado, a inclusão dos jovens
brasileiros no mercado de trabalho formal. Segundo Moraes (2012),
por um longo período, houve declínio de demanda da aprendizagem
profissional no país, principalmente pelos poucos esforços de fiscali
zação trabalhista e o pouco investido em políticas de formação. A lei
garante aos jovens de 14 a 24 anos a possibilidade de adentrar no

SUMÁRIO mercado de trabalho na condição de jovem aprendiz, fornecendo-lhes


uma formação profissional básica.

As diretrizes referendadas nesta lei compreendem o jovem como


um ser em desenvolvimento, preconizando que, além de exercer ativi
dade profissional no contexto de uma empresa formal, o jovem deverá
realizar um curso de formação oferecido por uma instituição educacio
nal. Esta formação técnico-profissional, segundo a Lei n° 10.097, refe
re-se às “atividades teóricas e práticas, metodicamente organizadas
em tarefas de complexidade progressiva desenvolvidas no ambiente
de trabalho” (BRASIL, 2000, art. 428).

242242
Tais atividades devem ser organizadas pelas empresas e por
entidades qualificadas, por meio de programas de aprendizagem. As
atividades desenvolvidas pelos jovens nas empresas devem preser
var a sua condição de aprendizado, e seguir a Classificação Brasileira
de Ocupações (CBO), conforme o seguimento da empresa. Todavia,
no campo da formação educacional, parecia haver uma lacuna, prin
cipalmente pela falta de diretrizes que estabelecessem minimamente
os caminhos a serem seguidos por esta formação, garantindo, assim,
conforme as leis, o desenvolvimento integral dos jovens. A portaria nº
723, de 2012, do MTE (BRASIL, 2012), objetivou criar um Cadastro Na
cional de Aprendizagem Profissional (CNAP) e um Catálogo Nacional
de Programas de Aprendizagem Profissional (CONAP), além de definir
as diretrizes operacionais e pedagógicas dos programas.

O curso deverá contemplar (BRASIL, 2012) os jovens em seu


desenvolvimento de maneira integral, possibilitando ao jovem condi
ções de aprender e refletir sobre a sua prática profissional na empresa,
e sua inserção profissional no contexto de uma sociedade mais ampla.
Pois, além de discutir a respeito de suas atividades na empresa, que
devem ir de acordo com o segmento em que atuam, os jovens deve
rão estudar conteúdos que contemplem a sua formação nos aspectos
sociais, humanos e cidadãos, visando a sua inserção em uma socieda
SUMÁRIO de, na qual sejam capazes de intervir e transformar. Assim, o trabalho
do jovem na empresa deverá ser concomitante com a sua formação
educacional na instituição de ensino. Destaca-se o papel da formação
educacional no desenvolvimento do jovem aprendiz, sendo capaz de
gerar uma reflexão sobre a sua atuação e uma formação em serviço.

As dimensões teóricas e práticas da formação do aprendiz de


vem ser pedagogicamente articuladas entre si, sob a forma de
itinerários formativos que possibilitem ao aprendiz o desenvolvi
mento da sua cidadania, a compreensão das características do
mundo do trabalho, dos fundamentos técnico-científicos e das
atividades técnico-tecnológicas específicas à ocupação (BRA
SIL, MTE, 2012, art. 10 § 1º).

243243
Para Fonseca (2015), esta nova ideia proporciona uma revolu
ção na aprendizagem profissional, pois esta passa a não estar mais
atrelada, como no passado, a profissões específicas ou ofícios. Bus
cam-se, então, competências consideradas básicas à execução de
qualquer trabalho, em consonância com as constantes mudanças do
mundo do trabalho, e que devem ser pensadas de maneira metódica
e progressiva. A formação deve buscar alternar experiências, teorias e
práticas, a fim de gerar um constante diálogo entre ambos os campos.
“O direito à profissionalização, prioritário para adolescentes e jovens, e
essencial para adultos e pessoas com deficiência, assume relevância
estratégica no momento em que se vivencia a chamada ‘sociedade do
conhecimento’” (FONSECA, 2015, p. 96).

Nesta perspectiva, as diretrizes curriculares traçadas visam ao


desenvolvimento do jovem enquanto trabalhador e cidadão, primando
por seus aspectos sociais e profissionais. Com especial atenção às ju
ventudes que se apresentam em situações de vulnerabilidades e aos jo
vens com deficiência. Com relação ao conteúdo a ser abordado durante
os cursos de formação, é possível encontrar as seguintes propostas:

a) Comunicação oral e escrita, leitura e compreensão de tex


tos e inclusão digital; b) Raciocínio lógico-matemático, noções
de interpretação e análise de dados estatísticos; c) Diversidade
cultural brasileira; d) Organização, planejamento e controle do
SUMÁRIO processo de trabalho e trabalho em equipe; e) Noções de di
reitos trabalhistas e previdenciários, de saúde e segurança no
trabalho e do Estatuto da Criança e do Adolescente - ECA; f)
Direitos humanos, com enfoque no respeito à orientação sexual,
raça, etnia, idade, credo religioso ou opinião política; g) Educa
ção fiscal para o exercício da cidadania; h) Formas alternativas
de geração de trabalho e renda com enfoque na juventude; i)
Educação financeira e para o consumo e informações sobre o
mercado e o mundo do trabalho; j) Prevenção ao uso de álcool,
tabaco e outras drogas; k) Educação para a saúde sexual repro
dutiva, com enfoque nos direitos sexuais e nos direitos repro
dutivos e relações de gênero; l) Políticas de segurança pública
voltadas para adolescentes e jovens; m) Incentivo à participa

244244
ção individual e coletiva, permanente e responsável, na preser
vação do equilíbrio do meio ambiente, com enfoque na defesa
da qualidade ambiental como um valor inseparável do exercício
da cidadania (BRASIL, MTE, 2012, art. 10 III).

Em uma análise geral, os conteúdos estabelecidos apresentam


uma grande variedade de temáticas a serem abordadas na formação
dos jovens. Estes giram, ora em torno de uma formação profissional
mais específica, mesmo que não ligados a um único ofício, ora vão
rumo ao que se pode chamar de uma formação cidadã. Desperta
maior atenção, neste momento, conteúdos como: diversidade cul
tural, ECA, Direitos Humanos com enfoque no respeito à orientação
sexual, raça, etnia, idade, credo religioso ou opinião política, educa
ção para a saúde sexual e reprodutiva, relações de gênero e meio
ambiente. Tais temáticas parecem aflorar mediante as discussões
sociais que aparecem na cena pública da atualidade.

Na instituição educacional na qual a experiência foi realizada,


o curso de formação de jovens aprendizes segue as diretrizes legais
traçadas, dividindo-se em unidades curriculares, a partir do desen
volvimento de diferentes competências. Tais unidades curriculares
são: Mundo do Trabalho; Desenvolvimento Pessoal; e Participação
Social. Englobando aspectos do eu-trabalhador, eu-indivíduo e o eu

SUMÁRIO -social, buscando uma formação integral dos jovens. Além destas, há
também as unidades curriculares de Projeto Aprendizagem e Prática
profissional, que compõem e complementam a sua formação. Sem
pre privilegiando atividades em grupo, simulações, dramatizações,
visitas técnicas e culturais, relatório individuais, entre tantas outras
estratégias de modo dialógico e ativo.

O desafio a esta formação profissional oferecida aos adolescen


tes e jovens trabalhadores, conforme preconizado pela Lei da Aprendi
zagem, parece residir em um processo educacional que compreenda
estes sujeitos como indivíduos integrais em seus aspectos bio, psico,

245245
cognitivos e sociais. Indo além de uma formação profissional com foco
no mercado de trabalho, deve-se buscar oferecer uma formação que
compreenda adolescentes e jovens como seres em desenvolvimento
e com necessidades específicas. Desta forma, deve-se garantir este
desenvolvimento integral perante uma situação sanitária global, algo
que pareceu, sem dúvida, um grande desafio a ser realizado.

RELATO DA EXPERIÊNCIA

De acordo com Teixeira et al. (2020), tem sido necessário re


inventar a educação em tempos de pandemia. Os processos de
adaptação/transformação, nos diversos níveis de ensino, precisaram
ser feitos de forma inesperada, reestruturando ambientes de apren
dizagem e agudizando nuances que ainda levariam anos para serem
feitas. “Em certa medida, tal migração acelerou o (re)inventar de prá
ticas pedagógicas, ressignificando antigos espaços e criando novos
lugares para a aprendizagem e o ensino” (TEIXEIRA et al., 2020, p.
1). Porém, não se trata de um trabalho isolado e solitário, mas o qual
deve ser construído com inúmeras mãos.
Esta nova situação tem gerado inúmeros desafios à Educação,
SUMÁRIO como um todo, atingindo, em especial, docentes, estudantes,
gestores e familiares, ao mesmo tempo em que oportunizou um
despertar para a valorização e ampliação da educação on-line
no país e no mundo (TEIXEIRA et al, 2020, pp. 1-2).

Mesmo reconhecendo as limitações e dificuldades que a in


cidência inesperada deste novo modelo de educação suscitou, e as
consequências para as aprendizagens dos alunos, este texto busca
abarcar, em uma visão de esperança, suas potencialidades e alcan
ces. Reconhecendo que a educação de qualidade, aquela que ofe
rece aos alunos meios para o alcance e exercício de sua cidadania,

246246
pode e deve ser feita nos diversos espaços e contextos, seja no pre
sencial ou on-line (remotamente).

Como já apontado, até o início de 2020, o curso em questão, de


formação de jovens aprendizes, era oferecido totalmente de modo pre
sencial. Contava com uma carga horária semanal de 8h, dividido em
dois dias de aula. Uma característica marcante do trabalho desenvol
vido com este público era, sem dúvida, a multiplicidade de atividades,
tais como dinâmicas, jogos, brincadeiras em geral, as quais requeriam
sempre muito contato e proximidade entre todos, aspectos impossí
veis de serem praticados com o distanciamento social e a situação de
quarentena, estabelecidos a partir de março de 2020.

Em um primeiro momento, as aulas foram suspensas e os alu


nos e professores passaram a ficar de casa, apenas mantendo um
contato via mensagens e textos. Este primeiro momento foi chamado
pela instituição de ações de acolhimento e vínculo, que visavam man
ter a interação entre as turmas e a proximidade com os professores.
Com a continuidade e indeterminação do tempo de isolamento social
necessário, a instituição optou, a partir de maio de 2020, pela retomada
das atividades dos alunos, porém de modo on-line (remoto). Os pro
fessores passaram então a pensar nos conteúdos e estratégias que
poderiam ser realizados neste contexto, visando ao cumprimento do
SUMÁRIO
currículo do curso e o desenvolvimento das competências nos jovens.

Partindo-se, inicialmente, de uma situação totalmente nova e


confusa, na qual muitos elementos precisaram ser vistos, revistos e re
conhecidos por todos. O caminho pareceu se mostrar mais claramente
no próprio caminhar, parafraseando um tão conhecido verso. Desta
forma, conforme as aulas iam acontecendo, por meio de diversas fer
ramentas e canais, as estratégias iam sendo pensadas e adaptadas
às realidades das turmas e dos alunos, individualmente. A expressão
de desânimo e, às vezes, o desinteresse, de alguns alunos, perante as
atividades e interações propostas, precisaram ser contornados, visto

247247
que muitos não acreditavam que poderiam aprender e desenvolver as
suas potencialidades por meio das aulas on-line (remotas).

Neste contexto, o uso do aplicativo de mensagens WhatsApp


tornou-se a principal ferramenta de comunicação entre professores e
alunos, mostrando-se como um recurso potencializador na construção
de aprendizagens e de reflexões sobre o mundo do trabalho e demais
conteúdos do currículo do curso de formação, mesmo que a distância.
Outra ferramenta utilizada durante o período foi o Microsoft Teams, este
disponibilizado pela instituição educacional à qual o grupo pertence,
no qual foi possível a realização de encontros síncronos com a turma,
realização de atividades, formação de grupos, entre outras possibilida
des. Até mesmo o e-mail foi utilizado, incialmente, com alguns alunos,
que não tinham acesso a outros recursos, para a realização das aulas
e atividades. Assim, professores e alunos interagiam, trocavam ideias
e pensamentos, aprendiam uns com os outros, construindo, assim,
uma própria comunidade de aprendizagens sobre o uso dessas tec
nologias e suas potencialidades, uma verdadeira ecologia de saberes,
nos termos de Santos (2007).

Perante as dificuldades encontradas para a realização das ati


vidades de maneira remota, ocasionadas principalmente pela falta de
recursos tecnológicos apropriados, tais como smartphones e com
SUMÁRIO putadores, a falta de rede Wi-Fi em casa ou ainda a não familiarida
de no manuseio de algumas tecnologias, pensou-se em estratégias
que tornassem os conteúdos mais acessíveis aos jovens, haja vista
as suas realidades, seus tempos e seus espaços. Vale contextualizar
que menos da metade dos jovens dispunha de computador em casa,
a maioria usava pacotes de dados limitados de internet, e, em alguns
casos, os smartphones que dispunham não contavam com memória
suficiente para o uso de recursos mais avançados.

248248
Pretendeu-se também pensar e discutir sobre o uso e apropria
ção pelos jovens de tais recursos digitais e tecnológicos para a realiza
ção das atividades, durante o período de isolamento social, refletindo
sobre a perspectiva de inclusão/exclusão provocada por estas tecnolo
gias. Sobre estes aspectos, o relatório Estação Juventude, lançado em
2014, pela Secretaria Nacional de Juventude, já chamava a atenção:

A expansão das redes digitais se depara com realidades eco


nômicas e sociais diferenciadas. Vários autores chamam a aten
ção para os fortes obstáculos para a posse e a utilização de
computadores e internet, entre os quais se destacam: o nível
de renda e a escolarização; o pouco contato com pessoas que
utilizam essas tecnologias; as assimetrias na disponibilidade de
equipamentos para conexão (tais como computador, modem
etc.) e na infraestrutura de conexão. Assim, a ideia de inclusão
digital não se restringe ao acesso, também remetendo a desi
gualdades de acesso (qualidade precária) e a disparidades na
forma de utilização de uma tecnologia. As TICs não são “meios
técnicos” neutros, pois não eliminam hierarquias cognitivas. Isto
quer dizer que as diferenças e desigualdades sociais se revelam
na falta de conhecimento ou experiências para se apropriar de
uma informação virtualmente disponível (BRASIL, 2014, p. 83).

Ao ver cotidianamente os jovens fazendo uso de celulares e


aparelhos eletrônicos, é possível considerar, em um primeiro olhar,
que estes estão incluídos digitalmente. De fato, são nativos digitais, já
SUMÁRIO nasceram imersos em um mundo muito mais tecnológico e digital que
seus pais e avós, porém não se pode perder de vista também que as
diferenças sociais e econômicas determinam acessos, apropriações a
estes meios, geralmente com disparidades entre as juventudes. Com
preende-se, assim, que a utilização das “tecnologias da informação
e da comunicação (TICs) transformam-se em verdadeiras marcas de
identidade dos jovens, assim como são instrumentos de demarcação
de fronteiras sociais” (BRASIL, 2014, p. 79).

249249
O acesso às TICs, a uma internet de qualidade e a outros meios
para se comunicar e se informar, deve ser tomado como um direito
fundamental de todos. Porém, tal situação ficou exposta durante esta
pandemia, demonstrando que ainda há um longo caminho a ser cons
truído, principalmente no que diz respeito aos direitos das juventudes.
“O acesso à informação é um direito e condição do exercício de cida
dania, indispensável e estratégico ao desenvolvimento pessoal e social
dos jovens” (BRASIL, 2014, p. 86).

Muitas ações de ordem particular, de organizações sociais, gru


pos de pessoas, entre outros, foram realizadas durante a pandemia
para tentar auxiliar nesta questão. Seja oferecendo equipamentos, pa
gando planos de internet, chamando atenção do poder público, busca
ram-se estratégias para que os diversos alunos não perdessem, nesse
momento, o seu direito a uma educação de qualidade. No contexto
dos cursos de formação de jovens aprendizes, as empresas responsá
veis pela contratação de jovens passaram a ser também responsáveis
por fornecer estes meios (computadores e internet) aos alunos, o que,
ao longo do segundo semestre de 2020, propiciou o aumento significa
tivo da participação de todos e as possibilidades de interação durante
as aulas, as quais passaram a ser realizadas, em sua grande maioria,
via plataforma Microsoft Teams.
SUMÁRIO Como exemplo, a fim de compreender os sentimentos provo
cados nos jovens por toda esta situação, ao início das aulas, os pro
fessores utilizaram uma ferramenta on-line chamada Mentimetter, com
a qual é possível criar jogos, murais de opiniões e discussão, assim
como nuvens de palavras, como a apresentada na figura 1. A partir
do levantamento de tais sentimentos, foi possível trazer às aulas, em
certos momentos, um foco maior ao equilíbrio emocional dos jovens
durante este período, o qual é fruto de constantes preocupações.

250250
Figura 1 – Nuvem de palavras: sentimentos.

Fonte: elaborado pelo autor.

O equilíbrio emocional tem sido a maior dificuldade para os jo


vens durante a pandemia, principalmente com relação aos estudos
e aprendizados, aliado à dificuldade de organização, à falta de um
ambiente tranquilo em casa para tal e à dificuldade para tirar dúvidas
com os professores. Conforme apontado pela pesquisa ‘Juventudes
e a Pandemia do Coronavírus’, realizada pelo Conselho Nacional de
Juventudes (CONJUVE)22, os jovens destacam que a existência de
conteúdos para trabalhar as emoções (estresse, ansiedade) seriam
SUMÁRIO mais relevantes nestes tempos de pandemia. Com base nesses dados
e informações, foram realizadas estratégias com a turma de jovens
que visassem ao trabalho com os sentimentos e emoções. As aulas se
tornaram um lugar para que os jovens falassem sobre o que estavam
sentindo cotidianamente, tentando sempre englobar os conteúdos a
serem abordados com as vivências nos tempos de pandemia.

22
Disponível em https://atlasdasjuventudes.com.br/juventudes-e-a-pandemia-do-coronavi
rus/. Acesso em 02 de julho de 2021.

251251
A ansiedade com o coronavírus, o tédio, as saudades de ami
gos e ‘crushes’ (paqueras, pessoas por quem eles se interessam
amorosamente, em tradução livre), o interesse em conhecer formas de
organizar os estudos, tudo isso faz parte do cotidiano da maioria dos
adolescentes e jovens. Ao todo, 3.933 pessoas, de todo o Brasil, res
ponderam à enquete da plataforma U-Report Brasil sobre a pandemia
de Covid-1923. Na opinião dos participantes, o maior desafio em meio à
pandemia tem sido lidar com a preocupação e a ansiedade em relação
ao coronavírus. Essa preocupação foi mais frequente entre moradores
de capitais do que entre aqueles que moram em outras cidades, mas
foi a mais citada em ambos os grupos. Entre as crianças e adolescen
tes de até 14 anos, que moram em capitais, o maior desafio é ficar lon
ge de amigos e do crush. Nas outras cidades, o tédio foi o mais citado.

