presenteismo
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RESUMO
Este estudo teve como objectivo a validação para a língua Portuguesa de duas escalas de presentismo e apresentar as
características métricas das versões reduzidas do Work Limitations Questionnaire (WLQ) e da Stanford Presenteeism
Scale (SPS-6). Tratando-se de instrumentos desenvolvidos para avaliar o presentismo: um fenômeno frequente nas
organizações que consiste no facto de as pessoas estarem presentes no local de trabalho mas, devido a problemas físicos
ou psicológicos, não conseguirem cumprir as suas funções na totalidade. Participaram no nosso estudo trabalhadores
Portugueses pertencentes aos sectores da saúde, ensino e banca (n = 305). Através da realização de análises de
componentes principais com rotação varimax, análises factoriais confirmatórias, estudos de concomitância e teoria de
resposta ao item, foram demonstradas as boas qualidades métricas de ambas as escalas. Desta forma, sugere-se a
aplicação destes instrumentos em contexto organizacional, com vista a detectar padrões de inactividade dos recursos
humanos associados ao presentismo.
Palavras-chave: Validação; Psicometria; TRI; Produtividade; Recursos Humanos.
ABSTRACT
This study aimed to validate two presenteeism scales to the Portuguese language and present the metrical properties of the
short versions, in Portuguese, of the Work Limitations Questionnaire (WLQ) and the Stanford Presenteeism Scale (SPS-6).
These instruments were designed to measure presenteeism: an emerging concept in organizations that consists of workers
being on the job but, due to physical or psychological disorders, not be fully functioning. Portuguese workers from health,
education and bank sectors (n = 305) participated in our study. By conducting principal component analysis with varimax
rotation, confirmatory factor analysis, concomitance studies and item response theory, the appropriate metrical qualities of
both scales were demonstrated. Thus, we suggest the application of these instruments in organizational context, in order to
detect patterns of inactivity related to presenteeism.
Keywords: Validation, Psychometrics, IRT, Productivity, Human Resources.
Tabela 1. Análise descritiva, média, desvio-padrão e intercorrelações dos itens do WLQ e da SPS-6.
M DP Item 1 Item 2 Item 3 Item 4 Item 5 Item 6 Item 7
WLQ1 4.13 .97
WLQ2 4.12 .87 .650**
WLQ3 3.50 1.14 .462** .468**
WLQ4 3.97 .97 .603** .612** .511**
WLQ5 3.72 .99 .470** .565** .450** .438**
WLQ6 3.76 1.00 .596** .573** .495** .480** .741**
WLQ7 3.91 .93 .580** .586** .549** .525** .643** .724**
WLQ8 3.67 1.07 .398** .481** .387** .351** .474** .528** .498**
M DP Item 1 Item 2 Item 3 Item 4 Item 5
SPS1 3.01 1.23
SPS2 4.17 .89 -.033
SPS3 3.03 1.31 .567** -.065
SPS4 2.63 1.24 .591** -.139* .629**
SPS5 3.81 1.00 -.185** .495** -.209** -.309**
SPS6 3.50 1.13 -.365** .302** -.372** -.393** .588**
*p<.05; **p<.01
Velicer, 1986). De igual forma, recorreu-se ao
Para estudar o comportamento dos itens das método robusto dos mínimos ponderados (Velicer,
duas escalas, desenvolvemos duas análises de Eaton, & Fava, 2000) e formas paralelas (Horn,
componentes principais e rotação ortogonal do tipo 1965) para estimar o número de factores das escalas.
Varimax. Previamente, foram testados os Utilizando os procedimentos sugeridos por O’Connor
pressupostos de normalidade através das medidas de (2000), obtemos no WLQ um único factor com
assimetria e curtose. Os dados sugerem para todos os 59.16% da variância da escala. A SPS-6 permitiu a
itens, valores de normalidade não severos identificação de dois factores com 39.08% e 31.40%,
(Skewness<2; Kurtosis<7; West, Finch, & Curran, que totalizam 70.48% da variância. A plausibilidade
1995). As medidas de adequação da amostra de destes factores é ainda assegurada pelo facto dos
Kaiser-Meyer-Olkin (KMO=.901 para WLQ e loadings apresentarem correlações superiores a .60
KMO=.738 para SPS-6) e os testes de esfericidade de para todos os itens das duas escalas. Fazendo a
Bartlett (χ2(28)=4,733, p<.001 para WLQ e leitura dos itens que integram cada uma das duas
χ2(15)=581,550, p<.001 para SPS-6) mostraram uma escalas, designamos o factor único da WLQ
adequação dos dados para a presente amostra. “Limitações no Trabalho”. Seguindo as orientações
Estudos de simulação indicam que a correlação que estiveram na base de construção da SPS-6,
parcial média (CPM) é o melhor método para avaliar denominamos o primeiro factor “Distracção Evitada”
a dimensionalidade dos dados da matriz (Zwick & e o segundo factor “Trabalho Completado”.