Desta forma, trabalhar com este tédio e o sentimento de não ter


nada para fazer foi um conteúdo desenvolvido nas aulas. Como organi
zar o tempo durante o isolamento social foi algo debatido por alunos e
professores, em que cada um demonstrou o que estava fazendo, e de
que maneira foi possível deixar o seu dia mais produtivo, diminuindo a
sensação de tédio. O grupo de WhatsApp da turma se transformou neste
lugar de contato diário, de troca de informações, de engajamento e de
esperança, perante a situação de crises. O compartilhamento com os
SUMÁRIO pares das situações vividas se revelou a melhor estratégia de acolhimen
to e de aprendizagem. Por mais que haja uma relação de afeto e vínculo
com o professor, os alunos podem sentir-se melhor conversando com os
seus pares, cabendo ao professor apenas respeitar essa relação.

Algumas atividades especiais foram realizadas, ao longo dos


meses, a fim de proporcionar maior interação entre os alunos e profes
sores. Dentre estas, vale destacar uma atividade de festa junina, em
formato de arraial on-line, comemorando-se o dia de São João, com jo
gos e dinâmicas adaptadas à nova realidade. Outra atividade bastante
23
Disponível em https://www.ureportbrasil.org.br/story/739/. Acesso em 02 de julho de 2021.

252252
marcante foi realizada em comemoração ao Dia das Crianças, no mês
de outubro, intitulada de ‘Um retorno à infância: sonhos, descobertas
e aprendizados’. Nela, os alunos criaram um mural com fotos da infân
cia, criaram uma playlist com músicas de seu agrado e falaram sobre
brincadeiras e memórias marcantes. A figura 2 apresenta uma pesqui
sa respondida pelos alunos, utilizando-se a plataforma Mentimetter,
falando sobre a sua brincadeira preferida na infância.

Figura 2 - Brincadeira da infância

Fonte: elaborado pelo autor.

A fim de exemplificar melhor o processo educacional, realizado


SUMÁRIO com os jovens neste contexto, faz-se uso agora do exemplo de uma
experiência de aprendizagem realizada entre novembro e dezembro
de 2020. Tal experiência teve como foco o desenvolvimento pessoal
e o autoconhecimento dos jovens, entendidos como essenciais no
processo de formação profissional das juventudes. Nesta, após refle
xões e discussões, os jovens foram convidados a construir um Portfólio
Pessoal em meio digital. Um portfólio pode ser compreendido como o
conjunto de trabalhos de um indivíduo, uma coleção de suas obras, ou
uma sequência que conta uma determinada história. Neste contexto, o
portfólio tinha por objetivo levar os jovens a uma reflexão sobre os seus
aspectos mais pessoais, reunindo, em um único local, informações so

253253
bre si, sua vida e perspectivas de futuro. Os objetivos de aprendizagem
traçados para a realização do Portfólio Pessoal foram os seguintes:

• Oportunizar a reflexão a respeito dos aspectos que compõem


o desenvolvimento pessoal e buscar um autodesenvolvimen
to contínuo;

• Promover o autoconhecimento dos jovens a partir das diversas


representações de si;

• Compreensão, reconhecimento e reflexão sobre o que é e quais


são as suas potencialidades;

• Reconhecimento e fortalecimento de características individuais


perante o seu planejamento de carreira e vida;

• Descobrir sonhos e expectativas para o futuro;

• Pensar em estratégias para o alcance dos objetivos pessoais;

• Mapear de forças, fraquezas, oportunidades e ameaças para


o futuro;

• Refletir sobre os Projetos de Vida;

• Compreender sobre o processo de planejamento financeiro in


SUMÁRIO
dividual;

• Reflexão e apresentação do que são investimentos financeiros.

A partir destes objetivos e da reflexão sobre as características da


turma e dos alunos, foram elencadas algumas ferramentas que deve
riam compor o portfólio dos alunos, deixando para estes também a au
tonomia de acrescentar outros itens que julgassem pertinentes. A figura
3 apresenta os itens que compuseram a estrutura do Portfólio Pessoal,
conforme a proposta dos professores. São eles: Apresentação Pessoal;
Missão, Visão e Valores; Marca Pessoal; Curtograma; Pirâmide de Ha

254254
bilidades; Minha Experiência; Projetos para o Futuro; Análise SWOT; e
Planejamento Financeiro/Matriz de Recursos. Algumas destas já haviam
sido desenvolvidas com a turma em outros momentos do curso, mas
aqui foram retomadas e reatualizadas, a partir desse novo contexto.

Figura 3 - Itens de Portfólio Pessoal.

Fonte: elaborado pelo autor.

Para estimular a criação dos portfólios, foram utilizados vídeos


de inspiração, leitura de textos, reflexões e provocações em formatos
de frases que objetivaram facilitar a construção dos itens elencados,
SUMÁRIO tais como: Conhece-te a ti mesmo; Todo mundo tem um talento, é só
uma questão de descobrir; Seja você mesmo, porque todos os outros
já existem; A arte diz ao jovem quem ele é; Projeto de vida é o caminho
entre o ser e o querer ser na vida de cada pessoa; dentre outras opções.

Com base no roteiro apresentado pelos professores ao longo de


quatro encontros síncronos, via Microsoft Teams, os jovens realizaram
as entregas dos portfólios utilizando diversos meios, tais como: vídeos,
músicas, desenhos digitalizados ou ainda apresentações por meio
de sites como Sway, Canva, Prezzi, entre outros, os quais englobam
múltiplas linguagens e formas de expressão. Foi realizado um dia de

255255
apresentação dos portfólios, no qual os jovens puderam compartilhar
com a turma suas criações, sentimentos, descobertas e dificuldades
de realização, assim como a superação destas dificuldades. Dos mais
simples aos mais complexos, todos os jovens entregaram os seus tra
balhos e puderam refletir sobre a importância deste para o seu desen
volvimento pessoal em tempos de pandemia.

Ao final do processo de criação dos portfólios, foi realizada uma


pesquisa de avaliação por meio do Google Forms, a fim de se mensurar
o impacto da atividade na perspectiva dos jovens, trazendo ainda ele
mentos para a sua continuidade. Os resultados demostraram a satisfa
ção dos jovens com a atividade, aumento de seus níveis de autoeficácia,
uma vez que se sentiram capazes de realizar uma atividade que julgavam
inicialmente tão completa, ampliando uma representação de si positiva.

Como resultados, foi possível perceber que a realização da ativi


dade possibilitou aos jovens um momento de reflexão sobre suas vidas
no agora, trazendo ainda uma prospecção para o futuro. Possibilitou
aos jovens também um sentimento de autoria, ao criarem seus portfó
lios, enriquecendo-os com a apresentação aos demais da turma, o que
gerou momentos de compartilhamentos e criação de uma comunidade
de aprendizagem. A atividade facilitou também o contato com diferen
tes tecnologias, visto que os jovens foram estimulados a explorarem
SUMÁRIO
meios digitais para a sua criação. Alguns aprenderam a editar vídeos,
montar sites, administrar páginas em redes sociais, a partir da ativida
de. Os jovens foram estimulados a compartilharem os seus portfólios
com outras pessoas, principalmente familiares, e, se possível, que pu
blicassem o portfólio na internet, como uma maneira de publicizar a
sua criação digital, transformando esta em um currículo vivo e criativo,
tão valorizado pelas empresas nos processos seletivos da atualidade.

256256
CONSIDERAÇÕES FINAIS

O presente texto teve como objetivo apresentar e discutir uma


experiência educacional de formação para o trabalho, desenvolvida
com jovens da cidade de São Paulo-SP, durante a pandemia da Co
vid-19, no ano de 2020. Ainda em 2021, data da escrita deste capítulo,
a situação sanitária não foi solucionada e as turmas continuaram de
senvolvendo suas atividades do curso de formação de jovens aprendi
zes de modo on-line (remoto). As turmas que, inicialmente, estavam no
presencial e migraram para o remoto finalizaram o curso, não podendo
haver, assim, uma despedida presencial.

Outras turmas de jovens aprendizes começaram neste formato


(on-line), requerendo dos professores outras adaptações e modifica
ções, afinal o desafio agora reside em acolher, criar laços e vínculos
com alunos que só se conhecem no virtual, mas isto é assunto para
outro texto, um próximo relato.

A respeito da experiência aqui relatada e seus impactos, é possí


vel elencar que esta se revelou em um momento profícuo para o apren
dizado de alunos e professores, assim como para o desenvolvimento de
diferentes habilidades. Perante a situação enfrentada, as dificuldades de
SUMÁRIO acesso e concretização da participação dos alunos foram aos poucos
sendo vencidas, criando-se uma comunidade de aprendizagem on-line.

Reconhecer o trabalho do professor como algo que requer co


nhecimentos e técnicas específicas, advindas de estudo e formação
constantes, possibilita o situar-se como profissional da educação, que
compreende, atua e interfere neste campo de saber. A necessária flexi
bilidade do professor impele a pensar que ele nunca conhecerá todos
os alunos, todas as suas realidades e necessidades, nunca será um
expert capaz de ensinar a todos, em qualquer contexto. Mas, ele pode
ter isto em perspectiva quando se mostra aberto, sensível, solidário,

257257
reflexivo e empático, junto às juventudes com as quais trabalha. Aqui
se reconhecem estes valores na prática então relatada.

Nesta perspectiva, as diferentes metodologias de ensino po


dem ser analisadas, deixando claro os seus pressupostos e os con
textos em que foram cunhadas. Entendendo, com isso, que toda prá
tica revela uma visão de ser humano, de sociedade, de conhecimento
e de educação. Questiona-se, neste momento, sobre quais visões os
professores que atuam junto às juventudes trabalhadoras têm basea
do a sua prática cotidiana.

A reflexão didática, segundo Candau (2000), que aprimora a


relação teoria-prática, tem compromisso com a transformação social,
buscando práticas pedagógicas que tornem o ensino eficiente para
todos, segundo suas necessidades. Torna ainda a prática docente
não individualista, pois promove a integração no ambiente escolar
e a discussão constante acerca do currículo. Pois, uma vez que não
há receitas, o professor deve construir a sua prática ensaiando, ana
lisando e experimentando.

Concorda-se com Dayrell (2016) de que não existem “receitas”


prontas para o trabalho com jovens, ainda mais quando se conside
ra um contexto tão atípico e desafiador como o colocado pela pan
SUMÁRIO demia. Para este autor, somente a partir do diálogo entre jovens e
educadores pode-se pensar nesta ação educativa. O exemplo, aqui
apresentado, da criação do Portfólio Pessoal buscou abarcar, no con
texto das práticas com os alunos, as suas necessidades, desejos e
anseios. Concorda-se, assim, que os professores devem ser convi
dados “a refletirem sobre sua própria prática, estimulando a ação-re-
flexão-ação” (DAYRELL, 2016, p. 250).

A ação educativa junto aos jovens, neste contexto de pandemia e


afastamento social, no qual não é possível o encontro físico, deve seguir
pressupostos e objetivos específicos, com vistas à formação humana,

258258
ao reconhecimento dos jovens como sujeitos sociais, com múltiplas
identidades que apresentam demandas específicas das suas condi
ções de vida. São diversos os desafios postos neste processo: a for
mação educacional das juventudes, como prática da autonomia, bem
como o reconhecimento das culturas juvenis no espaço escolar, no sen
tido dos projetos de vida. Aqui seguimos confiantes e esperançosos.

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Microsoft Teams - https://www.microsoft.com/pt-br/microsoft-365/microsoft
-teams/free
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260260
on-line

Capítulo 11

Intervenção psicológica
para o desenvolvimento de projetos
de vida de adolescentes darede
pública: desafios e possibilidades

Juliano Porto de Cerqueira Leite

Júlia Kawano Brito

Carlos Henrique Ferreira


11
AntonellaJuliano PortoBisetto de Cerqueira Leite
SilvaKawano Brito
daJúlia
Antonella Bisetto
LetíciaCarlosLovatoDellazzana-Zanon
Henrique Ferreira da Silva
Letícia Lovato Dellazzana-Zanon

Intervenção psicológica on-line para o


desenvolvimento de projetos de vida
de adolescentes da rede pública:
desafios e possibilidades

DOI: 10.31560/pimentacultural/2021.107.261-285
INTRODUÇÃO

No ano de 2020, não seria possível abordar qualquer tema


relacionado à educação sem destacar os impactos que a COVID-19
ocasionaram neste âmbito. Isto porque, com a pandemia, foram can
celadas as aulas presenciais em escolas e universidades, resultando
em um prejuízo para mais de 90% dos estudantes dos mais diversos
países (UNESCO, 2020). Dentre as adversidades que acompanham o
contexto pandêmico, estão as dificuldades de acesso dos estudantes
à educação, por meio da tecnologia, e as questões de saúde física
e mental. Com o prolongamento do distanciamento social, surgiram
fatores estressores, como a privação do contato social entre colegas,
o constante medo de ser infectado pelo vírus e a falta de espaço em
casa, o que tornou os alunos menos ativos fisicamente do que se esti
vessem na escola (DIAS; PINTO, 2020).

O ano de 2020 representou um desafio a mais para os profissio


nais da educação: a implementação da disciplina de Projeto de Vida
(PV). Essa disciplina surgiu para dar conta da competência 6 da Base
Nacional Comum Curricular (BNCC), que fala sobre a necessidade de
ajudar os estudantes a fazerem escolhas alinhadas ao seu projeto de
vida, considerando aspectos como consciência crítica, responsabili
SUMÁRIO dade, liberdade e autonomia (BRASIL, 2017a). Essa inclusão do PV,
na legislação escolar, chama atenção para a importância do trabalho
de construção do PV do adolescente, bastante difundida na literatura
sobre a temática (ARAÚJO; ARANTES; PINHEIRO, 2020; DELLAZZA
NA-ZANON; BACHERT; GOBBO, 2018; DELLAZZANA-ZANON et al.,
2020; DELLAZZANA-ZANON; SILVA; ZANON, no prelo). Entretanto,
sabe-se que os professores que assumiram a disciplina de PV não
foram devidamente capacitados para abordar essa temática com seus
alunos. Soma-se a isso a transição do ensino presencial para o ensino
remoto, por conta das medidas de isolamento social implantadas para
conter a disseminação do coronavírus, com todas as dificuldades de

262262
adaptação que isso acarretou, tanto para os professores como para os
alunos. Este capítulo tem como objetivo apresentar uma intervenção
psicológica realizada on-line, com foco na promoção de PV para alu
nos do Ensino Médio de uma escola pública de Ensino Fundamental
II e Ensino Médio. A intervenção foi realizada por um grupo de duas
estagiárias e um estagiário do quarto ano do Curso de Psicologia de
uma universidade do interior de São Paulo.

EDUCAÇÃO PÚBLICA NO CONTEXTO


DA PANDEMIA: IMPACTOS E DESAFIOS

Com o fechamento das escolas, foi necessário que a educa


ção fosse continuada de forma remota. As secretarias da educação
do país adotaram, como estratégia de ensino remoto: (a) a utilização
de aulas síncronas ou assíncronas, transmitidas via TV aberta, rádio,
redes sociais, páginas eletrônicas das secretarias de educação, pla
taformas digitais; e (b) a disponibilização de materiais e atividades
digitais. No estado de São Paulo, a adoção do ensino remoto se deu
a partir do lançamento do Centro de Mídias da Educação de SP e
da transmissão de aulas via dois canais digitais da TV Cultura, em
SUMÁRIO acordo com o Governo (CUNHA; SILVA; SILVA, 2020). Esta forma de
ensino tem gerado um aumento de respostas de desatenção e irrita
bilidade por parte dos alunos (JIAO et al., 2020).

O ensino remoto tem sido erroneamente comparado à Educação


a Distância (EAD). No entanto, diferentemente da EAD, o ensino remoto
é tido como uma solução rápida, utilizada por um curto espaço de tem
po, e diz respeito a atividades oferecidas tanto por meios digitais como
físicos, podendo abranger diferentes modalidades, como videoaulas,
programas de televisão ou rádio, redes sociais, suportes virtuais ou ado
ção de materiais didáticos impressos (RIBEIRO JÚNIOR et al., 2020).

263263
A adaptação a esse novo ensino, apesar de necessária, piorou
a qualidade da aprendizagem, e fez com que a aversão de muitos
alunos em relação às aulas se intensificasse (LANCKER; PAROLIN,
2020). Isso ocorre, pois o ensino remoto traz um modelo massivo e
unidirecional, resultando no desânimo dos alunos e na exaustão dos
docentes (BARBOSA; JÚNIOR, 2020). Em parte, esses sentimentos
também são gerados pela falta de interação no ambiente educacio
nal, tornando as aulas uma fonte de transmissão de conteúdo ape
nas, negligenciando a subjetivação, a construção em conjunto e a in
terdisciplinaridade, o que reduz o processo de educação somente ao
ensino (MARTINS; ALMEIDA, 2020). Nesse contexto, um dos maiores
desafios para os professores é conseguir manter a atenção dos alu
nos às aulas remotas, tornando-as atrativas, interativas e capazes
de engajar os alunos, principalmente aqueles que demonstram baixo
comprometimento, uma vez que a leitura corporal deixa de ser efetiva
nas aulas on-line (RIBEIRO JÚNIOR et al., 2020).

Dentre os prejuízos causados pelo contexto pandêmico, o dis


tanciamento social privou os adolescentes de seu contato, antes diário,
com seus pares, que se faz tão importante para o seu desenvolvimen
to. A socialização entre iguais possibilita a formação de apoio, empatia
e autoconhecimento, uma vez que os indivíduos compartilham suas
formas de lidar diante dos impasses da idade. Em uma fase na qual
SUMÁRIO
os conflitos entre pais e filhos tendem a se tornar mais comuns, o iso
lamento se apresenta como um desafio a mais (THE LANCET CHILD
ADOLESCENT HEALTH, 2020).

Em um estudo realizado via formulários on-line, com o objetivo


de avaliar a educação à distância, 17 alunos de instituições públicas do
ensino fundamental e médio relataram falta de motivação e de um local
adequado para o estudo, dificultando a compreensão dos conteúdos,
e ausência de uma organização rotineira dos horários de estudo (MI
RANDA et al., 2020). Esses resultados apontam para o impedimento

264264
de avançar nos conteúdos, uma vez que assuntos prévios não foram
satisfatoriamente assimilados (MÉDICI; TATTO; LEÃO, 2020). Além dis
so, a falta do contato entre pares e da interação em sala de aula têm
sido apontadas por alunos como uma das maiores dificuldades aca
dêmicas decorrentes do ensino remoto (LANCKER; PAROLIN, 2020).

As escolas públicas têm ainda um papel essencial na alimenta


ção dos alunos, principalmente aqueles que são membros de famílias
em situação de vulnerabilidade social (PEREIRA et al., 2020). Por isso,
o fechamento das escolas representa um impacto relevante na inges
tão calórica de muitos estudantes, e escancara as desigualdades so
ciais à que estas crianças estão submetidas, sejam elas educacionais
ou econômicas (JUNIOR; MORAES, 2020). As desigualdades sociais
são agravadas nesse contexto pandêmico: parte da população pode
proporcionar acesso a recursos eletrônicos que permitem seus filhos
acompanharem os estudos transmitidos de forma remota pela escola,
enquanto a outra parcela luta pela sua sobrevivência, sem poder ofe
recer acesso a muitas das necessidades básicas de suas crianças,
quanto mais acesso a uma rede de internet e equipamentos tecnológi
cos que os permitam estudar (MÉDICI; TATTO; LEÃO, 2020). Assim, o
fechamento das escolas, com a interrupção das aulas, e o advento do
ensino remoto acarretaram sérias consequências para a saúde mental
de crianças e adolescentes (DELLAZZANA-ZANON et al., 2020).
SUMÁRIO
De acordo com o Comitê Gestor da Internet no Brasil (CGI.br,
2019), a desigualdade quanto ao acesso à rede de internet é nítida.
No ano de 2019, apenas 71% da população brasileira utilizava internet,
sendo que, destes, 99% correspondiam à classe socioeconômica A,
95% à classe B, 80% à classe C, e somente 50% correspondiam às
classes De E. Esses dados representam não somente a disparida
de nas condições de acesso à internet, mas também evidenciam a
desigualdade quanto ao acesso à educação, no Brasil, frente ao con
texto pandêmico, que tem se mantido, em grande parte, dependente

265265
de recursos tecnológicos. Além disso, em média, apenas 37% das re
sidências possuem internet e computador, o que significa, ainda, que
grande parte da população não dispõe de ferramentas importantes
para acompanhar as aulas de forma adequada, apesar de ter acesso
à conexão de rede (CUNHA; SILVA; SILVA, 2020).

Em relação à parcela da população supracitada, encontram-se


também outras dificuldades que corroboram para que essas famílias se
jam impossibilitadas de proporcionar um ambiente físico ou familiar com
recursos necessários para a educação de suas crianças em casa. Frente
à ameaça vital da COVID-19, e submersos às inseguranças e incertezas
acerca do futuro, essas famílias são obrigadas a enfrentar o dilema entre
manter o seu sustento, colocando a sua vida em risco, e deixar o seu
emprego para sentirem-se seguras contra o vírus. Os pais passam a ter
um papel ainda mais fundamental na educação de seus filhos, que dei
xam de frequentar o ambiente escolar para estarem presentes em suas
residências de forma ininterrupta. Esse fato é preocupante, uma vez que
grande parte dessas famílias é majoritariamente composta por provedo
res que tiveram pouca ou nenhuma escolaridade, estando empregados
em funções precárias ou provisórias, o que torna pouco provável que
possam ocupar, na vida de suas crianças, o espaço que corresponde à
ausência da escola (GOLBERSTEIN; WEN; MILLER, 2020).
SUMÁRIO

PROJETOS DE VIDA NA ADOLESCÊNCIA:


DEFINIÇÃO E IMPORTÂNCIA

A literatura científica, acerca da temática de Projetos de Vida (PV),


argumenta que o exercício de se projetar no futuro, pensando em como a
vida seria em 5, 10 e 20 anos, por exemplo, traz diversos benefícios para
o sujeito (BRONK, 2014; DAMON, 2009; MINEHAN, NEWCOMB; GA
LAIF, 2000), como a resiliência diante de momentos difíceis, bem como

266266
a realização e satisfação pessoal. O PV alimenta uma atitude positiva
perante a vida e o futuro, promovendo comportamento pró-social, com
promisso moral e elevação da autoestima (DAMON; MENON; BRONK,
2003). Esta última reflete diretamente na projeção que o adolescente faz
de seu futuro, uma vez que a visão que ele tem dele mesmo define a sua
expectativa de sucesso na vida (VERNI; AUREA-TARDELI, 2015). Além
desses benefícios, ter um PV claro também pode afastar o adolescente
de comportamentos de risco típicos dessa fase do desenvolvimento,
como o abuso de substâncias e o sexo desprotegido (DAMON, 2009).

Em contrapartida, adolescentes que não têm um PV, isto é, que


não alimentam uma expectativa positiva acerca de seu próprio futu
ro, podem sofrer de efeitos negativos característicos do que se pode
chamar de ausência de propósito (BRONK, 2014; FARIAS JÚNIOR, et
al., 2009). Alguns exemplos desses efeitos, recorrentes na atualidade,
são depressão, falta de produtividade e incapacidade de sustentar re
lações interpessoais estáveis (MINEHAN; NEWCOMB; GALAIF, 2000).
Portanto, entende-se que estudar a construção e a promoção de PV
é essencial para o bem-estar subjetivo e para o desenvolvimento do
caráter dos adolescentes (MARIANO; SAVAGE, 2009).

Tendo em vista adolescentes que se encontram em situações


de maior vulnerabilidade social, o PV funciona como uma possibilida
SUMÁRIO de de uma vida melhor, na medida em que alimenta uma postura de
resiliência e otimismo perante o futuro, e, com isso, previne a adesão
a comportamentos antissociais (MACHELL; DISABATO; KASHDAN,
2015). Em outras palavras, o PV funciona como um farol moral, orien
tando o indivíduo em direção a sua realização, e, consequentemente,
fomentando uma disposição pró-social e resiliente diante dos eventos
estressores e dificuldades da vida (TIRRI; MORAN; MARIANO, 2016).

Contudo, um PV propriamente solidário, voltado para necessi


dades sociais, depende de uma construção moral sólida na infância
e do reconhecimento que o indivíduo recebeu diante de seus valores

267267
e potencialidades (AUREA-TARDELI, 2008). Ademais, o caráter pre
ventivo do PV, apresentado anteriormente, é compreendido como uma
consequência da articulação de valores, circunstâncias e projeções
que constituem a identidade do sujeito, que, por sua vez, é produto
das ações, decisões e aspirações cotidianas. Em outras palavras, o
adolescente constrói uma ideia de identidade ideal, e começa a julgar
suas atitudes com base nesse ideal (ARANTES et al., 2018).

Nesse sentido, o PV contribui para a formação de uma identida


de saudável. Esse aspecto é de extrema relevância na atualidade por
conta da explosão do uso de redes sociais, as quais estão associadas
à lógica da comparação. Em tais redes, o sujeito busca validação e
reconhecimento externo na opinião alheia, o que está negativamente
associado com o bem-estar (O’REILLY et al., 2018). Ao contrário dos
padrões de reconhecimento superficiais e extrínsecos, provenientes da
mídia e das redes sociais, o PV é caracterizado pela motivação intrín
seca, mas dificilmente é abalado por adversidades, e não dependente
da coerção externa (BIGGINS, 2018).

INSERÇÃO DO PROJETO DE VIDA NA ESCOLA

SUMÁRIO
Em 2017, houve uma alteração na Lei de Diretrizes e Bases da
Educação (LDB), que determinou aos currículos do Ensino Médio “[...]
considerar a formação integral do aluno, de maneira a adotar um tra
balho voltado para a construção de seu projeto de vida e para a sua
formação nos aspectos físicos, cognitivos e socioemocionais” (BRASIL,
2017b, art. 35-A, § 7º). Essa alteração demonstra que o poder público
encara a escola como um ambiente capaz de preparar os seus alunos
para o futuro, seja ele qual for, e destaca o PV como sendo central nesse
processo. Portanto, faz-se necessário o desenvolvimento de pesquisas,

268268
sobre a temática do PV, que possam subsidiar a atuação dos professo
res, especialmente porque estão ainda sendo introduzidos no assunto.

O desenvolvimento de PV de adolescentes vem ganhando es


paço nas discussões sobre a educação, pois é considerado um fator
responsável por promover engajamento cívico e boa cidadania (TIRRI;
MORAN; MARIANO, 2016). A escola é um contexto central na promoção
do PV, uma vez que ela guia os adolescentes no processo de constru
ção identitária e de objetivos futuros (ARAÚJO et al., 2016). Professores
assumem o papel de mentores, exercendo a função de mediadores en
tre as aspirações de seus alunos, que emergem a partir das atividades
escolares da vida prática, de forma a ampliar a gama de possibilidades
referentes ao futuro, e que antes eram mais restritas (QUINN, 2016).

Por isso, as práticas educacionais ativas, que operam a partir


do protagonismo do aluno, são centrais na construção de PV, fazendo
dele um parceiro na construção do conhecimento, em oposição a uma
postura de mero consumidor de conteúdo curricular (ARAÚJO et al.,
2016). O professor tem um papel fundamental, em todo o processo
de elaboração do PV de seus alunos, na medida em que é o adulto
responsável por sua educação formal ao longo da vida (DELLAZZANA
-ZANON; BACHERT; GOBBO, 2018). Sobre a visão que o adolescente
tem da escola, evidências indicam que, embora eles percebam que ela
SUMÁRIO pode ajudá-los na construção de seus Projetos de Vida, a escola não
promove um espaço para o seu desenvolvimento, especialmente por
conta das condições de ensino e da ausência de projetos socioedu
cacionais (NASCIMENTO, 2013; NASCIMENTO; RODRIGUES, 2018).

Considerando-se que: (a) o PV traz benefícios para o adolescen


te; (b) a disciplina de PV foi recentemente implementada na escola e (c)
os professores ainda não estão adequadamente capacitados, o objeti
vo deste estudo foi desenvolver uma intervenção para a promoção de
PV de adolescentes da escola pública. Os objetivos específicos foram:
(a) aproximar o conteúdo da disciplina de PV da realidade concreta dos

269269
alunos do 1º ano do Ensino Médio da Escola Estadual em questão;
(b) apresentar opções de atividades que trabalham aspectos do PV
de forma prática e dinâmica; (c) trazer exemplos de PV que estejam
próximos à realidade dos alunos; (d) demonstrar as possibilidades de
PV, de forma a apresentar opções acadêmicas ou voltadas para o mer
cado de trabalho; e (e) instrumentalizar a professora de PV do 1º ano
do Ensino Médio com demais conteúdos e estratégias de ensino para
a construção do PV dos alunos.

MÉTODO

Caracterização do Campo

A intervenção foi realizada em uma Escola Estadual de uma ci


dade do interior de São Paulo, que contempla Ensino Fundamental
II, Ensino Médio e Educação para Jovens e Adultos (EJA). De acordo
com a equipe gestora, a maioria dos estudantes que frequenta a esco
la são membros de famílias com baixa renda, e, por isso, muitas vezes,
não têm o que comer em suas casas. Além disso, grande parte dos
alunos tem dificuldades nas atividades acadêmicas, não sabendo ler e
SUMÁRIO escrever. O Grêmio Estudantil da escola se apresentava ativo, no início
do ano letivo de 2020, anterior à pandemia, realizando tarefas como
organização da biblioteca para a sua restauração, limpeza da escola e
organização de atividades extras.

Quanto à sua estrutura, a escola oferece internet banda larga,


quadras esportivas cobertas, laboratório de informática, sala de leitura,
pátio coberto, sala dos professores e refeitório para alimentação. É
relevante informar que a escola tem, em seu quadro de funcionários,
uma pessoa que responde pelo cargo de Mediadora.

270270
Levantamento de Necessidades

O levantamento de necessidades teve por foco compreender


e analisar o envolvimento, a participação e a percepção dos alunos a
respeito do ensino remoto quanto à disciplina de PV. Tal levantamento
foi feito por meio de entrevistas remotas, via Google Meet, com alunos
e professores, além da observação de algumas aulas remotas do Cen
tro de Mídias SP, da disciplina de PV, disponíveis no Youtube. Foram
realizadas duas entrevistas por meio de um questionário produzido
pelos estagiários, com um aluno do 1° ano do Ensino Médio e com
a professora da disciplina de PV. A realização dessas entrevistas de
levantamento de dados foi fundamental, pois possibilitou a compreen
são da situação da disciplina no período de ensino remoto. Por um
lado, havia alunos desinteressados, pois os temas tratados nas aulas
foram considerados muito distantes de suas realidades. Por outro lado,
tínhamos uma professora desanimada com o planejamento das aulas
on-line, uma vez que os alunos não compareciam às aulas.

Deve-se ressaltar que o desinteresse pelas aulas, durante a pan


demia, tem sido uma questão geral da escola no ensino remoto, não
se referindo, portanto, apenas à disciplina de PV. Não obstante, diante
SUMÁRIO
dessa situação, as aulas de PV foram paralisadas após a segunda aula
do semestre. Essa foi a primeira vez que a disciplina de PV foi incluí
da na grade curricular da escola, e, segundo o relato da professora,
ela realizou um curso on-line que lhe permitisse lecioná-la, mas não o
achou suficiente para dar conta da demanda, tendo, por apoio, apenas
os materiais disponibilizados pela escola. Diante dessas circunstâncias,
a professora optou por encerrar as atividades da sua disciplina de PV.

271271
Planejamento da Intervenção

A partir do contato feito com a professora de PV e a apresen


tação da proposta do desenvolvimento de um projeto de intervenção
em suas aulas, foram planejados cinco encontros semanais com ob
jetivos distintos, os quais ocorreram sempre no mesmo dia e horário,
nos meses de novembro e dezembro de 2020, tendo duração de uma
hora cada. Foram elaborados banners semanalmente para a divulga
ção dos encontros no Facebook e no site da escola. Além disso, a
professora responsável conseguiu expandir o público da intervenção
também para o 2° e 3° ano do EM.

Quadro 1 - Cronograma

Encontro Objetivo Resultados Esperados Materiais Referências

1 Apresentação
de intervençãodos contrato. do projeto
e doestagiários, Espera-se a construção de um víncu Projeto de Vida.
Formulário Meu Pereira (2019).
lo com os alunos e com o professor.
Apresentação teórica sobre PV (Anexo A). Espera-se também que esse primeiro
Aplicação
de Vida. do Formulário Meu Projeto encontro motive os alunos a participa
rem do projeto, tendo uma noção mais
clara do que o PV é.
2 Apresentação teórica sobre autoconhe-
cimento. Espera-se que a atividade estimule Faço (ou
eQuadro Não);
do Gosto Pereira (2019).
uma reflexão acerca das condições e
SUMÁRIO
de
seções:
Quadro gosto
-se papel,
aosdo
alunos
Gosto
e que efaço,
equeaFaço
dividam
peguem
não em
(ougosto
Não). efolha
não
umaquatro
Pede- atitudes do presente, relacionando-as Papel e caneta.
com expectativas futuras, aumentan
do, portanto, autoconhecimento.

faço, gosto e não faço, não gosto e faço.


Realizar um breve fechamento da ati
vidade.
3 com
conversa
seu para
nas
Apresentar
seguida,
comum
soassucesso,
os
que
alunos,e,uma
realizar por
concretizaram
três
histórias,
histórias
abordando
uma de de PVs.
autorreflexão.
fim,
refletindo
roda de
direcionando
seus
temáticas Em
vidaconversa
pes-
emoa
sobre Espera-se que as histórias de vida Os estagiários
apresentadas sirvam de referência e pediram a conhe
inspiração para os alunos, e que a roda cidos que gravas
de conversa amplie o conhecimento sem os vídeos.
prático da vida, além do autoconhe
cimento.

272272
4 Desenvolver a atividade Carta ao Passa Espera-se que a atividade organize Carta ao Passado, Pereira (2019).
do, Presente e Futuro, a fim de instigar uma autobiografia para o adolescente, Presente e Futuro.
uma reflexão acerca das atitudes do pre sendo uma forma de conexão entre
sente, qual o impacto do passado sobre os três tempos, proporcionando um
elas, e instigar uma prospecção quanto maior autoconhecimento e atenção à
ao futuro. interdependência entre passado, pre
sente e futuro.
5 Apresentar informações sobre opor Espera-se que os últimos encontros Formulário Meu - Ministério da
tunidades de estudo superior e bolsas tenham contribuído para que os par- Projeto de Vida. Educação (2006).
(FIES, PROUNI, ENEM). ticipantes se tornem engajados diante - Ministério
Responder o formulário Meu Projeto da tarefa de construção do PV, e que da Educação
de Vida. Socializar o formulário com o este último encontro sirva de moti (2020a).
grupo. vação final, apresentando oportuni - Ministério
Realizar um encerramento. dades. da Educação
Espera-se que os PVs dos participan (2020b).
tes sejam esclarecidos por meio da - Pereira (2019).
reaplicação do formulário Meu Projeto
de Vida, comparando-a com as res
postas da primeira versão. Espera-se
também que, com a socialização dos
formulários, os objetivos de vida que
emergirem, durante a atividade, tor
nem-se mais concretos.

RESULTADOS E DISCUSSÃO
SUMÁRIO
O projeto de intervenção desenvolvido no presente trabalho con
tou com uma baixa adesão dos alunos (média de 5 alunos por encon
tro), o que pode estar relacionado a um dos maiores desafios na edu
cação em tempos de COVID-19: o engajamento dos alunos nas aulas
remotas. De acordo com Jiao et al (2020), essa dificuldade tem ocorrido
pelo fato de que o ensino remoto tem gerado um aumento de respostas
de desatenção e irritabilidade por parte dos alunos. Ademais, autores
como Médici, Tatto e Leão (2020) têm estabelecido uma forte relação
entre o distanciamento social e a aprendizagem, já que a educação é

273273
favorecida por ambientes colaborativos, e, em função do ensino remo
to, o contato entre pares foi diminuído durante as atividades escolares.

De qualquer forma, a fim de tentar atingir o engajamento dos alu


nos da melhor forma possível, os estagiários, em um primeiro momento,
recorreram à ajuda da professora de PV para que fizesse a divulgação da
intervenção, e, num segundo momento, a estratégia foi a de deixar claro
aos alunos que eles teriam voz nos encontros, ou seja, que os alunos
direcionariam os temas e as discussões dos encontros, com base em
seus PVs. Essa abordagem é diferente da que eles estão acostumados
em suas aulas rotineiras, nas quais os conteúdos e as discussões estão
cristalizados e a participação do aluno se limita à absorção e à repro
dução de conteúdo via avaliações. Não obstante, previa-se ao menos a
constância dos alunos que compareceram no primeiro encontro, porém
o número de alunos presentes diminuiu no decorrer das semanas.

Ainda, outra hipótese para tentar explicar a baixa adesão dos


alunos aos encontros propostos seria o fato de muitos alunos do
ensino público não terem acesso a recursos tecnológicos para com
parecer às aulas remotas (MÉDICI; TATTO; LEÃO, 2020). De acordo
com relatos da equipe gestora da escola, muitas famílias não tinham
recursos para fornecer os equipamentos necessários para as aulas
remotas, o que pode ter influenciado na adesão à intervenção pro
SUMÁRIO posta para a disciplina de PV. Além disso, outra dificuldade ocasiona
da pelo meio remoto foi quanto ao espaço de estudo proporcionado
aos alunos em suas residências. Em alguns dos encontros, foi possí
vel escutar barulhos quando eram ligados os microfones, como sons
de crianças brincando ou chorando, adultos falando alto, barulhos
de motor automotivo e outros ruídos, que interferiam na atenção dos
alunos, visto que, em diversas ocasiões, diziam não ter ouvido ade
quadamente alguma orientação, e pediam para que esta fosse repe
tida. Esse resultado está em consonância com Golberstein, Wen e
Miller (2020), segundo os quais a falta de um ambiente físico e familiar

274274
adequados para a educação em casa pode interferir no engajamento
dos alunos em atividades remotas, o que é intensificado em tempos
de pandemia. Apresentam-se, a seguir, os resultados e a discussão
de cada um dos encontros da intervenção.