As correlações entre itens e a dimensão (Arbuckle, 2005). Tal como referido atrás,
global da escala sugerem um contributo do item na efectuámos um conjunto de análises que atestaram os
avaliação do comportamento que está a ser medido pressupostos de normalização das medidas. Este
(Anastasi & Urbina, 2000). Wolfe e Smith Jr. (2007) procedimento permitiu a utilização do método
recomendam valores acima de .40 para escalas com robusto de estimação em Máxima Verosimilhança.
estas características. Neste caso, o valor mais baixo Neste sentido, a literatura (Hoyle & Panter, 1995)
situa-se em .440 na correlação entre SPS2 e a parece enfatizar o facto de este último tolerar bem
dimensão global do factor 2. Uma análise atenta amostras com tamanhos mais reduzidos e funcionar
destes resultados permite-nos constatar que os itens adequadamente com dados numa escala intervalar. A
das duas escalas de presentismo são relevantes e dão interpretação dos resultados obtidos foi efectuada por
um contributo importante para as dimensões intermédio de alguns índices de ajustamento
avaliadas. Por outro lado, as correlações ainda algo sugeridos por MacCallum e Austin (2000): Qui-
distantes da unidade retiram alguma redundância do Quadrado, GFI (Goodness-of-Fit Index), CFI
item para as dimensões avaliadas. (Comparative Fit Index), IFI (Incremental Fit Index),
Ainda de acordo com a Tabela 2, é possível TLI (Tucker-Lewis Index) e RMSEA (Root Mean
encontrar valores de consistência interna de .897 para Squared Error of Approximation). Para Macmann e
a dimensão global de limitações no trabalho. No que Barnett (1994), no Qui-Quadrado quanto menor for o
diz respeito aos itens que integram cada um dos seu valor, melhor é o ajustamento, sendo desejável
factores da SPS-6, verificam-se índices de uma maior aproximação aos graus de liberdade (df) e
consistência interna de .815 (Factor 1) e .780 (Factor consequente aceitação da hipótese nula (p>.05). No
2). Tratando-se de uma análise do alpha de CFI e IFI, um valor superior a .90 representa um bom
Cronbach, o número de itens é um factor a ter em ajustamento e no GFI e TLI o ajustamento do modelo
consideração (Cortina, 1993). Neste caso, as remete para valores superiores a .95 (Hu & Bentler,
dimensões avaliadas apresentam poucos itens, pelo 1995). Por sua vez, no RMSEA consideram-se os
que podemos considerar os alphas obtidos como valores inferiores a .08 como sendo devidamente
sendo adequados para as medidas em estudo. adequados (Hancock & Freeman, 2001). De alguma
De acordo com alguns autores (Fabrigar, forma, procurámos modelar e confirmar os modelos
Wegner, MacCallum, & Strahan, 1999; Thompson, obtidos na análise de componentes principais. Os
2004), os dados obtidos na análise de componentes modelos post-hoc justificaram uma maximização do
principais podem ser devidamente confirmados numa ajustamento dos modelos com a covariação dos
posterior análise factorial confirmatória. Para esse resíduos de alguns itens com conteúdos semelhantes
efeito, desenvolveu-se uma análise factorial no WLQ e na dimensão Trabalho Completado da
confirmatória com recurso ao software AMOS 6.0 SPS-6. Os valores obtidos revelaram um ajustamento
Para além da validação das escalas com 2003). Existindo vários modelos associados à teoria
recurso à teoria clássica dos testes, recorreu-se de resposta ao item, optámos neste caso pelo modelo
adicionalmente à teoria de resposta ao item e logístico a um parâmetro (que integra a grande
utilização do software estatístico Winsteps. Para o família dos modelos de Rasch), tendo em vista as
efeito, utilizou-se o modelo de Rasch para itens diferenças entre o desempenho dos sujeitos e a
politómicos que coloca os dados dos sujeitos e itens dificuldade dos itens:
dentro de um mesmo contínuo (Prieto & Delgado,
Pr (pi,s)
logit(pi,s) = log ( )=θ -β
s i
Pr (1 - pi,s)
O indicador para verificar o ajustamento dos Completado da SPS-6. Neste caso, Wright e Linacre
dados e das características do modelo são as medidas (1998) argumentam que valores superiores a 1.5
de Infit e Outfit. Infit corresponde à média dos indicam desajuste moderado a alto e acima de 2.00
resíduos ponderados com a sua variância e, de acordo valores proibitivos que tendencialmente degradam e
com Linacre (2000), um valor ajustado situa-se entre prejudicam gravemente a medida. De referir ainda
-.5 e 1.5. Outfit refere-se à média dos resíduos que este último valor é bastante sensível aos outliers
padronizados ao quadro, o que reflecte a diferença e respectivos valores extremos (Prieto & Velasco,
entre os valores observados e esperados pelos 2006).
modelos testados nos oito itens que integram a Na tabela 4, encontram-se os valores médios
dimensão global da WLQ e dos três itens das de Infit e Outfit das duas dimensões de presentismo
dimensões Distracção Evitada e Trabalho da SPS-6 e do factor Limitações no Trabalho obtido
Tabela 4. Medidas de Rasch para sujeitos e itens das dimensões de presentismo avaliadas pelas escalas WLQ e
SPS-6.