O primeiro encontro buscou construir o início de um vínculo posi


tivo entre os estagiários, os alunos (8) e a professora responsável pela
disciplina. Os estagiários se apresentaram à turma e pediram para que
esta fizesse o mesmo, com cada aluno falando seu nome, sua série e
sua ideia de PV. Em seguida, foi feita uma breve apresentação teórica so
bre PV, contendo uma breve definição, alguns de seus princípios básicos
e, por fim, uma série de questionamentos para refletir sobre o próprio
PV, como: Quais habilidades preciso desenvolver? Meu PV é realista?
O que devo fazer a curto prazo? A quem posso recorrer por apoio e/
ou referência? (LEITE; DELLAZZANA-ZANON, 2021). Por fim, foi enviado
aos alunos, via WhatsApp, a atividade a ser realizada no dia - o formulário
Meu Projeto de Vida - e foi informado aos estudantes que estes teriam 15
minutos para o seu preenchimento. Após o tempo estipulado, foi aberto
um espaço de fala para que os alunos pudessem socializar o seu PV.
Neste encontro, esperava-se, além da construção do vínculo
com a turma, motivar os alunos a participarem dos encontros seguin
tes da intervenção. Houve alunos que se mostraram interessados e
SUMÁRIO
participativos, mas, em contrapartida, alguns estudantes chegaram
consideravelmente atrasados ao encontro, perdendo a apresentação
e boa parte do tempo da atividade. Num contexto presencial, a inter
venção não teria esse tipo de interrupção, de alunos que entram e
saem constantemente da sala (no caso, da conferência), e a atenção
deles seria maior. Não só a participação na aula foi comprometida,
mas também a entrega das atividades. Segundo a Tabela 1, o número
de atividades recebidas foi menor em todos os encontros do que o
número de alunos presentes na conferência.

275275
Tabela 1 - Comparação entre o número de alunos presentes
e a quantidade de atividades recebidas em cada encontro.

Encontro Número de Alunos Presentes Número de Atividades Recebidas


1 8 4
2 6 1
3 6 -
4 1 1
5 3 1

O segundo encontro contou com a presença de 6 alunos, e bus


cou estimular a reflexão dos mesmos sobre como as condições e ati
tudes do presente podem impactar no futuro, procurando trabalhar o
autoconhecimento. Este encontro iniciou com 15 minutos de atraso,
pois nenhum aluno compareceu antes disso. Após esse período, come
çaram a chegar alguns alunos, e, assim, novamente foi feita uma breve
apresentação dos estagiários e dos objetivos da intervenção, visto que
estavam presentes alunos diferentes dos que compareceram no primei
ro encontro. Após isso, realizou-se uma apresentação breve em slides,
abordando-se a importância do autoconhecimento para a elaboração e
a prática do PV. Por fim, pediu-se que os alunos realizassem a atividade
Quadro do Gosto e Faço (ou Não). Neste dia, não houve possibilidade
de realizar a socialização dos resultados por conta do atraso no início
SUMÁRIO do encontro. Além deste atraso no começo, houve alunos que chega
ram após a apresentação dos slides, e durante a realização da ativida
de. Em função disso, a professora responsável pela disciplina tentou
orientar os alunos conforme eles chegavam, o que pode ter sido um
fator de distração para a turma. Ademais, observou-se que os alunos
que compareceram a esse encontro não participaram de forma efetiva.

O terceiro encontro também contou com a participação de 6


alunos, e consistiu na transmissão de vídeos de profissionais específi
cos, requisitados pelos alunos que compareceram nos primeiros dois
encontros. As profissões indicadas pelos estudantes foram: medicina,

276276
confeitaria, investigação criminal, arquitetura, engenharia civil, mecâni
ca automobilística, administração, cardiologia e psicologia. Os vídeos
foram feitos de forma voluntária por profissionais conhecidos dos es
tagiários, e o convite foi realizado por telefone. Após a apresentação
de cada vídeo (com duração média de 5 minutos), uma discussão foi
conduzida por um dos estagiários. Esse foi o encontro no qual os alu
nos se mostraram mais participativos, ligando os seus microfones para
fazerem perguntas sobre os profissionais dos vídeos, e até discutindo
entre si. Observou-se que a utilização de um conteúdo que aproxima o
adolescente da realidade hipotética na qual ele projeta seu PV aumen
tou a adesão à atividade. Os alunos tiveram um contato objetivo com
as profissões pelas quais têm interesse, sua atuação, rotina de traba
lho, e com os perfis dos profissionais. Isso demonstra a importância de
o adolescente ter um referencial para construir o seu PV, alguém que já
tenha concretizado e objetivado a trajetória que antes era abstrata na
sua imaginação (ARAÚJO et al., 2016; QUINN, 2016).

O quarto encontro consistiu na transmissão dos vídeos que fal


taram ser apresentados na semana anterior e na aplicação da atividade
Carta ao Passado, Presente e Futuro, de acordo com o previsto no cro
nograma. Porém, o planejamento desse encontro, assim como suas dis
cussões, foi comprometido pelo fato de que apenas uma aluna esteve
SUMÁRIO presente durante todo o horário da aula. Os vídeos foram apresentados
e a atividade seguinte foi explicada em detalhes para que a aluna a fizes
se em casa, uma vez que a sua discussão não seria possível por conta
do tempo. A falta de tempo se deu pela escolha de esperar mais alunos
entrarem na aula antes de começá-la. O ponto positivo deste encontro
foi a atenção dada à única aluna presente, que estava interessada, e
aproveitou a oportunidade para fazer diversas perguntas sobre o seu PV.

O quinto e último encontro contou com a presença de três alu


nos, e consistiu em uma apresentação informativa sobre o Exame Na
cional do Ensino Médio (ENEM), o Programa Universidade Para Todos
(PROUNI) e o Fundo de Financiamento Estudantil (FIES). Consideran

277277
do o contexto socioeconômico dos alunos da escola em questão, o
PROUNI e o FIES são oportunidades interessantes para os alunos,
uma vez que seus PVs estão voltados para o ingresso na universida
de e para a construção de uma carreira. Os alunos presentes tinham
pouco ou nenhum conhecimento sobre essas oportunidades, o que
pareceu motivá-los ainda mais. Em seguida, foi aplicado o formulário
Meu Projeto de Vida pela segunda vez, a fim de fazer uma comparação
com os resultados da primeira aplicação. Porém, como nenhum aluno
passou por ambas as aplicações, essa comparação não foi possível.

Pediu-se, ao final do último encontro, que os alunos preenches


sem um questionário de avaliação geral da intervenção, estruturado
nos formulários do Google. O questionário foi preenchido por apenas
três alunos, porém suas respostas parecem ter refletido a opinião ge
ral dos alunos que compareceram aos encontros da intervenção, com
base nos comentários e discussões nas aulas. Os resultados dessa
avaliação mostraram que a atividade que os alunos mais gostaram foi
a transmissão dos vídeos de especialistas, e, com isso, houve o apro
fundamento de seus conhecimentos sobre determinadas profissões.
O fato de que a maioria dos participantes ainda não tinha tido contato
com ninguém que exercesse a profissão que eles desejam pode ser
considerado um motivo a mais para essa atividade ter sido essencial
para a intervenção. O retorno dos alunos foi positivo, na medida em
SUMÁRIO que eles enxergaram as reflexões e temáticas tratadas ao longo da
intervenção como pertinentes para a construção de seus PVs, agrade
cendo a oportunidade de participar nesse processo.

CONSIDERAÇÕES FINAIS

O objetivo deste capítulo foi relatar uma intervenção realizada


por estagiários de Psicologia de uma universidade do interior de São
Paulo, que visou promover PV num contexto remoto, expondo todas

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as dificuldades e complicações que essa realidade acarreta. Diante
desses obstáculos, foi preciso a alteração de alguns encontros no per
curso da intervenção em busca da maior adesão dos alunos no meio
remoto. Entre as dificuldades enfrentadas, podem-se citar: a falta de
local de estudos adequado na casa dos alunos, que proporcionaria
um ambiente tranquilo e silencioso para a realização das atividades;
a conexão da internet que, muitas vezes, falhou, fazendo com que os
alunos ficassem saindo e entrando da conferência; as inconveniências
do áudio que, frequentemente, se mostrou instável; e as interferências
de áudio em alguns dos vídeos que estavam previstos para a apresen
tação aos alunos no 4º encontro da intervenção.

Deve-se destacar também que, como a disciplina de PV foi imple


mentada em 2020, essa foi a primeira vez que a professora responsável
pela de disciplina PV ministrou-a. A falta de experiência quanto à temá
tica de PV da professora, atrelada às dificuldades do ensino remoto,
foi uma razão a mais para a intervenção realizada pelos estagiários de
psicologia. Nesse sentido, a intervenção serviu também como fonte de
apoio e aprendizado para a professora, que recebeu a proposta com
entusiasmo e auxiliou os estagiários nas demandas referentes à partici
pação dos estudantes. O vínculo estabelecido entre a professora de PV
e os estagiários foi positivo e auxiliou o desenvolvimento da intervenção.
SUMÁRIO
Outro aspecto a ser salientado é que, por mais que a baixa ade
são dos estudantes à intervenção tenha causado preocupação e frus
tração, os estagiários aproveitaram o número reduzido de alunos nos
encontros para a exploração individual do PV de cada um deles, o que
foi considerado um aspecto positivo. Nesse sentido, os dados obtidos
por meio do formulário de avaliação foram favoráveis, indicando que
os participantes gostaram de participar da intervenção. Assim, apesar
de todas as dificuldades enfrentadas pelos estagiários de psicologia,
em meio ao contexto remoto, entende-se que o objetivo de promover
PV de adolescentes foi alcançado, na medida em que os adolescen
tes puderam se apropriar de alguns conhecimentos necessários para a

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elaboração de seus PV. Por fim, considera-se que o desafio de conduzir
uma intervenção de forma remota, no contexto escolar, com todas as di
ficuldades, complicações e impossibilidades que isso acarreta, foi uma
experiência fundamental para a formação dos estagiários de psicologia.

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the world. Journal of Education for Teaching, v. 42, n. 5, pp. 1-6, 2016. DOI: https://
doi.org/10.1080/02607476.2016.122655. Disponível em: https://www.tandfonline.
com/doi/full/10.1080/02607476.2016.1226551. Acesso em: 13 nov. 2020.
UNESCO. COVID-19 - Educational disruption and response, 2020. Disponível em:
https://en.unesco.org/covid19/educationresponse. Acesso em: 13 nov. 2020.

285285
Capítulo 12

Experiências da pós-graduaçãostricto
sensu no contexto da covid-19:oque
as pesquisas têm nos indicado?

Mônica Tessaro

Rosane França Cavasin


12
Mônica Tessaro
Rosane França Cavasin

Experiências da pós-graduação stricto


sensu no contexto da covid-19:
o que as pesquisas
têm nos indicado?

DOI: 10.31560/pimentacultural/2021.107.286-305
INTRODUÇÃO

No atual contexto, em que estamos inseridos, torna-se impossí


vel não falarmos da pandemia provocada pela COVID-19, em função
de todas as (trans)formações que ela tem provocado no mundo, afe
tando diretamente os setores da saúde, economia, política, cultura e
a educação. Portanto, neste texto, vamos refletir sobre os impactos
provocados pela pandemia da COVID-19 na Pós-Graduação Stricto
Sensu, especificamente, devido a algumas particularidades dessa eta
pa formativa, dentre elas, destacamos: o desenvolvimento da pesquisa
e a exigência da produção científica.

Em uma pesquisa recente, Colombo (2018) analisou o perfil dos


ingressantes de cursos de mestrado e doutorado no Brasil, onde cha
ma a atenção para algumas características, a saber: a grande parte
dos discentes da Pós-Graduação concluiu o curso de graduação re
centemente; os alunos apresentam um desempenho acadêmico ele
vado, indicado pela produção do currículo Lattes; esses alunos pos
suem uma distribuição de renda superior aos alunos da graduação,
pois já assumem melhores vagas no mercado de trabalho.

Contudo, diante do “novo normal” imposto pela COVID-19, o ano


SUMÁRIO de 2020 foi marcado por profundas mudanças no contexto educacional.
Na Pós-Graduação Stricto Sensu, os alunos estão enfrentando dificul
dades para cumprir prazos, especialmente aqueles que estão desen
volvendo pesquisa de campo. Impactados pela nova rotina acadêmica,
discentes da Faculdade de Direito da Universidade de São Paulo – Largo
São Francisco (FDUSP), se reuniram para desenvolver uma pesquisa
com a comunidade acadêmica da Pós-Graduação, com o objetivo de
identificar os principais impactos da pandemia em suas rotinas.

A referida pesquisa (CLÍNICA DE DIREITOS HUMANOS LUIZ


GAMA, 2020) indicou que os alunos da Pós-Graduação foram afetados

287287
diretamente pelas mudanças provocadas pela pandemia. Os dados
coletados de forma anônima desvelaram que:
42,7% dos alunos e alunas exercem alguma função de cuidado
na família, 95,9% tiveram a rotina familiar afetada pela pande
mia e sofrem com a sobrecarga de trabalho (89,2% afirmaram
trabalhar em paralelo à pesquisa). 84,1% alegaram ter adoeci
do psicologicamente durante o período (CLÍNICA DE DIREITOS
HUMANOS LUIZ GAMA, 2020, pp. 4-5).

Diante desses dados, consideramos que a rotina dos pós-gra-


duandos foi abalada. Os discentes que mantêm uma ocupação profis
sional têm enfrentado inúmeros desafios, entre eles, a readequação da
rotina e/ou do lugar em que desempenham a sua função, e, em alguns
casos, a recessão de renda e até mesmo o término do vínculo de tra
balho. Por outro lado, o tempo de dedicação e cuidado aumentado de
outros membros da família (filhos, sobrinhos, pais) potencializam os
prejuízos em relação aos desenvolvimentos das pesquisas em curso
(CLÍNICA DE DIREITOS HUMANOS LUIZ GAMA, 2020).

Em linha com essas observações, localizamos a pesquisa de


senvolvida por Ferrinho (2020) em parceria com o Instituto de Higiene
e Medicina Tropical (IHMT), uma Unidade Orgânica de Pós-Graduação
e Investigação em Saúde Global e Medicina Tropical da Universida
de Nova de Lisboa-PT, de onde foram obtidos 30.383 estudantes de
SUMÁRIO
62 países, incluindo 1.208 estudantes de Portugal e 23 da Universi
dade Nova-IHMT referente aos impactos provocados pela pandemia
em suas vivências acadêmicas. Entre os resultados pré-apurados (os
dados referem-se apensas aos alunos da NOVA-IHMT), destacamos:

- para 54% dos alunos, o cancelamento das aulas não os afetou,


pois estavam em situação de escrita da dissertação ou tese;

- para 46%, as aulas foram recuperadas utilizando-se os recur


sos tecnológicos – por videoconferência em tempo real;

288288
- cerca de 20% dos alunos perderam o emprego;

- em geral, os alunos procuram manter uma rede de apoio: fa


miliar e de amigos próximos;

- a grande maioria citou a sensação de conviver diariamente


com sentimentos ruins, tais como: ansiedade, frustração, sem espe
rança, aborrecido e vergonha.

Além dessas indicações, outros dados de pesquisa (FERRINHO,


2020) indicaram uma constante preocupação dos alunos da Pós-Gra
duação com a saúde, sua e dos seus familiares, com a continuidade
dos estudos, com a profissão futura e com a sua situação financeira.

De acordo com os dados divulgados pela Unesco (2020), mais


de 90% dos estudantes (da Educação Básica e Superior) de todo mun
do, foram afetados diretamente com a pandemia provocada pela CO
VID-19. Diante desse cenário, torna-se primordial pensar e desenvolver
estratégias relacionadas às políticas sociais e educacionais para en
frentar o retrocesso no processo de ensino e aprendizagem.

Na pesquisa de Silva e Freitas (2020), o (re)inventar a Educa


ção Superior perpassa por três indicações: mediação pedagógica;
utilização das tecnologias digitais e autonomia discente. Esses três
SUMÁRIO elementos impactam na práxis discente no atual cenário. Por isso, des
tacamos a necessidade de, cada vez mais, aprimorar a formação di
dático-pedagógica dos cursos de Pós-Graduação. O grande desafio é
criar espaços (virtuais) de encontros colaborativos entre os discentes,
de modo a priorizar a interatividade, o diálogo, a construção do conhe
cimento científico, a colaboração e o posicionamento crítico-reflexivo.

Diante desses dados preliminares, o presente texto tem por ob


jetivo categorizar, por meio do software Iramuteq, estudos publicados
que tratam sobre os impactos da pandemia para os alunos da Pós
-Graduação Stricto Sensu.

289289
Os dados que embasam a discussão apresentada neste texto
foram selecionados por meio de uma pesquisa de revisão sistemática
da literatura, que utiliza como “[...] fontes de dados a literatura sobre
determinado tema” (SAMPAIO; MANCINI, 2007, p. 84). E, ainda, para
Galvão e Pereira (2014, p. 183), a revisão sistemática da literatura
refere-se a “[...] um tipo de investigação focada em questão bem de
finida, que visa identificar, selecionar, avaliar e sintetizar as evidências
relevantes disponíveis”. Portanto, apoia-se na: a) elaboração de uma
questão orientadora; b) delimitação de diferentes fontes de pesquisa
para a busca literária; c) utilização de critérios de inclusão e exclusão;
e d) sistematização das contribuições dos trabalhos selecionados
acerca do objetivo deste estudo.

Nesse sentido, o software Iramuteq auxilia as pesquisas qualita


tivas provenientes de materiais textuais, pois a análise dos dados parte
do material verbal transcrito, resultando na demonstração dos pensa
mentos, opiniões e conteúdo simbólico sobre o fenômeno estudado
(CARMARGO; JUSTO, 2013). Esse programa é de acesso gratuito, e
está ancorado no software Re na linguagem python. Dessa forma,
viabiliza diferentes formas de análises, entre elas destaca-se: a análise
lexicográfica, a classificação hierárquica descendente, a análise por
similitude e a nuvem de palavras.
SUMÁRIO Neste texto, vamos utilizar o método da Classificação Hierár
quica Descendente (CHD) para a análise dos dados, que, amparado
pelo software Alceste, “classifica os segmentos de texto em função
dos seus respectivos vocabulários, e o conjunto deles é repartido com
base na frequência das formas reduzidas - palavras já lematizadas”
(CARMARGO; JUSTO, 2013, p. 516); e na análise por meio da Árvore
da Similitude, que ilustra as “relações entre as principais palavras ou
formas que compõem segmentos de texto” (CAMARGO; JUSTO, 2018,
p. 55). As análises são realizadas a partir do agrupamento dos tex
tos (corpus) codificados, que, juntos, geram relatórios, os quais foram
analisados pelas autoras.

290290
CAMINHO METODOLÓGICO

Conforme mencionado anteriormente, trata-se de um estudo


qualitativo, do tipo revisão sistemática da literatura. De acordo com
os critérios dessa metodologia de pesquisa, delimitamos o campo do
conhecimento científico em duas bases de dados virtuais, a saber:
Scientific Electronic Library (Scielo) e Portal de Periódicos Capes (Aces
so pela Comunidade Acadêmica Federada - CAFe). Não houve delimi
tação temporal devido às recentes publicações acerca do tema em es
tudo. A busca dos dados foi orientada pela combinação dos seguintes
descritores: Covid-19 AND Pós-Graduação; Covid-19 AND Educação;
Pandemia AND Pós-Graduação; Pandemia AND Educação, na área
de concentração Educação. Os descritores foram testados nas bases
de dados e considerados compatíveis quanto ao objetivo deste texto.

Para a apresentação dos resultados, organizamos os dados iden


tificados na revisão sistemática da literatura em dois blocos, a saber: o
Bloco A apresentará o caminho sistemático que nos permitiu o acesso
às pesquisas publicadas, e o Bloco B apresentará as análises e refle
xões dos trabalhos selecionados por meio do uso do software Iramuteq.

SUMÁRIO
BLOCO A: CAMINHO METODOLÓGICO PARA
A DEFINIÇÃO DO CAMPO CIENTÍFICO

No quadro 1, apresentamos o resultado das buscas nas duas


bases de dados, Scielo e Portal de Periódicos Capes.

Quadro 1 – Apresentação da coleta de dados na base de dados Scielo.

Descritores Nº de trabalhos
COVID-19 AND Pós-Graduação 04

291291
COVID-19 AND Educação 00
Pandemia AND Pós-Graduação 00
Pandemia AND Educação 57
Total 61
Fonte: as autoras.

No quadro 2, apresentamos os dados coletados na base de


dados Portal de Periódicos CAPES (Acesso CAFe).

Quadro 2 – Apresentação da coleta de dados na base de


dados Portal Periódicos CAPES (Acesso CAFe).

Descritores Nº de trabalhos
COVID-19 AND Pós-Graduação 53
COVID-19 AND Educação 75
Pandemia AND Pós-Graduação 191
Pandemia AND Educação 39
Total 358
Fonte: as autoras.

Como podemos observar, na base de dados Scielo, localizamos


um total de 61 (sessenta e um) artigos publicados, já na base de dados
Portal de Periódicos CAPES (Acesso CAFe), localizamos 358 (trezentos
SUMÁRIO e cinquenta e oito) artigos publicados sobre a temática Covid-19, no
entanto, nem todos os artigos atendiam ao objetivo deste estudo. Por
isso, delimitamos alguns critérios de inclusão e exclusão, a saber: a)
abordar no conjunto do texto, contribuições a respeito do impacto da
Covid-19 no campo da Educação, especificamente, no campo da Pós
-Graduação Stricto Sensu; b) oportunizar pistas sobre como a Covid-19
impactou o desenvolvimento das pesquisas e a rotina de estudos dos
alunos da Pós-Graduação Stricto Sensu; c) estarem disponíveis na ín
tegra e on-line. Já os critérios de exclusão foram: a) desconsideramos
os artigos que tratavam de forma separada a pandemia provocada
pela Covid-19 e o contexto da Pós-Graduação Stricto Sensu; b) tam

292292
bém foram eliminados artigos que tratavam de forma genérica os im
pactos da pandemia no campo da Educação.

De acordo com os critérios de inclusão e exclusão, seleciona


mos 13 (treze) artigos, sendo 12 (doze) da base de dados Portal de
Periódicos CAPES (Acesso CAFe) e um da base de dados Scielo.
Apresentaremos, no quadro 3, as publicações selecionadas nas
bases de dados e que compuseram a análise e discussões sobre a
temática foco deste estudo.

Quadro 3 – Publicações selecionadas para compor nossa amostra

Base de dados Portal Periódicos CAPES (Acesso CAFe)


Autores Títulos Local e ano de publicação
Remoto, mas não distante: a reinvenção do
Carla Cristie de França Silva;
Lêda Gonçalves de Freita. ensino na Educação Superior em tempos Revista Dialogia, São Paulo, 2020.
de COVID-19
Transição para o ensino remoto de emer
Filipa Seabra; Luísa Aires; António Teixeira. gência no ensino superior em Portugal – Revista Dialogia, São Paulo, 2020.
um estudo exploratório
Tárcila Lorrane Fernandes de Sou
Ensino remoto na pandemia de COVID-19:
za Soares; Ícaro Silva de Santana; lições
são aprendidas em um projeto de exten- Revista Dialogia, São Paulo, 2020.
universitário
Maria Luiza Caires Comper.

SUMÁRIO Pandemia, as reinvenções educacionais e


Michel Douglas Pachiega; Débo mal-estar docente: uma contribuição sob Revista Dialogia, São Paulo, 2020.
psicanalítica
ra Raquel da Costa Milani. ao ótica

Regiane Caldeira; Entre as conexões e as desconexões: expe


Stephanni G. Silva Sudré; riências acadêmicas
ciamento social físicoem tempos de distan- Revista Dialogia, São Paulo, 2020.
Gabriel José Pereira.
Beatriz Rosana Gonçalves de Oliveira Toso;
Ana Tereza Bittencourt Guimarães;
Abordagem sobre Interdisciplinaridade em
Cláudia Silveira Viera; Saúde na Pós-Graduação em Tempos de
Rose Meire Costa; Revista EAD em Foco, Rio de Janeiro, 2020.
Pandemia: Experiência de Atividade Remo
Rosa Maria Rodrigues; ta e Síncrona
Gicelle Galvan Machineski;
Solange Fátima Reis.

293293
Kelmara Mendes Vieira;
Gabrielle Fagundes Postiglioni; Vida de Estudante Durante a Pandemia:
Géderson Donaduzzi; fação com aSocial,
Isolamento Vida Ensino Remoto e Satis- Revista EAD em Foco, Rio de Janeiro, 2020.
Caroline dos Santos Porto;
Leander Luiz Klein.
Percepções de Qualidade dos Alunos de
Marcelo de Jesus Sousa do uma IES de
emRemotas
Aulas Estado do Pará o Estu- Revista EAD em Foco, Rio de Janeiro, 2020.
doPós-Graduação:

Maria Laís dos Santos Leite; Entre sonhos e crises: esquadrinhando os


Revista de Estudos em Educação e
Geovane Gesteira Sales Torres; impactos da pandemia por COVID-19 na
Diversidade, Itapetinga, 2020.
Rocelly Dayane Teotonio da Cunha. vida de pós-graduandas(os) brasileiras(os)
Mário André de Freitas Farias;
De ensino presencial para o remoto emer
Gilson Pereira Santos Júnior;
gencial: adaptações, desafios e impactos Revista Educação, Aracajú, 2020.
Humberto Luiz Barros Moraes;
na Pós-Graduação
Solange Melo do Nascimento.
Relatos de pós-graduandos em ensino de
Fernanda Garcia de Almeida;
ciências e educação matemática a respeito Revista Docência do Ensino Su
Viviane Arrigo; de aspectos da formação em tempos de perior, Belo Horizonte, 2020.
Fabiele Cristiane Dias Broietti.
pandemia

Quezia Galarca de Oliveira; Sinto falta de abraços: os impactos da pan


Milena da Silva Langhanz; demia de COVID-19 na vida cotidiana dos História em Revista, Pelotas, 2020.
Lorena Almeida Gill. alunos e alunas da UFPEL
Base de dados Scielo
Autores Títulos Local e ano de publicação
Impactos da pandemia de Covid-19 no
SUMÁRIO Douglas Carvalho Amorim; processo formativo de professores de Revista Devir Educação, Lavras, 2020.
Cleide Jane Araújo Costa. Biologia de um mestrado profissional:
desafios em tempos de quarentena

Fonte: as autoras.

Como podemos observar, a totalidade dos artigos selecionados


foram publicados no ano de 2020. Quanto à distribuição regional, dez
artigos são da região Sudeste (envolvendo os estados de São Paulo,
Minas Gerais e Rio de Janeiro), um artigo da região Sul (envolvendo o
estado do Rio Grande do Sul) e dois da região Nordeste (envolvendo
os estados da Bahia e Aracajú).

294294
BLOCO B: ANÁLISE QUALITATIVA DOS DADOS

Para a análise dos textos por meio do software Iramuteq, pri


meiro é necessário que se faça a construção do corpus textual, ou
seja, que se organizem os dados para serem submetidos à análise. No
caso deste texto, por se tratar de uma revisão sistemática da literatura,
utilizamos os resumos dos artigos selecionados, onde mantivemos a
classificação do grupo “art” para a codificação de cada corpus.

Na análise do corpus textual, o programa Iramuteq reconheceu os


13 (treze) textos, os quais foram fracionados em 48 (quarenta e oito) seg
mentos de textos, divididos em 1842 (mil oitocentos e quarenta e duas)
ocorrências. Na Classificação Hierárquica Descendente (CHD), foram re
tidos 79% (setenta e nove) dos segmentos de textos. Na sequência, está
o dendograma de classes obtido na análise do corpus textual (figura 1).

Figura 1 - Dendograma obtido com a análise lexográfica básica do Iramuteq

SUMÁRIO

Fonte: relatório gerado pelo software Iramuteq.

295295
Neste dendograma, as palavras estão apresentadas de acordo
com a lista de contabilizações realizadas sobre o corpus textual, entre
as quais envolvem: “número de lemas; média de formas por segmen
to; número de segmentos classificados; número de clusters” (SALVIA
TI, 2017, pp. 48-49). As palavras de maior incidência no corpus textual
estão com tamanho da fonte maior, as palavras de média incidência
estão escritas em tamanho médio, já as palavras de baixa incidência
estão escritas com tamanho da fonte menor. Ou seja, quanto mais no
topo da lista e maior o tamanho, maior a influência das palavras na
classe. Além disso, é válido destacar que o corpus textual é organizado
sem qualquer tipo de acentuação e/ou pontuação, caso contrário, o
programa não reconhece todas as palavras, e também não reconhece
algumas palavras devido ao número de incidências. Estas aparecem
cortadas no dendograma, e o programa não nos possibilita realizar
correções nos relatórios gerados.

De acordo com Camargo e Justo (2013, p. 516), o método da


CHD visa construir classes de Unidades de Contextos Elementares
(UCE) “que, ao mesmo tempo, apresentam vocabulário semelhante
entre si, e vocabulário diferente das UCE das outras classes”. Portanto,
como podemos observar, o corpus textual foi dividido em sete classes,
as quais foram categorizadas nominalmente pelas autoras, a saber:

SUMÁRIO
• Classe 1: Rotina da Pós-Graduação no contexto da Covid-19,
com destaque para as palavras: rotina, produção, resultado;

• Classe 2: Implicações da Covid-19 na rotina da Pós-Graduação,


com destaque para as palavras: tecnologia, digital, ensino remoto;

• Classe 3: Aspectos metodológicos das pesquisas selecionadas,


com destaque para as palavras: dados, google forms, questionário;

• Classe 4: Processo de adaptação das aulas da Pós-Graduação


no contexto da Covid-19, com destaque para as palavras: pro
cesso, aluno, gestão do tempo;

296296
• Classe 5: Impactos da Covid-19, com destaque para as pala
vras: pandemia, Covid-19, educação;

• Classe 6: Impactos causados pela Covid-19 no cotidiano dos


alunos da Pós-Graduação, com destaque para as palavras: ati
vidades, sentimento, ansiedade;

• Classe 7: Novas perspectivas apresentadas pela Covid-19 no


contexto da Pós-Graduação, com destaque para as palavras:
forma, refletir, professor.
As sete classes foram divididas em dois subcorpus. O primeiro
subcorpus foi construído pela classe 1, que contém as classes 4 e 3,
as quais possuem forte relação entre si, pois mostram aspectos em
comum, entre eles: o caminho metodológico elegido pelas pesquisas e
os resultados das pesquisas. O segundo subcorpus é construído pela
classe 5, que deu origem à classe 2, que contém a classe 7 e a classe
6, as quais possuem uma relação muito forte entre si, pois apontam
os impactos causados pela Covid-19 no cotidiano dos alunos da Pós
-Graduação, e as novas perspectivas apresentadas pela Covid-19 no
contexto da Pós-Graduação.

A classe 1, Rotina da Pós-Graduação no contexto da Covid-19,


representa 15,8% do total das classes. Nesta classe, os artigos selecio
SUMÁRIO
nados apresentam dados relacionados à rotina dos pós-graduandos no
contexto da pandemia provocada pela Covid-19, especialmente, no que
diz respeito aos limites da vida acadêmica durante a pandemia (ALMEI
DA; ARRIGO; BROIETTI, 2020). Entre as principais dificuldades enfrenta
das pelos pós-graduandos, durante o período da pandemia, apontadas
pelas pesquisas, destacamos: a falta de apoio docente; a quantidade
de horas em frente ao computador; o difícil acesso à biblioteca da uni
versidade; o acúmulo das funções (afazeres domésticos, cuidado dos
filhos e atividades acadêmicas) (SEABRA; AIRES; TEIXEIRA, 2020).

297297
A classe 2, Implicações da Covid-19 na rotina da Pós-Gradua
ção, representa 13,2% do total das classes. Esta classe demonstra
quais foram as principais implicações da Covid-19 na rotina dos pós
-graduando. A primeira delas é o aumento do uso das tecnologias di
gitais por meio do ensino remoto. Esse processo de acompanhar as
aulas de casa (ensino remoto) tem gerado diferentes sentimentos entre
os alunos da Pós-Graduação Stricto Sensu, entre eles destacamos:
sentimento de ansiedade e insegurança (VIEIRA et al., 2020).

A classe 3, Aspectos metodológicos das pesquisas seleciona


das, representa 13,2% do total das classes. Nela, estão contidas pala
vras que representam as opções metodológicas dos artigos seleciona
dos para compor o corpus textual desta pesquisa. A grande maioria dos
dados de pesquisa foi gerada por meio de questionários enviados aos
participantes pela plataforma Google Forms e/ou por meio de entrevis
tas agendadas através das plataformas digitais. Trata-se, portanto, de
pesquisas qualitativas descritivas, que analisaram, por meio da Análise
de Conteúdo, os discursos dos alunos da Pós-Graduação Stricto Sensu.

A classe 4, Processo de adaptação das aulas da Pós-Gradua


ção no contexto da Covid-19, representa 13,2% do total das clas
ses. Nesta categoria, encontramos dados relacionados ao processo
de adaptação dos alunos nas aulas no contexto da pandemia. Esse
SUMÁRIO processo envolve, prioritariamente, a gestão do tempo dos alunos.
Segundo Amorim e Costa (2020), a pandemia impactou na gestão e
organização do tempo destinado aos estudos e desenvolvimento da
pesquisa, seja de mestrado ou doutorado, principalmente, em função
da sobrecarga de tarefas extras à vida acadêmica (atividades domés
ticas, saúde e readequação no trabalho).

A classe 5, Impactos da Covid-19, representa 15,8% do to


tal das classes. Esta classe aborda os impactos provocados pela
pandemia da Covid-19 nas áreas da educação e saúde, bem como
apresenta as mudanças no ensino da Pós-Graduação. Para Toso et

298298
al. (2020), a pandemia evidenciou a exclusão econômica e social pre
sente no mundo todo, impactando atividades essenciais, entre elas,
os setores da saúde e educação, juntas, essas duas grandes áreas
estão sofrendo (trans)formações, sendo a interação online o principal
mecanismo adotado por ambas as áreas, tanto para a continuidade
das aulas e pesquisas no campo educacional quanto para a intera
ção entre clientes e os diferentes setores da saúde.

A classe 6, Impactos causados pela Covid-19 no cotidiano dos


alunos da Pós-Graduação, representa 13,2% do total das classes.
Nela, estão contidas palavras que representam os principais impac
tos e desafios que a pandemia tem provocado no cotidiano de alunos
dos cursos de Pós-Graduação Stricto Sensu. A alteração da rotina do
processo formativo tem provocado um sentimento de insegurança e
ansiedade nos alunos. As dificuldades de gerir o tempo e a adapta
ção ao novo têm diminuído, significativamente, a produção textual
dos pós-graduandos, o que implica no atraso do desenvolvimento
das pesquisas de mestrado e/ou doutorado (AMORIM; COSTA, 2020;
SOARES; SANTANA; COMPER, 2020).

A Classe 7, Novas perspectivas apresentadas pela Covid-19


no contexto da Pós-Graduação, representa 15,8% do total das clas
ses. Nela, localizamos algumas perspectivas quanto ao futuro das
SUMÁRIO aulas da Pós-Graduação no pós-pandemia. As pesquisas indicam a
necessidade de reflexão docente sobre o uso das diferentes tecno
logias em suas práticas pedagógicas, as quais podem favorecer as
relações professor-aluno. Além disso, os estudos sugerem a amplia
ção de pesquisas sobre as inovações educacionais pós-pandemia
(PACHIEGA; MILANI, 2020). Apesar das novas possibilidades de en
sino-aprendizado, provocadas pela pandemia, o sentimento de inse
gurança está instalado nos alunos da Pós-Graduação Stricto Sensu,
especialmente no que concerne as suas expectativas de término do
curso e atuação profissional na área acadêmica (CALDEIRA; SUDRÉ;
PEREIRA, 2020; LEITE; TORRES; CUNHA, 2020).

299299
Além da CHD, geramos a árvore da similitude, decorrente da
análise do corpus textual, apresentada na figura 2. A árvore da simili
tude é baseada na teoria dos grafos, ou seja, ela “possibilita identificar
as co-ocorrências entre as palavras e seu resultado traz indicações da
conexidade entre as palavras, auxiliando na identificação da estrutura
de um corpus textual” (CAMARGO; JUSTO, 2013, p. 516).

Figura 2 – Árvore da similitude para identificação


das conexões entre as palavras.

SUMÁRIO

Fonte: relatório gerado pelo software Iramuteq.

Como podemos observar, a figura 2 apresenta três palavras em


destaque, as quais se repetiram no corpus textual e formaram a ár
vore da similitude, são elas: aluno, Pós-Graduação e pandemia, as

300300
quais possuem forte ligação, devido à espessura das linhas que ligam
uma palavra às outras. Além das palavras em destaque, chamamos
a atenção para o clusters, os quais estão formados ao redor de cada
palavra. Na palavra aluno, aparece em destaque: processo-formativo;
universidade, tecnologia, investigação, refletir, mestrando. Na palavra
Pós-Graduação, aparecem em destaque: construção, percepções,
qualidade, realizar, aspecto. Na palavra pandemia, aparece em desta
que: ensino remoto, atividade, Covid-19, gestão do tempo, mudanças,
pesquisa, adaptação, limitações, ansiedade.
As análises lexicográficas e de similitude revelam, a partir dos
dados gerados na figura 2, as relações entre as palavras ativas da
árvore da similitude, nas quais o período da pandemia provocou alte
rações quanto à rotina dos alunos da Pós-Graduação.