Média Sujeitos Média Itens
Medida Infit Outfit Medida Infit Outfit
Distracção Evitada -.17 .95 .96 .00 .99 .96
Trabalho Completado 1.22 .93 .95 .00 .98 .99
Limitações no Trabalho 1.36 1.09 1.05 .00 .99 1.05
ou modalidade de resposta num item apresenta
Através do Winsteps é ainda possível diferenças entre indivíduos de sexo diferente, mas
identificar um dos principais pressupostos de cuja medida de Rasch para os sujeitos se situe num
validade, normalmente associado à ausência de viés mesmo patamar de dificuldade (Aliste, 1996).
das medidas (Sisto, Bartholomeu, Santos, Rueda, & Para análise do funcionamento DIF dos itens,
Suehiro, 2008). Os viés (ou enviesamentos) utilizámos a metodologia desenvolvida por Wright e
reportam-se a um conjunto de erros que deturpam a Stone (1979) para comparação das estimações dos
validade dos constructos no que diz respeito à sua parâmetros de dificuldade dos itens. Controlando o
avaliação entre grupos de proveniências diversas nível de dificuldade dos atributos avaliados é
(Aliste, 1996). A análise de funcionamento esperado que não existam diferenças de
diferencial dos itens (DIF) é uma importante fonte funcionamento dos itens para variáveis externas
para comprovar que um teste é válido (Camilli, como o género (Aliste, 1996). Neste sentido, é
2006). Assume que a probabilidade de responder esperado que a probabilidade dos elementos dos sexo
correctamente a um item depende somente das masculino e feminino responderem a uma categoria
diferenças do constructo, determinadas pela do item não seja diferente quando se encontram num
capacidade do sujeito e pela dificuldade do item, mesmo nível do constructo. Tal como indicado na
independentemente do grupo de pertença (sexo, fórmula, através de um procedimento t-test,
cultura, língua, etc...). Uma vez que a variável sexo conseguimos estimar os parâmetros de dificuldade do
foi incluída neste estudo e assume-se como uma das item e os erros standardizados das estimativas,
variáveis mais estudadas nos estudos de DIF (vide, contrastando os resultados do sexo masculino
Prieto & Delgado, 2003; Sisto et al., 2008), (categoria 1 na fórmula) com o sexo feminino
procuraremos analisar se a probabilidade de escolha (categoria 2 na fórmula):
No que diz respeito às duas dimensões de presentismo avaliadas pelo SPS-6, não foram encontrados itens com
SOBRE OS AUTORES:
Luís Fructuoso Martinez: Licenciado em Economia (Faculdade de Economia da Universidade Nova de Lisboa),
Mestre em Comportamento Organizacional (ISPA) e Doutor em Psicologia Económica e Social (Tilburg
University, Países Baixos). Actualmente, é Professor Auxiliar Convidado no ISCTE–IUL, leccionando nas áreas
de Comportamento Organizacional, Análise de Dados e Psicologia do Consumidor. É ainda formador de SPSS e
possui experiência internacional na área do Marketing (Grupo Sonae Indústria), tendo participado na 4ª edição
do programa Contacto@ICEP.
João Vieira da Cunha: Professor Auxiliar da Faculdade de Economia da Universidade Nova de Lisboa. É
doutorado em Gestão pela Sloan School of Management do MIT e mestre em Comportamento Organizacional
pelo ISPA. É autor de mais de vinte capítulos, comunicações e artigos publicados em revistas científicas e
profissionais. O seu trabalho científico tem sido objecto de vários prémios de investigação atribuídos pela
Academy of Management e pela System Dynamics Society. A par da actividade académica, tem estado
envolvido em vários projectos de consultoria empresarial e formação de executivos a nível nacional e
internacional, em empresas e em ONGs.
Itens do WLQ-8
1. Trabalhar as horas que me são solicitadas.
2. Começar as suas tarefas assim que chega ao trabalho.
3. Fazer os mesmos movimentos, repetidamente durante o trabalho.
4. Utilizar o equipamento de trabalho (i.e.: telefone, caneta, teclado, rato...).
5. Concentrar-se no trabalho.
6. Ajudar os outros a acabar o trabalho.
7. Desenvolver a quantidade de trabalho que me é solicitada.
8. Sentir que devia ter feito aquilo que sou capaz de fazer.
Itens do SPS-6
1. Devido ao meu problema de saúde, as dificuldades que normalmente fazem parte do meu trabalho foram mais
complicadas de gerir.
2. Apesar do meu problema de saúde consegui terminar as tarefas difíceis do trabalho.
3. O meu problema de saúde inibiu-me de tirar prazer do trabalho.
4. Senti-me desesperado na concretização de determinadas tarefas de trabalho devido ao meu problema de
saúde.
5. No trabalho, consegui concentrar-me na concretização dos meus objectivos, apesar do meu problema de
saúde.
6. Senti-me com energia suficiente para completar todo o meu trabalho, apesar do meu problema de saúde.