ALGUMAS CONSIDERAÇÕES

Neste texto, que teve por objetivo categorizar, por meio do soft
ware Iramuteq, estudos publicados que tratam sobre os impactos da
pandemia para os alunos da Pós-Graduação Stricto Sensu, foi possível
apresentar uma breve análise dos artigos publicados sobre os impac
SUMÁRIO
tos da pandemia no cotidiano das aulas e na vivência dos alunos da
Pós-Graduação, trazendo, ao mesmo tempo, indicações para novas
pesquisas nesse campo de investigação.

O conjunto de artigos selecionados para compor o nosso cor


pus textual, ainda que de maneira descritiva e preliminar, nos revelou
alguns aspectos, entre eles destacamos:

• A rotina da Pós-Graduação no contexto da Covid-19 sofreu al


terações, especialmente no que diz respeito à produção textual
dos alunos;

301301
• O ensino remoto foi adotado pela grande maioria das institui
ções de Ensino Superior, sejam elas públicas ou privadas;

• O ensino remoto, adotado durante o período da pandemia, exi


giu que alunos e professores buscassem estabelecer novas e
diferentes formas de se relacionar com as tecnologias digitais;

• O caráter metodológico das pesquisas da Pós-Graduação Stric


to Sensu sofreu transformações, as atividades e ações presen
ciais deram lugar para atividades on-line, questionários e entre
vistas por meio de plataformas digitais;

• A gestão do tempo, principalmente dos alunos, foi afetada dire


tamente, devido à sobrecarga de outras atividades (pessoais,
domésticas, familiares e de saúde);

• A pandemia tem gerado sentimentos de ansiedade e inseguran


ça, principalmente nos alunos.

Diante destas indicações e devido ao contexto atual da pan


demia, sugerimos a continuidade das pesquisas, as quais poderão
colaborar com a indicação de novas práticas pedagógicas envolvendo
o ensino remoto, tanto na continuidade da formação acadêmica e pro
fissional quanto na reestruturação das pesquisas científicas.
SUMÁRIO

REFERÊNCIAS
ALMEIDA, Fernanda Garcia de; ARRIGO, Viviane; BROIETTI, Fabiele Cristiane
Dias. Relatos de pós-graduandos em ensino de ciências e educação mate
mática a respeito de aspectos da formação em tempos de pandemia. Revista
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SUMÁRIO

305305
para

Capítulo 13

Práticas de autoconhecimento como


estratégia de autorregulação
professores e gestores na pandemia

Cristiane Paiva Alves

Júlia Costa Ishiuchi

IsabelPatrícia
13
Patrícia Unguer Raphael Bataglia

Raphael Bataglia
UnguerBaraldi
Bragança

Cristiane Paiva Alves


Júlia Costa Ishiuchi
Isabel Bragança Barald

Práticas de autoconhecimento como


estratégia de autorregulação para
professores e gestores na pandemia

DOI: 10.31560/pimentacultural/2021.107.306-321
INTRODUÇÃO

Se caracterizarmos rapidamente os últimos séculos por grandes


movimentos que os tipifiquem, temos que o século XVIII foi chamado
século das luzes; o século XIX, o da industrialização; o século XX, o
início da era espacial; e o século XXI iniciou como o século da co
municação, da alta tecnologia e, mais recentemente, o das grandes
mudanças em termos de relações sociais. Temos nos deparado com o
grande desafio de conectar a quantidade enorme de informações com
a complexidade crescente nas relações sociais (FERNANDES, 2019).

Como se não bastasse a complexidade nas relações coloca


das pela tecnologia, redes sociais, fake news... Em 2020, o mundo
foi assolado por uma pandemia da Covid-19 que trouxe agravos à
saúde mental da população, em especial aos educadores, que, de
acordo com uma pesquisa realizada no mês de maio de 2020, entre
os 8,1 mil entrevistados da Educação Básica, 8% sentiam-se ótimos
quando compararam sua saúde emocional com o período pré e pós
-pandemia. Outra parcela de 28% relatou estar com a saúde mental
péssima ou ruim neste momento, e 30% como razoável. Ou seja,
58% dos educadores estavam se sentindo com a saúde mental de
razoável à péssima, apenas dois meses após o início da pandemia.
SUMÁRIO
Dentre os termos mais utilizados para descrever a situação vivencia
da estão: ansiedade, cansaço, estresse, preocupação, insegurança,
medo, cobrança e angústia (NOVA ESCOLA, 2020).

Quando um indivíduo sofre por ansiedade, essa desordem se


manifesta por meio de sintomas cognitivos, comportamentais e físicos.
O tratamento geralmente ocorre com medicamentos psiquiátricos e tra
tamento psicológico, porém, além dos efeitos colaterais e da dificulda
de de adesão ao tratamento devido ao estigma, autores como Smits
e Zvolensky já trouxeram que a falta de atividade física está significati

307307
vamente associada a maiores níveis de sensibilidade à ansiedade e a
maior severidade de distúrbios do pânico (JAYAKODY et. al., 2014), ou
seja, a saúde integral depende do cuidado com a mente e com o corpo.

O ser humano é um indivíduo complexo que influencia e é in


fluenciado por diversos contextos, como o físico, psicológico, social,
cultural e espiritual. Dessa forma, é válido considerar que todo ser hu
mano não deve ser visto, em nenhum contexto, de forma fragmentada,
considerando-se apenas uma faceta de sua composição. Essa ideia
é corroborada pela definição de saúde da OMS (1946): “Saúde é um
estado de completo bem-estar físico, mental e social, e não apenas
uma mera ausência de doença ou enfermidade”.

Segundo Casassus (2009), a mente é o que permite ao humano


conhecer e experienciar, obter e processar informações do mundo in
terior e do exterior, e o corpo é o instrumento que percebe, para que a
mente possa realizar essa percepção mais fina e ampla. Nesse sentido,
a saúde, na percepção de Casassus (2009, p. 23), depende do estado
de equilíbrio emocional; um desequilíbrio se traduziria em doenças que
se manifestam no nível psicológico, extravasando para o físico. Sendo
assim, a mente pode prejudicar o corpo e o corpo pode prejudicar a
mente, trazendo consequências para o ser humano que os compõe.

SUMÁRIO As filosofias orientais trazem uma metáfora interessante sobre


esse processo de equilíbrio emocional. Imagina-se um transporte con
duzido por cavalos, em que há duas possibilidades: que o condutor
controle os cavalos e o caminho percorrido, ou que o controle seja as
sumido pelos cavalos. Nessa ideia, a mente seria representada pelos
cavalos e o “si mesmo” seria o condutor da mente; este deve aprender
a conduzi-la, para que não seja conduzido por ela.

Na concepção da educação Integral ou Holística, valoriza-se a


coordenação de diferentes espaços e agentes do território para garan
tir que os indivíduos tenham um desenvolvimento individual em todas

308308
as suas dimensões - intelectual, emocional, físico, social, espiritual,
sensibilidade, sentido estético, responsabilidade pessoal e ética. Este
desenvolvimento deve ocorrer pela integração de diversos agentes,
movidos por um projeto comum com metas educacionais bem defi
nidas. A existência de objetivos e projetos em comum pode levar ao
desaparecimento de preconceitos e hostilidades latentes, e ao surgi
mento de uma cooperação mais serena e até mesmo à amizade.

Essa grande mudança na educação deve ocorrer, segundo Sin


ger (2016), como resultado do encontro entre inovação e reforma, ou
seja, depende do envolvimento da liderança e suporte das redes como
universidades e ONGs. A educação holística deve se transformar em
uma realidade social. Esse movimento vai ao sentido contrário das po
líticas governamentais, já que estas se alinham com uma avaliação
educacional baseada em testes de proficiência, que reduzem a escola
a uma mínima de habilidades para o trabalho.

Na Educação Holística, deve haver inclusão de novos agentes


no processo, e foco em diferentes habilidades e formas de aprender. A
escola, segundo Puig (1998), é um meio de experiência moral relevante
para o processo de construção de personalidades, e os conflitos que
surgem podem ajudar a desenvolver a capacidade de “sensibilidade
SUMÁRIO moral”. Nesse contexto, considera-se importante a reflexão e o pensa
mento de virtude e valores, inclusive por parte dos professores, para
que possam desenvolver tanto o seu autoconhecimento quanto o seu
pensamento moral. Como consequência desse processo, os profes
sores, seres humanos holísticos, passam a ajudar a construir pessoas
integrantes da sociedade que também detenham pensamento ético e
moral desenvolvido, através da transmissão de virtudes.

309309
CONTEXTO DO TRABALHO ATUAL

Em 2017, iniciamos um trabalho colaborativo que ocorre entre o


Programa de Ressignificação da Educação - PRE de duas escolas do
Ensino Fundamental II do interior de São Paulo e o Grupo de Estudos
e Pesquisas Psicologia Moral e Educação Integral - GEPPEI da UNESP
de Marília. Até janeiro de 2020, o acompanhamento dos educadores se
dava de modo presencial, duas vezes ao ano, oferecendo formações
nos meses de janeiro e julho. Com o início da pandemia, os educadores
solicitaram que fizéssemos reuniões on-line, nos momentos dedicados
ao HTP (Hora de Trabalho Pedagógico). Inicialmente, tais reuniões se
dedicaram ao estudo de materiais sobre educação em valores, forma
ção ética e o ambiente sociomoral da escola. Aos poucos, detectou-se a
necessidade de um trabalho mais voltado a aspectos emocionais.

Tendo em mente a importância de um trabalho diferenciado com


os educadores que se ressentem muito das dificuldades que vão se
apresentando no contexto do trabalho a distância, desde lidar com
as crianças em um formato até então inédito, ter a família em “sala de
aula”, dificuldades de conexão, restrições pessoais para lidar com pla
taformas diversas, cobranças da diretoria, coordenação, secretaria da
educação, até a situação de trazer o ambiente estudantil para dentro
SUMÁRIO
de casa, reformulamos o nosso trabalho de formação continuada em
um grupo que vínhamos atuando desde 2017.

O trabalho tem acontecido semanalmente desde maio de 2020,


mas, desde março de 2021, temos revezado o estudo com um projeto
chamado “Cuidar de Si”. Os encontros entre esses dois grupos acon
tecem pela plataforma Meet, com 1 hora de duração, contando com
a participação de aproximadamente 60 participantes por encontro, se
manalmente, e são mediados por duas profissionais: uma terapeuta
ocupacional e outra psicóloga. Relataremos, a seguir, o desenvolvi
mento das reuniões no “Cuidar de Si”.

310310
A proposta dos estudos e do “Cuidar de Si” é de criar espaços
de partilha de experiências para o acolhimento emocional, realizar prá
ticas integrativas que visam ao autoconhecimento, fomentar discus
sões que levem à reflexão sobre práticas para uma autorregulação do
estresse e de estados emocionais, e oferecer subsídios teóricos às
questões levantadas pela equipe nesses encontros. Para servir como
base para o trabalho, propusemos o estudo do livro “Sete competên
cias básicas para se educar em valores” (GARCÍA; PUIG, 2010), que
trabalha na linha de cooperação, compartilhamento, confiança e cons
trução em equipe, por todos os membros da equipe escolar.

O OLHAR DO PRINCIPIANTE

A primeira semana de ‘cuidado de si’ iniciou-se com um alon


gamento que a mediadora do grupo aplicou com a finalidade de mo
vimentar o corpo, devido ao excesso de tempo sentado em frente ao
computador. Durante o alongamento, foi ensinada a prática de respi
ração diafragmática com a finalidade de relaxamento e concentração.

Em seguida, foi feito um acolhimento da atividade passada na


semana anterior de ‘educação em valores’, baseada no primeiro capítulo
SUMÁRIO
do livro, que direcionava os participantes a realizarem uma entrevista
consigo mesmo, com o objetivo de reconhecer seus pontos negativos
e positivos. Observou-se que os participantes apresentaram dificuldade
de responder às perguntas e relataram pouco conhecimento de si.

Educador (E) 1 - “foi muito difícil (...) e outra, para responder so


bre si mesmo é muito difícil. (...) a gente anda correndo o tempo todo,
olhando somente para o outro, se preocupando com tudo que está à
nossa volta menos com a gente. E eu não me conheço”.

311311
E 2 - “Não consegui achar resposta”.

E 3 - “Não consegui me encontrar”.

Visando continuar a discussão sobre conhecimento de si, foi pas


sado um vídeo disponível no Youtube chamado “Alike - a sociedade e
nossa capacidade criativa”, que retrata a rotina de um personagem que
caiu no automático, e perdeu suas cores, sua razão de viver. O vídeo
traz à tona a reflexão de como o modo de vida atual e as cobranças da
sociedade podam a energia e a subjetividade de cada indivíduo.

A partir desse vídeo, a mediadora do ‘Cuidado de Si’ propôs


para os participantes que eles tentassem, durante uma semana, olhar
para as coisas com “O olhar do principiante”, como uma criança:

• olhar para dentro de si;

• sair da zona de conforto, tentar algo novo com uma dose de


coragem.

Essa atividade, passada para os integrantes, teve como princi


pal objetivo mostrar que é necessário cuidar primeiro de si, antes de
cuidar dos outros.
Além disso, foi proposta a atividade do ‘não fazer’, em que
SUMÁRIO os participantes são orientados e estimulados a realizarem as suas
tarefas diárias de maneira não automática, visualizando cada tarefa
por outra perspectiva.

AUTOAVALIAÇÃO DO FUNCIONAMENTO
OCUPACIONAL

A semana de ‘cuidado de si’ seguinte teve início com um relaxa


mento, automassagem, música relaxante, focando sempre na respira
ção diafragmática, com o intuito de conexão consigo mesmo.

312312
Duas professoras relataram, após a respiração, quando pergun
tadas sobre a rotina e as práticas de respiração e relaxamento e olhar
do principiante:

E-4: “Já virou meta para mim, peguei meu violão de volta, cortei
as unhas (...), questão de honra agora, vou me olhar, vou me amar (...)”.

E-5: “Então, esses últimos dias eu percebi que tá muito puxado,


tá bem estressante, final de bimestre, correria. Eu não consegui fazer
isso, o que eu ‘tô’tentando fazer é à noite, a questão da respiração, de
dia eu nem percebo o que eu tô fazendo (...)”.

Baseado na dificuldade relatada na semana anterior, pelos


membros da equipe escolar, de se conhecerem, foi proposta a aplica
ção da “Autoavaliação do Funcionamento Ocupacional”, pela platafor
ma do Google Forms, com o objetivo de levar os participantes a darem
atenção a outras áreas de sua vida que não apenas o trabalho.

Esse modelo de avaliação é exclusivo da Terapia Ocupacio


nal, desenvolvido pelas autoras Kathi Baron e Clare Curtin (BARON
e CURTIN, 1990), e adaptado e validado em português por Tedesco
(2010). É conceituado em cima do ideal de tratamento colaborativo, e
foi desenvolvido visando avaliar a percepção do indivíduo em relação
às suas áreas do desempenho ocupacional, e identificar os pontos
SUMÁRIO
mais vulneráveis no funcionamento global do mesmo, avaliando tanto
o desempenho em si quanto a percepção e satisfação que a pessoa
tem de seu desempenho. O SAOF possui duas versões e as duas
possuem 23 itens distribuídos em 7 áreas: Causalidade pessoal (au
toavaliação das ações), Valores (atividades importantes e valor dos
objetivos), Interesses, Papéis (desempenho e comportamento pes
soais), Hábitos (Rotinas e cotidiano), Habilidades (aptidões) e Meio
Ambiente (Locais, pessoas e recursos sociais), em que cada item
avaliado apresenta três níveis de resposta (1 = ponto forte; 2 = ponto
adequado; e 3 = ponto que necessita ser melhorado).

313313
Ao avaliar os resultados, na primeira área de Causalidade pes
soal, constatou-se que apesar de mais de 80% dos participantes te
rem confiança em suas realizações no trabalho e lar, esse número era
consideravelmente menor em se tratando da autoconfiança nas reali
zações de lazer.

Outro resultado que se sobressaiu no estudo foi na área de Pa


péis Ocupacionais, em que, apesar de mais de 70% afirmarem que
se envolvem em seus papéis de trabalho, família e amizades, apenas
8,8% afirmaram ter um equilíbrio saudável entre eles. Além disso, na
área de Hábitos, mais de 65% alegaram não conseguir organizar satis
fatoriamente o próprio tempo.

Vale destacar um último resultado preocupante do estudo na


área de Habilidades, que mostrou que apenas 35,3% dos participantes
se sentiam fisicamente capazes de realizarem as suas tarefas.

Para finalizar a reunião do dia, foi realizado um momento de aco


lhimento e bate-papo com os participantes, em que a mediadora apon
tou como é importante desenvolver uma rotina, para que a vida não
fique presa no piloto automático, para que não ocorra uma desconexão
consigo mesmo, e para que não se perca a conexão com o presente
pela ansiedade. Após a devolutiva da autoavaliação, surgiu a proposta
da realização de uma atividade com a aplicação do Kawa Model.
SUMÁRIO

KAWA MODEL

Na próxima semana de ‘cuidado de si’, foi realizado o mesmo


esquema do início da reunião, em que os participantes foram estimula
dos a relaxarem, se concentrarem na própria respiração, e a realizarem
a automassagem e alongamento. Em seguida, foi proposta a atividade
da semana, baseada nos resultados obtidos no questionário anterior,
de que diversos integrantes apresentaram dificuldade de organização
do tempo e das ocupações.

314314
A atividade proposta foi o modelo de intervenção de Terapia
Ocupacional, o Kawa Model, criado por Michael Iwama, em que o prin
cipal objetivo é avaliar a realidade em que o indivíduo se encontra e os
instrumentos que cada um tem para encarar as dificuldades relatadas.

O modelo trabalha com a metáfora de um rio. A água do rio


representa a energia da vida em seu volume e intensidade, o que in
terfere em tudo a volta; as paredes e o fundo do rio são as determi
nantes desse fluxo vital, e representam o entorno do indivíduo, o seu
contexto social, ambiental, familiar e laboral; as rochas representam
as circunstâncias problemáticas da vida, e podem ser representadas
de diferentes formas e tamanhos, impedindo ou não o fluxo de água;
os troncos representam as características pessoais positivas, seus re
cursos materiais e os recursos não materiais, características estas que
podem auxiliar o indivíduo a movimentar as rochas (IWANA, 2009).

Após explicar o modelo, os integrantes foram direcionados a de


senharem o seu rio durante os próximos 15 minutos, nomeando tanto
as dificuldades quanto os seus instrumentos ecaracterísticas para lidar
com os problemas.

Figura 1: Desenhos produzidos pelos educadores


na atividade com o Kawa Model.

SUMÁRIO

315315
Após desenharem seus rios, todos retornaram para conversa
rem sobre o que visualizaram em seus desenhos. A seguir, na figura
1, são apresentados alguns exemplos de desenhos produzidos pe
los educadores:
Educador 4 1 (E-1) “(Foi) difícil. Tem tanta coisa que a gente
quer colocar e às vezes a gente não consegue se expressar, eu pelo
menos fui assim”.

E 6 - “Para mim, é muito difícil, porque desde o ano passado eu


tô com crise de ansiedade crônica por conta da pandemia, então tudo
me trava, eu acho que eu não consigo, assim, fazer nada, se eu vou ler
um livro eu acho que não vou ter o entendimento (...) eu não consigo
dar conta de nada, eu fico estressada, frustrada, porque eu acabo me
cobrando muito com tudo isso, (...) esse medo me suga as energias
porque sempre eu acho que não vou dar conta de nada”.

Apesar de vários participantes terem relatado dificuldade de re


presentar a realidade no papel, observou-se, pelos desenhos, que as
principais circunstâncias problemáticas relatadas foram a pandemia, a
ansiedade, o cansaço e o excesso de trabalho. Durante a reunião, os
integrantes também relataram que, apesar das dificuldades, o modelo
os ajudou a visualizar possibilidades e instrumentos de manejar as
SUMÁRIO rochas, auxiliando-as no autoconhecimento.

E 7 - “Para mim, foi, assim, esse autoconhecimento, esses dias


eu parei um pouquinho e fiz uma ‘agendinha’ com o que eu gosto, o
que me faz, o que não me faz bem, sabe, para ter esse autoconhe
cimento. E foi bem de acordo com o que eu ‘tava’ pensando, só que
dessa forma ficou mais organizado, porque além (disso), o que eu
posso fazer para melhorar, alguma coisa que não tá legal, o que é que
eu posso fazer para melhorar, esse lado eu não tinha visto ainda, não
tinha pensado, foi muito bom”.

316316
Para acolher essas demandas e encerrar a reunião do dia, a
mediadora comentou sobre dois instrumentos para auxiliar no controle
da ansiedade: a Logoterapia, uma abordagem criada por Viktor Frankl,
após a sua experiência nos campos de concentração nazista, em que
se estimula os indivíduos a ressignificarem as cirscunstâncias adver
sas, e a exercerem a sua liberdade de escolha de atitudes de forma
positiva frente a cada uma delas; e o A.C.A.L.M.E-SE, uma técnica de
Bernard Range, que tem o intuito de lidar com a ansiedade, ataque de
pânico e agorafobia, através de uma sequência de atitudes represen
tada por cada letra; (A): aceitar a ansiedade; (C): comtemplar as coisa
à volta; (A): agir com a ansiedade continuando suas tarefas; (L): liberar
ar dos pulmões; (M): manter os passos anteriores; (E): examinar seus
pensamentos; (S): sorrir; (E): esperar o futuro com aceitação.

CRIAÇÃO DE LINHA DO TEMPO

Visando contemplar as demandas surgidas no ‘cuidado de si’


anterior, o esquema da reunião foi diferente. Optou-se por realizar ape
nas uma respiração diafragmática, com o relaxamento da musculatura
do pescoço, ombro, punho e tronco, iniciando, logo em seguida, a
SUMÁRIO discussão sobre a atividade.

Foi passado um vídeo sobre o fluxo da vida, chamado “Pílulas


de consciência”, que comparava a linha da vida de um monitor car
díaco, com ‘altos e baixos’, quando estamos vivos, e ‘linear’, quando
morremos, com as experiências da vida; ter altos e baixos significa
estar vivo: amor e perda, felicidade e tristeza, sucesso e fracasso, dor
e prazer fazem parte da vida.

Então, foi iniciada a discussão sobre os desenhos, com uma re


flexão sobre se as atividades e ocupações estão sendo realizadas de

317317
forma produtiva ou automática, e sobre o nível de autocobrança, e como
isso influencia na percepção do cansaço e quantidade de trabalho.
Baseado nessa demanda de excesso de trabalho e cansaço,
e na falta de materialização do que está sendo vivido diariamente, os
participantes foram divididos em grupos menores. Assim, foi proposta
como atividade da semana a produção de uma linha do tempo que
contemplasse o período do início da pandemia até a data presente.
Nesses grupos, cada participante deveria formular a sua linha do tem
po, e dividi-la com os outros, trazendo os principais obstáculos enfren
tados e também a forma como foram solucionados.

Essa atividade visava mostrar que, apesar do contexto caótico e


da sensação de incapacidade, diversos obstáculos foram superados
com êxito através de diferentes instrumentos.

Ao retornarem para o grupo maior, a mediadora comentou so


bre como a sobrecarga, que é colocada sobre si mesmo, influen
cia negativamente todos os contextos da vida. É necessário saber
conciliar os papéis ocupacionais, criar uma rotina, delegar tarefas e
conhecer seus próprios limites. Foi aberto o momento de discussão,
que foi preenchido pelo desabafo de alguns participantes, todos eles
acolhidos pela mediadora.
SUMÁRIO
E 8 - “Nosso grupo, eu percebi que a gente tá muito tentando
entender o agora, então nossa linha do tempo praticamente não andou
muito no passado, ali, no começo da pandemia, pois nós ainda estamos,
de maneira geral, tentando entender o agora, para nossa linha do tempo
ficar pronta, mas eu estou aprendendo muito com as diferentes visões”.

E 9 - “Nós colocamos que estamos estagnados, começou com


medo e hoje estamos com desespero, o vírus está aí (...) é medo de
transmitir, medo de pegar, medo o tempo todo (...) as crianças estão
igual a gente, nessa angústia, nesse medo o tempo todo. Dentro de
casa, não estou organizada, porque, assim, (...) tudo cai sobre a mulher

318318
dentro de casa, e chega um ponto que a gente fica assim, querendo
sumir, querendo procurar um poço pra entrar e não sair mais, ficar lá
escondido, por que tudo cai em cima da gente”.

Para finalizar a reunião, a mediadora relembrou sobre algumas


formas de manejo e autocuidado, já faladas anteriormente, com o intuito
de organizar os pensamentos, emoções, atividades e uma reflexão so
bre viver a vida de forma leve, dentro dos limites possíveis de cada um.

CONSIDERAÇÕES FINAIS

Iniciamos um Processo de Ressignificação da Educação, e fo


mos surpreendidos com a pandemia em meio ao processo. Nós nos
encontramos em uma situação nunca antes vivenciada, mas, apesar
das circunstâncias pouco favoráveis, no início das atividades do cuidar
de si, não sabíamos o que aconteceria, mas, decidimos tentar, espe
rançar, como dizia Paulo Freire:
(…) É preciso ter esperança, mas ter esperança do verbo espe
rançar; porque tem gente que tem esperança do verbo espe
rar. E esperança do verbo esperar não é esperança, é espera.
Esperançar é se levantar, esperançar é ir atrás, esperançar é
SUMÁRIO construir, esperançar é não desistir! Esperançar é levar adiante,
esperançar é juntar-se com outros para fazer de outro modo (…)
(FREIRE apud CORTELA, 2005, p. 22).

Neste esforço conjunto, foi possível manter o vínculo de forma


virtual, e dar continuidade ao trabalho que sempre teve como caracte
rística a construção conjunta, com a participação de todos os envol
vidos. E foi desta forma que as atividades aqui apresentadas foram
elaboradas, de acordo com as demandas que eram trazidas em cada
encontro, o que manteve o processo vivo e flexível.

319319
Foi possível perceber que a realização das atividades propos
tas pôde avivar a importância do autocuidado como a primeira tarefa
do educador, pois, as atividades e as partilhas em grupo criaram a
visualização do impacto da falta de autoconexão para a atuação nas
atividades cotidianas, e a vontade de melhora deste aspecto foi trazida
pelo grupo. Os educadores relataram a satisfação em terem um tempo
para cuidarem de si, e conseguiram perceber a importância da imple
mentação de mudanças de hábitos e introdução de reflexões sobre as
funções que executam em seu dia a dia.

Apesar dos educadores constatarem as suas dificuldades de


autoavalição, e a desconexão com as suas realidades internas, ao
mesmo tempo, puderam iniciar o processo de reconexão e de melhoria
na qualidade de vida. Além disso, tratou-se de uma experiência com
muitas interações e construções grupais, o que reforçou a importância
de cada pessoa na constituição da equipe e o quanto um necessita do
outro, principalmente em uma pandemia.

REFERÊNCIAS
BARRERA, T.G.S. O movimento brasileiro de renovação educacional no início
do século XXI. 2006, 276 p. Tese (Doutorado) - Faculdade de Educação da
SUMÁRIO Universidade de São Paulo, São Paulo, 2016.

BATLLE, R. ¿De qué hablamos cuando hablamos de aprendizaje-servicio?


Crítica, 972, 49-54, 2011.
CORTELLA, M. S. Recusar a destruição da convivência digna! (valores inadiá
veis). In: PASSETTI, Edson; OLIVEIRA, Salete (Orgs). A tolerância e o intem
pestivo. Cotia: Ateliê Editorial, p. 2005.
FERRETTI, C. A inovação na perspectiva pedagógica. In: GARCIA, Walter.
Inovação educacional no Brasil: problemas e perspectivas. São Paulo: Cortez.
Autores Associados, 1980, pp. 55-82.
HERRERO, M. El problema del agua. Un desafío para incorporar nuevas
herramientas pedagógicas al aula Universitaria (tesis doctoral). Universidad de
Buenos Aires, Buenos Aires, Argentina, 2002.

320320
IWAMA, M. K. et al. The Kawa model: The power of culturally responsive occu
pational therapy. Disability and rehabilitation, v. 31, n. 14, pp. 1125-1135, 2009.
LUNA, José Arturo; LUNA, José Arturo. Logoterapia: un enfoque humanista
existencial. Editorial San Pablo, 1996.
MIZUKAMI, M. da G. N. Ensino: as abordagens do processo. São Paulo:
EPU, 2007.
FREIRE, P. Pedagogia da Esperança: um reencontro com a Pedagogia do
Oprimido. 4. ed. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1992.
PACHECO, J. Inovar é assumir um compromisso ético com a educação.
Petrópolis, Rio de Janeiro: Editora Vozes, 2019.
PINTO, M.R.S.V. Transformação vivencial e os caminhos para a ressignificação
escolar. Memorial apresentado ao Curso de Especialização em Alternativas
para uma Nova Educação, do Setor Litoral, da Universidade Federal do Paraná.
Orientador(a): Prof(a). Ms. Susan Regina Raittz Cavallet. Matinhos, 2018.
PUIG, J. M. Aprender a dialogar: materiales para la educación ética y moral.
In: Educación secundaria. Madri: Rogar, 1995.

TEDESCO, Solange Aparecida et al. Tradução e validação para português


brasileiro da Escala de Autoavaliação do Funcionamento Ocupacional:[revi-
são]. Mundo saúde (Impr.), pp. 230-237, 2010.

SUMÁRIO

321321
Sobre os autores e as autoras
Adriano Moro
Doutor em Educação pela UNICAMP, com Doutorado Sanduíche pela HAR
VARD UNIVERSITY: Graduate Shool of Education. Mestre em Psicologia da
Educação pela Pontifícia Universidade Católica de São Paulo (PUC-SP). Es
pecialista em Psicopedagogia pela Universidade Ítalo Brasileira. Graduado
com Licenciatura Plena em Educação Física pela Universidade Ítalo Brasileira.
Pesquisador do GEPEM (Grupo de Estudo e Pesquisa em Educação Moral)
UNESP/UNICAMP. Pesquisador do Departamento de Pesquisas Educacionais
da FUNDAÇÃO CARLOS CHAGAS (DPE/FCC) e integrante do Grupo de Pes
quisas em Avaliação Educacional. Integrante do Grupo de Pesquisa em Convi
vência Democrática: estudos sobre clima escolar e atmosfera moral do PPGE
-UMESP. Membro do International Observatory for School Climate and Violence
Prevention na Universidade de Sevilla, Espanha. E-mail: amoro@fcc.org.br

Antonella Bisetto
Graduanda em Psicologia pela Pontifícia Universidade Católica de Campinas
(PUC-Campinas). E-mail: antonellabisetto@gmail.com

Adriana Pasqualini
Mestre em Educação pelo Programa de Pós-graduação da Universidade Me
todista de São Paulo. Licenciatura em Pedagogia pela Universidade Metodista
de São Paulo, Licenciatura em Letras Português/Inglês pela UNICID - Universi
SUMÁRIO
dade de São Paulo. Professora do Ensino Superior. Mediadora de Aprendiza
gem no Programa de Enriquecimento Instrumental de Feuesrtein - certificada
pelo Instituto Feuesrtein-Bassou - PEI I e PEI Básico. E-mail: adriana.pasqua
lini@gmail.com

Beatriz Favinchi Rossi


Graduanda em Psicologia pela Universidade de Sorocaba (2021). E-mail: bia
rossi98@hotmail.com

Beattriz Guedes de Seixas


Mestranda em Educação pela Faculdade de Educação da Universidade de
São Paulo. E-mail: bguedes@usp.br

322322
Carlos Henrique Ferreira da Silva

Psicólogo, Filósofo, Mestrando em Psicologia pela Pontifícia Universidade Ca


tólica de Campinas (PUC-Campinas), bolsista do Conselho Nacional de De
senvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq). Membro do grupo de pesquisa
Psicologia da Saúde e Desenvolvimento da Criança e do Adolescente. E-mail:
carloshfdasilva@outlook.com

Cristina Maria D’Antona Bachert


Doutora em Psicologia como Profissão e Ciência e Mestre em Psicologia Esco
lar pela PUC-Campinas. Professora nos cursos de Psicologia e de Pedagogia
na Uniso – Universidade de Sorocaba. Supervisora de Estágio Específico em
Psicologia Escolar e em Psicologia e Saúde, Professora convidada no curso de
Pós-Graduação Lato Sensu de Psicopedagogia na Uniso. Realiza atividades
de formação para professores e gestores de escolas públicas. E-mail: cristina
bachert@gmail.com

Cristiane Paiva Alves


Terapeuta Ocupacional, pela Faculdade de Filosofia e Ciências - FFC, UNESP,
de Marília, tem mestrado e doutorado em Educação Especial, pela Universida
de Federal de São Carlos – UFSCar. É especialista em Neurologia e Reabilita
ção dos Membros Superiores, pela UFSCar. Docente da FFC, UNESP/Marília.
Instrutora de Yoga e vice-líder do Grupo de Estudos e Pesquisas em Psicologia
Moral e Educação Integral (GEPPEI).
E-mail: paiva.alves@unesp.br

Cristofer André Caous


Biomédico com Especialização em Patologia Clínica e Análises Clínicas (UMC).
SUMÁRIO
Mestrado em Biologia Molecular (UNIFESP). Doutorado em Ciências da Saú
de (UNIFESP), Especialização em Política, Ciência e Tecnologia (UNICAMP)
e Pós-Doc na área de Neurociências pelo Instituto Israelita de Ensino e Pes
quisa (HIAE). Integrante do Grupo de Pesquisa em Convivência Democrática:
estudos sobre clima escolar e atmosfera moral do PPGE-UMESP. Atualmente,
é pesquisador-colaborador da Universidade Federal de São Paulo, Docente
Coordenador na Faculdade Marquês de Olinda. E-mail: cacaous@gmail.com

Daniela Crepaldi Molás


Graduanda em Psicologia pela Pontifícia Universidade Católica de Campinas
(PUC-Campinas). E-mail: dani.ggj@hotmail.com

323323
Denise D’Auria-Tardeli
Graduada em Psicologia e Pedagogia. Mestre em Educação (USP). Doutora
em Psicologia Escolar e Desenvolvimento Humano (USP) com Pós-Doutorado
em Educação (USP). Professora titular do Programa de Pós-Graduação em
Educação da UMESP. Pesquisadora na área da Psicologia Moral e Educação.
Coordenadora do Grupo de Pesquisa em Convivência Democrática: estudos
sobre clima escolar e atmosfera moral do PPGE-UMESP. Membro da Associa
tion for Moral Education (USA). E-mail: denisetardeli@gmail.com

Isabel Bragança Baraldi


Graduanda do curso de Terapia Ocupacional da FFC, UNESP/Marília.
E-mail: isabel.baraldi@unesp.br

Joice Maria de Oliveira


Graduação: Letras Português/Inglês pela Unoesc- Joaçaba. Pós-graduação:
Tradução Literária Português/Inglês, pela UFSC e em Interdisciplinaridade com
ênfase em Leitura e Produção de Texto, pela Cesusc e Mestranda em Educa
ção pelo Programa de Pós-graduação em Educação - PPGEd da UNOESC
- Joaçaba. E-mail: joicemariadeoliveira@gmail.com

Júlia Kawano Brito


Graduanda em Psicologia pela Pontifícia Universidade Católica de Campinas
(PUC-Campinas). E-mail: julia.kawano@hotmail.com

Júlia Costa Ishiuchi


Graduanda do curso de Terapia Ocupacional da FFC, UNESP-Marília. E-mail:
julia.ishiuchi@unesp.br
SUMÁRIO
Juliano Porto de Cerqueira Leite
Graduando em Psicologia pela Pontifícia Universidade Católica de Campinas
(PUC-Campinas). E-mail: julianoporto.leite@gmail.com

Karen Naomi Cardoso Kubo


Graduanda em Psicologia pela Pontifícia Universidade Católica de Campinas
(PUC-Campinas). E-mail: karennckubo@gmail.com

Letícia Lovato Dellazzana-Zanon

Professora do Programa de Pós-Graduação em Psicologia da Pontifícia Uni


versidade Católica de Campinas (PUC-Campinas), Doutora em Psicologia pela
Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS), Psicóloga pela Pontifícia

324324
Universidade Católica do Rio Grande do Sul (PUCRS). Membro do grupo de
pesquisa Psicologia da Saúde e Desenvolvimento da Criança e do Adolescen
te. E-mail: leticiadellazzana@gmail.com

Lucas de Góes Ribeiro


Graduando em Psicologia pela Universidade de Sorocaba (2021).
E-mail: lcsgribeiro@hotmail.com

Lucian da Silva Barros

Doutorando em Educação, Arte e História da Cultura pela Universidade Presbi


teriana Mackenzie (UPM). Mestre em Educação pela Universidade Municipal de
São Caetano do Sul (USCS). Especialização em Ética, Valores e Cidadania na
escola, pela Universidade de São Paulo (USP). Psicólogo formado pela Univer
sidade Católica de Santos (UNISANTOS). Professor do SENAC São Paulo. Inte
grante do Grupo de Pesquisa em Convivência Democrática: estudos sobre clima
escolar e atmosfera moral do PPGE-UMESP. E-mail: lucian.barros@hotmail.com

Maria Cristina do Nascimento


Graduanda em Psicologia pela Universidade de Sorocaba (2021).
E-mail: nascimento.job@gmail.com

Mara Cristina Normídio Bini


Graduação em Administração pela REGES – Dracena. Pós-Graduação Lato
Sensu MBA em Gestão Empresarial pela TOLEDO – Presidente Prudente. Gra
duanda em Psicologia pela Universidade de Sorocaba (2021). Bolsista de
Iniciação Científica do CNPq pela Universidade de Sorocaba (2019/2020). Ex
periência em Plantão Psicológico em Delegacia de Defesa da Mulher.
E-mail: mara_normidio@hotmail.com
SUMÁRIO
Marcelo dos Santos
Doutorando em Educação pela UMESP (2020). Mestre em Finanças (UMESP
-2011). MBA em Finanças - USP (2000). Pós-graduado em Administração Fi
nanceira e Tecnólogo Mecânico pela FATEC-SP (1994). Tem licenciatura plena
em Matemática pela Universidade Oswaldo Cruz (2006). Diretor do Campus
Rudge Ramos da UMESP. E-mail: marcelo.santos@metodista.br

Maria José de Oliveira Russo


Doutora em Educação (2018) e Mestra em Educação pela UMESP (2007).
Licenciada em Pedagogia e Especialista em Educação Especial e Inclusiva.
Coordenadora e professora no curso de Pedagogia presencial e nos cursos de
Pós-Graduação em Psicopedagogia e Educação Infantil da UMESP.
E-mail: maria.russo@metodista.br

325325
Maria Teresa Ceron Trevisol
Pós-doutorado pela Universidade de Coimbra - Faculdade de Psicologia e
Ciências da Educação, UC, Portugal. Doutora em Psicologia pelo Instituto de
Psicologia da Universidade de São Paulo – USP. Mestre em Educação – PUC/
RS. Docente da graduação e do Programa de pós-graduação em Educação
– PPGEd – UNOESC. Líder do Grupo de Pesquisa Cognição, Aprendizagem
e Desenvolvimento Humano-PPGEd-UNOESC. Integrante do Grupo de Pes
quisa em Convivência Democrática: estudos sobre clima escolar e atmosfera
moral do PPGE-UMESP. E-mail: mariateresa.trevisol@unoesc.edu.br

Mônica Tessaro
Graduada em Psicologia pela Universidade Comunitária da Região de Cha
pecó (Unochapecó). Mestra em Educação pela Unochapecó. Doutoranda em
Educação pela Universidade do Oeste de Santa Catarina (Unoesc). Atualmen
te é bolsista CAPES, cod. de fin. 001. Integrante do Grupo de Pesquisa em
Convivência Democrática: estudos sobre clima escolar e atmosfera moral do
PPGE-UMESP. E-mail: m_tessaro@unochapeco.edu.br

Patrícia Unger Raphael Bataglia


Graduada em Psicologia pela Pontifícia Universidade Católica de São Paulo
(1986). Mestre em Psicologia Social pela Universidade de São Paulo (1996).
Doutora em Psicologia Social pela Universidade de São Paulo (2001). Docente
e pesquisadora do Departamento de Psicologia da Educação e do Programa
de Pós-Graduação Stricto Sensu em Educação da Faculdade de Filosofia e
Ciências da Universidade Estadual Paulista “Júlio de Mesquita Filho” - UNESP,
campus de Marília. Líder do Grupo de estudos e Pesquisas em Psicologia
Moral e Novas Alternativas em Educação. Membro da Comissão de Ética do
SUMÁRIO Conselho Regional de Psicologia de São Paulo, e é assessora científica da
FAPESP. Membro do Grupo de Estudos de Psicologia e Epistemologia Gené
ticas (GEPEGE) e do Grupo de Estudos, Valores, Educação e Formação de
Professores. E-mail: patricia.bataglia@unesp.br

Renata Thurler Lessa


Graduanda em Psicologia pela Pontifícia Universidade Católica de Campinas
(PUC-Campinas). E-mail: rthurlerlessa@gmail.com
Rosane França Cavasin

Pedagoga, com especialização em Educação Infantil, Mestre em Educação


e Doutoranda pela Universidade do Oeste de Santa Catarina (Unoesc). Atua
como professora do Instituto Federal Catarinense (IFC), campus Concórdia,

326326
nos cursos de Licenciatura em Matemática e Física com as disciplinas de Teo
rias Educacionais, Estágios, Psicologia da Educação e Didática.
E-mail: rosane.cavasin@ifc.edu.br

Simone Bálsamo

Coordenadora de atividades pedagógicas no Serviço de Aprendizagem Indus


trial (SENAI) na Faculdade de Tecnologia SENAI Mário Amato. Especialista em
Química e Plásticos em São Bernardo do Campo - São Paulo. Doutoranda em
Educação pela UMESP. Mestre em Educação pela Universidade Metodista de
São Paulo (2019). Pós-graduada em Educação e Psicopedagogia pela Pon
tifícia Universidade Católica Campinas (PUC). Graduada em Habilitação em
Química pela Faculdade de Filosofia, Ciências e Letras de Santo André. Inte
grante do Grupo de Pesquisa em Convivência Democrática: estudos sobre cli
ma escolar e atmosfera moral do PPGE-UMESP. E-mail: sbalsamo@uol.com.br

Telma Pileggi Vinha


Pedagoga. Doutora em Educação pela Faculdade de Educação da Unicamp.
Professora titular do departamento de psicologia educacional desta mesma
instituição. Coordenadora do Grupo de Estudos Ética, Diversidade e Democra
cia na Escola Pública do Instituto de Estudos Avançados da Unicamp (IdEA).
Coordenadora associada do Grupo de Estudos e Pesquisas em Educação
Moral (GEPEM.). E-mail: telmavinha@uol.com.br

Valéria Amorim Arantes de Araújo


Professora Livre-Docente da Faculdade de Educação da Universidade de São
Paulo e Bolsista de Produtividade em Pesquisa do CNPq desde 2009. Doutora
em Psicologia pela Faculdade de Psicologia da Universidade de Barcelona -
SUMÁRIO Espanha (2000). Graduada em Psicologia pela Pontifícia Universidade Católica
de Campinas (1993). Foi professora-visitante na Harvard Graduate School of
Education (EUA) em 2020, na Stanford University School of Education (EUA)
em 2016 e 2008, e na Universidad Autónoma de Barcelona (Espanha) entre
os anos de 2006 e 2010, ministrando disciplinas anualmente no Programa de
Doutorado - Psicologia de la Comunicación: Interacción Social y Desarrollo
Humano. E-mail: varantes@usp.br

Vanessa Maghry de Andrades


Graduação em Pedagogia pela ULBRA e em Psicologia pela Unoesc. Especia
lista em Neuropsicopedagogia pelo Inepe e em Neuropsicologia pelas Facul
dades Santa Rita e Instituto Inclusão Eficiente. Mestranda em Educação pelo
Programa de Pós-graduação em Educação - PPGed da UNOESC – Joaçaba.
E-mail: vanessamahry.a@unoesc.edu.br

327327
A
ÍNDICE REMISSIVO 124, 128, 169, 170, 171, 191, 202, 205,
acessibilidade 28, 33, 141, 147, 192 206, 207, 209, 216, 217, 220, 247, 248,
acolhimento 29, 116, 119, 124, 130, 195, 250, 251, 252, 262, 263, 264, 265, 266,
204, 205, 207, 209, 247, 252, 311, 314 271, 272, 273, 274, 278, 288, 296, 298,
alunos 13, 14, 19, 20, 24, 27, 28, 29, 31, 299, 301
32, 33, 40, 42, 45, 47, 55, 56, 64, 65, 68, B
69, 70, 71, 72, 74, 75, 77, 78, 79, 80, 81, BBC News 13
82, 83, 84, 85, 86, 90, 91, 95, 97, 98, 99,
101, 102, 105, 106, 107, 112, 114, 117, C
118, 120, 121, 122, 123, 124, 126, 127, capitalismo 17, 66, 145, 146, 151, 155
128, 129, 131, 132, 141, 152, 160, 165, comportamento 17, 22, 23, 31, 47, 52, 53,
171, 176, 177, 178, 181, 182, 184, 185, 92, 93, 101, 105, 111, 119, 121, 136, 195,
186, 191, 192, 193, 201, 202, 205, 206, 267, 313
207, 208, 209, 214, 215, 216, 217, 219, comunidade 13, 14, 15, 19, 20, 40, 46, 67,
220, 221, 223, 226, 232, 246, 247, 248, 85, 90, 91, 120, 121, 123, 124, 125, 126,
250, 252, 253, 254, 257, 258, 262, 263, 127, 130, 132, 133, 144, 160, 164, 174,
264, 265, 268, 269, 270, 271, 272, 273, 181, 185, 188, 190, 194, 209, 232, 248,
274, 275, 276, 277, 278, 279, 284, 285, 256, 257, 287
287, 288, 289, 292, 294, 297, 298, 299, confinamento 9, 25, 90, 98, 99, 100, 104,
301, 302, 304 105, 214
ambiente virtual 19, 23, 28, 42, 77, 224 contexto social 13, 18, 46, 81, 176, 315
aprender 28, 40, 41, 44, 48, 52, 55, 57, 59, convívio social 22, 23, 25, 29, 90
64, 65, 67, 68, 72, 73, 80, 84, 86, 87, 88, cooperação 27, 28, 127, 149, 190, 197,
122, 129, 171, 178, 183, 184, 186, 191, 206, 309, 311
200, 209, 243, 248, 308, 309 coronavírus 13, 26, 71, 90, 105, 141, 152,
SUMÁRIO aprendizagem 9, 13, 14, 19, 20, 22, 23, 164, 169, 190, 211, 212, 233, 238, 252,
24, 27, 28, 29, 30, 31, 32, 33, 34, 40, 42, 262, 282, 284
43, 45, 46, 47, 48, 51, 52, 53, 54, 55, 56, Covid-19 10, 36, 66, 88, 90, 99, 103, 105,
57, 58, 59, 60, 61, 64, 70, 71, 74, 75, 76, 136, 137, 169, 170, 171, 190, 193, 194,
77, 78, 80, 83, 84, 85, 86, 87, 92, 93, 94, 197, 206, 207, 208, 209, 210, 211, 217,
96, 97, 101, 108, 114, 119, 120, 121, 122, 219, 223, 229, 230, 232, 233, 234, 238,
123, 124, 125, 126, 127, 154, 201, 207, 252, 257, 282, 285, 291, 292, 294, 296,
214, 219, 226, 230, 238, 242, 243, 244, 297, 298, 299, 301, 302, 307
246, 252, 253, 254, 256, 257, 260, 264, COVID-19 13, 14, 15, 17, 19, 24, 26, 34,
273, 289 35, 37, 38, 64, 73, 78, 84, 87, 109, 110,
aulas 13, 14, 27, 28, 29, 40, 55, 56, 59, 67, 111, 113, 135, 136, 137, 138, 139, 141,
71, 74, 75, 80, 82, 85, 86, 90, 91, 92, 97, 167, 189, 209, 211, 212, 214, 219, 223,
98, 101, 107, 110, 112, 113, 114, 117, 123, 225, 229, 230, 231, 233, 234, 262, 266,

328328
273, 282, 283, 285, 286, 287, 289, 291, 77, 78, 80, 83, 84, 85, 86, 87, 92, 93, 97,
292, 293, 294, 303, 304, 305 101, 106, 107, 113, 114, 116, 118, 120,
crianças 9, 19, 21, 23, 24, 25, 26, 27, 28, 121, 122, 123, 124, 125, 126, 127, 133,
40, 42, 43, 45, 46, 47, 50, 51, 53, 54, 55, 134, 141, 152, 154, 172, 184, 190, 191,
56, 57, 58, 71, 74, 75, 80, 81, 84, 94, 101, 192, 199, 201, 202, 207, 214, 216, 217,
114, 115, 116, 120, 132, 138, 184, 252, 218, 221, 223, 232, 233, 238, 243, 246,
265, 266, 274, 310, 318 258, 262, 263, 264, 265, 269, 270, 271,
crise sanitária 13, 19, 29, 169, 178, 179, 273, 274, 279, 281, 289, 293, 294, 296,
184, 195 298, 299, 301, 302, 303, 304
cultura 43, 45, 75, 78, 82, 84, 87, 105, Ensino Fundamental 19, 28, 49, 66, 72, 75,
118, 119, 121, 130, 134, 149, 151, 159, 80, 128, 199, 200, 201, 215, 218, 229, 263,
173, 287 270, 310
ensino híbrido 27, 29
D
Ensino Médio 19, 66, 72, 75, 80, 199, 200,
digitalização 26 201, 210, 215, 218, 229, 263, 268, 270,
distanciamento social 17, 18, 24, 25, 26, 271, 277, 281, 284, 285
64, 81, 90, 105, 114, 124, 191, 193, 214, ensino on-line 27
247, 262, 264, 273, 282, 293, 303 escolar 10, 13, 14, 15, 19, 20, 22, 24, 29,
E 40, 42, 45, 46, 48, 56, 64, 67, 68, 69, 71,
72, 76, 78, 85, 86, 87, 91, 92, 93, 94, 95,
EAD 75, 214, 263, 293, 294, 305
96, 101, 114, 115, 119, 120, 121, 122, 123,
econômico 13, 17, 46, 148, 155, 176 124, 125, 126, 127, 128, 129, 130, 132,
ecossistema 23 133, 134, 135, 136, 137, 138, 139, 153,
educação 9, 13, 14, 15, 20, 21, 22, 27, 28, 154, 158, 160, 164, 182, 188, 190, 191,
29, 31, 34, 40, 41, 42, 45, 54, 58, 59, 60,
192, 198, 199, 206, 214, 215, 217, 218,
61, 63, 64, 67, 68, 71, 73, 75, 77, 84, 85,
219, 220, 221, 223, 225, 227, 229, 230,
86, 87, 88, 90, 91, 96, 97, 100, 102, 106, 231, 232, 233, 258, 259, 262, 266, 280,
107, 112, 117, 119, 120, 124, 132, 141, 282, 285, 311, 313, 321, 322, 323, 324,
SUMÁRIO 144, 145, 147, 149, 150, 151, 152, 154, 325, 326, 327
160, 164, 165, 171, 175, 178, 180, 181,
estresse social 24
183, 185, 186, 187, 197, 198, 199, 201,
209, 211, 212, 214, 215, 223, 225, 227, F
229, 230, 231, 232, 238, 245, 246, 250, família 14, 20, 21, 46, 55, 77, 78, 84, 101,
257, 258, 259, 262, 263, 264, 265, 266, 104, 110, 111, 114, 115, 116, 118, 122,
269, 273, 275, 281, 282, 283, 287, 294, 124, 127, 174, 183, 192, 205, 218, 288,
297, 298, 299, 302, 308, 309, 310, 311, 310, 314
321 fase pandêmica 24
educativa 13, 14, 20, 122, 125, 258 ferramentas tecnológicas 28, 34, 40, 67,
e-learning 24 68, 74, 85
ensino 13, 14, 19, 21, 23, 24, 27, 29, 32, formação 11, 20, 21, 27, 40, 46, 57, 58, 66,
33, 34, 40, 41, 42, 45, 56, 57, 58, 59, 64, 67, 72, 75, 87, 90, 91, 93, 94, 96, 106, 127,
65, 66, 67, 68, 70, 71, 72, 73, 74, 75, 76,

329329
144, 177, 181, 186, 187, 191, 194, 195, neurodesenvolvimento 47, 49, 50
199, 203, 217, 218, 231, 238, 239, 242,
P
243, 244, 245, 246, 247, 248, 250, 253,
257, 258, 259, 264, 268, 280, 289, 294, pandemia 9, 10, 11, 12, 14, 17, 18, 19, 21,
302, 310, 323 22, 23, 24, 25, 26, 27, 29, 32, 38, 40, 56,
57, 58, 64, 65, 67, 69, 71, 72, 73, 74, 75,
G 76, 77, 78, 79, 80, 81, 82, 83, 84, 86, 87,
gestão escolar 91 90, 92, 94, 95, 96, 97, 99, 100, 101, 103,
global 17, 26, 28, 29, 38, 90, 141, 162, 105, 106, 110, 111, 112, 113, 115, 117,
190, 194, 246, 313 118, 123, 132, 133, 134, 136, 137, 138,
141, 142, 149, 151, 152, 153, 164, 169,
H
170, 171, 178, 179, 181, 183, 184, 185,
humanização 25 191, 192, 194, 196, 201, 204, 205, 206,
I 207, 208, 209, 210, 211, 212, 214, 215,
216, 217, 218, 219, 221, 223, 225, 226,
idade escolar 24, 48
228, 229, 230, 231, 232, 233, 234, 238,
inteligência emocional 30, 31 242, 246, 250, 251, 252, 256, 257, 258,
interação 24, 27, 28, 32, 33, 40, 43, 44, 50, 262, 270, 271, 275, 281, 282, 283, 284,
54, 55, 57, 58, 59, 68, 69, 70, 71, 76, 77, 285, 287, 288, 289, 292, 293, 294, 297,
90, 92, 93, 94, 101, 142, 150, 194, 247, 298, 299, 300, 301, 302, 303, 304, 307,
250, 252, 264, 265, 299 310, 316, 318, 319, 320
interações 20, 23, 25, 33, 44, 71, 92, 101, população 13, 17, 18, 66, 75, 110, 141,
120, 121, 132, 215, 247, 320 144, 145, 164, 169, 191, 197, 201, 207,
interativos 21 265, 266, 307
internet 18, 19, 21, 22, 23, 26, 27, 71, 74, prática pedagógica 61, 90, 91, 101, 107,
75, 77, 85, 114, 151, 152, 171, 191, 192, 184
202, 203, 214, 217, 219, 223, 226, 241, psicologia educacional 23, 327
248, 249, 250, 256, 265, 266, 270, 279
Q
SUMÁRIO L
quarentena 17, 114, 138, 141, 214, 247,
linguagem 21, 43, 48, 49, 290
294, 303
linguagem audiovisual 21
R
M
meios de comunicação 21, 25 remoto de aula 24
meios digitais 91, 202, 256, 263 S
mercado 17, 29, 147, 238, 242, 244, 246, sala de aula 58, 59, 64, 70, 74, 82, 96, 97,
270, 287 122, 177, 192, 207, 265, 310
mídias 25, 26, 201 saúde 13, 17, 23, 30, 55, 58, 92, 99, 105,
N 110, 111, 115, 116, 117, 119, 121, 123,
131, 138, 141, 145, 147, 149, 172, 191,
neurocognitivo 19
192, 193, 197, 198, 201, 203, 204, 205,

330330
211, 212, 214, 215, 223, 225, 228, 229, transtorno psicológico 23, 24
233, 234, 244, 245, 262, 265, 282, 287, transtornos psicológicos 24
289, 298, 299, 302, 307, 308, 321
V
século XX 17, 142, 143, 144, 307
segurança 13, 64, 121, 123, 126, 127, 202, virtual 13, 14, 19, 23, 25, 28, 29, 33, 35,
208, 217, 244, 282 40, 42, 64, 72, 77, 80, 82, 91, 97, 107, 114,
smartphones 14, 21, 22, 114, 248 191, 196, 205, 224, 257, 319
sociedade 17, 21, 40, 42, 59, 82, 91, 132, virtualidade 14, 29, 33, 193
143, 144, 146, 148, 149, 150, 151, 154, vírus 14, 17, 26, 87, 88, 97, 106, 141, 169,
155, 156, 160, 173, 175, 188, 193, 222, 190, 262, 266, 318
239, 241, 243, 244, 258, 309, 312 vulnerabilidade 23, 24, 110, 114, 117, 143,
201, 223, 238, 265, 267
T
tecnologia 14, 23, 26, 29, 33, 34, 67, 68,
69, 71, 74, 90, 93, 96, 98, 117, 165, 183,
184, 203, 249, 262, 296, 301, 307

SUMÁRIO

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SUMÁRIO

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